SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO RAIMUNDA LUCENA MELO SOARES LIMITES EPISTEMOLÓGICOS DA FILOSOFIA DIALÉTICA NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO EM EDUCAÇÃO BELÉM-PA 2017 RAIMUNDA LUCENA MELO SOARES LIMITES EPISTEMOLÓGICOS DA FILOSOFIA DIALÉTICA NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO EM EDUCAÇÃO Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação, do Instituto de Ciências da Educação da UFPA, na Linha de Pesquisa Educação: Currículo, Epistemologia e História, para obtenção do título de Doutora em Educação. Orientador: Prof. Dr. Paulo Sérgio de Almeida Corrêa. BELÉM-PA 2017 Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Biblioteca do Instituto de Ciências da Educação (ICED / UFPA) S676l Soares, Raimunda Lucena Melo. Limites epistemológicos da filosofia dialética na produção do conhecimento científico em Educação / Raimunda Lucena Melo Soares ; orientador Paulo Sérgio de Almeida Corrêa. – Belém, 2017. 257 f. Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciências da Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Belém, 2017. 1. Pesquisa educacional – Brasil. 2. Dialética. 3. Teoria do conhecimento. 4. Ciência – Filosofia. I. Corrêa, Paulo Sérgio de Almeida (orient.). II. Título. CDD 22. ed. – 370.72 Belém, ____ de ___________ de 2017 BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Sérgio de Almeida Corrêa (PPGED/ICED/UFPA) Orientador ___________________________________________________________ Prof. Dr. Sílvio Ancísar Sanchez Gamboa (PPGE/UNICAMP) Examinador Externo ___________________________________________________________ Profª. Drª. Ivanilde Apoluceno de Oliveira (PPGED/ CCSE/UEPA) Examinadora Externa ___________________________________________________________ Prof. Dr. Carlos Jorge Paixão (PPGED/ICED/UFPA) Examinador Interno ___________________________________________________________ Profª. Drª. Flávia Cristina Silveira Lemos (PPGED/ICED/UFPA) Examinadora Interna EPÍGRAFE Existem momentos em que o que parece tão simples traz à tona uma complexidade que analisada apresenta limites onde antes não se percebia. AGRADECIMENTOS Pelo dom da vida, agradeço a Deus, Supremo Mestre, em quem busco lições de amor, partilha, generosidade e liberdade. Ao meus filhos Paulo Alexandre, Júlio Cesar e Ana Cláudia por me ensinarem a amar, pelo companheirismo, paciência, apoio e incentivo diante das dificuldades. A minha sobrinha e afilhada Camila Claíde por ajudar-me a desenvolver minha capacidade de ternura, pelo carinho e companhia nos momentos de cansaço. Ao professor Dr. Paulo Sérgio de Almeida Corrêa pelo acompanhamento, olhar atento, compreensão e firmeza nas orientações na produção desta tese. Aos professores Dr. Sílvio Ancísar Sanchez Gamboa, Dr. Carlos Jorge Paixão e Drª. Flávia Cristina Silveira Lemos pelas valiosas sugestões que deram a este texto por ocasião da qualificação. A professora Drª. Ivanilde Apoluceno de Oliveira, pela leitura atenta do texto de defesa. Aos colegas de turma pelos momentos partilhados com carinho e ternura durante o processo de doutoramento, especialmente, à Elza Ezilda Valente Dantas, amiga querida, pela atenção e companhia nos momentos de fragilidade com a saúde, a Iza Helena Travassos Ferraz de Araújo que prencheu com sua alegria muitos dos momentos vividos nesse processo, à Maria Gorete Rodrigues Cardoso pela conversa minutos antes da defesa, pessoas queridas juntamente com Céres Cemírames de Carvalho Macias e Daniele Vasco Santos acompanharam atentas a defesa da tese. Ao PPGED-ICED-UFPA, pela oportunidade de qualificação como docente pesquisadora. Aos meus amigos, companheiros de estudos e pesquisas do Gepefee e do Nepec, pela escuta e contribuição no processo formativo. Aos meus irmãos Geraldo Lucena Melo e Clarisse Lucena de Melo Pantoja pela presença amiga no momento da defesa. RESUMO Abordou-se a complexidade das limitações epistemológicos da filosofia dialética em pesquisas realizadas na área de educação. Como se configuram as limitações epistemológicas da filosofia dialética em pesquisas em educação, apesar do reconhecimento de sua capacidade heurística e da sua organicidade lógica? Qual o lugar de importância atribuído à Filosofia Dialética no âmbito da produção do conhecimento científico no campo da pesquisa em educação no Brasil? Qual a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação no Brasil? Como se configura o método de investigação científica e quais temáticas e objetos de estudos são privilegiados na construção do conhecimento científico em educação? Quais os limites epistemológicos na abordagem dialética quando seus pressupostos são aplicados na construção das Teses Doutorais provenientes dos Programas de Pós-Graduação em Educação? O objetivo geral do estudo visou entender e expor os limites epistemológicos que permeiam a formação de pesquisadores e a construção do conhecimento científico na área de educação, sob a influência da Filosofia Dialética. De modo específico, os objetivos almejaram: analisar a importância atribuída à Filosofia Dialética na produção do conhecimento em teses desenvolvidas no âmbito dos Programas de Pós-Graduação da área de educação; examinar a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação e as contribuições do materialismo histórico dialético para a formação do pesquisador nesse campo disciplinar; discutir a lógica de construção do conhecimento expressa nos métodos de pesquisa adotados nas Teses Doutorais visando à produção do conhecimento científico na área da educação; analisar as implicações epistemológicas da abordagem dialética na produção do conhecimento científico resultante das Teses Doutorais. Partiu-se de uma abordagem epistemológica baseada na Filosofia Dialética, especialmente materialista e histórica. As fontes bibliográficas e documentais foram as principais bases da pesquisa, destacando-se as obras de Karl Marx e Friedrich Hegel e as teses de doutoramento orientadas pelos professores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani. O tempo histórico de abrangência da pesquisa abrangeu o período de 1974 a 2015. Pude constatar que a abordagem dialética na pesquisa educacional, inclusive em sua concepção materialista histórica, apresenta limitações que não são apenas de ordem da insuficiência teórica dos pesquisadores que adotam seus pressupostos nas pesquisas que realizam, mas em razão da complexidade em que se originam as tensões epistemológicas implícitas em tal filosofia, em função do caráter contraditório em que se estabelece o movimento do real e de sua própria lógica, da dificuldade que se tem de colocar em prática o materialismo histórico dialético, na perspectiva da práxis transformadora da realidade, bem como do modo como os autores constroem seus objetos e métodos heurísticos no processo de produção do conhecimento científico. Logo, a multiplicidade de dimensões e relações do objeto no contexto histórico, implica ainda mais na presença complexa dos limites da dialética, apesar da sua capacidade heurística nas pesquisas em educação. Com base no princípio de contradição, pude concluir que esses limites são explicados pelos princípios e concepções no cerne da lógica dialética, tanto do ponto de vista ideal como da perspectiva material e que são forjados juntamente com as possibilidades epistemológicas. Por fim indago e aponto alguns vestígios das limitações enfrentadas na construção desta tese. Palavras-chave: Educação. Filosofia Dialética. Limites Epistemológicos. Produção de Conhecimento. Complexidade. ABSTRACT Study on the complexity of the epistemological limitations of the dialectical philosophy in researches in the field of education. How are the epistemological limitations of dialectical philosophy configured in research in education, despite the recognition of its heuristic capacity and its logical organicity? What is the place of importance attributed to the Dialectic Philosophy within the production of scientific knowledge in the field of educational research in Brazil? What is the Dialectic Philosophy receptivity in the investigative practices of researchers in education in Brazil? How to setup the scientific research method and what themes and study objects are privileged in the construction of scientific knowledge in education? What are the epistemological limits in dialectical approach when its assumptions are applied in the construction of doctoral theses from the Graduate Program in Education? The general objective of the study was to understand and expose the epistemological limits that permeate the formation of researchers and the construction of scientific knowledge in the area of education under the influence of Dialectical Philosophy. Specifically, it aims to analyze the importance given to Dialectic Philosophy in knowledge production in theses developed within the Postgraduate Programs of education area; to reflect on the receptivity of the Dialectic Philosophy in the investigative practices of researchers in education and contributions of historical dialectical materialism for the researcher formation in this subject area; to discuss the construction of knowledge logic expressed in the research methods used in the doctoral theses aiming the production of scientific knowledge in education area; and analyze the epistemological implications of the dialectical approach in the production of scientific knowledge resulting from doctoral theses. Starting from an epistemological approach based on Dialectical Philosophy, especially materialism and historical ones. The bibliographical and documentary sources were chosen as the main basis of the research, highlighting works of Karl Marx and Friedrich Hegel and doctoral thesis supervised by Professors Antônio Joaquim Severino and Dermeval Saviani. The historical time span of the research covered the period from 1974 to 2015. I could see that the dialectical approach in educational research, including in its historical materialist conception, presents limitations that are not only of the order of the theoretical insufficiency of the researchers who adopt their presuppositions in the researches they carry out, but because of the complexity in which the tensions originate Epistemological implications implicit in such philosophy, due to the contradictory character in which the movement of the real and its own logic is established, the difficulty of putting into practice dialectical historical materialism, in the perspective of the praxis transforming reality, as well as the way authors construct their heuristic objects and methods in the process of producing scientific knowledge. Therefore, the multiplicity of dimensions and relations of the object in the historical context implies still more in the complex presence of the limits of the dialectic, in spite of its heuristic capacity in the researches in education. Based on the principle of contradiction, I have been able to conclude that these limits are explained by principles and conceptions at the heart of dialectical logic, both from an ideal point of view and from a material perspective, and which are forged along with epistemological possibilities. Finally I inquire and point out some vestiges of the limitations faced in the construction of this thesis. Keywords: Education. Dialectical Philosophy. Epistemological Limits. Knowledge Production. Complexity. RÉSUMÉ La complexité des limites épistémologiques de la philosophie dialectique de la recherche menée dans le domaine de l'éducation a été approché. Comment les limites épistémologiques de la philosophie dialectique dans la recherche en éducation sont configurés, en dépit de la reconnaissance de sa capacité heuristique et son organicité logique? Quelle est la place de l'importance attribuée à la philosophie Dialectique sous la production de connaissances scientifiques dans le domaine de la recherche en éducation au Brésil? Quelle est la réceptivité de Philosophie Dialectique dans les pratiques d'investigation des chercheurs en éducation au Brésil? Comment la méthode de la recherche scientifique se configure et qui sujets et objets d'étude sont privilégiés dans la construction des connaissances scientifiques dans l'éducation? Quelles sont les limites épistémologiques dans l'approche dialectique lorsque ses hypothèses sont appliquées dans la construction de Thèses de Doctorat des Programmes d'Études Supérieures en Éducation? L'objectif général de l'étude visait à comprendre et exposer les limites épistémologiques qui imprègnent la formation des chercheurs et la construction des connaissances scientifiques dans le domaine de l'éducation sous l'influence de la philosophie dialectique. Plus spécifiques, les objectifs étaient analyser l'importance accordée à la Philosophie Dialectique dans la production de connaissances dans les thèses développées dans le cadre des programmes d'études supérieures de domaine de l'éducation; examiner la réceptivité de Philosophie Dialectique dans les pratiques d'investigation des chercheurs en éducation et les contributions du matérialisme dialectique historique à la formation du chercheur dans ce domaine disciplinaire; discuter la logique de la construction de la connaissance exprimée dans les méthodes de recherche utilisées dans les thèses de doctorat visant à la production de connaissances scientifiques dans le domaine de l'éducation; analyser les implications épistémologiques de l'approche dialectique dans la production de connaissances scientifiques résultant de les Thèses de Doctorat. L’étude a partir d’une approche épistémologique basée sur la Philosophie Dialectique, en particulier le matérialisme et historique. Les sources bibliographiques et documentaires ont été la base principale de la recherche, en particulier les œuvres de Karl Marx et Friedrich Hegel et les thèses de doctorat dirigées par les professeurs Antônio Joaquim Severino et Dermeval Saviani. La recherche a couvert le temps historique de 1974-2015. Je pouvais voir que l'approche dialectique dans la recherche en éducation, y compris sa conception matérialiste historique, a des limites qui ne sont pas seulement commandent l'insuffisance théorique de chercheurs qui adoptent leurs hypothèses dans la recherche qu'ils font, mais à cause de la complexité qui proviennent des tensions épistémologique implicite dans cette philosophie, en raison du caractère contradictoire qui établit le mouvement réel et sa propre logique, la difficulté que vous avez à mettre en pratique le matérialisme historique dialectique, du point de vue de la transformatrice de la réalité, ainsi que le comment les auteurs construisent leurs objets et méthodes heuristiques dans scientifique processus de production des connaissances. Ainsi, la multiplicité des dimensions et des relations d'objet dans un contexte historique, implique en outre la présence complexe de limites de la dialectique, en dépit de sa capacité heuristique dans la recherche en éducation. Basé sur le principe de contradiction, je conclus que ces limites sont expliquées par les principes et les concepts au cœur de la logique dialectique à la fois du point de vue du point de vue matériel idéal et sont forgés avec les possibilités épistémologique. Enfin informer et souligner quelques traces des difficultés rencontrées dans la construction de cette thèse. Mots-clés: L'éducation. La Philosophie Dialectique. Limites Épistémologiques. La Production de Connaissances. Complexité. LISTA DE GRÁFICOS E QUADROS GRÁFICO 01 – Distribuição de Teses por Instituição de Ensino Superior. 47 GRÁFICO 02 – Distribuição de Dissertações por Instituição de Ensino Superior. 48 GRÁFICO 03 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das teses em Educação. 50 GRÁFICO 04 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das Teses em Filosofia. 59 GRÁFICO 05 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das Dissertações em Educação 61 GRÁFICO 06 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das Dissertações em Filosofia. 65 GRÁFICO 07 – Distribuição das Dissertações por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Antônio Joaquim Severino no período de 1977 a 2013 93 GRÁFICO 08 – Distribuição das Dissertações por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Dermeval Saviani no período de 1977 a 2000. 95 GRÁFICO 09 – Distribuição das Teses por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Antônio Joaquim Severino no período de 1980 a 2016 96 GRÁFICO 10 – Distribuição das Teses por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Dermeval Saviani no período de 1978 a 2016. 98 QUADRO 1 – Distribuição de resumos de teses e dissertações pelas diferentes áreas de conhecimentos no período1987-2012 43 QUADRO 02 – Escolarização superior no percurso de formação dos orientadores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani 79 QUADRO 03 – Vínculo dos orientadores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani com os Grupos de Pesquisa 89 QUADRO 04 – Produção Intelectual de Antônio Joaquim Severino no Período de 2000 a 2016 100 QUADRO 05 – Produção Intelectual de Dermeval Saviani no Período de 2000 a 2016 101 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 12 2 MAPEANDO A IMPORTÂNCIA ATRIBUÍDA À FILOSOFIA DIALÉTICA NO CAMPO DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO NO BRASIL............................................ 41 2.1 A FILOSOFIA NAS TESES EM EDUCAÇÃO E EM FILOSOFIA.......................... 49 2.2 A FILOSOFIA NAS DISSERTAÇÕES EM EDUCAÇÃO E EM FILOSOFIA.......... 60 3 REPERCUSSÕES ACADÊMICAS NA TRAJETÓRIA DE FORMAÇÃO DE ANTÔNIO JOAQUIM SEVERINO E DERMEVAL SAVIANI................................... 73 3.1 OS CAMINHOS PARA A GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA E AS PRIMEIRAS INVESTIDAS PROFISSIONAIS...................................................................................... 76 3.2 TRILHANDO CAMINHOS DA PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA E DA CONSOLIDAÇÃO NA DOCÊNCIA................................................................................ 83 3.3 A TOTALIDADE DE ORIENTAÇÕES EM PROGRAMAS DE PÓS- GRADUAÇÃO ESTRICTO SENSU................................................................................ 92 3.4 AS PRERROGATIVAS TEMÁTICAS E OS MEIOS DE CIRCULAÇÃO DE PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA..................................................................................... 100 4 A LÓGICA DE ELABORAÇÃO DO CONHECIMENTO EM EDUCAÇÃO: TESES ORIENTADAS POR SEVERINO E SAVIANI NO PERÍODO DE 2000 A 2015..................................................................................................................................... 114 4.1 APROPRIAÇÃO E ELABORAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DO MÉTODO........ 115 4.2 RELAÇÕES ENTRE CATEGORIAS DA DIALÉTICA NO PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO: TOTALIDADE E CONTRADIÇÃO................................................. 133 4.3 CONTEXTUALIZAÇÃO COMO PERSPECTIVA DE TOTALIZAÇÃO.................. 141 4.4 A ESCOLHA DOS TEMAS E SUAS LIGAÇÕES COM A VIDA.............................. 152 5 MEANDROS E COMPLEXIDADE DOS LIMITES EPISTEMOLÓGICOS DA ABORDAGEM DIALÉTICA NAS TESES DOUTORAIS ORIUNDAS DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO......................................... 169 5.1 A RELAÇÃO ENTRE O SUJEITO E O OBJETO NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO............................................................................................................ 174 5.2 A PROVA REVELADORA DA MATERIALIDADE DO OBJETO......................... 188 5.3A VERDADE CIENTÍFICA.......................................................................................... 195 5.4 A SUSTENTAÇÃO TEÓRICA DA TESE ANUNCIADA......................................... 202 6 CONCLUSÃO.......................................................................................................... 216 REFERÊNCIAS........................................................................................................... 228 APÊNDICE A – TESES DEFENDIDAS NO PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DO INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ – 2011 A 2015.............. 240 APÊNDICE B – TESES ORIENTADAS POR ANTÔNIO JOAQUIM SEVERINO. 2000-2015........................................................................................................................... 245 APÊNDICE C –TESES ORIENTADAS POR DERMEVAL SAVIANI – 2000-2015.. 246 12 I INTRODUÇÃO A educação educação é entendida como processo de formação humana, pelo menos na cultura ocidental, desde o entendimento do inacabamento do homem (SEVERINO, 2006), ideia da qual se origina a noção de educação como atividade nuclear da formação, processo sem o qual não se pode falar propriamente de humanização e de cultura. Daí a preocupação que se tem desenvolvido em relação à educação e os investimentos teóricos e práticos a ela dedicados. Dentre as muitas possibilidades investigativas que a educação proporciona, situa-se a da formação dos pesquisadores brasileiros que centram suas investigações na produção do conhecimento em educação e a dos problemas relacionados a essas formação e produção. Para efeito da produção desta tese doutoral, o meu interesse investigativo se fixou aos problemas relacionados à produção científica em educação. Na produção do conhecimento a escolha de um método de investigação não se reduz a uma questão técnica, mas consiste ao mesmo tempo em uma escolha ética e política, sustentada por concepções de conhecimento, de ser humano e de sociedade assumidas pelo pesquisador. Cada metodologia é constituída a partir de uma filosofia, busca os fundamentos desta e a ela se liga inexoravelmente. Além disso, tem um poder de alcance finito, conhecer as limitações desse poder é importante a todo aquele que se aventura pelos caminhos da investigação. Na compreensão da ligação entre filosofia e conhecimento, importa dizer que a Filosofia nasce com características valiosas para a humanidade, referentes especialmente à produção do conhecimento. Fundada na pluralidade, desde as suas origens ela assume a responsabilidade da atitude investigativa e da crítica sobre si mesma. Por meio dela a humanidade dá um salto qualitativo na capacidade de pensar e de conhecer. Seu surgimento impulsionou a evolução cultural e histórica, e da própria razão humana. Com a Filosofia surgiu a exigência de métodos de investigação, além do estudo relativo aos próprios métodos. Não é sem razão que Gamboa (2009, p. 65) comenta: “A filosofia nas suas diferentes etapas históricas tem pretendido tomar consciência do método, por exemplo, no ‘Organón’ de Aristóteles, na lógica medieval e, de forma mais explícita, em Descartes, que colocou em primeiro plano a reflexão sobre o método”. 13 Para além do aspecto metodológico, a atividade filosófica se caracteriza pela tomada de consciência do homem sobre si mesmo, a capacidade de articular uma visão de mundo, efetivando assim características ontológicas e, ao mesmo tempo, gnosiológicas, posto que se trata de uma consciência capaz de compreender a necessidade de pensar critérios de elaboração do conhecimento e de verdade, isto é, preocupada com suas próprias maneiras de tratar a realidade, nesse processo inventivo, o que significa que essa atividade apresenta características epistemológicas, uma vez que chama para si a responsabilidade não somente de veiculação do conhecimento, como se dava no pensamento mitológico, mas especialmente da produção do mesmo, tirando dos deuses a responsabilidade exclusiva desta e da elaboração da verdade, dos critérios que a definem como tal e, finalmente, assumindo-se como crítica de sua própria produção. Com essas características principais a Filosofia passou a ser compreendida como essencial à formação do educador, pelas contribuições que ressoam à educação e, especialmente, à formação do pesquisador, segundo defendem Severino (1990), Saviani (1990), e Luckesi (1990). Nesse sentido, é indicada como indispensável à formação da consciência do pesquisador, sobretudo, uma filosofia que tenha como objeto de reflexão a questão da metodologia da pesquisa e da lógica de sustentação do raciocínio científico, como indica Vieira Pinto (1999). Os estudiosos da educação, como todo pesquisador, realizam uma série de atividades que incluem, dentre outras, a proposição de problemas e hipóteses e a elaboração de teorias e conceitos. Nesse exercício, ainda que se possa dizer que as ideias independem do pensamento, que são representações do real, não se pode negar que o pensamento se organiza logicamente. A própria realidade se estrutura dessa forma. O pesquisador, pois segue uma lógica que, por sua vez, se sustenta em princípios necessários a sua constituição. É nesse sentido que determinado método pode ser considerado um instrumento lógico de interpretação da realidade. Mas, que abordagens filosóficas são utilizadas pelos pesquisadores em educação em seus métodos investigativos, em programas de pós-graduação? A esse respeito, Gatti (1999) menciona as abordagens “lógico-empirista”, “fenomenológicas” e “materialistas históricas”, Gamboa (2013) indica as abordagens empírico-analítica”, “histórico-hermenêutica ou fenomenológica” e “dialética ou teoria crítica” e Severino (2001), ao falar de pesquisa em educação no Brasil, aponta três perspectivas, a “positivista”, a “fenomenológica” e a “dialética” e as relaciona, respectivamente à ciência 14 da natureza, às ciências humanas e a ciência da educação. Esse autor refere-se, ainda, à perspectiva pós-moderna que começa a se afirmar no final do século XX. Além disso, Severino (2001, p. 17) diz que o paradigma dialético “tem se revelado, até o momento, como a perspectiva mais fecunda” para dar conta “da praxidade da educação”. Então, há grande probabilidade que as teses que ele orienta se sustentem teoricamente na perspectiva dialética. Em relação aos estudos com que me ocupo nos últimos anos têm se dirigido a questões curriculares nos seus aspectos éticos, epistemológicos e políticos. São pesquisas que interpelam a Filosofia da Educação como plano sobre o qual se assentam questões investigativas, no envolvimento com inquietações acerca da Filosofia da Educação, especialmente como conhecimento relativo à educação, mas também como disciplina, com suas possibilidades e limitações no processo de formação de educadores, e com o lugar por ela ocupado nessa mesma formação, quando realizada sob a responsabilidade do Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do Pará. Assim, minhas escolhas investigativas, pois, marcam uma aproximação epistemológica com a Linha de Pesquisa Educação: Currículo, Epistemologia e História do Programa de Pós-Graduação em Educação, desse instituto e universidade. No que diz respeito às inquietações investigativas concernentes ao processo de doutoramento, o interesse pela produção do conhecimento na esfera da educação, o caráter epistemológico desse interesse indica a importância institucional deste estudo, uma vez que se trata de um assunto relevante para uma linha de pesquisa preocupada com a questão epistemológica, para a qual os aspectos filosóficos e metodológicos são especialmente significativos, pois epistemologia e filosofia estão efetivamente ligadas, mas também para uma instituição que se organiza como centro de produção de conhecimento, como é o caso das universidades. Meu trabalho e estudos estão centrados no Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do Pará, desde a formação inicial. Por isso, a curiosidade em saber como a questão das abordagens se espelha nesse programa, a fim de situar melhor a importância institucional da pesquisa desenvolvida por mim nos estudos doutorais. Ao perscrutar a página eletrônica http://www.ufpa.br/ce/ppged/ do Programa de Pós-Graduação em Educação, do Instituto de Ciências da Educação – ICED, da Universidade Federal do Pará – UFPA, observei que a situação é bastante propícia para receber as inquietações epistemológicas que movem meu interesse investigativo. O atual Programa de Pós-Graduação deste instituto é bastante novo, possuindo, no momento de 15 preparação para o ingresso como discente no doutorado desse programa apenas 6 teses, defendidas nos anos de 2011 e 2012, cujos títulos apontam interesses epistemológicos relacionados com as políticas públicas e a educação, com os sentidos que alguns trabalhadores têm de seu próprio labor e com a relação entre os saberes sociais e a luta de classes, porém nenhum parece interessado nos problemas que a formação de pesquisadores e a conhecimento em educação possa apresentar. Ao atualizar esses indicadores no início do mês de outubro de 2015, percebi que o número de teses defendidas setuplicou em relação àquele momento, saltando de seis (6) para quarenta e três (43) teses, mas a situação em relação ao meu interesse investigativo não mudou. Como é possível observar no Quadro A, em anexo, nenhum dos títulos das teses indica um interesse em estudar os limites epistemológicos da filosofia dialética na formação de pesquisadores e na produção do conhecimento científico em educação. Não somente os títulos permitem afirmar a distância de interesses entre as teses defendidas até outubro de 2015, no Programa de Pós-Graduação em Educação do ICED/ UFPA, e o estudo que realizei, relatado neste texto. Ao observar as palavras-chave indicadas abaixo dos resumos de cada uma dessas teses e expostas no quadro acima mencionado, é possível notar que nenhuma delas, seja tomada isoladamente, ou considerada no conjunto indicativo de cada tese, remete a uma preocupação com o tema da produção do conhecimento na área da educação, muito menos com a possibilidade dos limites epistemológicos da filosofia dialética nessa produção. O que me permite dizer que nenhuma delas trata do tema, do objeto e do problema de investigação que consubstancia os estudos de minha Tese Doutoral. Entretanto, e para não pairar dúvida a respeito, além dos títulos e das palavras- chave verifiquei os resumos, as introduções e as conclusões dessas teses e pude confirmar que realmente nenhuma delas coincide com minha curiosidade epistemológica. Apoiada nas informações contidas nesses componentes das teses, pude verificar que as bases teóricas subsidiárias das metodologias dessas produções podem ser distribuídas da seguinte forma: do total de quarenta e três (43) textos oito (8) referem uma abordagem pós (pós-estruturalista (18,60%); pós-moderna), três (3) mencionam a fenomenologia (6, 97%), duas (2) o estruturalismo de Pierre Bourdieu (4,65%), uma (1) a Teoria das Representações Sociais de Serge Moscovici, duas (2) a Nova História (4,65%), três (3) a análise de conteúdo (6,67%), duas com base em Laurece Bardin e uma subsidiada por Laura Franco, uma (1) fundamentada na análise do discurso de Bakhtin 16 (2,32), e uma (1) situa as bases teóricas de sua análise em três autores: Freire no que se refere à Concepção de Educação, Boaventura de Souza Santos, concernente ao enfoque da Epistemologia do Sul e Michael Apple a respeito da abordagem sobre currículo (2,32%). As vinte e duas (22) restantes, portanto mais da metade das teses (51,16%), mencionam que tomam como base teórica de suas análises o materialismo histórico- dialético. Entre essas o autor mais citado é Karel Kosik. Apenas uma (1) não indica entre as referências de seus estudos autores que se aproximam da dialética como Karl Marx, Gramsci, Karel Kosik, Gaudêncio Frigotto e Dermeval Saviani, por exemplo. Mas nenhuma dessas produções orienta a sua análise para a possibilidade de limitações epistemológicas dessa abordagem. Nas experiências no âmbito profissional, no trato com a pesquisa, a extensão, e a docência em Filosofia da Educação no Curso de Pedagogia e no componente disciplinar Didática da Filosofia ministrado ao Curso de Filosofia, ambos na Universidade Federal do Pará, o primeiro no decorrer dos anos de 1994 a 2012 e o segundo no período de 2007 a 2011, constantemente surgiam perguntas ligadas às relações da Filosofia e da Filosofia da Educação com a formação do educador e do pesquisador, à produção do conhecimento nas pesquisas em Educação e em Filosofia da Educação, e à importância das discussões epistemológicas para essa formação. Nesse contexto do cotidiano profissional foram geradas as ideias que se situavam no plano da Filosofia da Educação como disciplina e como conhecimento relativo à educação, com suas possibilidades e limitações no processo de formação de educadores, preocupação essa desenvolvida na dissertação de Mestrado intitulada Filosofia da Educação: Limites e Possibilidades na formação do pedagogo, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPA. Diante da densidade e da complexidade que comporta a educação, assumindo como base uma dialética da história, com um problema relativo aos limites e possibilidades da disciplina Filosofia da Educação na formação do pedagogo1, objetivei, 1 Essa dissertação foi defendida em 2012 e pode ser acessada no site do programa de pós-graduação do Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do Pará, http://www.ppged.com.br/. Esse estudo resultou na publicação de dois trabalhos. O primeiro, sob o título de “Educação: da lógica social à lógica educacional”, foi apresentado no 11º Seminário Nacional de Políticas Educacionais e Currículo, realizado na Universidade Federal do Pará, em Belém, no período de 12 a 14 de março de 2013, seguida de publicação de um artigo, com o mesmo título, nos Anais desse evento. In: Os Fundamentos Epistemológicos e Políticos da Produção do Conhecimento em Educação. Belém, Pa. 2013, v. 1. p. 1- 30. ISSN 2176-803x. O segundo, com o título A Filosofia da Educação em Questão: Por que retomar um 17 principalmente, analisar a participação da Filosofia da Educação, seus limites e possibilidades na formação do educador, indagando sobre esses dois elementos e onde podemos situá-los, tendo em vista que essa disciplina constitui um conjunto de saberes ligado a duas grandes áreas do conhecimento: a Filosofia e a Educação, em suas complexidades, nexos e contradições. A análise dos documentos e informações que alimentaram este estudo, permitiu observar que os limites, mas também as possibilidades da disciplina Filosofia da Educação são forjadas nas relações entre ela a Educação, a Filosofia, a prática educativa de professores e alunos e as contradições engendradas no contexto teórico e prático destas áreas de saber, em função das necessidades e das contingências a que elas são submetidas no contexto social e histórico. Os estudos realizados nos grupos de pesquisa dos quais participo, foram bastante significativos para a pesquisa que realizei no processo de doutoramento e que deu azo a este texto. As discussões e encontros realizados no Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia Ética e Educação – GPFEE, com as pesquisas, sobretudo, no que diz respeito à importância da dialética para a educação e no Núcleo de Estudos e Pesquisas em Currículo – NEPEC, desde o ano de 2010, nas pesquisas aí realizadas, onde tive e tenho a oportunidade de intensificar as discussões sobre questões epistemológicas, teórico-metodológicas, na pesquisa em Educação. E nas orientações coletivas e individuais, durante esses anos de estudos doutorais no período de 2013 a 2017. As atividades efetivadas nesses dois grupos, somadas às questões emergidas a partir da docência foram essenciais para formular as inquietações sobre o poder de alcance epistemológico da dialética, em especial do materialismo histórico-dialético na área da educação e para o delineamento e a execução do meu projeto de tese doutoral. A preocupação com a possibilidade de limites dessa abordagem faz parte de uma postura epistemológica que não se quer dogmática e, ao mesmo tempo, entende a necessidade de aprofundamento teórico. Dois eventos foram fundamentais às reflexões em torno do meu objeto de investigação. texto elaborado há dezessete anos, foi publicado nos Anais de evento Educação no Campo: História, Desafios e Perspectivas Atuais. São Carlos, SP. 2015. p. 1-17. ISSN 23175133. 18 O primeiro foi I Colóquio da Linha de Pesquisa Educação: Currículo, Epistemologia e História, ocorrido no ano de 2012, que teve como temática central “A Pesquisa em Educação e a lógica de construção do conhecimento na produção científica”. Tema analisado na palestra do Prof. Dr. Silvio Sánchez Gamboa que conheci nesse evento e a partir do qual entrei em contato com a obra “Pesquisa em educação: métodos e epistemologias”, publicada por ele no ano de 2007. A leitura desse livro muito contribuiu para as inquietações que tomaram corpo no projeto de pesquisa que resultou nesta tese. O Segundo foi o 11º Seminário Nacional de Políticas Educacionais e Currículo que trouxe novas contribuições, com dois momentos bastante significativos. O primeiro deles foi a Conferência de Abertura que teve como tema “Os fundamentos epistemológicos e políticos da produção do conhecimento em educação”. Além da importância do tema para os meus estudos e da presença do professor Dr. Antônio Joaquim Severino, um dos pesquisadores com cujas produções converso em minha tese, foi a partir dessa conferência que emergiram alguns questionamentos. Naquela ocasião, o professor Severino falou da inserção da fenomenologia e do marxismo na produção do conhecimento e das contribuições deste com a produção de categorias insuperáveis. Eis que veio a baila a questão: Se as categorias são insuperáveis, e se o “marxismo” assume como método o materialismo histórico-dialético, isso significa que esse método não implica limitações epistemológicas? Mas então, como fica a efetivação da superabilidade característica do movimento dialético? E a filosofia crítica de si mesma? Pensei nessas questões e na importância que elas poderíam ter nas minhas reflexões, porque me levavam a pensar naquilo que estou chamando de lógica dialética. Lembrei da importância da epistemologia, das questões que ela suscita. Recordei Moser (2004, p. 44) quando afirma que “em qualquer disciplina para que o conhecimento tenha algum valor, a epistemologia pode contribuir na medida em que elucida as condições, as fontes e os limites do verdadeiro conhecimento”. O segundo momento ocorreu durante a palestra do professor Dr. Genylton Odilon Rêgo da Rocha, sobre o tema “Questões epistêmico-metodológicas e axiológicas nas pesquisas sobre currículo e história da educação”, em que o professor mencionou as contribuições do materialismo histórico-dialético para o campo do currículo, especialmente no que diz respeito à passagem da discussão técnica para a política. A questão por mim dirigida ao professor foi justamente: Que críticas o materialismo dialético tem sobre si mesmo, no campo do currículo e da produção do conhecimento em 19 educação? A resposta do professor dirigiu-se a “dificuldade de efetivar uma educação marxista”, ou seja, “os avanços teóricos não são acompanhados por avanços práticos.” Essa resposta me levou a questionar: Como se explica essa contradição? Como uma filosofia que se quer prática não consegue se realizar como tal? Quais os impedimentos para essa realização? Esses podem ser tomados como consequências da própria lógica dialética? Que relações constituem essa limitação? Que distância vai entre teoria e prática, na práxis, tomando-se a práxis como ponto de partida e de chegada? O que explica a não realização da categoria práxis, tão cara ao materialismo histórico e na forma por ele proposta? Pensava que ocorria em função de uma lógica que traz inerente a si a contradição, todavia, a possibilidade de superação desse limite é real nessa perspectiva, contudo, pelos ensinamentos de Hegel (1992), essa superação não cessa a contradição, posto que novas contradições surgirão, necessariamente, para que o movimento dialético seja contínuo, puro devir. As questões acima possibilitam ao leitor uma ideia de minhas inquietações e, considerando o traçado investigativo desenhado nesses anos de docência e pesquisas, conduziram-me a uma curiosidade epistemológica relacionada à formação dos pesquisadores brasileiros que centram suas produções em educação, com ênfase em Filosofia da Educação e História da Educação, e a apropriação filosófica que eles fazem em suas pesquisas. Por isso, a decisão de realizar um estudo sobre a produção do conhecimento em educação, que foi tomada com o entendimento de que toda Filosofia tem seu próprio método e o poder de alcance de cada uma delas nessa produção está implicado ao poder de que se reveste o seu respectivo método, numa situação de correlação. Sobre essa questão é necessário esclarecer que a expressão cada filosofia aqui empregada refere-se ao pensamento de cada filósofo. Com esse entendimento, para efeito da produção desta Tese Doutoral, assumo como área de estudo a epistemologia no contexto da filosofia da educação dialética, na produção do conhecimento em educação, em teses doutorais orientadas por Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani, em Programas de Pós-Graduação em Educação. Muitos são os motivos que me levaram a escolher esses dois autores, dentre outros que se dedicam à pesquisa em educação. 20 As informações postadas no currículo lattes destes dois intelectuais, indicam que existem algumas semelhanças na formação de Dermeval Saviani2 e Antônio Joaquim Severino3 que trazem indícios de uma boa contribuição ao que me propus investigar. Ambos são licenciados em Filosofia, têm experiência na área de Educação, são autores de uma vasta produção na área da educação, que consiste em uma preciosa contribuição para a história da educação e da filosofia da educação no Brasil. Os estudos de Severino têm ênfase na Filosofia e Filosofia da Educação e os de Saviani em História e História da Educação. A dialética une filosofia e história e logicamente o método fundamentado nessa perspectiva filosófica também, então, a escolha dos dois autores. Os dois intelectuais atuam em programas de Pós-Graduação desde a década de 1970 e, certamente, suas pesquisas, as publicações de sua produção científica e as orientações de dissertações e teses, por mais de 30 anos são vestígios suficientes da contribuição que eles proporcionam aos estudos que deram oportunidade e organicidade a este texto. A escolha desses autores que são também professores e orientadores, visou os dois vetores constitutivos da lógica de investigação Filosofia e História. Além disso, pensei na possibilidade de que o lastro teórico-prático dos dois renomados pesquisadores constitua uma significativa probabilidade de minimização das dificuldades oriundas de uma possível carência teórica dos doutores formados sob suas orientações. A presença do orientador, com seu olhar atento, suas críticas e sugestões é essencial ao bom desenvolvimento da tese. A escolha de Severino e Saviani tem relação com minha vida acadêmica, que é traçada numa relação de proximidade com a Filosofia e a Filosofia da Educação e esta não se faz sem História da Educação e vice-versa. Saviani (2011, p. 123) menciona a importância dos conteúdos históricos e observa que “é pelo caminho deles que se aprende a perspectiva histórica, o modo de situar-se historicamente.” Toda a produção de conhecimento científico, de algum modo, depende da Filosofia, por isso ela é tão importante para a formação do pesquisador. Afinal, como compreende Vieira Pinto (1999), todo pesquisador necessita de uma formação filosófica, a fim de que possa construir uma ciência libertadora do homem. 2 Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/2205251281123354. Última atualização do currículo em 16/04/2013 3 Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4415326563786783. Última atualização do currículo em 25/11/2012 21 A ciência pode tornar-se um instrumento de libertação do homem e do seu mundo nacional se for compreendida por uma teoria filosófica [...], uma filosofia da pesquisa científica, que incorporará naturalmente toda a reflexão sobre a metodologia da investigação, a lógica do raciocínio científico [...]. (VIEIRA PINTO, 1999, p.5) No que se refere a minha própria formação, considero de grande importância o estudo realizado, tendo em vista o fato de que as atividades que exerço em minha vida acadêmica e profissional aumentam a necessidade de compreender os nexos entre Filosofia, Educação, Filosofia da Educação, História da Educação e conhecimento e, ainda, a relevância disso para a cultura, a educação e o educador cuja formação pressupõe um envolvimento com pesquisa e exige o entendimento das questões metodológicas, dos princípios que fundamentam uma metodologia, da lógica que a sustenta, enfim, da Filosofia em que se plasma. Como assevera Gamboa, (2012, p. 87), concernente à formação do pesquisador, “hoje existe maior preocupação com os aspectos metodológicos, teóricos e epistemológicos da investigação [...]. O propósito de formar pesquisadores de maior grau de capacitação exige o conhecimento desses elementos pressupostos e a articulação lógica entre eles”. O que, para mim, significou também ter clareza dos limites de cada processo metodológico, do alcance de cada lógica de investigação. Pensando sobre tudo isso, e considerando que Severino e Saviani apresentam uma forte presença da crítica em seus escritos, e sendo a dialética a filosofia por excelência, tomada na teoria crítica e, ainda, a possibilidade de influência desses autores, na condição de orientadores, sobre as teses de seus orientandos, é que decidi, a partir da análise das teses derivadas de suas orientações, situar os limites da abordagem dialética na formação dos pesquisadores e na produção do conhecimento. Um estudo com tal pretensão não prescinde da criticidade, tem sua importância filosófica e pode trazer significativas contribuições para a sociedade em que se realiza e para o programa de Pós-Graduação em Educação e à Faculdade de Educação do ICED, na UFPA, tanto do ponto de vista científico, como cultural. Admite Gamboa, (2012, p. 32) que “interrogar os métodos utilizados na pesquisa científica é uma tarefa histórica da filosofia, que ajuda a tomar consciência da importância e das limitações dos métodos como também de suas implicações e contradições inerentes”. E mais, que esse papel crítico dos métodos continua atual e necessário para a pesquisa em educação. 22 Se essa é uma tarefa histórica atribuída ao campo de raciocínio filosófico e se a filosofia se propõe crítica, isso significa que interrogar seus próprios pressupostos, inclusive os metodológicos, também consiste nessa tarefa. Então uma pesquisa que se propõe a analisar o poder de alcance da filosofia dialética e do seu método na produção de conhecimento em educação, efetiva uma filosofia da educação que cumpre essa empreitada, podendo-se encontrar nisso o valor filosófico, reflexivo e conceitual, e o valor histórico da produção de conhecimento que oportunizou a elaboração deste texto, o que me faz vislumbrar vestígios de sua pertinência e importância no contexto da Filosofia da Educação, bem como no cenário científico da pesquisa educacional no Brasil. Ater-se à Filosofia da Educação é de alguma forma unir duas áreas do conhecimento, Filosofia e Educação. Então, é sobremaneira valioso verificar como essas duas áreas se relacionam em Filosofia da Educação e qual o papel específico de cada uma delas, uma vez que diversos são os modos de se fazer Filosofia, que nos permitem falar de fenomenologia e de dialética, por exemplo. Fazer Filosofia será sempre um exercício de reflexão sobre os acontecimentos históricos que nos desafiam cotidianamente. Tais respostas, resguardadas as diferenças consequentes da pluralidade filosófica, conservam uma pertinência e relevância formativa, própria da filosofia e que permite a compreensão, para muitos, de que a Filosofia já nasceu paidéia. Por sinal, é este o caráter formativo da Filosofia que a vincula íntima e necessariamente com a educação, se esta for entendida como investimento na universalização dos significados, na universalização dos benefícios do conhecimento. Se a educação for concebida como processo, por excelência, da humanização, investimento coletivo para construir o próprio homem, subsidiando-o na necessária superação de sua pura naturalidade físico-biológica. É a necessidade da formação integral dos homens que legitima a própria educação e a presença, nela, da Filosofia. (SEVERINO, 2004, p.103). Servir-se da epistemologia a fim de perscrutar um método filosófico, considerar a possibilidade de seus limites a partir de teses doutorais existentes no campo da educação é, de certo modo, fazer filosofia da educação, mas é também fazer história da educação, uma vez que mantendo as respectivas especificidades elas se relacionam inexoravelmente. Tarefa essa a que me propus nesta investigação. O papel específico do pensar filosófico é outro aspecto que aparece no centro das discussões sobre Filosofia e Filosofia da Educação. Muitas são as interpretações 23 constituídas historicamente a esse respeito, mas para efeito desta análise destaquei duas possibilidades: a que entende que o papel da filosofia é a reflexão e aquela que compreende ser criação de conceitos. Neste caso, vale perguntar: Fenomenologicamente, como se reflete? Ou então, como se reflete dialeticamente? Ou ainda: Como se cria conceitos fenomenologicamente? Como se cria conceitos dialeticamente? A Filosofia, concebida como reflexão, como crítica radical é essencial para o processo de desalienação do homem, tão importante no contexto da teoria crítica. Nessa concepção, a formação da consciência crítica é fundamental para superar um pensamento ingênuo e, sobretudo, para evitar a barbárie4. Na educação essa concepção de Filosofia tem sido traduzida sob a ideia de que a Filosofia da Educação é uma reflexão sobre a educação. Tradicionalmente, no Brasil, ela tem sido entendida como saber sistematizado, que segue o rigor de um método e busca a raiz do problema para conhecê-lo em profundidade. Na interpretação de Saviani (1991), trata-se de uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto sobre os problemas perceptíveis na educação. Severino (2004), por sua vez, define que o caráter pragmático da Filosofia só pode ser o de contribuir criticamente na construção e explicitação das significações de todas as outras práticas. Como podemos observar os autores brasileiros, de algum modo, referenciam a filosofia como reflexão. Que implicações isto tem para a pesquisa? Tomada dessa forma, qual o seu poder de alcance na produção do conhecimento? De acordo com Severino (2012, p. 12-13), dado que a consciência é passível das ilusões, dos erros e da ideologia, “a Filosofia da Educação precisa implementar uma reflexão propriamente epistemológica sobre a natureza dessa experiência na sua manifestação na área educacional”. À Filosofia da Educação, então caberia uma dupla missão: justificar a si própria e incentivar a ciência a se justificar “avaliando e legitimando a atividade epistêmica como processo tecido no texto/contexto da realidade histórico- cultural”. Mas há quem pense diferente dessa tradição, com a compreensão de que a especificidade da Filosofia é criar conceitos5. 4 Em acordo com essa ideia, Adorno (1995) propõe que a educação deve ter como objetivo maior, a formação da consciência crítica, para que massacres como os ocorridos nos campos de concentração, por ocasião da segunda guerra mundial, não se repitam. 5 Essa concepção é defendida pelos franceses Gilles Deleuze e Félix Guattari na obra O que é Filosofia? e, no Brasil, é assumida por Sílvio Gallo na obra Deleuze & Educação. Este autor segue a compreensão de Deleuze sobre a especificidade da Filosofia e, deslocando-a para o campo da educação, apresenta a criação de conceitos para a educação como o papel precípuo da Filosofia da Educação. 24 Contudo, não se cria conceitos se não se reflete criticamente, como indica Luckesi (1990, p.42) quando escreve que “[...] a prática do filosofar vai de um inventário dos conceitos e dos valores que no momento ‘explicam’ a vida humana, passando por uma crítica e chegando a uma proposição de novos conceitos e valores, que incorporam os anteriores por superação”. Existem diferentes métodos e formas de abordar a realidade. Minha compreensão é de que seja qual for o método, ele abre possibilidades, porém, ao mesmo tempo, efetiva limitações no processo de conhecimento. Portanto, a falta de clareza do poder de alcance de uma abordagem epistemológica é um problema fundamental na realização de uma pesquisa. Penso que as limitações de uma pesquisa podem surgir no próprio método, na lógica que o sustenta, nos pressupostos que o fundamentam, no contexto em que se situa o objeto de investigação e nas escolhas do pesquisador. Situar, compreender e analisar o poder de alcance de um método em uma pesquisa, demanda tempo e requer uma investigação das condições lógicas, epistemológicas e históricas dessa mesma pesquisa. E na compreensão de Gamboa (1987), também das condições ontológicas, gnosiológicas. Gamboa (2012, p. 29), esclarece que “a epistemologia [...] é parte da filosofia que se ocupa especialmente do estudo crítico da ciência em seu detalhamento prático, isto é, da ciência como produto e como processo [...]”, e que “o discurso epistemológico encontra na filosofia seus princípios e na ciência o seu objeto”. Alguns autores indicam a existência de uma epistemologia dialética, seja nas discussões sobre a efetividade de uma metodologia histórica, seja no contexto da pesquisa em educação como fazem Gamboa (2012) e Severino (2010). A maior importância da filosofia dialética está na concepção de movimento fundada na ideia de contradição, consubstanciada na superação que garante que esse movimento realize a transformação, mas isso não significa que não apresente limitações e que essas não ressoem nas teses referentes à educação. Em relação à epistemologia dialética, Severino (2001) não só confirma sua existência como também reconhece importância para as pesquisas em educação. Embora seja favorável ao uso da epistemologia dialética, no trato com os fenômenos educacionais, ele descarta o caráter ontológico marcante no materialismo histórico-dialético, constituído no esforço epistêmico de Karl Marx. Em suas considerações sobre a epistemologia no campo da educação Severino (2010), fala de uma abordagem multi e interdisciplinar por entender que a complexidade 25 é inerente à educação e isso impede que se apreenda e analise todos os elementos nela implicados num único objeto, o que inviabiliza que o processo investigativo seja uma atividade desenvolvida por uma única ciência. Porém, isso não implica dizer que só se deve falar em ciências da educação. Afinal, o conhecimento sobre a educação não consiste na soma dos resultados investigativos de diferentes ciências. Por isso mesmo, necessário se faz uma ciência da educação interdisciplinar. Sendo a epistemologia uma disciplina da filosofia que tem como principal ocupação o estudo crítico da ciência e sendo “a crítica ao método um dos papéis fundamentais da filosofia”, como afirma Gamboa (2012, p. 47), então atender a essa necessidade crítica certamente abre maiores possibilidades no processo investigativo, contudo, mesmo os métodos que se preocupam com o contexto da investigação também podem apresentar limitações na pesquisa. Como se dá isso? Em análise de pesquisas em educação realizada por Gamboa (2012, p. 166), esse autor indica que as limitações se encontram na falta de profundidade teórica dos pesquisadores. De modo que de acordo com esse autor “as pesquisas analisadas que revelam a utilização de algumas categorias do marxismo são questionadas, na maioria das vezes, por falta de rigor metodológico e de compreensão dos pressupostos epistemológicos e filosóficos nos quais pretendem se fundamentar”. Contudo, a questão que me instiga é: Que limites estão para além da falta de profundidade teórica dos pesquisadores em educação? Por isso mesmo o objeto de estudo proposto nesta Tese Doutoral consistiu na complexidade dos limites epistemológicos da filosofia dialética na formação dos pesquisadores e na produção do conhecimento científico em educação. Diante das reflexões apresentadas interroguei: a) Qual o lugar de importância atribuído à Filosofia Dialética no âmbito da produção do conhecimento científico no campo da pesquisa em educação no Brasil? b) Qual a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação no Brasil? c) Como se configura o método de investigação científica e quais temáticas e objetos de estudos são privilegiados na construção do conhecimento científico em educação? d) Quais os limites epistemológicos na abordagem dialética quando seus pressupostos são aplicados na construção das Teses Doutorais provenientes dos Programas de Pós-Graduação em Educação? 26 Entendo que toda filosofia só é crítica quando interpela a si mesma, o que me fez cogitar ser possível ampliar o objeto da epistemologia, numa espécie de deslocamento da ciência para a filosofia e, assim, fazer uma epistemologia da filosofia e da filosofia da educação. Em relação às limitações indicadas por Gamboa (2012), considero que há problemas no domínio de teorias, que ressoam na falta de uma postura coerente que, por sua vez, repercute nas abordagens metodológicas. Nessa direção, Frigotto (1997) considera que a dialética materialista constitui também uma postura. Se for assim, então é possível que a mecanização mencionada no fragmento acima se dê em função da falta de uma postura condizente com a teoria subsidiária do método, necessária à prática investigativa. E que esse problema esteja presente em estudos fundados na dialética materialista. A Filosofia Dialética contribui, ao mesmo tempo, para a formação do pesquisador e para a produção científica na área da Educação. É importante nesse campo investigativo, pois tem se mostrado produtiva do ponto de vista epistemológico, sobretudo na sua concepção materialista, o que faz com que goze de ampla receptividade por parte dos pesquisadores, em suas práticas investigativas em Educação. Porém, nenhuma teoria e método são soberanos na constituição de verdades, sejam estas relativas ao próprio conhecimento como um todo ou relacionadas à realidade em sua totalidade. Com base nesta análise foi possível propor a seguinte tese deste estudo: A abordagem dialética na pesquisa educacional, inclusive em sua concepção materialista histórica, apresenta limitações que não são apenas de ordem da insuficiência teórica dos pesquisadores que adotam seus pressupostos nas pesquisas que realizam, mas em razão da complexidade em que se originam as tensões epistemológicas implícitas em tal filosofia, em função do caráter contraditório em que se estabelece o movimento do real e de sua própria lógica, da dificuldade que se tem de colocar em prática o materialismo histórico-dialético, na perspectiva da práxis transformadora da realidade, bem como do modo como os autores constroem seus objetos e métodos heurísticos no processo de produção do conhecimento científico. Logo, a multiplicidade de dimensões e relações do objeto no contexto histórico, implica ainda mais na presença complexa dos limites da dialética, apesar da sua capacidade heurística nas pesquisas em educação. Como objetivo Geral do estudo, dediquei-me a entender e expor os limites epistemológicos que permeiam a formação de pesquisadores e a construção do conhecimento científico na área de educação, sob a influência da Filosofia Dialética. 27 Fixei como objetivos específicos: 1) Analisar a importância atribuída à Filosofia Dialética na produção do conhecimento em teses desenvolvidas no âmbito dos Programas de Pós-Graduação da área de educação. 2) Examinar a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação e as contribuições dessa filosofia para a formação do pesquisador nesse campo disciplinar; 3) Discutir a lógica de construção do conhecimento expressa nos métodos de pesquisa adotados nas Teses Doutorais visando à produção do conhecimento científico na área da educação; 4) Analisar as implicações epistemológicas da abordagem dialética na produção do conhecimento científico resultante das Teses Doutorais. O processo cognoscente consiste numa ação investigativa em que o pesquisador coloca em movimento sua capacidade reflexiva e criadora na sistematização de estratégias por meio das quais planeja e realiza ações, exercitando sua capacidade epistêmica necessária à construção do conhecimento. Mas, essa construção não é uma atividade isolada, apartada da sociedade, da cultura e de seus valores, acima da história. Por isso a necessidade de atenção à produção filosófica, teórica e prática, amealhada pela humanidade, a fim de que se possa desenhar teoricamente um estudo particular. Embora os contornos teóricos desta tese estejam sendo traçados desde o início deste texto, alguns detalhes ainda precisam ser esclarecidos. Nesse sentido, é necessário pensar que os pressupostos epistemológicos de uma pesquisa que busca aproximar-se da dialética não podem prescindir de uma discussão sobre a concepção dialética atual do conhecimento que, resguardados os diferentes posicionamentos tomados pelos mais diversos estudiosos nessa discussão, tem suas bases consubstanciadas especialmente em Hegel e sua atenção especial ao caráter histórico e contraditório do conhecimento e à constituição da história humana na prática cognoscente, mesmo que esta seja pensada como o desenvolvimento racional da ideia, viabilizado pelas contradições que engendram cada conceito. A abordagem dialética, consiste em um modelo teórico de que um estudo particular apenas se aproxima para não perder a autonomia criadora necessária ao exercício teorético. É nessa perspectiva que se situa este estudo. 28 A aproximação de que falo, alia-se ao esforço de autonomia criadora e à necessidade de análise do objeto de pesquisa. Contudo, essa aproximação, coerente com a compreensão de que cada filósofo elabora a sua própria filosofia, e cada teórico a sua teoria, e que essas contribuem para a produção filosófica em sua totalidade, conduz-me à necessidade de esclarecer que aquilo que indico como filosofia dialética consiste em um conjunto de diferentes pensamentos de diversos filósofos que têm em comum algumas características como movimento e contradição, por exemplo, sendo aquele garantido por esta. Nesse caso, o mais coerente seria falar de dialéticas e esclarecer a que dialética estou me referindo. De modo que, para efeito das discussões desenvolvidas neste texto, considero a dialética que se instala a partir do contexto histórico do século XIX, e da movimentação que favorece as novas criações no âmbito da filosofia e da ciência, mas também da política, da técnica e da ética. Assim, meu interesse investigativo, que tem sua razão de ser em relação ao meu objeto de estudo, dirige-se ao conhecimento que se gera a partir de então, sobretudo por meio das análises de Hegel, do caráter idealista nelas contido, e da apropriação que Marx faz desse estudo e do materialismo nele sustentado. Por que volver o olhar ao século XIX e a obras de Hegel e Marx? O século XIX constitui um período em que a humanidade parece tomar maior consciência da história, o que concorre para a necessidade de saber, de um querer saber sobre quem e o que a constitui, e sobre o que é constituído por ela. Hegel e Marx viveram toda essa movimentação e a efervescência teórica que a dinamizava. Estes dois pensadores são essenciais à dialética contemporânea e à compreensão da abordagem dialética na epistemologia e de um método dela decorrente. São, pois, fundamentais para pensar o objeto e analisar o problema de investigação proposto em meu estudo. Desde que Hegel entendeu que a razão é dinâmica e sempre vinculada ao tempo, o caráter histórico da prática humana passou a constituir um elemento fundamental para a compreensão do processo de produção científica. Nessa perspectiva, falar de pesquisa é considerar que ela tem um caráter histórico que inclui aspectos ligados ao que se convencionou considerar ciência e às críticas lançadas a essa convenção, de onde é possível produzir conhecimento sobre a ineficiência do estatuto epistemológico a ela concernente, em sua relação com os diferentes fenômenos e com a construção de diferentes objetos de pesquisa. Fenômenos naturais e humanos mantêm certas diferenças que necessitam ser consideradas. Isto impulsiona um movimento epistemológico do qual Severino (2010) 29 participa, e que no final do século XX e nessas primeiras décadas do século XXI questiona o estatuto epistemológico dessa forma de conhecer que não consegue tratar dos fenômenos da educação e das ciências humanas. No fundo, o que está em jogo é a concepção de ciência forjada na modernidade. A esse respeito Severino observa que o sujeito não pode ser objetivado nem manipulado tecnicamente, pois disso decorre a sua própria destruição, por isso a necessidade e a possibilidade de diversas metodologias no contexto das ciências humanas, o que depõe contra a “unicidade metodológica da ciência” (SEVERINO, 2010, p. 483). No que tange à educação, esse processo se torna mais complexo na medida em que exige uma discussão de seu estatuto epistemológico, posto que esta consiste em uma prática cujo caráter histórico-social implica um desenho epistêmico próprio. Severino assegura que “conhecer, fazer ciência na esfera dos fenômenos educacionais, é diferente não apenas do fazer ciência no âmbito das ciências naturais, mas também daquele no âmbito das ciências humanas. Daí a distinção entre ciências da educação e uma possível ciência da educação” (SEVERINO, 2001, p. 16-17). Ainda na compreensão desse autor “estabelecer um estatuto de cientificidade para o conhecimento no campo educacional impõe a exigência de uma profunda (re) conceituação de ciência. E o motivo fundamental é o caráter práxico da educação” (Idem, p.17). A realização de um estudo no espaço da epistemologia da educação remete a esses debates referentes à instituição daquilo que é compreendido como ciência e do que pode ser considerado como tal mediante novas convenções no âmbito da comunidade científica e sobre a complexidade que envolve essas discussões. O caráter social do conhecimento exige do pesquisador a seleção e organização das fontes históricas que são vitais à elaboração do conhecimento. Essa ação propicia ao investigador criar objetos de pesquisa e desenhar a teoria que sustenta as suas análises, pois são essas fontes que constituem a base do conhecimento que o pesquisador elabora, é nelas que ele busca apoio. Ao mesmo tempo em que elas auxiliam na criação do objeto de pesquisa, deste dependem. Toda investigação possui uma carga de valores, sejam estes assumidos pelo pesquisador na sua existência, sejam eles elementos do próprio tema estudado e forjadores do problema e do objeto de estudo. Essa carga valorativa abre possibilidade para uma diversidade metodológica e para a utilização de várias e diferentes fontes, resultado das múltiplas interações entre as subjetividades e os objetos de estudo engendrados a partir das vivências no meio social. 30 Então, as fontes históricas são escolhidas e organizadas de acordo com os interesses teórico-metodológicos do pesquisador, e não somente em decorrência da determinação do objeto. Mas é preciso entender que a elaboração do conhecimento é uma atividade humana que exige uma metodologia de investigação que orienta a ação de pesquisar e produzir conhecimento. Esta ação consiste em um ato particular de cada indivíduo, mas também possui caráter social, uma vez que o pesquisador vive em relação com outros pesquisadores com quem dialoga, concorda, diverge, totalmente ou em parte. Portanto, o conhecimento por ele produzido é marcado por outros conhecimentos. O pesquisador não constitui a representação de uma função que se exerce separada de tudo aquilo que a constitui. Logo, não há neutralidade. Todo o caminho metodológico é percorrido por um pesquisador na inteireza de sua multidimensionalidade. Necessário se faz observar que no processo cognoscente o homem sistematiza temas, cria objetos de estudos, organiza estratégias de investigação que dão sustentação metodológica ao método e sua lógica, ou seja, ao caminho traçado pelo pensamento, cujo percurso dá forma prática à abordagem da realidade pelo sujeito. Pensar o método como caminho é conceber a possibilidade de percorrer atalhos, desvios. É pensar como tudo isso se relaciona e como diversas ações constituem um todo e formam uma unidade. É refletir sobre as condições lógicas, filosóficas, históricas e sociais que possibilitam este processo. É fazer diferentes nexos, por meio das vias que percorre o pensamento em cada investigação. Isto significa a possibilidade de realizar ações sustentadas por diferentes lógicas. Estas questões remetem a pensar qual a melhor abordagem metodológica para discuti-las. Então, tendo a filosofia como base, reconhecendo que toda pesquisa se sustenta em pressupostos filosóficos e entendendo que o conhecimento resulta de um processo social, segui a trilha de uma dialética como método epistemológico, com o entendimento de que há limites em cada traçado, em cada caminho trilhado. São justamente esses limites que quiz conhecer e analisar, sem ignorar que as trilhas percorridas por esta tese também têm seus limites. A escolha por essa abordagem tem em vista atender a necessidade de autocrítica que deve fazer toda teoria que se quer crítica. Além disso, meu objeto de estudo requer tratamento dialético. Penso que o poder de alcance de uma abordagem filosófica na pesquisa se dá em um contexto contraditório. Por isso, é necessário 31 compreender as contradições e pensar as relações que tecem a produção de conhecimento, especialmente em educação. Severino (2001, p. 18) reconhece que a questão nuclear de uma discussão epistemológica “é que a sociabilidade, a historicidade e a praxidade não constituem apenas contextos circunstanciais no âmbito dos quais o homem desenvolveria sua existência. Ao contrário, eles são constitutivos do próprio ser do homem, de sua essencialidade”. Trata-se de realizar um esforço no sentido de olhar de dentro e por dentro a filosofia dialética, e em conformidade com a compreensão de que “o conhecimento é uma construção que se faz a partir de outros conhecimentos sobre os quais se exercita a apreensão crítica e a dúvida” (MINAYO, 1994, p. 89), de acordo com o caráter histórico do conhecimento. A perspectiva do estudo ora relatado consiste em realizar um esforço no sentido de trabalhar com a possibilidade de uma teoria que se faz e refaz no processo mesmo de pesquisar. Talvez seja mais pertinente falar de abordagem como ponto de partida, posto que conceber uma teoria que se faz no processo da pesquisa é manter o impulso criador que uma metodologia nos permite. Nesse sentido, é que são pensadas as fontes históricas da pesquisa que deu ensejo a este texto. Essas fontes foram pensadas como estratégia para estabelecer as ligações necessárias à compreensão da complexidade originária dos limites da dialética na pesquisa em educação. E são compostas por livros, artigos extraídos de revistas científicas, Teses e Dissertações registradas no Banco de Teses da CAPES 6 , especialmente as teses orientadas pelos professores Dermeval Saviani e Antônio Joaquim Severino, e o currículo lattes destes dois orientadores. Dos livros e artigos que discutem sobre a filosofia dialética é importante destacar, sobretudo, algumas obras de Marx e Hegel que consistem em fontes imprescindíveis para desenhar os contornos teóricos desta tese. São obras que facilitam a compreensão da discussão desses dois sobre a história e sua efetiva constituição e indicam os problemas por eles vivenciados, seus interesses e conflitos. Além disso, possibilitam a apropriação de princípios e conceitos que proporcionam uma boa contribuição à análise do objeto de pesquisa. 6 http://www.capes.gov.br/ 32 Das obras de Hegel selecionei “A Fenomenologia do Espírito” porque nessa obra o filósofo, ao discorrer sobre o desenvolvimento da consciência, reflete sobre o processo dialético, aponta uma filosofia da história e o método dialético. Ainda que se mantenha o entendimento de Hegel de que o método dialético não pode ser uma imposição exterior ao conteúdo, posto que é este que se move, essa obra é essencial para perceber a possibilidade de uma lógica das contradições, para entender que o pensamento pode se movimentar por meio delas. Outra obra de Hegel é a Ciência da Lógica, especialmente o prefácio, utilizada com o intuito de entender a discussão que esse filósofo fez sobre as categorias de análise. Essa obra é fundamental para se compreender o esforço intelectual empreendido para superar a filosofia kantiana e explicar a concreticidade do pensamento na união entre o ser e o pensar. Das obras de Marx selecionei “A ideologia alemã”, “Manuscritos econômico- filosóficos e outros textos escolhidos” e o Prefácio de O Capital: crítica da economia política. Em “A Ideologia alemã” Marx e Engels (1999, p.56) deixam vestígios claros do seu materialismo dialético quando, ao explicar a concepção de história, afirmam que “as circunstâncias fazem o homem, assim como o homem faz as circunstâncias”. E esclarecem que em suas análises partem dos homens reais, considerados em suas ações práticas e não de seus discursos, de suas imaginações e representações. Nos “Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos” Marx critica Hegel, porém reconhece: a grandeza da fenomenologia hegeliana e seu resultado final – a dialética da negatividade na qualidade de princípio motor e gerador – consiste de uma parte, em que Hegel compreenda a autogeração do homem como processo, a objetivação como desobjetivação, alienação e superação dessa alienação; em que compreenda então a essência do trabalho e conceba o homem objetivado verdadeiro, pois esse é o homem efetivo como o resultado de seu próprio trabalho (MARX, 1991. p.197) Essa observação de Marx sobre as reflexões hegelianas deixa claro que a dialética é crucial para a transformação. É no Prefácio de “O Capital: crítica da economia política”, que Marx faz afirmativas quando à inversão da dialética hegeliana por ele realizada. Trata-se de obras que trazem vestígios da possibilidade de um materialismo histórico como método que se sustenta em uma filosofia dialética. 33 Os elementos do movimento triádico e o conceito hegeliano de ideia, assim como o princípio de superação, mediação e, sobretudo, de contradição e totalidade, são fundamentais para compreender a filosofia dialética herdada de Hegel e juntamente com o conceito marxista de matéria são essenciais para entender uma síntese possível da dialética e começar a traçar, desvendar, a complexidade de possíveis limitações dessa filosofia e dos métodos que dela se originam. Contradição e totalidade são vitais para pensar o movimento dialético ideal e material, para entender a transformação, então esses princípios são essenciais a fim de compreender o que pode ser a origem das limitações dessa lógica dialética e dos métodos dela originados. As relações que constituem, que dão origem a essas limitações, são complexas e exigem um maior esforço para a sua compreensão, por isso esses princípios e conceitos são tão importantes, podendo constituir-se em categorias analíticas e explicativas de pesquisa. Assim é que os princípios de totalidade e de contradição podem ser tomados como categorias analíticas neste estudo. Mas, a opção e organização das categorias de análise eleitas nesta pesquisa não se esgotam nos princípios dialéticos e ou nas categorias marxistas, elas também dizem respeito especialmente às delimitações que foram pensadas, relacionadas e colocadas em prática no percurso da investigação. A proximidade com o materialismo histórico teve em vista perquirir a realidade que no caso específico do objeto desta tese tem relação com a atividade de pesquisa, lugar em que se situa o primeiro limite do método que se desenvolveu neste estudo, posto que se tratou de uma atividade prática e uma vez que “a atividade prática dos homens concretos constitui-se em fundamento e limite do processo de conhecimento, e o próprio método é produto dessa prática”. (FRIGOTTO, 1997, p. 82), limite este do qual não escapa o método pensado e colocado em prática neste estudo. Além do método ser limitado pela própria prática, nenhuma teoria é soberana, posto que não garante um poder ilimitado ao método nem a si própria. Se considerássemos o contrário, estaríamos assumindo uma posição semelhante à de Hegel em relação ao poder infinito da razão no Espírito Absoluto. Os livros e artigos que discutem sobre a filosofia dialética e a produção do conhecimento em educação remetem para as contribuições de diferentes autores sobre o objeto estudado e são essenciais para auxiliar na fundamentação teórica da pesquisa, no trato com as questões conceituais, epistemológicas e metodológicas que dizem respeito a 34 essa filosofia. Além do que consistem em matéria propícia à reflexão. Nessa perspectiva, são importantes alguns escritos de Gamboa, de Severino e de Saviani. A obra “Pesquisa em educação: métodos e epistemologias”, de Sílvio Sánchez Gamboa, constitui outra fonte a partir da qual se colocou e cresceu a atenção em relação às fragilidades teóricas dos pesquisadores em educação, e a necessidade de interrogar os métodos na pesquisa científica. Gamboa (2012, p. 166) assevera que “o marxismo e a dialética se afirmam como teoria e método com significativa capacidade heurística, dada sua proximidade com o interesse transformador”. Essa capacidade já foi bastante demonstrada na história do conhecimento, especialmente no cerne das ciências humanas e da educação, mas isso não significa que tenha alcance epistemológico ilimitado. Meu desafio ao projetar e desenvolver esta Tese de Doutorado consistiu em compreender esses limites não apenas no que concerne às carências teóricas dos pesquisadores, mas sobretudo, de dentro da própria dialética, uma vez que discutir um assunto implica interrogá-lo, ser interrogado por ele e expor-se nele. De modo geral, as contribuições de Severino são relevantes para compreender e discutir assuntos relacionados à diferença entre fazer ciência no âmbito dos fenômenos educacionais e no espaço das demais ciências humanas e naturais. Para pensar questões que dizem respeito à importância da reflexão epistemológica sobre a educação, à tarefa essencial da Filosofia da Educação de interpelar os pesquisadores, ao caráter formativo desta e a necessidade da formação integral dos homens, especialmente sobre a epistemologia dialética e a sua fecundidade heurística em relação aos problemas políticos e pedagógicos. São importantes para este estudo, as contribuições de Severino (2003) para a compreensão da necessidade da formação integral, e da formação como processo de desnaturalização e culturalização do homem, as discussões de Saviani (2009) sobre a relação entre a formação e as condições de trabalho docente, além das contribuições de Marx e Engels (1999), para quem a formação humana consiste em uma construção coletiva e histórica. As Teses e Dissertações registradas no Banco de Teses da CAPES foram eleitas fontes históricas vitais para compor o estado do conhecimento e analisar o lugar de importância atribuído à Filosofia Dialética no âmbito da produção do conhecimento científico no cerne da pesquisa em educação no Brasil, considerando sua receptividade nas práticas investigativas dos pesquisadores brasileiros. Além da possibilidade de análise 35 dos aspectos epistemológicos relacionados à produção do conhecimento científico no campo da educação, de modo a compreender mais profundamente os meandros teóricos da abordagem dialética. A utilização do currículo lattes de Severino, de Saviani e dos autores e autoras das teses sob a orientação desses dois professores, como fonte histórica, é essencial para investigar alguns elementos de formação, constitutivos dos percursos realizados por esses dois professores. Em relação aos autores e autoras das teses saber quais os cursos de graduação que fizeram parte de sua formação inicial, e que podem tê-los influenciado na escolha dos temas e na apropriação e formulação dos objetos e problemas de pesquisa. Em relação aos dois professores, a decisão de orientação na elaboração das teses, no caráter marcado pela história e pela filosofia assumido nessas teses. O currículo funciona como uma espécie de mapa que permite situar no tempo e no espaço a produção de seus sujeitos e deles nos aproximam, amenizando a falta de um conhecimento direto, desses intelectuais da educação. A riqueza de informações contida nesses documentos dá indícios da atitude filosófica assumida por esses dois autores diante do conhecimento e do mundo, da permanência e mudanças de seus interesses investigativos, sobretudo na menção que fazem de seus projetos de pesquisa e de suas publicações. Esses documentos proporcionam situar os objetos estudados por eles, as abordagens teórico-metodológicas e as finalidades de seus estudos. Enfim, facilitam a localização das produções científicas dos dois orientadores e a observação do desenvolvimento do seu processo intelectual e de suas práticas. Juntando os aspectos característicos apresentados pelos dois orientadores, temos a possibilidade de uma interessante conexão que proporcionou excelente contribuição à constituição desta tese. Uma vez que a filosofia dialética une filosofia e história, seja do ponto de vista do idealismo, seja do materialismo, logicamente os métodos decorrentes dessa filosofia também o fazem. A apropriação das teses orientadas por Severino e Saviani, como fontes históricas, foi imprescindível para compreender as relações entre a abordagem filosófica que consubstancia os aspectos epistemológicos e a possibilidade de limitações, tanto dessa abordagem teórica, como do próprio método traçado com o subsídio teórico da filosofia dialética. 36 As fontes históricas têm um papel fundamental no processo de pensar as questões metodológicas que, dentre outras providências, inclui a definição das técnicas de investigação e das categorias de análise. Se todo método tem suas limitações, portanto, parece óbvio que o que almejo não é descobrir algo espetacular, mas tão somente analisar essas produções, a epistemologia por elas sustentada, a apropriação que fazem do pensamento dialético na elaboração de seus próprios métodos, com a perspectiva de compreender a complexidade das limitações da filosofia dialética, quando subsidiária das pesquisas em educação. Com esse intuito, a análise que empreendi se dirigiu às temáticas, aos objetos, ao método de investigação das teses e à forma como são relacionados nesses elementos os aspectos epistemológicos condizentes com as proposições de Hegel e Marx, a concepção de realidade e os princípios de totalidade e, em especial, de contradição porque possibilitam compreender a lógica de elaboração do conhecimento na área da educação, constituída nessas teses e auxiliam a entender a complexidade de possíveis limitações epistemológicas que constituem o cerne de interesse deste estudo. A sistematização e produção do conhecimento nos meios acadêmicos, como os trabalhos de conclusão de curso, no ensino de graduação, as dissertações e teses oriundas dos Programas de Pós-Graduação, são marcadas pela presença do orientador que se coloca como o primeiro pesquisador com quem o orientando dialoga, além dos autores das obras lidas. Nesse processo, interferem: o orientador, os professores integrantes das bancas de qualificação e defesa, além do autor do trabalho, daquele que realiza a pesquisa e literalmente escreve o texto, aluno em processo de avaliação. Observa-se também a interferência do contexto em que se realiza a pesquisa, dos autores acionados como referencial teórico e, dependendo do caso, daqueles que concedem entrevistas e respondem questionários, cujas informações são cruciais à análise do objeto de investigação e exposição dessa análise na elaboração do texto da tese. A presença do orientador é importante na produção do conhecimento científico produzido nos programas de pós-graduação, são sua observações, críticas e sugestões que em muito contribuem para o desenvolvimento da pesquisa e a elaboração do texto final da tese doutoral. E os professores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani têm em suas trajetórias históricas um lastro considerável de pesquisas e de orientações em programas de pós-graduação, os dois partilham da concepção de filosofia 37 como reflexão e mantêm uma proximidade com a filosofia dialética em seus percursos na produção de conhecimento. Em decorrência desse entendimento, as estratégias metodológicas incluem investidas inquiridoras nos currículos lattes desses dois professores e dos autores e autoras das teses orientadas por ele, consultas à Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP e ao Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes, para formar o acervo de teses e dissertações que fazem referência à Filosofia Dialética e, sobretudo, das teses orientadas pelo professores Saviani e Severino. Por ocasião da coleta de dados a situação enfrentada foi a seguinte: a) o Banco de Capes, não disponibilizava trabalhos completos, mas apenas resumos de teses e dissertações defendidas em diferentes áreas do conhecimento no período de 1987 a 2012; b) a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP, universidade que guarda grande parte das teses orientadas pelo professor Severino, registra a produção de teses a partir de 2005, mas das dez teses defendidas nesta universidade, nesse lapso de tempo, apenas quatro estavam disponibilizadas na biblioteca, quando da pesquisa empírica; e c) a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em cuja biblioteca se encontra parte das teses orientadas pelos dois professores também não disponibilizava esse material na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações. Nos anos de 1974 e 1978 o professor Dermeval Saviani teve, respectivamente, as primeiras defesas de dissertação de mestrado e de tese de doutorado sob sua orientação. Os dois trabalhos têm como autora Betty Antunes de Oliveira. O Primeiro, sob o título “Implicações Filosóficas da Tecnologia Educacional: Uma Experiência Brasileira”, foi defendido na Universidade Metodista de Piracicaba e o segundo, com o título “Política de Formação de Professores do Ensino Superior”, foi realizado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo7. Já o professor Antônio Joaquim Severino teve os primeiros trabalhos sob sua orientação em mestrado e doutorado, defendidos respectivamente nos anos de 1977 e 1980, ambos na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O primeiro, sob o título “Fundamentos fenomenológico-existenciais da comunicação professor/aluno na teoria da educação de Carl Rogers”, tem como autora Lucila Schwantes Arouca. O segundo, de autoria de Antonio Chizzotti, tem como título “Estado, Educação e Ideologias: O Estado Brasileiro e Ideologias da Educação”8. 7 Dados coletados do Currículo Lattes. http://www.cnpq.br. Acesso em: 08/06/2013 8 Dados coletados do Currículo Lattes. http://www.cnpq. Acesso em: 08/06/2013 38 Uma primeira observação nos currículos lattes dos dois professores demonstrou ainda que, com ênfase em História e História da Educação, os estudos de Saviani direcionam-se principalmente a temas como: legislação do ensino e política educacional, história da educação, história da educação brasileira, historiografia e educação, pedagogia e teorias da educação. Os estudos de Severino, por sua vez, situam-se no âmbito da Filosofia e da Filosofia da Educação, com destaque para as questões relacionadas com a epistemologia da educação e para as temáticas concernentes à educação brasileira e ao pensamento filosófico e sua expressão na cultura brasileira. Todos esses elementos foram cruciais na escolha desses orientadores para auxiliar na construção do objeto e na formulação dos problemas de pesquisa assumidos nesta tese doutoral. São os acontecimentos históricos científicos e acadêmicos desses professores que influenciam na demarcação do lapso temporal da pesquisa, definido no período que vai do ano de 1974 ao ano de 2015. Estou considerando o ano de defesa da primeira dissertação de mestrado orientada pelo professor Saviani, e a última tese defendida em 2015, orientada por um dos dois professores. Mesmo tendo em conta que o tempo de vida de Hegel e Marx remeta ao século XIX, e a importância desses autores para pensar meu objeto de pesquisa no que diz respeito às teses em foco. No que diz respeito à experiência desses professores em orientações em programas de pós-graduação, ela iniciou em 1974. Então o lapso temporal para a análise das teses poderia iniciar neste ano e chegar a 2015. Contudo, questões relativas tanto ao volume de (82) teses e principalmente quanto à dificuldade de acesso a esse material implicaram na definição de um lapso temporal específico de 15 anos para a seleção das teses, em um período compreendido entre 2000 a 2015. Para o planejamento dos momentos ou passos necessários ao desenvolvimento do estudo que constitui a tese proposta e defendida neste texto, considerei ainda outras fontes históricas que constam de livros e artigos que discutem sobre a Filosofia Dialética e a produção do conhecimento em educação, necessários para compor a fundamentação teórica. Para tratar da complexidade dos limites epistemológicos da filosofia dialética na produção do conhecimento científico na área da educação, estruturei a tese em quatro seções, além da Introdução e da Conclusão. 39 A primeira seção, a Introdução apresenta elementos exigidos a um projeto de tese e introduz a discussão sobre os problemas discutidos nesta tese. Traz muitos vestígios da construção da pergunta e da construção epistemológica das respostas. Na segunda seção, sob o título Mapeando a Importância Atribuída à Filosofia Dialética no Campo da Pesquisa em Educação no Brasil, fiz um mapeamento da produção acadêmica do conhecimento científico na área da educação, com o objetivo de analisar a importância atribuída à Filosofia Dialética na produção do conhecimento em teses e dissertações no âmbito da Educação. A terceira seção com o título Repercussões Acadêmicas na Trajetória de Formação de Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani, cumpre uma exigência epistemológica, mas sobretudo ética que é a de conhecer os orientadores das teses que serviram de material de análise para auxiliar na compreensão e análise do objeto da pesquisa. Nesse momento inspecionei a trajetória de formação, especialmente em nível superior, dos dois orientadores, Severino e Saviani, com o objetivo de refletir sobre a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação e as contribuições do materialismo histórico-dialético para a formação do pesquisador nesse campo disciplinar. Com a compreensão de que o ensino superior é essencial à constituição formativa dos orientadores enquanto tais e de que investigar em que, onde, quando, como e por que os dois orientadores realizaram seus estudos de Graduação e de Pós-Graduação, foi fundamental para obter melhor entendimento sobre o perfil intelectual e acadêmico dos dois intelectuais, alcançar o objetivo proposto para essa seção e, de algum modo, auxiliar na reflexão sobre o objeto da pesquisa. A quarta seção tem como título A Lógica de Elaboração do Conhecimento em Educação: Teses Orientadas por Severino e Saviani no Período de 2000 a 2015 e examina as teses orientadas por Severino e Saviani, produzidas na área da educação, a respeito de que temáticas e objetos de estudos são privilegiados pelos autores dessas investigações, como se relacionam na configuração do método de pesquisa e constituem a lógica de elaboração do conhecimento nessas produções, com o objetivo de discutir a lógica de construção do conhecimento expressa nos métodos de pesquisa adotados nas Teses Doutorais visando à produção do conhecimento científico na área da educação. A quinta seção, intitulada Meandros e Complexidade dos Limites Epistemológicos na Abordagem Dialética em Teses Doutorais em Programas de Pós- Graduação em Educação, objetivou analisar as implicações epistemológicas da abordagem dialética na produção do conhecimento científico resultante das Teses 40 Doutorais. A proposição da lógica de análise para essa seção tem a ver com os princípios orientadores das metodologias usadas nas teses analisadas, as concepções de sujeito e de objeto e a relação entre eles, assim como com a materialidade do objeto e a contituição da verdade. Finalizando a estrutura do estudo, apresento algumas reflexões sobre o objeto de pesquisa e as principais conclusões decorrentes do trabalho investigativo realizado realizado. 41 2 MAPEANDO A IMPORTÂNCIA ATRIBUÍDA À FILOSOFIA DIALÉTICA NO CAMPO DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO NO BRASIL A presença de um caráter cognoscente, problematizador e pedagógico marca a Filosofia desde as suas origens gregas, ao mesmo tempo em que dispõe problemas e os discute, no intuito de preencher uma ausência de saber, com uma intenção formativa da própria humanidade. A esse respeito, Severino (2003) observou a importância da filosofia na elucidação do sentido de humanidade a que pertence cada sujeito, o que torna imprescindível a presença desse componente curricular na formação de educadores. O termo filosofia traduz pluralidade de princípios, métodos, concepções de conhecimento e de problemas de investigação, ou seja, uma diversidade de conhecimentos. É essa característica que permite falar de filosofia dialética, aliás de filosofias dialéticas para ser fiel ao entendimento já declarado na introdução desta tese de que cada filósofo faz a sua filosofia. Foi por isso que para falar de dialética na contemporaneidade me aproximei de Hegel e de Marx nas suas perspectivas idealista e materialista. Em decorrência dessa pluralidade talvez seja mais coerente falar de diversas abordagens filosóficas. É também essa característica que me permitiu falar de filosofia da educação, não como uma filosofia aplicada à educação, mas com uma filosofia da própria educação, que se propõe à refletir sobre os problemas educacionais, sem ignorar os princípios de uma filosofia o que me respaldou falar de filosofia da educação dialética. Ou em uma outra perspectiva que se preocupa em criar conceitos para a educação. Essa existência plural implica relação de poder, que se expressa na disputa que tende a se estabelecer entre os intelectuais que lhes são adeptos, no sentido de que se fundamentam em seus princípios para conceber o homem, o mundo, o método e o conhecimento. Essa relação pode ser notada até mesmo na maneira de indicar que existe uma ligação entre filosofia e educação, afinal falar de filosofia da educação não é o mesmo que falar de filosofia na educação. Contudo, as teorias educacionais, os projetos pedagógicos e os discursos políticos sobre a educação frequentemente recorrem a filósofos que fazem referências à educação. Há como que uma consciência da necessidade da filosofia na educação, de um saber específico, capaz de fazer vir à tona as múltiplas relações entre filosofia e educação. 42 A confiança na filosofia como facilitadora, implicadora e propulsora dos atos de pensar, refletir, raciocinar, criar e criticar, tem sido propagada por diversos autores, em diferentes perspectivas e relacionada aos mais variados aspectos da existência humana, sobretudo, como imprescindíveis à elaboração do conhecimento. As diversas abordagens filosóficas, resguardadas as suas especificidades, gozam desse crédito tanto no que se refere à produção do conhecimento, como no que diz respeito à formação do ser humano, para a qual se dirige como Filosofia da Educação que, em função da diversidade de concepções filosóficas, também partilha dessa noção de multiplicidade. Relativo à produção do conhecimento, Severino afirma: “É sem dúvida uma tarefa imprescindível da Filosofia da Educação interpelar todos os pesquisadores, explicitando os pressupostos epistemológicos envolvidos na prática da pesquisa” (SEVERINO, 2012, p. 12). Essa interpelação é fundamental à pesquisa, posto que consiste em importante via por onde o pesquisador interroga a sua própria prática investigativa e o método que viabiliza o conhecimento em determinada pesquisa passa a ser um percurso no qual o pesquisador questiona, mas também se indaga e é problematizado, num consentimento sensato cuja exigência se coloca como condição da própria atividade da pesquisa. Esse processo questionador é necessário para que o estudioso tenha consciência do seu percurso investigativo, do que ele não abarcou, do que é importante e ele deixou de fora, ou seja, para que ele tenha clareza das limitações de sua própria caminhada heurística. O pesquisador é tomado pela incerteza, pela insatisfação diante do saber que o move em busca de saber mais e melhor. É incomodado pelas questões que se colocam para ele como exigência de problematização e de saber sobre seu próprio fazer. Nesse sentido, soou inevitável e necessária a existência de um conjunto de investigações problematizadoras dos limites epistemológicos das diferentes abordagens filosóficas da pesquisa. Tais estudos podem constituir um indicativo do poder de alcance epistemológico do método delineado pelo investigador, da abordagem filosófica que o subsidia e da necessidade de traçar novos planos. Trata-se de estudos que consistem numa possibilidade de esclarecimento a fim de compreender o poder de alcance da sua própria pesquisa. Em outras palavras: Qual o poder de alcance epistemológico da abordagem filosófica escolhida para subsidiar o estudo? Essa é uma questão que todo pesquisador deve fazer, por mais que considere que a abordagem escolhida é a mais adequada para a análise realizada em sua pesquisa. 43 Tal compreensão se coloca como facilitadora desse mesmo processo. No contexto desta tese, essa ideia ressoou como um indicativo da necessidade de saber sobre a importância atribuída à Filosofia Dialética pelos pesquisadores no âmbito da produção do conhecimento científico, de modo que a problematização que orientou a análise intencionada nesta seção foi: Qual lugar de importância é atribuído à Filosofia Dialética no âmbito da produção do conhecimento científico no campo da pesquisa em educação no Brasil? Esta seção, pois consiste em um mapeamento da produção acadêmica do conhecimento científico no campo da educação, com o objetivo de analisar a importância atribuída à Filosofia Dialética na produção do conhecimento em teses desenvolvidas no âmbito dos Programas de Pós-Graduação da área de educação. A fim de rastrear as produções necessárias no Banco de Teses, foi utilizado o termo Limites da Filosofia Dialética, escolhido como possibilidade de uma maior aproximação com o problema da tese. O resultado quantitativo deste rastreamento consistiu na coleta de 105 resumos entre os quais se encontram aqueles referentes a teses e dissertações de diferentes áreas do conhecimento, consideradas conforme a designação da Capes. O quantitativo de produções trouxe indícios do grau de importância da Filosofia Dialética no contexto da pesquisa em diferentes áreas do conhecimento. QUADRO 1 – Distribuição de resumos de teses e dissertações pelas diferentes áreas de conhecimentos no período1987-2012 TITULARIDADE GRANDE ÁREA DO CONHECIMENTO ÁREA DO CONHECIMENTO TOTAL Mestrado Doutorado 1 2 Ciências Sociais Aplicadas Administração, Ciências Contábeis e Turismo 3 1 0 Linguística, Letras e Artes Artes e Músicas 1 1 0 Ciências Sociais Aplicadas Arquitetura e Urbanismo 1 1 0 Ciências Sociais Aplicadas Ciências Sociais Aplicadas I 1 7 7 Ciências Sociais Aplicadas Direito 4 1 0 Ciências da Saúde Educação Física 1 4 2 Ciências da Saúde Enfermagem 6 2 0 Multidisciplinar Ensino 2 1 0 Ciências Humanas Filosofia e Teologia: subcomissão Teologia 1 1 1 Ciências Humanas Geografia 2 0 1 Linguística, Letras e Artes História da Arte 1 1 0 Multidisciplinar Interdisciplinar 1 2 1 Ciências Humanas Psicologia 3 3 1 Linguística Letras e Artes Letras e Linguística 4 1 0 Ciências da Saúde Saúde Coletiva 1 44 1 1 Ciências Sociais Aplicada Serviço Social 2 1 1 Ciências Humanas Sociologia 2 9 4 Ciências Humanas Filosofia e Teologia: subcomissão Filosofia 3 4 2 Ciências Humanas Educação 6 2 3 05 Fonte: Banco de Teses da Capes. Elaborado pela Autora Do total de cento e cinco (105) resumos, trinta e três (33) são de teses (31,42% e destes doze (12) são teses da área de Educação (36,36%, quatro (4) são da área de Filosofia e as dezessete (17) restantes estão distribuídas entre outras áreas. No que concerne às setenta e duas (72) dissertações, catorze (14) são da área de Educação (19,44%) e vinte e nove (29) são da área de Filosofia, restando vinte e nove (29) distribuídas entre as outras áreas de conhecimento. Observei ainda que depois das áreas de conhecimento da Educação e da Filosofia, a área do Direito é a que mais privilegiou a Filosofia com sete (7) dissertações e sete (7) teses, seguida da área de Enfermagem que apresenta duas (2) teses e quatro (4) dissertações. No enfrentamento das dificuldades epistemológicas em sua atividade investigativa visando à produção do conhecimento, os pesquisadores das teses e dissertações, cujos resumos foram recolhidos para compor esta seção, buscam o auxílio da filosofia. Uma vez que o domínio das técnicas de pesquisa, embora necessário, não é suficiente, há necessidade vital de adentrar em um universo teórico e conceitual das abordagens filosóficas que se colocam no contexto investigativo do pesquisador como possibilidades de embasamento para análise. A mensuração dessa presença de várias áreas do conhecimento no processo de rastreamento da Filosofia Dialética na produção do conhecimento em educação, pode ser uma possibilidade de inteligibilidade, um saber a mais sobre a temática estudada. Apesar da problematização que orienta esta seção da tese referir-se à área de conhecimento da Educação, são consideradas também produções de outras áreas. Dentre estas aquelas oriundas da área da Filosofia, tendo em vista que esta é uma área de interesse em função do objeto da tese. Assim sendo, do total de cento e cinco (105) resumos foram selecionados dezesseis (16) resumos de teses (15,23%) e quarenta e três (43) resumos de dissertações (40,95%), correspondentes às áreas do conhecimento da Educação e da Filosofia. A leitura dos resumos apontou a necessidade de perquirir as introduções e conclusões dessas produções a fim de compreender melhor as razões da aproximação 45 dessas com a filosofia, saber o que levou autores de diferentes áreas do conhecimento a buscarem o auxílio da filosofia na fundamentação teórica de suas pesquisas. Porém, a procura pelo texto completo dessas dissertações e teses demonstrou que apenas parte delas pode ser encontrada na BDTD – Biblioteca Digital de Teses e Dissertações. Dos textos selecionados para exemplificar as teses e dissertações de diferentes áreas, para além da área de Educação e de Filosofia, uma produção da área do Direito e outra da área da Geografia não disponibilizaram o texto completo de suas teses na BDTD, atendo-se a análise dessas duas produções aos resumos extraídos do banco de dados da Capes. Na área do Direito, destacam-se a tese de Luis Carlos Balbino Gambogi (2004) e a dissertação de Raildes Pereira Santos (2003). A tese de Gambogi aproxima-se da Filosofia com uma curiosidade investigativa sobre a intuição. Seu estudo toma como base Max Sheler e as suas “intuição criadora, heurística,” e “intuição emocional”, Immanuel Kant e as suas razão pura e razão prática e Joaquim Carlos Salgado e sua “razão prudencial” e a “sensibilidade intelectual”, com o entendimento de que é possível demonstrar a importância que elas adquirem na hermenêutica jurídica. Segundo o próprio autor, em sua tese a razão se lança nos “meandros do pensamento dialético”. A dissertação de Santos, com um tema referente aos limites da interpretação jurídica, busca contribuições de Heidegger e Gadamer para embasar a ideia de “importância do diálogo da hermenêutica jurídica com a Filosofia, para entender que o ato de interpretar compreende um juízo prévio ou uma pré-compreensão”. Destaca-se também a tese de Marcella Furtado de Magalhães Gomes (2009), em que a Filosofia Dialética é considerada por meio de estudos referentes à dialética da virtude e do direito em Aristóteles. A procura de contribuições da hermenêutica para o processo de investigação e análise que dão forma ao conhecimento científico também pode ser notada área da Psicologia, como exemplo observei a tese de Luciana Dantas Farias de Andrade (2012) em que a análise sobre as “relações entre enfermeiros e usuários” é subsidiada pela “fenomenologia hermenêutica-dialética”, conforme mencionado no resumo. Na área de Enfermagem, jorraram exemplos de que os pesquisadores buscam embasamentos na Filosofia, a dissertação de Leandro Barbosa de Pinho (2005) em que a abordagem dialética segue a orientação de Antonio Gramsci como base para analisar a possibilidade do cuidado de enfermagem na Unidade de Terapia Intensiva tornar-se contraditório e a dissertação de Vera Lúcia Avena Carmo (2003), que optou pelo 46 materialismo dialético para subsidiar os estudos sobre a “estratégia utilizada pela Secretaria Estadual de Saúde do Estado da Bahia (SESAB) e Secretaria Municipal de Saúde de Salvador (SMS) na capacitação dos profissionais de saúde em um Distrito Sanitário na década de 90”. A investigação permitiu concluir que o “conflito entre os interesses organizacionais e dos trabalhadores tende se perpetuar. Contudo, não se observa por parte dos trabalhadores uma mobilização no sentido de reverter esta situação”. As contribuições da Filosofia Dialética são buscadas na tese de Carlos Mottana (1991), da área da Geografia. Nessa produção a dialética embasa a análise sobre as contradições históricas, sobre o escamoteamento das prioridades sociais. Também são encontradas no contexto do Banco de Teses da CAPES, produções sustentadas no Pensamento Complexo de Edgar Morin. Os resumos selecionados como exemplos são da área de conhecimento da Administração, Ciências Contábeis e Turismo. O primeiro, relativo à tese de Cleber José Cunha Dutra (2008), em que o Pensamento Complexo de Morin, é utilizado para fundamentar um estudo exploratório sobre os Programas de Produção mais Limpa (PPLs). De acordo com o autor, a lógica da tese, colocada em funcionamento por meio da hermenêutica, tem como base o Pensamento Complexo de Morin. Essa estrutura lógica permite ricas interpretações sobre o tema. O segundo diz respeito à dissertação de Rebecca de Nazareth Costa Cisne (2010), que assume a Dialética, porém como opção metodológica inicial, pois no desenvolvimento da pesquisa essa abordagem se mostrou, para a autora, insuficiente para encaminhar a síntese buscada no movimento intentado no trabalho. Em decorrência disso, procurou “suporte epistemo-filosófico” no Pensamento Complexo de Morin para prosseguir com a investigação. Na área de Letras e Linguística, o resumo da dissertação de Gedeon Pereira Campos (2008) teve como “objetivo demonstrar que o riso representa a síntese de uma dialética, configurada pela realidade”. A dissertação trata sobre o escritor Bernardo Elis e conforme Campos, a análise assenta as suas bases “nas concepções filosóficas e nos principais arquétipos do riso que são: cômico das formas, cômico das situações e cômico da linguagem”. A filosofia na perspectiva pós-crítica também é procurada por produções de outras áreas do conhecimento que não a Educação e a Filosofia. Nessa linha de análise, a dissertação de Camilo Vladimir de Lima Amaral (2008), da área da Arquitetura e 47 Urbanismo, investiga os "Planos Diretores" de Goiânia a fim de entender como esses planos, “ao longo do tempo, refundaram o espaço urbano desta cidade”. Embora as teses e as dissertações de dezoito (18) diferentes áreas do conhecimento tenham privilegiado a Filosofia, nem todas as produções referem-se à Filosofia Dialética, e as que a utilizam indicam diferentes motivos para usá-la. Contudo, é interessante que pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento busquem a abordagem da Filosofia Dialética e de outras filosofias. Nos exemplos anunciados nesta seção, nota-se a presença de diversos temas e objetos. Estes abrangem desde as contradições do riso à importância que a intuição adquire na hermenêutica jurídica; à dialética da virtude e do direito em Aristóteles; à possibilidade de contradição no cuidado de enfermagem na Unidade de Terapia Intensiva tornar-se contraditório; ao escamoteamento das prioridades sociais e aos Programas de Produção mais Limpa (PPLs), e os "Planos Diretores" de Goiânia. Além de pressupor um embasamento teórico, a elaboração do objeto remete ao envolvimento do autor com sua área de trabalho, às inquietações emergidas de sua experiência profissional, mas sobretudo dos estudos que desenvolve nessa área. O rastreamento das produções no Banco de Teses indicou, além da diversidade de áreas, um caleidescópio de Instituições de Ensino Superior em cujos Programas de Pós-Graduação essas produções foram elaboradas. GRÁFICO 01 – Distribuição de Teses por Instituição de Ensino Superior. Fonte: Banco de Teses da Capes. Elaborado pela Autora 0 2 4 6 Universidade Federal de Minas Gerais. Universidade Federal do Espírito Santo Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Federal do Rio Grande… Universidade do Estado do Rio de… Universidade de Brasília PUC de São Paulo PUC do Rio de Janeiro 4 2 1 1 1 1 3 1 1 2 2 6 2 2 2 2 48 Na distribuição de teses por Instituição de Ensino Superior, tem-se uma ideia do montante dessas produções. Entre o universo de quarenta (40) instituições, vinte e quatro (24) não apresentaram nenhuma tese que atendesse a chamada “Limites da Filosofia Dialética”. Entre as Instituições de Ensino Superior em que se nota a presença de doutorado, destacam-se a Universidade de São Paulo que apresenta seis (6) teses, Universidade Federal de Minas Gerais que contabilizou quatro (4) teses, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul com três (3) teses. A Universidade de Brasília, Universidade Federal de São Carlos, a PUC do Rio Grande do Sul, a PUC do Paraná a PUC de São Paulo, a PUC do Rio de Janeiro e a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/Araraquara que apresentaram duas (2) teses cada. Isso configura uma concentração de ofertas de doutorado em universidades das regiões Sul e Sudeste do país. GRÁFICO 02 – Distribuição de Dissertações por Instituição de Ensino Superior. Fonte: Banco de Teses da Capes. Elaborado pela Autora 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Universidade Federal do Ceará Universidade Federal da Paraíba Universidade Federal da Bahia Universidade Federal de Goiás Universidade Federal de São Carlos Universidade Federal do Paraná Universidade Federal de Santa Maria Universidade Estadual do Centro-Oeste Universidade Estadual de Campinas Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita… Universidade Estadual de Maringá PUC de Campinas PUC do Paraná PUC do Rio Grande do Sul. Universidade Católica de Pernambuco Universidade de São Paulo Universidade São Marcos Universidade Metodista de Piracicaba Universidade Presbiteriana Mackenzie. Universidade do Oeste do Paraná 0 2 2 2 2 5 2 2 1 1 1 1 1 1 1 3 1 1 2 2 2 1 4 1 1 1 9 1 2 1 5 1 1 0 1 2 2 2 2 0 49 As dissertações indicadas no contexto quantitativo de cento e cinco (105) resumos somam setenta e duas (72) produções distribuídas pelas quarenta (40) diferentes Instituições de Ensino Superior. Desse quantitativo, vinte e nove (29) dissertações são da área de conhecimento da Filosofia e quatorze (14) da área de Educação. Na distribuição de dissertações por Instituição de Ensino Superior, observei que das quarenta (40) instituições de ensino superior, apenas três (3) não apresentaram nenhuma dissertação. Diferentemente do que ocorre com as teses, a distribuição das dissertações por Instituições de Ensino Superior é mais equilibrada. Contudo, no que diz respeito à concentração numérica das produções, as regiões Sul e Sudeste permanecem na liderança. Com destaque apenas para a PUC do Rio Grande do Sul que apresentou nove (9) dissertações, para a Universidade Federal de Minas Gerais que somou seis (6) dissertações, para a Universidade de São Paulo com cinco (5) dissertações e para a Universidade Federal de Santa Catarina que registrou quatro (4) dissertações. A Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, e PUC de São Paulo que ficaram representadas com três (3) dissertações cada. 2.1 A FILOSOFIA NAS TESES EM EDUCAÇÃO E EM FILOSOFIA. O sentido da pós-graduação é a produção de conhecimento o que significa que se constitui um lugar de produção acadêmica em que se dá, sobretudo, a consolidação do pesquisador enquanto tal, mas também como lugar de aprendizado, tendo em vista a possibilidade de problematização que se instaura nos programas de pós-graduação. Sobre a construção metodológica pode-se dizer que advém da exigência de um planejamento prévio, mas também das necessidades que emergem no decorrer da investigação. Afinal, o método não se constitui antecipadamente, como um plano que não se pode mudar, como um roteiro rígido que necessariamente precisa ser seguido. A esse respeito, Gatti (2002, p. 64) considerou que “o método oferece a orientação de base necessária à garantia de consciência e validade, mas ele não pode virar uma camisa de força. Por isso precisa ser apropriado pelo pesquisador que pelas suas mediações cria alternativas, novas saídas, novas soluções”. A criatividade é uma exigência no contexto das ações humanas sejam elas ideais e ou materiais. A elaboração de conhecimento supõe a criação de alternativas que se dá tanto no processo de 50 investigação como na apresentação dos resultados desse processo, o que significa que o método não é único, existem várias formas de se fazer germinar o conhecimento. A diversidade de métodos tem origem numa série de fatores que vão desde as influências históricas, aos acontecimentos e necessidades que se colocam para um homem no cotidiano de sua existência social e política. Mesmo considerando todos esses aspectos, há de se ter uma organização básica que permite uma compreensão clara da lógica seguida pelo autor e o resumo necessita constituir um texto organizado nesse sentido. Mas não é bem isso que os resumos, no geral, permitem. Por isso, um problema encontrado na elaboração do material analisado é a ausência dos elementos essenciais de estruturação de um resumo, que permitem uma boa visualização da tese, ainda que de forma breve. Trata-se de informar o Objetivo, o Problema de Pesquisa, a Metodologia, as Fontes Históricas, o Período de abrangência do Estudo e a Conclusão central. Mas perscrutando os resumos desse ponto de vista é possível notar que poucos são aqueles que indicam pelo menos o objetivo, a metodologia e a conclusão geral. GRÁFICO 03 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das teses em Educação. Fonte: Base de Teses da CAPES. Elaborado pela autora Considerando as informações utilizadas na pesquisa que subsidia este texto, dentre um total de doze (12) resumos de teses em educação, três (3) não mencionam o objetivo do trabalho, oito (8) não indicam o problema de pesquisa, três (3) não explicam a metodologia, cinco (5) não apontam as fontes históricas, sete (7) não dizem qual o período de abrangência da pesquisa e sete (7) não apresentam conclusão central. Os problemas estruturais encontrados nos resumos tanto das teses como das dissertações em Educação e Filosofia, implicaram uma exigência ao processo investigativo desta tese, a de inquirir para além dos resumos das teses e dissertações, 0% 20% 40% 60% 80% 100% Total de Teses Problema de Pesquisa Fontes Históricas Conclusão Central 100% 25,00% 66,66% 25,00% 41,66% 58,33% 58,33% 51 obtidos no site da CAPES. Assim, foram buscados os trabalhos completos a fim de investigar a Introdução e a Conclusão. Porém, nem todas essas produções estavam disponibilizadas integralmente na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações e mesmo as acessíveis, nem todas apresentaram os elementos na Introdução e Conclusão, assim como também não organizaram um capítulo específico para a metodologia, como se pode notar em algumas de outras produções. Então, das doze (12) teses em educação quatro (4) foram avaliadas apenas o resumo e das quatro (4) teses em Filosofia apenas uma (1) foi analisada somente o resumo. Esse movimento que implica definições e redefinições do material usado e do modo de usá-lo constitui e recompõe a metodologia da pesquisa, o que equivale dizer que o método se faz na própria atividade de pesquisa. É nesse sentido que se pode falar de método dialético, por exemplo. Dizer que o método se faz no próprio ato de investigação, no processo mesmo da pesquisa, não significa pensar que não é possível buscar uma teoria a priori. Contudo, embora seja possível ao pesquisador optar por uma abordagem teórica e metodológica, filosófica e epistemológica, para fundamentar a sua investigação e análise, essa escolha representa apenas uma aproximação um reconhecimento de um conhecimento já organizado e elaborado no cerne da cultura, do qual a pesquisa se aproxima e o pesquisador considera de algum modo no seu próprio processo de teorização. No que concerne à apropriação da Filosofia Dialética como fundamentação teórica para embasar a elaboração metodológica realizada pelos autores das produções analisadas, ela se dá de diferentes formas, e diversos são os autores buscados como embasamento para a discussão e análise dos objetos de pesquisa. Nessa perspectiva é que se situam as produções científicas em Educação. Os argumentos analíticos a seguir dão uma ideia mais clara dessa afirmativa. Na área de conhecimento da Educação, as teses procuram uma aproximação com a filosofia não somente para fundamentar suas análises, mas para discutir alguns problemas ligados, de alguma forma, à filosofia. Com uma pesquisa ocupada em fazer uma reconstrução histórica da trajetória da disciplina Filosofia da Educação no intervalo dos anos de 1940 e 1980, no curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Maria Betânia Barbosa Albuquerque (2002) considera que para tratar de uma disciplina da área da Filosofia, neste caso da Educação, a aproximação da Filosofia se faz por meio da própria disciplina. No 52 resumo, sobre a abordagem no tratamento dss informações a autora apenas menciona o apoio nos “estudos históricos e sociológicos que possibilitam compreender o itinerário das disciplinas, tais como os de e André Chervel, Ivor Goodson, e Tomaz Popckewitz”, onde o foco é dado à questão da orientação filosófica seguida pela disciplina. Sabe-se que esses autores, resguardadas as devidas diferenças, investigam a História do Currículo. De modo geral, pode-se dizer que interrogam as relações entre conhecimento e poder, no campo da história do currículo9. Chervel10 centraliza suas investigações na história das disciplinas e suas relações com a cultura escolar enquanto Ivor Goodson,11 dirige suas análises à história do currículo e Thomas Popkewitz12 às teorias educacionais críticas e a possibilidade de ressignificação dessas, ou seja, são autores, cujos estudos contribuem significativamente para o esforço de reconstrução histórica da trajetória da disciplina Filosofia da Educação que a autora se propôs realizar em seu estudo. A preocupação com as relações entre a filosofia e a pedagogia também pode ser notada no estudo de Filipe Ceppas de Carvalho Faria (2003) em que se observa uma investigação dos nexos entre uma abordagem filosófica e uma abordagem pedagógica das questões relativas ao ensino de filosofia no nível básico de ensino. Com o principal objetivo de “refletir criticamente sobre pressupostos que tendem a ser assumidos indiscriminadamente no debate sobre o ensino de filosofia” (2003, p. 12), o autor atenta para as tensões, aproximações e distâncias entre as duas abordagens. A tese anunciada pelo autor dirige-se ao “rendimento da teoria crítica na investigação sobre o ensino de Filosofia” (Idem, p. 13). Assim, importa, sobretudo, a noção de crítica relacionada ao ensino desta disciplina. Para tanto, busca as ideias de Theodor W. Adorno por ele ter sido um intelectual estudioso dessa relação entre as abordagens filosóficas e pedagógicas. 9As diferentes abordagens a esse respeito são discutidas pelos autores mencionados em várias obras. As três próximas notas referem algumas delas. 10 CHERVEL, A. Historia de las disciplinas escolares. Reflexiones sobre un campo de investigación. Revista de Educación, n. 295, p. 59-111, 1991. 11 GOODSON, I. F. Historia del currículum. La construcción social de las disciplinas escolares. Barcelona: Pomares-Corredor, 1995. 12 POPKEWITZ, T. S. História do Currículo, Regulação Social e Poder. In: T. T. Silva (org.). O sujeito da educação: estudos foucaultianos. 6. ed. Petrópolis: Vozes, p. 173-210, 2008. 53 Theodor W. Adorno também é considerado na tese de Alex Sander da Silva (2010), que tem como objetivo central discutir a “desmitologização do conceito, no sentido de analisar a dimensões estético-formativas da educação”. (2010, p.17). Com um estudo centrado na problematização da racionalidade formativa da educação, o autor menciona como problemática: Como pensar a educação no âmbito de uma persistência da razão instrumental? De que forma pode-se pensá-la em termos de contribuição para a desmitologização do seu conceito na atualidade? (Idem, p. 17-18) Note-se que o referencial está centralizado no âmbito das questões da teoria crítica de Theodor W. Adorno. Nessa produção a filosofia é tomada na perspectiva da teoria crítica via escola de Frankfurt na explicitação da relação entre o conceito de educação e seus próprios desdobramentos críticos, na perspectiva de servir como um forte contraponto aos processos interpostos atualmente pela razão instrumental, que longe de formar deformam. Nos anos de 1960, Adorno discutia que a questão mais urgente da educação, era desbarbarizar. Era preciso formar a consciência crítica no sentido do exercício da capacidade crítica. Para Adorno a educação só tem sentido se for direcionada a “uma auto-reflexão crítica”. Em Educação e Emancipação, esse autor observou que apesar da civilização se encontrar em boa fase de desenvolvimento tecnológico, muitas pessoas demonstravam o quanto estavam atrasadas em relação a sua própria civilização, além de não apresentarem uma formação que correspondesse ao que se entendia por civilização, mas também pelo nível de agressividade, uma espécie de “ódio primitivo, um impulso de destruição” (ADORNO, 1995, p.155) A abordagem da filosofia hermenêutica também pode ser notada na elaboração das análises constituídas no âmbito da produção científica da pós-graduação. As teses de Vera Isabel Caberlon (2003) e de Sergio Ricardo Silva Gacki (2010) são dois exemplos dessa abordagem. A primeira toma a “Ação Comunicativa (Jürgen Habermas) e a Hermenêutica Filosófica (Hans-Georg Gadamer) e como repercussões metodológicas a aproximação entre hermenêutica e dialética”, para analisar a inclusão da pesquisa, como princípio educativo, no ensino de graduação. A ideia de aproximação metodológica entre hermenêutica e dialética pode ser encontrada em autores como Cecília Minayo (1994) que apresenta a hermenêutica unida à dialética como um método de análise qualitativa, ideia que, conforme a própria autora, necessitou de maior aprofundamento, o que a levou a escrever um artigo com essa 54 intenção. Nesse artigo, Minayo (2014) explica que se propôs a enfatizar o poder de alcance da hermenêutica e da dialética para a compreensão e crítica da realidade social. A segunda tese, com referência em Gadamer, apresenta a hermenêutica filosófica, visando esclarecer os limites do método em uma abordagem metafísica, a diferença entre a hermenêutica filosófica e a hermenêutica metodológica e propiciar o diálogo conceitual com a educação. Mas, o esforço do autor no que se refere aos limites do método em uma abordagem metafísica não são suficientes para ele se afastar da maneira típica de formulação da pergunta nos moldes metafísicos. Entre as questões que ele diz que ajudam a compor o objeto da tese encontra- se a pergunta “O que é isso que chamamos de educação?” (GACKI, 2010, p. 16). Essa é uma pergunta pelo ser da educação. Em outras palavras e sem perder o teor filosófico da questão, pergunto: O que define a educação como tal? O que a educação não poder deixar de ter para ser entendida como educação? A pergunta pelo ser das coisas é própria da Filosofia Metafísica na sua forma ontológica. O que quero destacar aqui é que a forma de perguntar consiste um indicativo da concepção que o questionador, neste caso o pesquisador, tem a respeito do homem, do conhecimento, do mundo. Note-se que perguntar “o que é” é muito diferente de perguntar “o que está sendo” o “o que pode ser” ou mesmo “o que deve ser”. Trata-se no mínimo de uma pergunta a ser esclarecida no contexto teórico do texto, com referência a uma ontologia marxista. No texto da tese Gacki justifica a sua inserção no campo da filosofia da educação, apresenta o diálogo como campo ético/hermenêutico e indica os conceitos da hermenêutica filosófica como essenciais para compreender a educação. As discussões do autor apontam para a compreensão de que agir hermeneuticamente significa ir para além da crítica ao método “como elemento orientador da racionalidade moderna, bem como toda sua problemática decorrente”. Essa ultrapassagem implica uma insurreição “contra práticas que amordaçam e impedem o surgimento de reflexões de outra ordem ou que, reivindicam uma nova postura para a humanidade” (GACKI, 2010, p. 13). O materialismo histórico-dialético sustenta a produção de Agostinho da Silva Rosas (2008) que tem como objeto de investigação a criatividade, porém (re)significada como constituinte da educação popular. Seu ponto de partida foi a ideia de que há uma singularidade quando se pensa a criatividade em educação popular, e como ponto de chegada, demonstrar que a criatividade em educação popular pressupõe a criatividade libertadora. 55 Na trilha de seu objeto de investigação, o autor questiona: a criatividade é um constitutivo do fenômeno educação popular? Com o objetivo de “sistematizar argumentos teórico-filosóficos que possibilitem mostrar a criatividade libertadora como fundamento e princípio da educação popular” Rosas (2008, p. 25), adota a perspectiva filosófico-educacional de Paulo Freire com a intenção de captar argumentos teóricos para a elaboração do conceito de criatividade em educação popular. O autor considerou essa escolha fundamental para a formulação da tese, qual seja: “a educação popular pressupõe criatividade libertadora.” (Idem, p. 24) No que diz respeito à metodologia, Rosas explica que se fundamenta na perspectiva marxiana e se orienta por um triplo movimento de construção teórica, que vai do concreto ao abstrato e deste a novas abstrações para enfim recuperar o novo que consiste no concreto pensado. Com uma abordagem materialista dialética, a produção de Fábia Magali Santos Vieira (2009) discutiu questões referentes ao papel da educação na sociedade capitalista. Investigou o problema do “valor ético-político e pedagógico do conhecimento dos professores das séries iniciais do ensino fundamental, do Projeto Veredas – Formação Superior de Professores a distância, no fórum de discussão da AFOUFJF. (VIEIRA, 2009, p. 15)” e examinou a tarefa filosófica, política e pedagógica da educação. Seu objetivo geral foi justamente investigar esse problema Partiu dos pressupostos históricos da formação de professores a distância, centrou a análise nas mensagens do fórum de discussão do Projeto Veredas – Formação Superior de Professores da AFOR – UFJF, e identificou as mediações, contradições e resistências que permeiam a formação de professores neste projeto. A autora justificou a opção por uma abordagem “materialista dialética do tipo descritivo histórico-estrutural, na perspectiva de Gramsci”, (Idem, p. 16) com a compreensão de que se trata de uma concepção científica da realidade, fertilizada pela prática social dos sujeitos. Nesta perspectiva, a prática social é considerada critério de verdade. A variedade de temas analisados com o auxílio da Filosofia Dialética abarca também preocupações com as capacidades musical e lúdica do homem. Patrícia Lima Martins Pederiva (2009, p. 13) indagou sobre “as consequências da escolarização da musicalidade para a aprendizagem e para a criação musical”. A análise da musicalidade 56 é realizada em uma perspectiva histórico-cultural, de modo a abranger desde a sua gênese à estrutura e função em diferentes momentos históricos. Esse trabalho questiona: “em que condição emergiu o modo excludente de conceber a atividade musical humana? Como compreender música e musicalidade em meio a esse paradoxo? Como o processo pedagógico pode ser enriquecido por meio dessa reflexão?” (Idem, p.16) A análise foi subsidiada pela perspectiva genético-psicológica de Vigotski, que possui por base a filosofia de Spinoza e o materialismo dialético marxista. Teve a intenção de demonstrar a tese “a institucionalização da música fundamentada em bases equivocadas, resulta na desvalorização das diferentes formas de expressão da musicalidade humana e a sua afirmação como dom natural, mas de caráter universal, limita a expressão musical das pessoas” (Idem, p. 17). Com o objetivo de refletir sobre as possibilidades emancipadoras do esporte escolar Waldemar Marques Junior (2012) escolheu a ontologia marxiana como base teórica para pensar sobre a questão: “há potencialidades emancipadoras no ensino do esporte como conteúdo da Educação Física Escolar?” (p. 25) Os benefícios efetivos da prática desportiva para a formação do indivíduo, foram interrogados por esse autor que optou pela abordagem metodológica materialista histórica e dialética, a partir do entendimento de que essa perspectiva metodológica realiza um esforço na busca pela “explicação da essência das coisas/fenômenos em seu processo (gênese, movimento e tendência de ‘vir a ser’) [...]” (p. 25). De acordo com as indicações do próprio autor, o seu estudo teórico-conceitual apresenta as principais categorias da ontologia do ser social de Lukács sobre a gênese do ser humano a partir do trabalho, além de tomar como base os estudos da psicologia histórico-cultural desenvolvidos por Vigotski, Elkonin e Leontiev num esforço por aproximar as categorias da ontologia lukacsiana das vigotskianas. No contexto das diferentes perspectivas dialéticas, o materialismo histórico- dialético tem se revelado pertinente no âmbito da pesquisa em educação. Mas nem sempre é considerado suficiente para fundamentar a análise. Gustavo Martins Piccolo (2012) investigou a importância da teoria para compreender o fenômeno da deficiência sobre bases não hegemônicas, fundado na ideia de que “apenas um movimento guiado por uma teoria efetivamente revolucionária pode desempenhar o papel de combatente de vanguarda”. Embora sua análise tenha por referencial teórico o materialismo histórico, o próprio autor reconheceu que não se trata de um trabalho marxista strictu sensu. Essa é 57 uma produção à qual só foi possível o acesso ao resumo, ainda assim foi possível notar que o autor dá pistas de que buscou auxílio em outra teoria além do marxismo. De modo geral, ainda que se considere as suas diferentes interpretações, a Filosofia Dialética tem prestígio gnosiológico no âmbito da pesquisa em educação, sobretudo por considerar o caráter dinâmico e histórico dos objetos de estudo, elaborados no âmbito das investigações em educação. A respeito da Filosofia Dialética e sua imersão na pesquisa, manifestou Severino (2001) que A epistemologia dialética é o paradigma epistemológico que se tem revelado mais fecundo para dar conta da especificidade dos problemas políticos e pedagógicos, mostrando assim sua relevância atual para a pesquisa educacional. Conta, isso sim, é com os subsídios das ciências da sociedade, particularmente da história, da antropologia, da sociologia, da política, da economia (SEVERINO, 2001, p. 19). Apesar disso, essa Filosofia, em sua epistemologia, não é a única a ser buscada pelos pesquisadores. Outras vertentes explicativas são apropriadas por eles no percurso de suas investigações como a filosofia pragmatista de Dewey que também aparece no contexto da produção científica analisada nesta seção. Nadia Mara Eidt (2009) apresentou como objeto de estudo “a relação entre a função social da educação e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, em especial o pensamento” (EIDT, 2009, p. 10). Como objetivo geral propôs-se a investigar as proposições a respeito do desenvolvimento do pensamento nas obras de Dewey e Piaget assim como nas obras de defensores contemporâneos do aprender a aprender, como Perrenoud, Delval, Schön e Tardif, que segundo a autora são aliados ao pragmatismo e ao liberalismo em oposição à produção de Leontiev, que encontra seus fundamentos filosóficos no materialismo histórico-dialético. Eidt indicou sua perspectiva de aprofundamento de alguns aspectos essenciais ao tema e esclareceu que sua tese intentou demonstrar que as ideias dos autores que ela situou como pragmatistas e liberais “submetem o desenvolvimento humano à ordem do capital” em contraposição ao “objetivo humanizador da educação escolar pressuposto na produção teórica de Leontiev.” (Idem, p.14) Antonio Vital Menezes de Souza (2005) estuda “A Estética da Diferença na Vida de Professor”. O estudo foi realizado no período entre fevereiro de 2004 e março de 2005, e teve como sujeitos informantes um grupo de professoras da cidade de Itaberaba 58 no Estado da Bahia, com o principal objetivo de “identificar marcas de diferença nas maneiras atuais de ser professor do grupo pesquisado e analisar como as professoras lidam com os estados de devir durante o desenvolvimento pessoal e profissional na docência”. Esse autor baseou-se no referencial teórico da Filosofia da Diferença. Além de Gilles Deleuze mencionou autores como Michel Foucault, Gilbert Simondon, António Nóvoa, Marie-Christine Josso, Gaston Pineau que, dentre outros, compõem o quadro teórico. Na obra “O que é a Filosofia?”13, escrita em parceria com Guattari, Deleuze indica que a especificidade da Filosofia, é criar conceitos. Essa função é exclusiva da Filosofia. Para Deleuze e Guattari, o conceito é um “agenciamento”, ou seja, ao mesmo tempo em que é produto do pensamento é, sobretudo, um mecanismo que faz pensar. Deleuze inquieta-se com o pensamento, com as diferentes formas de pensar e de expressá- lo, tais como a arte, a ciência e a filosofia. Sobre a questão do método, Deleuze critica a linearidade com que a multiplicidade é conduzida na maioria dos métodos modernos. 14 Sua intenção é contrapor-se a uma filosofia do uno, por meio de uma filosofia do múltiplo. Essa intenção leva-o a negar a dialética, pela realização da unidade dos contrários que essa filosofia se propõe. Deleuze compreende que as diferenças, apesar de serem variações e expressões do mesmo ser, nunca devem ser unificadas. Para Deleuze importa a multiplicidade. A Filosofia da Diferença consiste, pois, em um oponente teórico à dialética. A crise das ciências humanas implica uma renovação epistemológica e o surgimento de outras formas de pensar a questão metodológica que estão sendo identificadas como pós-modernas. Segundo Severino (2001, p. 14), trata-se de posturas epistemológicas encetadas na “direção da ruptura do monismo metodológico do paradigma moderno da ciência”, o que, para ele (Idem, 16), “compromete a unicidade metodológica da ciência.” 13 DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. O que é a Filosofia? Trad. De Bento Prado Jr. E Alberto Alonso Muñoz. Rio de Janeiro: Ed.34, 1992. 14 Na obra Mil Platôs v 1. Deleuze realiza essa crítica ao esclarecer sobre um método que leva em consideração o pensamento rizomático. 59 GRÁFICO 04 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das Teses em Filosofia. Fonte: Banco de Teses da CAPES. Elaborado pela autora Os registros no gráfico indicam que das quatro (4) teses na área de conhecimento da Filosofia, duas (2) não mencionam o objetivo, três (3) não identificam o problema de pesquisa, três (3) não referem as fontes históricas, nenhuma esclarece sobre a metodologia e sobre o período de abrangência e todas não apresentam a conclusão. Em teses da área da Filosofia, é comum o interesse pelo pensamento de algum filósofo, sobre algum conceito criado ou mesmo discutido por determinados pensadores. Essa ideia se materializa nas quatro (4) teses encontradas na área de conhecimento da Filosofia. Assim, a tese de Márcio Alves de Oliveira (2010) discutiu o tema do deslocamento que Kierkegaard faz da dúvida clássica do objeto para o sujeito, como problematização dos fundamentos de uma época que no afã de modernizar padroniza as experiências a ponto de levar a crítica à falência. O autor não mencionou o problema, mas duas ideias aparecem de forma enfática na introdução da tese: a do “abismo moderno entre o pensamento e a realidade” e a de “falência da crítica no pensamento” (OLIVEIRA, 2010, p. 7) O problema das relações entre “estilo e verdade” foi averiguado por Gilson de Paulo Moreira Iannini (2009) que partiu “da crítica à metalinguagem, realizada por Jacques Lacan” e interrogou sobre as repercussões das noções de verdade e sobre o modo como pensar o estatuto da verdade no âmbito disciplinar que tem um objeto avesso à apreensão conceitual na temporalidade clássica. Com o principal objetivo de esclarecer o impasse contido na pergunta sobre a verdade da verdade, Iannini baseou sua pesquisa em Lacan recorrendo às ideias deste autor como uma boa alternativa para analisar o problema da verdade. 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Total de Teses Problema de Pesquisa Fontes Históricas Conclusão Central 100% 50,00% 75,00% 100,00% 75,00% 100,00% 60 Jair Antônio Krassuski (2004) e Roney Wagner Vieira (2007) demonstram interesse no pensamento kantiano. Krassuski analisou o sistema filosófico de Immanuel Kant no que diz respeito aos conteúdos e princípios da religião, com o objetivo de evidenciar que a filosofia religiosa elaborada no centro do pensamento kantiano contém elementos imprescindíveis para a compreensão de temas centrais do sistema filosófico de Kant. Vieira (2007) voltou-se ao problema central do século XVIII que era o de efetivar a coincidência e a harmonia entre o sujeito e o objeto cognoscível e conclui que esse é um problema que só chega a termo com o pensamento hegeliano. Além disso, defendeu a tese de que “a concepção da razão como história permite que a dialética hegeliana dissolva a oposição entre liberdade e causalidade natural, as dicotomias que Kant só resolve mediante os postulados morais”. (VIEIRA, 2007, p.14). Esse autor indicou apenas a tese e se dispôs a discutir o tema do conhecimento. Na dissertação que Vieira fez sobre o tema na introdução de seu texto de tese, embora não informe sobre os objetivos de seu estudo, foi possível perceber indícios de um esforço no sentido de demonstrar que para o idealismo absoluto de Hegel afirmar a necessidade de identificação entre razão e ser, “ele deve suprimir a noção kantiana do dever”. Para demonstrar essa ideia, o autor indicou como fundamentação teórica a abordagem da filosofia crítica. Os objetivos consistem um item importante tanto nos projetos como nos relatórios de pesquisa. Se observarmos as orientações para a organização da escrita de um relatório de pesquisa estas geralmente traçam um roteiro que orienta uma escrita na perspectiva de garantir uma comunicação inteligível para a qual a menção dos objetivos é fundamental. Então, considerando-se que o texto da tese constitui um relatório de pesquisa, mencionar os objetivos parece ser uma exigência metodológica. 2.2 A FILOSOFIA NAS DISSERTAÇÕES EM EDUCAÇÃO E EM FILOSOFIA. O método é um movimento constituído por nossas ações e nelas expresso. Sua relação com o conhecimento exige imaginação, criatividade e rigor. O que significa que se faz necessário o atendimento de algumas regras básicas que, como na conversação, serve para facilitar o entendimento. Especialmente por que as ações humanas têm caráter social, sendo inviável pensar o conhecimento fechado em um indivíduo. Assim, faz parte 61 desse processo indicar os elementos imprescindíveis à realização de uma pesquisa e à socialização de seus resultados. Do mesmo modo que os resumos das teses e mesmo as introduções de algumas delas apresentaram problemas que parecem desfavoráveis à comunicação nos meios científicos, as dissertações também o fazem. GRÁFICO 05 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das Dissertações em Educação Fonte: Banco de Teses da Capes. Elaborado pela Autora As evidências indicaram que dentre as catorze (14) dissertações na área de conhecimento da Educação, onze (11) não mencionaram o objetivo e não indicaram o período de abrangência, seis (6) não identificaram o problema de pesquisa, dez (10) não referiram às fontes históricas, oito (8) não esclareceram sobre a metodologia e todas apresentaram a conclusão. Se os objetivos são de fato importantes nos projetos e nos relatórios de pesquisa, também o são no resumo que abre esse relatório. Do mesmo modo, as fontes são essenciais para a realização da pesquisa. É bom reiterar que conhecer cientificamente, construindo o objeto, é conhecer a partir das fontes, onde se encontra o objeto, sejam elas primárias ou secundárias. Construir o conhecimento é obtê-lo mediante um processo epistêmico que leva o sujeito à apropriação de nexos e sentidos que são como que extraídos de suas próprias fontes; sendo o conhecimento científico a articulação de elementos lógicos com dados da realidade empírica, impõe-se vivenciar essa articulação pessoalmente, experienciando a explicitação do sentido explicativo (SEVERINO, 2001, p. 21). 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Total de Dissertações Problema de Pesquisa Fontes Históricas Conclusão Central 100% 78,57% 42,85% 57,14% 71,42% 78,57% 71,42% 62 Em razão da importância das fontes, como explicita Severino, então um resumo não poderia ser estruturado sem a informação sobre as fontes, pelo menos as principais. À semelhança das teses, as dissertações tanto na área do conhecimento da Educação em Filosofia não priorizam exclusivamente a Filosofia Dialética. Dentre as produções em Educação, visualizadas no resumo, encontram-se dois (2) trabalhos que anunciaram o aporte teórico substanciado na Filosofia Dialética, sob o embasamento do pensamento de Gramsci: o de Elismar Bezerra Arruda (2011) que refere o “materialismo histórico ressignificado conforme a Filosofia da Práxis de Antônio Gramsci” para investigar o Núcleo de Educação Permanente – o NEP de Colíder, e o de Maria do Rosário Cysne (1992), para quem as teses gramscianas sobre práxis social transformadora são fundamentais para analisar a dimensão social e educativa do trabalho do bibliotecário. Membros da escola de Frankfurt são considerados em análises como a de João Francisco Lopes de Lima (2002) para quem a teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas e a crítica da racionalidade moderna que Weber, Adorno e Horkheimer desenvolvem são importantes para refletir sobre o problema da crise de sentido da educação e pensar a possibilidade de renovação do sentido da educação, para o que se faz necessário denunciar a crise da razão. Da mesma forma, Magda Rodrigues de Almeida (2009), também buscou referências em Adorno e Horkheimer, para analisar “a problemática do predomínio da racionalidade científica em nossa cultura”, e pensar outros aspectos que não são lembrados no processo pedagógico, como a narrativa poética, por exemplo, pela qual é possível contrapor-se à racionalidade científica, entendida como “um lugar em que o esquecido, o que não cabe nos conceitos, pode se manifestar”. Já para Juliana Litvin de Almeida (2009), as posições teóricas de Adorno foram referências essenciais para compreender quais as condições de possibilidade da emancipação humana. Importa saber sobre até que ponto a educação, a formação cultural e a experiência poderiam contribuir para tal emancipação. Rubeni Pereira de Queiroz (2008) optou pelo que ela considerou o método dialético para orientar suas reflexões sobre problema de pesquisa referente a novas estratégias de acesso à educação superior como, por exemplo, as cotas, especificamente às “destinadas aos estudantes negros”. Preocupou-se com processo histórico de exclusão 63 social e cultural do negro brasileiro no ensino superior e investigou as implicações da implantação da Lei das Cotas na educação superior em Goiás. Com uma preocupação com a questão pedagógica, Marcel Lima Cunha (2012) teve como referência para seu estudo “a materialidade da proposta marxiana presente no projeto educacional soviético da Escola do trabalho.” Cunha indicou a importância dessas bases, especialmente por compreender que Marx e Engels fundaram o materialismo histórico-dialético e ao analisarem a sociedade, investigaram a questão da formação humana. Para Aline Bueno Chitero (2010) o materialismo histórico-dialético foi a abordagem necessária para investigar o modo como o “PCN se apropria da concepção de desenvolvimento sustentável”. E também necessário para discutir os limites e possibilidades desses parâmetros no que se refere ao conjunto de problemas ligados à questão ambiental. Tratou-se de observar, segundo essa autora, a “contradição dialética entre as suas dimensões histórica, econômica e social no contexto do ensino, com base nos fundamentos filosóficos, metodológicos e lógicos, expressos no materialismo histórico dialético”. Há resumos que não identificam a abordagem filosófica de sustentação da análise um exemplo desse tipo é o que se apresenta a seguir. Poder-se-ia pensar que se trata de resumos elaborados há uma ou duas décadas, mas na atualidade também encontra- se, especialmente na área da filosofia. Os dois resumos transcritos na íntegra abaixo são exemplos de diferentes momentos e de distintas Instituições de Ensino Superior. O primeiro é da dissertação de Dion David Macedo oriunda do Programa de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e data de 2000 enquanto o segundo é da tese de Márcio Alves de Oliveira, defendida na Universidade de São Paulo no ano de 2010. Esta dissertação constitui-se em uma análise do Banquete de Platão, diálogo consagrado ao amor, com suas imagens, paisagens, lições, metáforas e conceitos que se transformaram em alguns dos modelos compreensivos da nossa moderna concepção de amor e que, de alguma maneira, foram absorvidos pelo Ocidente, passando a fazer parte do nosso universo cultural e do nosso repertório civilizatório. Esta investigação é uma retomada, no quadro do debate travado no Banquete, da vinculação estabelecida por Platão entre Eros e Lógos, o exercício erótico e o exercício filosófico, assentando seus limites e seus fundamentos no famoso discurso de Diotima de Mantinéia, em que se firmam as articulações da busca erótica com o movimento dialético. Aí 64 Platão nos enuncia tanto sua teoria da participação quanto sua teoria do Amor, intermediário entre o sensível e o inteligível, os homens e os deuses, as Idéias e suas manifestações. A pesquisa se divide na análise do elogio do Amor realizado pelos convivas presentes ao banquete de Agatão, no exame do diálogo entre Sócrates e Diotima, em que se define Eros como intermediário e, por fim, no estudo da aparição conclusiva de Alcibíades, que desloca o elogio de Eros ao elogio de Sócrates. A dissertação tem seu eixo na investigação da iniciação amorosa proposta por Sócrates-Diotima, apresentando a ligação entre o amor masculino e o exercício erótico como atividade pedagógica e como modo de vida, por um lado, e a ligação entre amor e filosofia, por outro (MACEDO, 2000). O deslocamento kierkegaardiano da dúvida clássica do objeto para o sujeito problematiza os fundamentos de uma modernidade modernizadora que padroniza as experiências até o limite mesmo de uma falência da crítica. Imanente a duvidosas subjetividades que esvaziam absurdamente toda mediação com as coisas, um pensar ambiguamente crítico diferencia-se de determinações abstratas do ser passando pelo que resiste negativamente como historicamente recalcado em cada padronizada abstração, o que perspectiva um reconciliador desrecalque apenas no grande ultrapassamento do problema histórico de uma abstração totalitária. Racionalizando dialeticamente nas coisas existentes sem normatizar uma abstrata negatividade, um pensador crítico ultrapassa ironicamente este ser negativo, problema imanente essencialmente em aberto, para uma paradoxal dialética subjetiva que reconfigura subjetivamente um todo absurdamente crítico mediante uma subjetividade historicamente situada de modo ambíguo como a verdade e a não-verdade; ultrapassada, por sua vez, para além da normatização de um sem- sentido mais que absurdo, problema imanente essencialmente em aberto, por uma nova racionalização dialética. Antes que uma antinomia, que aqui teria um caráter pré-crítico, trata-se de uma antinormatização por parte de um pensar ambiguamente crítico objetivamente encravado de modo subjetivo no limiar histórico de sua própria falência. (OLIVEIRA, 2010) Observou-se que os dois resumos tratam quase que exclusivamente do tema, não apresentam nenhum outro elemento da estrutura de um resumo de trabalho científico. No primeiro, o indício de uma organização metodológica está restrito à divisão em duas partes uma referente ao “elogio do Amor” e a outra sobre “diálogo entre Sócrates e Diotima”. O segundo, indicou o objeto “a iniciação amorosa proposta por Sócrates- Diotima” e referiu-se a um “problema imanente essencialmente em aberto” no 65 pensamento filosófico, que parece ser apropriado como o seu próprio problema de pesquisa. Várias são as formas com que os pesquisadores privilegiam a Filosofia Dialética em suas dissertações de mestrado em programas de pós-graduação em educação. Essa variedade consiste um indício da criação de vários métodos de investigação inspirados na Filosofia Dialética, especialmente em sua versão materialista e histórica. É justamente essa variedade de formas que marca o grau de importância dessa filosofia para as pesquisas no campo da educação. A pesquisa bibliográfica é a base teórica de toda e qualquer pesquisa, pois dela são extraídos elementos para a problematização e discussão profícua sobre um determinado assunto. Em termos metodológicos, a pesquisa requer a definição de vários elementos estruturais que organizam tecnicamente o trabalho e são fundamentais na organização textual do relatório de pesquisa que, no âmbito da Pós-Graduação, consistem em dissertações de mestrado e teses de doutorado. Dentre esses elementos encontram-se os objetivos e a abordagem teórico-metodológica. GRÁFICO 06 – Problemas encontrados na identificação dos elementos estruturais dos resumos das Dissertações em Filosofia. Fonte: Banco de Teses da CAPES. Elaborado pela autora. Os números estatísticos colocam em evidência que dentre um total de vinte e nove (29) resumos de dissertações na área de conhecimento da Filosofia, um (1) não expôs o tema, treze (13) não mencionaram o objetivo do trabalho, sete (7) não apresentaram o problema da pesquisa, sete (7) não indicaram a metodologia, onze (11) 0% 20% 40% 60% 80% 100% Total de Dissertações Problema de Pesquisa Fontes Históricas Conclusão Central 100% 44,82% 24,13% 24,13% 37,93% 10,34% 34,48% 66 omitiram as fontes históricas, três (3) não disseram os períodos de abrangência do estudo e dez (10) não informaram a conclusão central. Da mesma forma que nos resumos das dissertações em Educação, as dissertações em Filosofia também não cumprem totalmente as exigências acadêmico- científicas de esclarecer no resumo os objetivos e o referencial teórico. Alguns mecanismos utilizados para destruir Eros na subjetividade, foram usados por Luciana do Nascimento Couto (1996) que buscou verificar “como o ser humano, aniquilado em seu desejo, é facilmente dominado e usado pelo mundo do trabalho como mercadoria”. A autora considerou a existência de um método dialético, colocando em evidência “o processo de construção, destruição e reconstrução do Eros”. A própria autora informou que esse método é “acompanhado de análises comparativas e estudo bibliográfico do tema, sendo possível abarcar outras áreas do saber para atingir o objetivo proposto”. A dissertação de Rodrigo Ortiz Salema (1996) tratou de “alguns aspectos da crítica de Adorno e Horkheimer sobre a razão instrumental”. O resumo privilegia o tema em detrimento dos outros itens necessários à estruturação e desenvolvimento da pesquisa. Da mesma forma que o resumo referente ao trabalho desenvolvido por Cleodon Borges de Oliveira. (1997) para quem o que caracteriza a sua dissertação é a tentativa de indicar uma possível leitura do texto de Hegel, como instrumento de ação pedagógica. O objetivo central do trabalho de Valério Hillesheim (1997) consiste em demonstrar o desenvolvimento objetivo da liberdade no estado, mas esse autor não esclareceu, nem mencionou qual a sua abordagem teórica. José Marcos Miné Vanzella (1998) fez uma descrição sobre a origem, os desvios e limites da ciência e tecnologia modernas, a partir de uma crítica que, segundo o autor, “articula dialética, hermenêutica e ciência contemporânea”. Antonio Patativa de Sales (2004) discorreu sobre a antropologia filosófica de santo Agostinho na obra De Trinitate e instituiu como objetivo de seu trabalho entender a relação que santo Agostinho faz entre o dogma da Trindade (teologia) e a imagem da Trindade no homem. Gustavo Ellwanger Calovi (2008) estudou o modo como Kant concebe a unidade entre virtude e felicidade, consideradas por Kant como elementos diversos e descreve o conceito de sumo bem. Esse estudo teve como objetivo “mostrar que Kant atribui diferentes papéis na ética, na religião e na filosofia política para o sumo bem [...]”. 67 Ernesto José Haefliger (2007) discutiu o problema de “que natureza de matriz epistemológica devemos construir a fim de dar conta da desagregação e da complexidade histórica” (p.12), com o objetivo de contribuir para o aperfeiçoamento das relações engendradas pelos homens. Com uma preocupação pedagógica Luis Fernando Weffort (2008) averiguou “o debate intelectual e político que marcou a vida cultural de Atenas na segunda metade do século V a.C., assim como os seus desdobramentos no campo moral e educacional”. Carolina Muranaka Saliba Barreto (2009) examinou o conhecimento dos primeiros princípios em Aristóteles com o objetivo de “determinar – ou, não sendo possível, ao menos indicar ou especular – o nível de contribuição que pode ser dado pela investigação dos primeiros princípios”, (BARRETO, 2009, p.18) mas atendo-se a leitura dos textos aristotélicos. Gilson de Paulo Moreira Iannini (2009) procurou “esclarecer e desdobrar o impasse contido na pergunta: o que significa afirmar a verdade sem o apoio de uma metalinguagem, ou seja, sem que seja possível dizer a verdade sobre a verdade?” Parte considerável dessa reflexão constrói-se sob o fundo das discussões sobre os limites do dizer e o estatuto da verdade na filosofia contemporânea. A dissertação de Márie dos Santos Ferreira (2009) com o objetivo de apresentar “a constituição do conceito de pessoa humana no pensamento filosófico de Lima Vaz, seu significado e expressão”, afirmou seguir a orientação metodológica desse autor. Também entre as dissertações em Filosofia encontram-se trabalhos em que representantes da escola de Frankfurt são considerados como as dissertações de Wisley Francisco Aguiar (2009) e de Paulo Ricardo Schulz (2011). Wisley Francisco Aguiar (2009) investigou a noção de progresso em Theodor W. Adorno tomando como ponto de partida “o enfoque dado pelo próprio autor em seus dois textos principais: a Dialética do Esclarecimento e a Filosofia da Nova Música”. (AGUIAR, 2009, p. 11). Para nortear sua análise, o autor interrogou: Que elementos Adorno trabalha para caracterizar o progresso como antimitologização da sociedade industrial? Que papel tem a indústria cultural nessa abordagem de progresso? Como é possível retirar de uma obra como Filosofia da Nova Música uma noção de progresso? O trabalho analisou o conceito de progresso à luz do pensamento adorniano, tendo como referência de estudo seus conceitos de Filosofia, Música e Sociedade. (Idem, p. 100) 68 Paulo Ricardo Schulz (2011, p. 14) afirmou que busca analisar “a contradição/conflito que surge entre a formação cultural e a indústria cultural, bem como a educação como aquele empenho ou investimento que pode contribuir para a conscientização da humanidade”. Tratou-se de uma pesquisa bibliográfica feita a partir do pensamento de T W Adorno. Luis Felipe Martins de Salles Roselino (2010) mencionou em seu resumo que “a dialética será investigada nas tipologias históricas de Max Weber como consequências da união entre razão e história”. A menção que o resumo da dissertação desse autor faz sobre a abordagem do seu objeto é que ela será feita “a partir de duas histórias da filosofia, a de Windelband e a de Luckás”, portanto, “de um ponto de vista filosófico, mas, que não deixa de ser também histórico e sociológico”. Roselino (p. 20) se propõe a “identificar em Max Weber uma herança do idealismo”, mas compreende que esta não é uma empreitada simples, sobretudo porque se pretende crítica. O estudo de Olmaro Paulo Mass (2011) foi orientado pela questão do alcance da Teoria Crítica para estabelecer a passagem da crítica da racionalidade instrumental à sustentação de um pensamento crítico-dialético. Mas preocupou-se com a crítica que Adorno e Horkheimer deflagaram sobre o conceito de racionalidade moderna, na obra Dialética do Esclarecimento e estabeleceu como objetivo entender “a relevância filosófica que essa obra proporciona para a formação e construção de um pensamento filosófico crítico, emancipador, audacioso e provocador” (Idem, p.11) Vera Lúcia da Silva Alves (2011) investigou o percurso teórico de Lacan sobre o conceito do grande Outro, no período de 1938 até o início da década de 1960. Atendo-se à retomada lacaniana da “dialética do senhor e do escravo”, com o objetivo de “analisar a retomada e a reformulação de Lacan sobre a relação dialética hegeliana – eu outro – para demonstrar as semelhanças, as diferenças, e o seu efeito na constituição do sujeito em cada um dos dois pensamentos” (Idem, p. 9) A autora não mencionou a abordagem de sustentação teórica de sua análise, mas deixou claro que se tratava de uma análise comparativa entre Lacan e Hegel que conduz à conclusão de que, apesar das críticas de Lacan a Hegel, “o início teórico de Lacan é mesmo semelhante à filosofia de Hegel” (Idem, p. 117). A fenomenologia é outra filosofia considerada entre as produções analisadas nesta seção da tese, todavia, não se trata de um interesse pela abordagem fenomenológica para fundamentar a análise de um fenômeno no processo de investigação, mas por um problema constituído a partir do pensamento de um fenomenólogo. 69 Essa filosofia aparece no trabalho de Rodrigo Alvarenga (2011), que estudou o problema das “relações entre consciência e natureza”, e estabeleceu como objetivo “verificar de que modo a expressividade do corpo relaciona-se com essa questão, sob a perspectiva de Merleau-Ponty.” (p, 10). O autor não explicou, sequer mencionou, qual abordagem fundamenta a análise em sua dissertação, cuja pesquisa é bibliográfica. Essa carência de indicações dos elementos estruturais dos resumos das produções analisadas nesta seção, que em muitas delas não é suprida na introdução, não se constitui na ausência de elementos meramente formais do processo de pesquisa, uma vez que a pesquisa consiste em um conjunto de ações que dão forma a atividade de investigação que gera conhecimento. E se consubstancia na utilização rigorosa de métodos com a finalidade de elaborar e validar o conhecimento. Ao visar à produção de um novo conhecimento que alcance relevância epistemológica e importância social, a pesquisa precisa apresentar uma atitude crítica e reflexiva tanto no trato com o tema estudado como com os métodos e as fontes históricas à disposição do pesquisador. O valor da produção do conhecimento para o homem é inegável. Não há sociedade que em maior ou menor escala deixe de investir nessa produção, posto que se trata de algo essencial à própria existência humana, por isso o mérito da Pós-Graduação como local de produção de conhecimento. A importância da produção do conhecimento para a sociedade brasileira é observada por Severino (2007) que faz referência à ciência, a pesquisa e ao ensino. No que diz respeito à Pós-Graduação, o autor chama atenção para os compromissos sociais e políticos dos quais a Pós-Graduação não pode se eximir. De acordo com Severino (2007, p. 32) a produção do conhecimento deve buscar soluções para os problemas cruciais enfrentados pela sociedade brasileira em cada área de conhecimento especificamente. O avanço do conhecimento deve ser articulado à investigação de problemas socialmente relevantes, considerando as demandas da sociedade brasileira. A respeito da formação do pesquisador a conclusão dos estudos de doutorado é tomada como um momento crucial da consolidação dessa formação. De modo que as Instituições de Ensino Superior crescem em importância na medida em que fundam e solidificam programas de Pós-Graduação. Mas nessa consolidação vem à tona problemas 70 que já não deveriam existir nesse processo de consolidação, como os notados nas exposições gráficas e análises realizadas nesta. Longe de ser uma atividade de natureza mecânica, a pesquisa constitui uma existência que requer imaginação criadora e iniciativa individual, mas o trabalho criativo é organizado a partir do rigor metódico, para o qual a criatividade só tem a contribuir. Além disso, toda investigação tem caráter axiológico, ou seja, possui uma carga de valores e abre possibilidade para uma diversidade metodológica. Nesse sentido, foi possível notar que algumas concepções filosóficas que fundamentam as metodologias tanto das produções em educação como em outras áreas do conhecimento são recorrentes como a hermenêutica filosófica apropriada por duas das três produções analisadas na área do direito, por uma da psicologia e por duas da educação. Dessas produções apenas uma não menciona Gadamer. Nas produções da área do direito a hermenêutica filosófica é considerada para embasar análises referentes à hermenêutica jurídica e nos dois trabalhos destaca-se a importância da filosofia para a constituição da hermenêutica jurídica. Na área da educação duas produções se aproximam da hermenêutica de Gadamer numa perspectiva epistemológica. Uma busca aproximação entre hermenêutica e dialética, como fundamentação metodológica para analisar a inclusão da pesquisa, como princípio educativo, no ensino de graduação. A outra fundamenta-se na hermenêutica com vistas a esclarecer os limites do método em uma abordagem metafísica e a diferença entre a hermenêutica filosófica. Mas as concepções mais procuradas não somente pelas produções na área da educação, mas principalmente nessa, são a teoria crítica dos frankfurtianos, especialmente nos estudos de Adorno e Horkheimer e a dialética materialista nos estudos marxianos. A diversidade de maneiras como a dialética é apropriada pelos pesquisadores discentes de programas de pós-graduação considerados neste texto, pode ser notada nas justificativas e explicações sobre a escolha dessa abordagem filosófica em suas produções. Diferentes são as formas e diversos são os autores buscados como embasamento para a discussão e análise dos objetos de pesquisa, na apropriação da Filosofia Dialética como fundamentação teórica para embasar a elaboração metodológica realizada pelos autores das produções científicas em Educação, mas Marx e Gramsci são os mais citados. 71 É interessante notar que os filósofos e suas obras não apenas fundamentam as abordagens metodológicas, mas são estudados em algumas produções, especialmente aquelas vinculadas à área de filosofia. Algumas conclusões são possíveis de pontuar. Nesse sentido, observo que a investigação orientada pelo problema da importância atribuída à Filosofia Dialética no âmbito da produção do conhecimento científico no campo da pesquisa em educação no Brasil, possibilitou constatar que a filosofia dialética é considerada importante pelos pesquisadores da área da educação. As informações obtidas na pesquisa indicam que os pesquisadores se apropriaram da Filosofia Dialética para embasar a metodologia e análise dos seus problemas e objetos de estudo. Além disso Filosofia Dialética foi considerada não somente apropriada, porém importante para fundamentar a análise de diferentes problemas no âmbito da educação e também referentes à própria filosofia, isto é, considerados filosóficos como o da racionalidade, por exemplo, com repercussão na educação. Os procedimentos metodológicos de investigação e análise realizados, foram suficientes para atingir o objetivo de analisar a importância atribuída à Filosofia Dialética na produção do conhecimento em teses doutoraes na área da Educação. Tais procedimentos me conduziram a outras áreas do conhecimento e proporcionaram uma amostra significativa da importância tanto da dialética como de outras filosofias na produção do conhecimento no Brasil. A decisão por mim assumida, de considerar produções de outras áreas do conhecimento para além da educação, na parte introdutória desta seção, configurou-se como um indicativo da receptividade e importância da Filosofia, de modo geral, nas práticas de pesquisa de diferentes áreas do conhecimento. Isso significa que tanto a Filosofia Dialética como outras diferentes filosofias são tomadas como fundamento das abordagens metodológicas das produções analisadas. Mas no que diz respeito ao objeto de pesquisa desta tese posse concluir que não há trabalhos interessados em falar dos limites da dialética. Quando os limites são mencionados nos resumos observados nesta primeira seção, indicam uma espécie de constatação com que o autor se defrontou no desenvolvimento do trabalho. Com a leitura e análise das introduções e das conclusões da maioria dessas produções foi possível compreender que termos como limites, possibilidades e até mesmo contradição são 72 referentes aos objetos de pesquisa que, por sua vez, não têm como objetivo analisar e compreender o poder de alcance da dialética. Uma das limitações desse estudo refere-se às fontes documentais formadas por um conjunto de teses e dissertações, perfazendo um total de 105 produções das quais, da maioria, tive acesso apenas aos resumos. Com o intuito de ter uma visão do que foi produzido na área da educação sobre os limites epistemológicos da Filosofia Dialética na produção do conhecimento científico na área da Educação, as informações obtidas nos resumos foram suficientes para concluir que não havia até aquele momento, ano de 1913, indícios de produções sobre meus problema e objeto de estudo, garantindo, assim o ineditismo de minha tese de doutoramento. O período histórico concernente a essas fontes, para coleta de informações na Caps, foi o de 1987 a 2013, que considerei pertinente para formalizar a visão referida no parágrafo acima. 73 3 REPERCUSSÕES ACADÊMICAS NA TRAJETÓRIA DE FORMAÇÃO DE ANTÔNIO JOAQUIM SEVERINO E DERMEVAL SAVIANI O processo de formação das pessoas marca suas vidas e diz muito sobre suas perspectivas em relação a si próprias, às outras pessoas e ao mundo. Esse si próprias inclui o modo de ser, de pensar, de sentir, de entender, de fazer, inclusive a compreensão que se tem sobre esse termo tão repetido na história da educação, sobretudo brasileira e recente. Trata-se de uma expressão comum em textos, livros e artigos referentes à educação, ensino, escolarização e também em enunciados que compõem a lei e expressam as políticas educacionais. Fala-se de formação inicial, continuada, cultural e a distância. Discute-se sobre formação e economia, mercado de trabalho, políticas educacionais. Questiona-se a individualidade e a coletividade no processo de formação. A fertilidade e a diversidade das discussões são indicativas de que se trata de um tema importante. Mas, afinal o que se entende por formação, sobretudo de professores, educadores? No que tange a essa questão Saviani (2009, p.153) entende que a formação “não pode ser dissociada do problema das condições de trabalho que envolvem a carreira docente, em cujo âmbito devem ser equacionadas as questões do salário e da jornada de trabalho”. Nessa perspectiva, afirma que “o trabalho foi, é e continuará sendo o princípio educativo do sistema de ensino em seu conjunto” (Op. Cit., p.13). Mas, formação tem a ver com forma. Neste sentido, trata-se de um termo no mínimo discutível. Severino observou que na maioria das vezes em que esse termo aparece objetivando conceituar a educação, é para contrapor-se à informação. Mas também em muitas outras situações de seu emprego traz consigo o sentido “pôr em forma, moldar”. Ao contrário disso, para Severino o sentido de formação é o da “constituição do sujeito que não tem molde onde se encaixar, para se enquadrar, medidas para se medir. Um sujeito totalmente contingente, com muito precárias referências históricas para se guiar em sua existência” (SEVERINO, 2006, p. 631). Nesse sentido, a formação humana consiste no processo de desnaturalização e culturalização do homem. Tomar a formação no sentido de moldar significa ignorar valores essenciais à humanidade de que se constitui o ser humano, a autonomia e a liberdade sem as quais 74 não se viabiliza a vida política, mesmo que a liberdade e a autonomia não se realizem de modo absoluto. Em outro sentido, é não levar em consideração a capacidade de resistência individual e coletiva do ser humano. Pensar a formação do educador requer, para Severino, (2003, p. 82) situá-la no ponto de vista da integralidade humana, considerar que os componentes filosóficos e científicos são imprescindíveis, posto que contribuem para refletir sobre a condição de existência e, por meio dessa reflexão esclarecer o “sentido da pertença dos sujeitos, à espécie humana em sua ‘essencialidade’ e na sua expressão sob as diferentes dimensões mediadoras de sua existência real: as dimensões histórica, social, cultural, política, econômica e psíquica.” Isso significa que a educação como formação integral não pode ser reduzida ao aspecto técnico, sem correr o risco de se tornar frágil. Necessita dirigir-se aos outros aspectos, especialmente no que tange à ética, à política e à estética, para que não se perca aquilo que de mais fundamental emerge na história. A compreensão de que a existência humana substancialmente se estabelece mediante a prática ou o trabalho e que, portanto, o processo formativo se realiza por meio do trabalho é partilhada por Severino e Saviani para quem a educação é uma prática social e histórica. Esse entendimento é marcado pela aproximação desses dois autores com Karl Marx. Marx e Engels (1999), apresentam a formação humana como uma construção coletiva e histórica que não dispensa os elementos naturais, mas que se realiza nas relações de produção da vida, pelo trabalho. O ser humano não se constitui um elemento simples, unidimensional, ao contrário é complexo, multidimensional. Essa é uma qualidade do ethos existencial humano que depõe a favor da riqueza constitutiva da humanidade e abre espaços a serem preenchidos, ambientes a ocupar, caminhos a trilhar, expandindo as possibilidades criativas e formativas da atividade educacional e as oportunidades elaborativas do conhecimento via pesquisa, sobretudo na área da educação, ao mesmo tempo em que na prática localizada da educação encontra a sua limitação. Ora, o processo de escolarização, que implica formação, constitui uma prática localizada. Então, como dar conta de todas as dimensões do ser humano? Apesar dos questionamentos que se possa fazer, das limitações encontradas, o processo de escolarização é fundamental para a formação que não prescinde dos elementos filosóficos e científicos que, de alguma forma, são acessíveis nesse processo, sobretudo em nível superior. 75 Por isso, a trajetória de escolarização de uma pessoa é tão importante para a sua formação. Afinal tais contribuições são essenciais ao processo educacional e marcam profundamente os caminhos traçados pelo homem em seu próprio contexto existencial, os lugares institucionais e a posição de sujeito que cada indivíduo ocupa. Os elementos formativos absorvidos, elaborados e reelaborados nesse processo, trazem a marca de uma concepção filosófica com a qual o indivíduo busca uma maior aproximação. No cerne dessa compreensão é que se coloca, como propulsora das investigações e análise que dão estofo teórico a esta seção, a seguinte questão: Qual a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação no Brasil? Direcionar essa questão a dois pesquisadores em particular, além de possibilitar alcançar o objetivo almejado, consiste em uma oportunidade de compreender como, na formação de cada um deles, se origina, se processa e se consolida a filosofia dialética entendida, também, como uma postura que não se adquire repentinamente, mas que requer dedicação, tempo de estudo, experiência e convivência teórico-prática. A dedicação de Severino aos estudos em Filosofia e Filosofia da Educação e de Saviani em Filosofia e História da Educação, dão vestígios de que se pode alcançar o nexo entre filosofia e história que realiza o amálgama da filosofia dialética, sobretudo em Hegel e Marx. Além disso, a participação discente em programas de pós-graduação em nível de doutoramento é considerada como consolidação do pesquisador, o que implica a exigência de autonomia por parte do corpo discente, contudo isso não dispensa a necessidade de um orientador que embora ciente da necessidade de exercício de autonomia discente na elaboração do conhecimento não pode se eximir da orientação que, por sua vez, marca a interferência e a influência do pesquisador nesse processo de elaboração do conhecimento por parte do pós-graduando. Tendo isso em consideração, a possibilidade de aproximação dos orientadores Severino e Saviani com a dialética, sobretudo o número significativo de pesquisas e de orientações em programas de pós-graduação, as semelhanças que os aproxima, as dissemelhanças que os afasta, o reconhecimento da importância de seus estudos para o processo do conhecimento em educação, esta seção inspeciona a trajetória de formação em nível superior dos dois orientadores, com o objetivo de examinar a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação e as 76 contribuições do materialismo histórico-dialético para a formação do pesquisador nesse campo disciplinar. Na construção dos argumentos apresentados nesta seção, as informações foram colhidas pela primeira vez no ano de 2012 com um olhar preliminar, no intuito de subsidiar o então projeto de tese, mas para a elaboração da análise que substancia esta parte do trabalho as informações foram coletadas no dia 30 de outubro de 2013. Nos dois momentos foi utilizado o sítio http://lattes.cnpq.br/ para inspecionar o currículo lattes de Saviani15 e de Severino16. Com a necessidade de buscar informações sobre o processo de formação desses dois orientadores, nesse segundo momento também foram usadas entrevistas17 concedidas por eles a esse respeito. Inspecionar em que, onde, quando, como e por que os dois orientadores realizaram seus estudos de Graduação e de Pós-Graduação pode proporcionar melhor entendimento sobre o perfil intelectual e acadêmico que os caracteriza como docentes e pesquisadores. 3.1 OS CAMINHOS PARA A GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA E AS PRIMEIRAS INVESTIDAS PROFISSIONAIS O nível de graduação consiste em um importante período do processo de escolarização. Não se quer dizer com isso que os outros níveis sejam menos importantes, mas tão somente destacar que é nesse nível de estudo que pela primeira vez no processo escolar se exige do discente um maior esforço e rigor no sentido de aprendizagem da elaboração do conhecimento, especialmente nas universidades que são instituições fundadas sob o princípio de articulação das atividades de ensino, pesquisa e extensão. Para além de qualquer crítica que se possa fazer, da precariedade muitas vezes existente, 15 Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/2205251281123354. Última atualização do currículo em 18/08/2013 16 Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4415326563786783. Última atualização do currículo em 25/11/2012 17 Essas entrevistas foram concedidas por Severino à Revista Espaço Pedagógico, em 1994 e a IHU On- Line. O acesso a esta última se deu em 14/11/2013 em http://www.paradigmas.com.br. A entrevista concedida por Saviani ao Arquivo Nacional e publicada na Revista Acervo em 2005 e também o discurso proferido por Saviani na Sessão Especial do Conselho Universitário, reunido em Assembleia Universitária para outorga do título de Professor Emérito da UNICAMP, no dia 15 de outubro de 2002. 77 é nesse ponto da formação que o aluno tem seus primeiros contatos, como aprendiz, com as abordagens teóricas e metodológicas de pesquisa. Fez-se necessário focalizar a trajetória de escolarização dos dois orientadores com ênfase a partir do ensino superior, uma vez que essa trajetória é fundamental para a constituição formativa dos orientadores enquanto tais. Nas histórias pessoais de Severino e Saviani é evidente a importância desse estudo. São vivências que trazem algumas semelhanças que marcam o acesso e a permanência dos dois sujeitos ao ensino superior. Ambos são de origem humilde e a trajetória de escolarização acadêmica inicial ocorreu na mesma época. Embora tenham cursado a graduação em lugares diversos, isto ocorreu na mesma década, portanto, ainda que de modo diferente são afetados pelo mesmo contexto histórico pelo qual o Brasil passava. Além disso, a oportunidade de acesso de ambos é marcada por estudos na condição de seminaristas. Dermeval Saviani, de origem “camponês-operária,” 18 realizou o curso primário19 no Grupo Escolar de Vila Invernada, na periferia da cidade de São Paulo, no período de 1951 a 1954 e o curso ginasial em Cuiabá, no período de 1956 a 1959, no Seminário Nossa Senhora da Conceição. O curso colegial foi realizado no período de 1960 a 1962 em dois seminários situados em diferentes cidades do Estado de Mato Grosso: o primeiro ano foi cursado no Seminário do Coração Eucarístico na cidade de Campo Grande, hoje capital do Estado de Mato Grosso do Sul. O segundo ano, o último do Seminário Menor, foi cursado no Seminário Nossa Senhora da Conceição, em Cuiabá, para onde Saviani voltou no ano de 1961. Antônio Joaquim Severino nasceu e viveu até os 14 anos de idade em uma pequena fazenda ao Sul de Minas, onde seu pai trabalhava. Realizou seus estudos primários no Grupo Escolar Cel. Manuel Pinto, no período de 1948 a 1951, na Cidade de Carmo do Rio Claro, distante 7 km da fazenda onde morava. A dedicação discente de Severino valeu-lhe uma bolsa de estudos da prefeitura da cidade, para estudar no Ginásio São Luís de Monfort, onde permaneceu por dois anos em regime de internato. Ao fim desse período Severino saiu de Carmo do Rio 18 Termo usado pelo professor Saviani em entrevista concedida ao Arquivo Nacional In:Acervo, Rio de Janeiro, v. 18, no 1-2, p. 5-14, jan/dez 2005 - pág. 5 19 Os cursos primário e ginasial correspondem ao ensino fundamental de hoje. E o curso colegial equivale ao Ensino Médio. Mas o ingresso no curso ginasial requeria um ano de curso de admissão ao ginásio. 78 Claro, em decorrência de sua decisão de entrar para o seminário. Primeiro o Seminário Menor de Ribeirão Preto, no norte de São Paulo onde deu continuidade ao curso ginasial. Concluído esse nível de ensino, seguiu para o Seminário Arquidiocesano de Campinas, onde cursou o colegial, no período de 1955 a 1960. Foi neste seminário que lhe foi propiciada a oportunidade de cursar Filosofia. O fato de Saviani e Severino serem de origem camponesa e economicamente humildes os distanciava do acesso ao ensino superior, não fosse o fato de terem cursado o seminário o que lhes possibilitou o primeiro contato com a Filosofia e a aproximação do ensino superior. A educação escolar que antecede os estudos universitários dos dois orientadores, abrangeu o período que vai de 1948 a 1960. Essa época correspondeu a um momento em que a cultura nacional sinalizava tensões e conflitos entre o tradicional fundado nos interesses latifundiários dos agroexportadores e o novo subsidiado pela política petrolífica iniciada no governo de Getúlio Vargas com a criação da Petrobrás e pela política de implantação da indústria pesada no Brasil, realizada por Juscelino Kubtischek que também se responsabilizou por inovações na penetração de capital internacional na economia brasileira, por meio da implantação de filiais multinacionais. No que tange à educação, esse foi um período em que os governos influenciaram a implantação de diferentes políticas educacionais. Mas considerando-se que a partir de 1950 intensificou-se o desenvolvimento econômico no Brasil, pode-se dizer que essa conjuntura política de desenvolvimento urbano-industrial, influenciou o sistema educacional, provocando a expansão da escolarização, muito embora não se possa defender que tal expansão supriu as necessidades de ampliação de qualidade da educação escolar. De alguma forma, as famílias dos dois intelectuais vivenciaram esse contexto que no caso deles foi marcado pelo trabalho assalariado, ou seja, o emprego de suas forças produtivas, no campo, em propriedade dos detentores dos meios de produção. Mas a família de Saviani realizou um movimento que deu a ela a oportunidade de aproximação maior com a indústria e a vida num centro urbano. Procurando melhorar financeiramente, mudou-se para São Paulo no ano de 1948, quando então o pai e seus irmãos mais velhos entraram para o mundo industrial. O pai como foguista de caldeira na indústria e os irmãos na condição de operários nas fábricas. 79 QUADRO 02: Escolarização superior no percurso de formação dos orientadores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani. Orientador Nível de Escolarização Graduação Mestrado Doutorado Livre Docência Estágio Pós- Doutoral Antonio Joaquim Severino 1960 - 1962 Graduação em Filosofia. Université Catholique de Louvain, UCL, Bélgica 1962 - 1964 Mestrado em Filosofia. Université Catholique de Louvain, UCL, Bélgica. 1967 - 1972 Doutorado em Filosofia. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, Brasil. 2000 Livre- docência. Universidad e de São Paulo, USP, Brasil. Dermeval Saviani 1963 - 1966 Graduação em Filosofia. Pontifícia Universidad e Católica de São Paulo, PUC/SP, Brasil. 1968 - 1971 Doutorado em Filosofia da Educação. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, Brasil. 1986 Livre- docência. Universidad e Estadual de Campinas, UNICAMP, Brasil. 1994 - 1995 Pós- Doutorad o em Educação . Universit à di Bologna. Fonte. CNPq. Currículo Lattes. http://www.cnpq.br. Acesso em: 20/01/2016 Em 1962 Saviani ingressou no Seminário Maior, iniciando então os estudos filosóficos, referentes a esse nível de formação eclesiástica, no Seminário Central de Aparecida do Norte, no Estado de São Paulo, onde ficou por dois anos e onde também cursou seu primeiro ano na Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras de Lorena. Além da aprovação no vestibular, exigência para frequentar o ensino superior, seu ingresso nesta faculdade foi possível em função de um convênio existente entre ela e o Seminário Central Filosófico de Aparecida do Norte, “mediante o qual o curso de Filosofia de Aparecida passava a funcionar como uma secção da Faculdade de Lorena” (SAVIANI, 2002, p. 280). Assim, o segundo ano de Filosofia no seminário foi cursado concomitantemente com o primeiro ano do curso de Filosofia na faculdade. Em 1964, com a garantia do curso universitário, Saviani saiu do seminário e voltou a morar em São Paulo com sua família, transferindo-se para a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde concluiria a graduação em Filosofia. Mas a sua transferência para essa universidade exigia que ele procurasse um emprego. Tal necessidade foi suprida, primeiro ao ser admitido no Banco Bandeirantes do Comércio e 80 depois no Banco do Estado de São Paulo para onde prestou concurso em 1965, com o objetivo de amenizar a precariedade financeira em que vivia. Os estudos nos seminários foram responsáveis também por alguns deslocamentos realizados pelos dois orientadores. De algum modo, essa movimentação ressoa na formação desses intelectuais. Para Saviani isso significou sair de São Paulo, primeiro para Cuiabá, depois rumo a Campo Grande, novamente retornou a Cuiabá, daí para Aparecida do Norte e finalmente de volta a São Paulo. O movimento realizado por Severino em função de seus estudos no seminário iniciou com um deslocamento da cidade de Carmo do Rio Claro, Minas Gerais, para Ribeirão Preto, daí a Campinas, ambas no Estado de São Paulo, em seguida para Bélgica, depois Roma e finalmente o retorno ao Estado de São Paulo. Para Saviani, as primeiras experiências na docência iniciaram em 1966, quando ele ainda era aluno da graduação e foi indicado como monitor pelo professor Joel Martins, na oportunidade em que este assumiu interinamente a cadeira de Filosofia da Educação no curso de Pedagogia. Na monitoria Saviani ficou responsável pelas aulas de Filosofia da Educação para o terceiro ano de Pedagogia. Antes de iniciar o último ano do curso, Joel Martins propôs a ele um plano de estudos em Filosofia da Educação. Saviani não só efetivou a incumbência que lhe fora delegada como se matriculou como ouvinte na disciplina "Questões Especiais de Educação", ofertada ao quarto ano de Pedagogia e elaborou um plano de curso para a disciplina Filosofia da Educação. Plano esse que foi desenvolvido na monitoria e que, de acordo com Saviani (2002, p. 282), “no ano seguinte foi encaminhado ao MEC como a programação da disciplina Filosofia da Educação para efeitos do reconhecimento do Curso de Pedagogia da PUC-SP”. No que concerne ao Severino, o acesso ao nível superior de ensino foi efetivado fora do Brasil. Durante o colegial realizado no Seminário Arquidiocesano de Campinas, foi propiciada a Severino a oportunidade de cursar Filosofia na Universidade de Louvain na Bélgica, para onde ele se mudou em 1960. Fora do Brasil, a graduação em Filosofia realizada no Instituto Superior de Filosofia, no período de 1960 a 1963, tinha, segundo o próprio Severino (2011) suas raízes fincadas na filosofia de São Tomás de Aquino, mas abria-se a um diálogo com a ciência moderna, o que lhe propiciou a realização de pelo menos duas disciplinas das ciências naturais e duas nas ciências humanas. Conforme o autor, estas últimas proporcionaram 81 significativas contribuições para a compreensão do processo social e histórico. Além disso, o curso oportunizou o contato com diversas tendências contemporâneas da filosofia. Essa abertura do curso, a consciência das questões políticas e a situação histórica do Brasil, que Severino acompanhava mesmo a distância, foram fundamentais para o desejo de engajamento político. Foi nesse contexto que, no segundo ano de faculdade, conheceu a obra de Emmanuel Mounieur. Com o término do curso de Filosofia em 1964, Severino deslocou-se para Roma, a fim de continuar seu projeto eclesiástico com o curso de Teologia, na Universidade Gregoriana. Mas, um ano de estudo foi suficiente para que ele compreendesse que essa não era propriamente a carreira que queria seguir, então decidiu abandonar esse projeto e voltar ao Brasil, precisamente à cidade de São Paulo. Tanto a graduação como o doutorado dos dois orientadores, ocorram entre os anos de 1960 e início da década 1970. Período de grandes conflitos políticos na história da educação brasileira que consequentemente contribuiu para o desenvolvimento de um forte sentimento de revolta e o surgimento da necessidade de resistência, especialmente entre os cidadãos mais jovens da época. A difícil situação política instalada com a ditadura militar, a violência e opressão que se expressava nessa forma de gestão, contribuiu para o estabelecimento da necessidade de resistência e a dedicação aos estudos de Marx, cujo materialismo acenava com a perspectiva de transformação da realidade. Em função disso, o marxismo tendeu a ser assumido como a ideologia das classes e grupos oprimidos pelo governo, o que, se por um lado contribuiu para o estudo das obras de Marx, por outro lado, a tendência ideologizante, serviu para instalar limitações do ponto de vista epistemológico. Outro aspecto que liga os dois autores foi a conjuntura histórica brasileira, marcada pelos conflitos e dificuldades vivenciadas em decorrência de um regime governamental ditatorial, fortemente repressivo e desenvolvimentista. Por essa política, o governo necessitava colocar a educação como fator de desenvolvimento. O ano de 1968 constituiu um momento em que isso começou a ser demonstrado, particularmente no que concerne ao ensino superior. Nesse sentido, nota-se a criação de leis aptas a reformá-lo. Nesse ano, por exemplo, as medidas legais podem ser observadas. Primeiro o governo baixou o Decreto 63.341, de 1º de outubro de 1968, a fim de garantir a política de expansão do Ensino Superior para o que esse documento estabeleceu os critérios. Depois a criação da Lei 5.537 de 1968 que criou o Fundo Nacional de Desenvolvimento 82 da Educação, com a finalidade de captar recursos para garantir a educação, com o financiamento de projetos de ensino e de pesquisa, e a Lei 5.540, de 28 de novembro de 1968, que estabeleceu as bases para a organização e funcionamento do ensino superior. Por esta lei, o ensino médio deve articular-se ao ensino superior. Nesse mesmo ano, o governo baixou o Decreto Lei 405 de 31 de dezembro que determinou o aumento da matrícula no Ensino Superior. Mas, por outro lado intituiu o Decreto nº 477 de 11 de fevereiro de 1969, que se aplica “exclusivamente ao corpo docente, discente e administrativo das escolas e coíbe toda e qualquer manifestação de caráter político ou de protesto no âmbito das universidades.” (ROMANELLI, 1996, p. 226). Algumas conclusões a que se pode chegar sobre essa fase da vida dos dois autores, é que escolhas e decisões que se toma mediante as condições de existência influenciam tanto novas ações como essa, quanto o ethos que vai se constituindo na história particular de cada indivíduo e da sociedade. As semelhanças nas trajetórias dos dois intelectuais não consistem mera coincidência, mas resultam, até certo ponto, de decisões praticadas por eles, por seus familiares e mesmo por outras pessoas com quem conviveram àquela época, como resposta às necessidades que se impunham aos processos históricos de suas existências. As experiências de Severino da vida na fazenda, mas como filho de empregado, as distâncias que tinha que percorrer para estudar, a vida no internato e depois no Seminário. A viagem e temporada na Europa, especialmente o fato de ter cursado a graduação e o mestrado na Bélgica, a necessidade de adaptação a uma cultura e sociedade bem diferentes daquelas em que ele havia vivido até então e, sobretudo, os estudos a partir do personalismo de Mounier. De volta ao Brasil o contato com o professor Joel Martins20. Tudo isso contribuiu para a formação de um intelectual preocupado com a sociedade, especialmente em seus aspectos éticos, políticos e epistemológicos, estudados sob a fundamentação filosófica firmada em sua formação. Já as experiências de Saviani com a mudança de sua família para a periferia de São Paulo, ainda quando ele era criança, certamente oportunizou a ele experiências bem diferentes das vivenciadas por Severino. A saída de Saviani do Seminário e o seu retorno a São Paulo, a graduação cursada na PUC. O contato com Joel Martins, ainda na graduação e o incentivo deste professor em relação aos estudos e à docência em Filosofia da Educação. A convivência com seu pai e seus irmãos e as experiências desses sujeitos 20 Criador da pós-graduação na PUC-SP, ainda segundo Severino (2011) 83 como operário de fábricas e indústrias, sua própria participação na militância estudantil, certamente fortalecida pelas condições existenciais de sua família. Todas essas experiências influenciaram a formação desse intelectual. 3.2 TRILHANDO CAMINHOS DA PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA E DA CONSOLIDAÇÃO NA DOCÊNCIA Os caminhos da pós-graduação começaram a ser trilhados por Severino ainda na Bélgica, quando ele fazia o curso de Filosofia e conheceu a obra de Emmanuel Mounier. Embora o autor não mencione quais textos específicos serviram de suporte reflexivo há uma grande probabilidade que dentre eles se encontre o livro “O Personalismo”, em que Mounier dar a conhecer a lógica de seu pensamento por meio da apresentação de conceitos relevantes. Vários são os textos de Emmanuel Mounier, dentre eles destaco: “Liberdade com condições”, “Introdução ao existencialismo”, “O que é o existencialismo?” e seu último livro “O Personalismo”. Em “O Personalismo”, Mounier discutiu os conceitos de pessoa, como existência livre e criadora, de comunicação como necessidade existencial, de conversão íntima, essencial à tomada de força para a realização do exterior, de comunicação, entendida por Mounier como o principal meio de evolução do homem, sem a comunicação não há diálogo, sem o qual não há o entendimento, a liberdade com condições, imprescindível para que ocorra a comunicação e o afrontamento21, a eminente dignidade, como garantia da segurança e o compromisso político, social, econômico, moral, ético, educacional, enfim em todos os sentidos, isso porque além de ser uma exigência da sociedade, o homem é um ser capaz de ação e reflexão, portanto, existencialmente comprometido. A proposta filosófica e política de Mounieur foi considerada por Severino uma reflexão revolucionária, o que foi essencial e contribuiu para que ele se dedicasse à leitura da referida obra, à realização de um trabalho que foi, conforme Severino (2011, p.361), “apresentado ao instituto como uma das exigências da Deuxieme Licence em Philosophie, etapa semelhante e equivalente ao nosso mestrado atual”. Ao retornar ao Brasil, Severino continuou os estudos sobre Mounier, de modo que no processo de formação no doutorado desenvolveu a tese “Pessoa e existência: os 21 Para Mounier existir significa dizer sim, aderir, mas também dizer não, protestar. 84 princípios ontológicos do personalismo de Emmanuel Mounier”, que foi apresentada no ano de 1972. Esses estudos, eivados por inquietações antropológicas lhe valeram o aprofundamento do exercício do filosofar, apesar das carências em termos de pós- graduação. O processo de orientação era precário, não havendo ainda um contexto adequado de pós-graduação, uma vez que em 1970/71 apenas se iniciava a experiência da pós-graduação na PUC/SP, tendo podido aproveitar dela seguindo alguns cursos avançados, avulsamente oferecidos, sob a fecunda e dinâmica liderança do professor Joel Martins, que virá a ser o fundador da pós-graduação sistematizada na PUC/SP. Ao professor Joel Martins devo o estímulo e a cobrança por essa etapa do doutorado (SEVERINO, 2011, p.362). A tese de Livre-docência foi apresentada à Universidade de São Paulo, no ano de 2000, sob o título “O sujeito, a história e a educação: tarefas e identidades da Filosofia da Educação”, publicada em livro no ano de 2001 sob o título “Educação, sujeito e história.” Sob o olhar do próprio Severino se tivesse que indicar uma obra como a mais relevante de suas produções destacaria esse livro “porque ele foi o resultado de um balanço, de uma síntese sistematizante de toda minha contribuição teórica sobre a educação. Nasceu institucionalmente como tese de livre-docência, mas era um projeto que eu pretendia realizar e foi um trabalho que fiz com essa intenção” (SEVERINO, 2011, p. 369). Severino iniciou a profissão de professor em 1965-1966, na PUC/SP, nos cursos de graduação em Filosofia e em Psicologia. No primeiro deles com as disciplinas História da Filosofia Contemporânea; Metodologia do Trabalho Científico (1975 – 1977); História da Filosofia Moderna (1971 – 1972); História da Filosofia Contemporânea e História da Filosofia Moderna; Teoria do Conhecimento (1966 – 1973) e no segundo com as disciplinas Introdução à Filosofia e Antropologia Filosófica (1966 - 1986). A fim de ampliar os espaços profissionais, passou a exercer a profissão também no curso de Pedagogia com as disciplinas Filosofia da Educação I EDF-115; Filosofia da Educação III EDF-401; Filosofia da Educação III EDF-209; Filosofia da Educação IV EDF-402; Filosofia da Educação V EDF-312; Filosofia da Educação VI EDF-622; Filosofia da Educação VII EDF-535 e Introdução aos Estudos da Educação EDF-283 (1986 – 2009); Teoria da Educação (1975 – 1975) e Filosofia da Educação (1971 – 1972). 85 No início, a experiência de Severino como professor de Filosofia da Educação no curso de Pedagogia ocorreu em algumas faculdades “isoladas” como as Faculdades de Moema, de Itapetinga e de Tatui, mas depois na própria PUC/SP, o que o levou a transferir-se para o Centro de Educação. Todavia, manteve o seu interesse pela Filosofia e não abandonou de imediato as suas atividades no curso de Filosofia. Contudo, muitos foram os compromissos na área da educação que o fizeram, aos poucos, deixar de exercer a docência no bacharelado de Filosofia. A experiência profissional na área da educação, no curso de Pedagogia, teve para Severino (2001, p. 364) o sentido do desafio de “explicitar a problemática educacional brasileira com todas as suas condições sociais, e de sensibilizar os futuros educadores para ela”. Decisão que, em parte explica a opção desse autor que em seu exercício da docência no curso de Pedagogia “buscou trabalhar os aspectos éticos e políticos da educação, com vistas a explicitar os compromissos do processo educacional tanto com a construção de um sujeito pessoal ético responsável como de uma sociedade democrática, espaço de cidadania.” (Idem, p. 365). Além da experiência docente no nível da graduação, Severino iniciou o exercício do magistério na pós-graduação ainda na década de 1970, quando após o término do doutorado, em 1972, a convite de Joel Martins passou a exercer a docência no curso de pós-graduação stricto sensu em Filosofia da Educação, na PUC/SP, espaço esse que se transformou no centro do seu trabalho muito embora tenha atuado também na graduação de várias universidades, como na UNIMEP em Piracicaba (1973-1974) e na PUCCAMP em Campinas (a partir de 1978). Assumiu cargos na administração, como diretor da Faculdade de Educação, Coordenador de Curso em Programa de pós-graduação em Filosofia, Chefe de Departamento de Filosofia, Coordenador de Curso de Mestrado em Educação e Reitor e exerceu várias funções. As trilhas profissionais de Saviani também foram abertas no nível de graduação e de pós-graduação, mas diferentemente de Severino, esse autor exerceu a docência também em nível médio. As experiências docentes na monitoria foram como que um estágio no ensino superior, pois concluída a graduação, em 1967, Saviani foi admitido formalmente como professor universitário para o curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde centrava as suas atividades de ensino e pesquisa na Filosofia da 86 Educação. Nesse mesmo ano também passou a exercer a docência no Ensino Médio e no Curso Normal. Em 1970 foi aprovado em concurso público e assumiu a disciplina Filosofia no Colégio e Escola Normal Estadual "Plínio Barreto", na cidade de São Paulo. Sob o olhar de Saviani a sua carreira docente foi assumida com bastante vigor: Iniciei a carreira de professor com muito entusiasmo e dedicação. Especialmente no nível universitário, eu considerava que o professor não poderia ser apenas um repetidor, um transmissor de conhecimentos já compendiados; ele deveria ser também e, sobretudo, um pesquisador, um criador, alguém que se posicionasse ativamente em relação à sua área, tendo condições de contribuir para o seu desenvolvimento (SAVIANI, 2002, p. 283). As palavras de Saviani na citação acima não constituem um discurso estéril, apenas fundado na boa vontade do iniciante, posto que ele se dedicou a produzir os textos a partir dos quais desenvolvia as suas aulas. Em novembro de 1971, concluiu o curso de doutorado com a defesa da tese intitulada "O conceito de sistema na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional", publicada em um livro no ano 1973 sob o título “Educação brasileira: estrutura e sistema”. Essa conclusão foi crucial para o profissional que Saviani projetava para si mesmo. Um professor que compreende que a docência exige pesquisa. Com a consolidação como pesquisador efetivada no curso de doutorado, Saviani iniciou-se na docência na Pós-Graduação logo no primeiro semestre do ano seguinte à conclusão de seu doutoramento, com a disciplina "Problemas da Educação", ministrada ao curso de mestrado no Instituto Educacional Piracicabano, que mais tarde viria a se tornar a Universidade Metodista de Piracicaba. A participação nesse programa de pós-graduação propiciou a ele um contato com professores da UNICAMP e da Universidade Federal de São Carlos que se tornaram alunos do programa. Esses contatos foram essenciais para que Saviani viesse, a partir do segundo semestre de 1975, assumir um contrato em tempo integral na UFSCAR. Nesta universidade participou da elaboração de uma proposta de Pós-Graduação em convênio com a Fundação Carlos Chagas e implantou e coordenou o Programa de Pós-Graduação. Retornou à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1978, quando passou a coordenar o mestrado e doutorado em Filosofia da Educação. 87 Em 1980, passou a trabalhar também na UNICAMP, no Departamento de Filosofia e História da Educação (DEFHE) da Faculdade de Educação dessa instituição. Sua ligação a esse departamento foi essencial para que centrasse suas pesquisas na História da Educação e para a sua decisão de submeter-se ao concurso de livre-docência nessa área, ainda que não necessitasse fazê-lo. Assim, defendeu a tese de livre-docência, intitulada "O Congresso Nacional e a educação brasileira: significado político da ação do Congresso Nacional no processo de elaboração das leis 4.024/61, 5.540/68 e 5.692/71". Essa tese originou o livro “Política e educação no Brasil: o papel do Congresso Nacional na legislação do ensino”, publicado em 1987. O período de 1994 a 1995 Saviani dedicou ao Pós-Doutorado em Educação na Università di Bologna. No início de 1989, Saviani desligou-se da PUC-SP e assumiu vínculo exclusivo com a UNICAMP, passando então a residir em Campinas. Sua vinculação com a UNICAMP é, segundo ele próprio, carregada de simbologia “em termos intelectuais, profissionais e acadêmicos, porque meu vínculo com a UNICAMP expressa total coerência com a luta em defesa da escola pública que marcou e vem marcando toda a minha trajetória educativa” (SAVIANI, 202, p. 286). Muito embora considere a sua atuação como líder do movimento educacional na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e reconheça que essa universidade não dificultava essa atuação. Sobre as disciplinas lecionadas é possível citar Filosofia, História, História da Arte, História e Filosofia da Educação nos cursos colegial e normal. Na pós-graduação o currículo lattes desse pensador registra três diferentes programas em que realiza suas experiência profissionais: Educação; Educação e Currículo; Educação História e Filosofia e Psicologia. Na pós-graduação em Educação as disciplinas ministradas foram Filosofia da Educação XXXIX - EDF 841; Filosofia da Educação XXXIV - EDF 5816 e Metodologia do Trabalho Científico e Filosofia da Educação. E na pós-graduação em Educação e Currículo as disciplinas Metodologia do Trabalho Científico e Filosofia da Educação. Na Pós-Graduação em Educação História e Filosofia exerceu a docência nas disciplinas Metodologia do Trabalho Científico, Filosofia da Educação e Tópicos Especiais de Filosofia da Educação. Enquanto que na pós-graduação em Psicologia as disciplinas sob sua responsabilidade docente foram Teoria do Conhecimento e Métodos e Técnicas de Pesquisa. 88 Além da docência, Saviani assumiu cargos na administração como diretor da Faculdade de Educação (1992 - 1996) e como Coordenador de Programa. As vidas desses dois proeminentes autores trazem muitas outras semelhanças além daquelas a respeito da formação escolar nos níveis que antecedem o ensino superior. No início de suas carreiras foram contratados pela mesma universidade para trabalhar no ensino superior e na pós-graduação. Realizaram o seu curso de doutorado no mesmo programa em uma mesma universidade, em um período em que a pós-graduação se encontrava em um estado precário, com um programa embrionário em fase de sistematização. Para os dois autores o contato com Joel Martins foi fundamental. Se para Severino foi significativo o estímulo ao doutorado, na situação de Saviani esse contato garantiu-lhe contribuir com a manutenção da sobrevivência na vida familiar, o incentivo para os estudos e o exercício da docência em Filosofia da Educação. As experiências docentes na pós-graduação uniram os dois educadores, pois seguramente a partir de 1973 ambos trabalharam na Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e na Universidade Metodista de Piracicaba, a UNIMEP. À época, éramos quatro os professores da PUCSP que havíamos assumido o mestrado em Piracicaba: Newton Aquiles Von Zuben, Geraldo Tonaco, Antônio Joaquim Severino e eu. Em função dos nossos horários daquele ano na PUC-SP, os professores Aquiles Von Zuben e Geraldo Tonaco iam a Piracicaba às segundas e terças-feiras. O Prof. Severino e eu íamos às sextas e sábados (SAVIANI, 2002, p. 283). A coincidência desses horários consiste em mais um elemento que relaciona os dois professores e pode ter constituído uma oportunidade de encontros e conversas que, mesmo de maneira informal, serviram de espaço para troca de experiências pedagógicas e discussões de alguns aspectos do processo de suas respectivas práticas profissionais, envolvendo inclusive os resultados de estudos por eles realizados. A participação em grupos de pesquisa é necessária ao pesquisador, para uma melhor organização do trabalho investigativo, consiste uma oportunidade de frequentes discussões e debates sobre a temática estudada e as concepções que alimentam esse estudo, tornando-se, assim, um ambiente mais seguro em relação à produção do conhecimento. 89 A existência dos grupos de pesquisa é essencial ao fortalecimento do conhecimento científico. As discussões nesses grupos sobre o rigor epistemológico e metodológico contribuem para a formação dos pesquisadores e melhora a qualidade da produção científica. De modo que os professores Saviani e Severino não ignoram a necessidade dessa participação em suas vidas profissionais. QUADRO 3 – Vínculo dos orientadores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani com os Grupos de Pesquisa Orientador Grupos de pesquisa a que se vincula Ano de Criação Linhas de Pesquisa em que atua Antônio Joaquim Severino GRUPEFE - Grupo de Pesquisa em Filosofia da Educação. UNINOVE (líder) Aspectos Éticos, Políticos, Estéticos e Epistemológicos das Teorias e Práticas Escolares ou Educacionais. 2010 2012 Educação, Filosofia e Formação Humana (LIPEFFORH) Ensino de Filosofia Dermeval Saviani HISTEDBR - Grupo de Estudos e Pesquisas - UNICAMP (líder) 1986 História das Instituições Escolares no Brasil. História das Políticas Educacionais no Brasil. Historiografia e questões teórico-metodológicas da história da educação. Fonte. CNPq. CV: http://lattes.cnpq.br/ . Diretório de Grupos de Pesquisa. Acesso em: 20/01/2016 Atualmente Antônio Joaquim Severino toma parte em dois grupos de Pesquisa22 registrados no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. O GRUPEFE – Grupo de Pesquisa em Filosofia da Educação e o grupo denominado Aspectos Éticos, Políticos, Estéticos e Epistemológicos das Teorias e Práticas Escolares ou Educacionais. O primeiro grupo de pesquisa, instalado na Universidade Nove de Julho, é certificado pela instituição e foi formado em 2010. Neste grupo Severino é líder e desenvolve trabalhos na Linha de Pesquisa Educação, Filosofia e Formação Humana. Mas, considerando o tempo de trabalho do professor Severino como docente no ensino superior, as universidades em que trabalhou, há grande probabilidade do GRUPEFE não ser o primeiro grupo liderado por ele. 22 Endereço para acesso: dgp.cnpq.br/dgp/espelhorh/4415326563786783 90 As pesquisas desenvolvidas por esse grupo consideram a Filosofia de três diferentes modos e a partir deles realizam suas investigações: a) como processo de reflexão sobre a educação seus sentidos ou significados para a ação educativa, sem perder de vista o contexto da existência humana: b) como conteúdo necessário à formação dos educadores, com estudos que abordam questões relacionadas ao conhecimento à ação educativa; c) como componente fundamental na formação de crianças e jovens. Destaca- se a preocupação com a dimensão formativa da Filosofia. Estão em desenvolvimento sob a coordenação do professor Severino, dois projetos de pesquisa sobre a América Latina. Um sobre a Filosofia da Educação na América Latina, abrangendo a Argentina, o Chile, o Paraguai e o Uruguai, que se propõe a investigar o pensamento filosófico-educacional que se expressa nesses países, outro sobre a literatura latino-americana de Filosofia da Educação direcionado a identificar, nos países latino-americanos, autores e obras que abordam a temática da educação sob uma perspectiva filosófica. Atualmente estão associados ao grupo 13 (treze) pesquisadores. São eles: André Luiz Alves Lima, Antônio Joaquim Severino, Cleide Rita Silvério de Almeida, Dorothy Rocha, Marcos Antônio Lorieri, Maria Dulcinea da Silva Loureiro, Ofélia Maria Marcondes, Jorge Alves de Oliveira, Júnior Ribeiro da Silva, Roseli Trevisan Marques de Souza, Marisa Soares, Rita de Cassia de Campos Andery e Paolo Nosella. E, ainda, onze (11) alunos: Juliana Costa Brisola, Cleonice Moreira Lino, Lélio Favacho Braga, Carla Campos de Oliveira Almeida, Solange Maria de Oliveira Cruz, Karine Amado Garcia, Luciane da Silva Vicente, Alessandra Maria Martins Gaidargi, Dimitri Wuo Pereira, Ademar Bernardes Pereira Junior, Melissa Salaro Bresci. O segundo grupo, na Universidade Federal de São Carlos, formado em 2012, é certificado pela instituição e realiza estudos sobre as Teorias e Práticas Escolares ou Educacionais em seus aspectos éticos, políticos, estéticos e epistemológicos. Conta com a participação de dezoito (18) pesquisadores. São eles: Adriana Mattar Maamari, Alexandrina Paiva da Rocha, Antonio Joaquim Severino, Caetano Ernesto Plastino, Carla Campos Batista da Silva, Celso Fernando Favaretto, Claudia Simone Galassi, Desiderio Orlando Figueiredo Murcho, Débora Barbam Mendonça, Edsel Pamplona Diebe, Gisele Gomédi, João Antonio de Moraes, João Vitor Ruvira Batista da Silva, Juliana Carla Fleiria Pimenta, Maria Helena Pires Martins, Nathalia Muylaert Locks Guimarães, Ítalo Leandro da Silva e Rodrigo Pinheiro e 2 (dois) alunos, Diogenes Galdino Morais Silva e Marcos Rodrigo Domenici. 91 Participam da linha de pesquisa Ensino de Filosofia, na qual Severino realiza suas pesquisas, 17 (dezessete) pesquisadores, a exceção é Rodrigo Pinheiro e os 2 (dois) alunos acima mencionados. Dermeval Saviani participa como líder do Grupo de Estudos e Pesquisas HISTEDBR – História, Sociedade e Educação no Brasil, na Universidade Estadual de Campinas. Registrado no Diretório de Grupos de Pesquisa e certificado pela instituição, esse grupo foi formado em 1986. Com o entendimento de que a educação é social, geográfica e historicamente determinada, o HISTEDBR23 realiza pesquisas, articulando educação e sociedade, a partir da perspectiva da História, dos métodos e teorias próprios dessa área do conhecimento. Neste grupo Saviani desenvolve trabalhos nas seguintes linhas de pesquisa: Historiografia e questões teórico-metodológicas da história da educação; História das Instituições Escolares no Brasil; e História das Políticas Educacionais no Brasil. O HISTEDBR agrega atualmente 21 (vinte e um) alunos. São eles: Elisabete Gonçalves de Souza, Karla Nazareth Corrêa de Almeida, Michele Cristine da Cruz Costa, Tania Conceição Iglesias, Leonardo Pereira da Costa, Matheus Bernardo Silva, Silvana, Lazzarotto Schmitt, Ricardo Pereira, Samantha Lodi-Corrêa, Desiré Luciane Dominschek Lima, Marta Loula Dourado Viana, Jorge Cleber Teixeira Neves, Leandro Sartori Gonçalves,Tiago Roberto Tenroller Manggini, Marcos Roberto Lima, Sandra Maria Barros Alves Melo, Elaine Cristina da Silva Melo Gonçalves, Magali Aparecida Pereira, Débora Villetti Zuck, Vera Lucia Martiniak e Sandra Maria Barros Alves Melo. Esse grupo conta com a participação de 15 (quinze) pesquisadores. São eles: Azilde Lina Andreotti, Dermeval Saviani, Gilberta Sampaio de Martino Jannuzzi, Jeferson Anibal Gonzalez, Jose Claudinei Lombardi, Jose Luis Sanfelice, Lalo Watanabe Minto, Mara Regina Martins Jacomeli, Maria Eugênia de Lima e Montes Castanho, Olinda Maria Noronha, Silvana Fernandes Lopes, Sérgio Eduardo Montes Castanho, Luciana Cristina Salvatti Coutinho, Fabiana de Cássia Rodrigues e Régis Henrique dos Reis Silva. Sem mencionar os pesquisadores que compõem os diversos grupos de trabalhos em seções estaduais do HISTEDBR. Importa notar que os três grupos de pesquisa aqui referidos têm em comum a predominância da área de Ciências Humanas: Educação. 23 Endereço para acesso: dgp.cnpq.br/dgp/espelhorh/2205251281123354 92 Mesmo breve essa observação sobre os grupos de pesquisa, suas respectivas linhas e repercussões e sobre a participação dos professores Severino e Saviani nesses grupos, é suficiente para chegar a algumas conclusões. Percebi que houve um privilégio do teor histórico nas pesquisas do professor Saviani indicado pela denominação do grupo “História, Sociedade e Educação no Brasil” e das linhas “História das Instituições Escolares no Brasil”, “História das Políticas Educacionais no Brasil,” “Historiografia e questões teórico-metodológicas da história da educação”. De modo semelhante, pode-se concluir que nas pesquisas do professor Severino a ênfase recaiu sobre o teor filosófico, apontado pelo nome do grupo “Grupo de Pesquisa em Filosofia da Educação” e das linhas “Educação, Filosofia e Formação Humana” e “Ensino de Filosofia”. Embora esses dois professores tenham sua graduação em Filosofia, e a Filosofia e a História estejam ligadas e a filosofia que embasa a análise dos dois professores prime por essa ligação, não é de se estranhar essa diferença entre os dois, uma vez que o exercício da docência de um é realizado na área disciplinar da História da Educação enquanto o outro na disciplina Filosofia da Educação. Assim, as preferências temáticas nas pesquisas dos dois intelectuais aqui estudados não são graciosas, mas dizem respeito às suas inquietações diante da realidade, dos caminhos trilhados na docência, que ligam necessariamente ensino e pesquisa. Da mesma maneira, as experiências existenciais de cada um deles contribuem para a elaboração dos problemas por eles estudados. 3.3 TOTALIDADE DE ORIENTAÇÕES EM PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO ESTRICTO SENSU. A contribuição dos professores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani para a educação se faz por meio de diversas e diferentes ações dentre as quais se encontram as orientações de dissertações de mestrado e de teses de doutorado, uma atividade que além de fortalecer a docência, também contribui significativamente para consolidação do profissional como pesquisador. Buscar a totalidade dessas permite localizar as instituições de ensino superior que receberam essa contribuição específica e observar o número de mestres e doutores formados sob a orientação desses dois professores. 93 Sobre as dissertações, os gráficos abaixo dão uma idéia das instituições em que os dois professores deram a sua contribuição. GRÁFICO 7 – Distribuição das Dissertações por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Antônio Joaquim Severino no período de 1977 a 2016 Fonte: CNPq. CV: http://lattes.cnpq.br/4415326563786783. As informações contidas no Lattes de Antônio Joaquim Severino dão conta que ele orientou setenta (70) dissertações de mestrado em 8 (oito) diferentes universidades, em programas de pós-graduação em Educação; em Filosofia; em Filosofia da Educação, em Educação História e Filosofia; em Educação: História, Política, Sociedade; em Educação: Currículo; e em Psicologia, totalizando 7 (sete) diferentes programas. Na distribuição por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero observa-se que o maior percentual de dissertações orientadas por Severino concentra-se na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo com 35,38 % das dissertações desenvolvidas por mulheres e 10,76% elaboradas por homens, seguida da Universidade de São Paulo em que as produções femininas consistem 12,30% enquanto que as masculinas somam 13,84%. Ainda nesse modo de distribuição foi possível identificar que no total de dissertações orientadas e defendidas no período de 36 anos houve um número maior de mulheres, em relação ao de homens. Apenas 25 homens foram orientados, ou seja, o equivalente a 35,39 %, enquanto que 44 mulheres, foram orientados, perfazendo um total 64,61%. 13,84% 1,53% 0% 1,53% 1,53% 10,76% 0% 6,15% 12,30% 4,61% 6,15% 0% 0% 35,38% 3,07% 3,07% Homens Mulheres 94 Na distribuição por relações de gênero, destaca-se a exclusividade das mulheres nos anos de 1981, 1984, 1989, 1991, 1996, 2005, 2010 e 2013, enquanto que a exclusividade masculina encontra-se nos anos de 2007 e 2008. Ao investigar o Lattes de Severino notou-se que 1978 foi o ano em que esse professor orientou o maior número de dissertações, com um total 6 (seis) produções, e nos anos de 1982, 1983, 1988, 1997, com 4 (quatro) dissertações cada um. Percebe-se, ainda, que as pesquisas no período de 2003 a 2013 referem-se à Filosofia da Educação na América Latina, o que constitui uma abertura a diferentes interesses de investigação, o que pode consistir em uma possibilidade de explicação para a diversidade de estudos indicada nos títulos das dissertações de seus orientandos. O caráter diverso dessas produções dificultou uma melhor aglutinação em eixos que abrigassem todos os temas, apesar disso, pode-se perceber o interesse maior dos autores dessas produções para com a formação e o ensino. Os trabalhos direcionados à formação incluem desde a experiência formativa à formação política, ética, cultural e filosófica. Entre os trabalhos que dirigiram seu interesse investigativo para o ensino encontram-se os relacionados aos três níveis de ensino. Houve os dedicados ao ensino da filosofia, na função política do ensino e até no ensino religioso. As Produções relativas à Filosofia Dialética também apresentam uma diversidade, com temáticas relacionadas à Teoria Crítica, notadamente em Adorno, a metodologia dialética de construção de conhecimento em sala de aula, ao engajamento político no personalismo de Emmanuel Mounier e os estudos sobre Enrique Dussel, que também indicam uma curiosidade epistemológica relativa à filosofia da libertação. 95 GRÁFICO 8 – Distribuição das Dissertações por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Dermeval Saviani no período de 1977 a 2000.24 Fonte: CNPq. CV: http://lattes.cnpq.br/2205251281123354. O Lattes de Dermaval Saviani indica 36 (trinta e seis) dissertações de mestrado orientadas por esse professor em 4 (quatro) diferentes universidades. São 2 (dois) os Programas de Pós-Graduação em que Saviani contribui nessas universidades, o de Educação e o de Educação: História, Política, Sociedade. Nota-se que as 3 (três) universidades que oferecem programas de pós-graduação em Educação, são as Universidade Estadual de Campinas, Universidade Estadual do Centro-Oeste e Universidade Metodista de Piracicaba. A Pontifícia Universidade Católica de São Paulo oferece o programa em Educação: História, Política, Sociedade. A distribuição por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero indica que o maior percentual de dissertações orientadas por Saviani aglutina-se na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, semelhante a Severino. Nesta universidade, o percentual é de 55,55 % de dissertações desenvolvidas por mulheres e 11,11% elaboradas por homens, seguida da Universidade Estadual de Campinas onde 19,44 é trabalho intelectual feminino e 2,77% correspondem à produção masculina. Na alocação das dissertações por ano, observei que o ano de 1979, foi o período histórico em que Saviani orientou o maior número de dissertações, constituindo 4 produções, e os anos de 1977, 1982, 1985, com 3 dissertações cada um, ficando o restante distribuído nos outros anos. 24 Considerando-se a última atualização em 26/05/2015 do lattes do professor Saviani, não se nota alteração no quantitativo das defesas de dissertação orientadas por ele. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Universidade Estadual de Campinas Universidade Estadual do Centro-Oeste Universidade Metodista de Piracicaba. 11,11% 2,77% 5,55% 0% 55,55% 19,44% 0% 5,55% Homens 96 Ainda nesse modo de distribuição identifiquei que no total de dissertações orientadas e defendidas no período de 23 anos o número de mulheres, foi maior que o de homens. Apenas 7 (sete) homens, ou seja, 19,44 %, foram desenvolvidas por eles, enquanto que as demais 29, isto é, 80,56% representam a produção das mulheres. Percebi ainda que a exclusividade nos anos de 1977, 1979, 1985, 1987, 1988 e 2000 foi das mulheres, nos demais anos do período são os homens os que gozam de exclusividade, uma vez que curiosamente nos anos em que Saviani teve orientandos homens, não orientou mulheres. No que diz respeito às teses orientadas pelos dois professores, os Currículos Lattes25 dos dois pesquisadores são bastante elucidativos. GRÁFICO 09 – Distribuição das Teses por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Antônio Joaquim no período de 1980 a 2016 Fonte: CNPq. CV: http://lattes.cnpq.br/4415326563786783 Observando os currículos notei que no período de 1980 a 2016 Antônio Joaquim Severino orientou o total de 28 teses já defendidas por seus autores e autoras. Essa produção está distribuída entre três Instituições de Ensino Superior. São elas: a Universidade Nove de Julho – UNINOVE, com duas (2) teses defendidas e quatro (4) em processo de orientação, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC- 25 Essa totalidade refere-se às teses defendidas até 21/06/2016. Em relação a essa produção, até dezembro de 2016 não há alteração no currículo de Saviani que foi atualizado em 26/05/2015. 0… 0% 8% 16% 16% 8% 8% 56% 0 12% 4% 16% 16% 8% 0% 44% % de Homens % de Mulheres 97 SP com seis (6) e a Universidade de São Paulo – USP com dezessete (20) defendidas. Esta universidade guarda o maior número das teses orientadas pelo professor Severino. Já se for considerado apenas o lapso temporal (2000-2016) designado para este estudo, essas produções podem ser localizadas em duas universidades: duas (2) na Universidade Nove de Julho e dez (10) na Universidade de São Paulo. Na distribuição por gênero e ano de defesa das teses orientadas por Severino notei uma oscilação entre os gêneros em que há uma proeminência dos homens em relação às mulheres. Os homens lideram com exclusividade no período de 1980 a 1988, com uma defesa por ano, equivalente a 4% em relação ao total e no ano de 1993, com um percentual 8% equivalentes a duas (2) defesas. De forma idêntica, nos anos de 1996 e de 2008 são as mulheres que lideram com exclusividade, com o mesmo percentual dos homens, isto é, de 8%, equivalentes a duas defesas para cada um dos anos. No total geral não há diferença no quantitativo de homens e mulheres. Os indicadores demonstram um equilíbrio entre os dois gêneros, no que concerne à formação em nível de doutorado, pelo menos sob a orientação do professor Severino cujas orientações de tese em programas de pós-graduação contribuiu com a formação de 14 doutores e 14 doutoras. GRÁFICO 10 – Distribuição das Teses por Instituição de Ensino Superior e relação de gênero, orientadas por Dermeval Saviani no período de 1978 a 2016. Fonte: CNPq. CV: http://lattes.cnpq.br/2205251281123354. 0… 2% 19% 5% 19% 10% 9% 64% 0% 3% 14% 5% 10% 3% 0% 36% % de Homens % de Mulheres 98 Ainda perquirindo o lattes, mas dessa vez o do professor Dermeval Saviani, notei que na distribuição por Universidades, as teses por ele orientadas e defendidas por seus respectivos autores e autoras, no período de 1978 a 2015, estão localizadas em duas universidades. São elas: a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, com vinte e seis (26) teses e a Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP com trinta (30) teses defendidas. No caso das teses orientadas pelo professor Saviani, na distribuição por gênero observei uma oscilação favorável às mulheres, que lideram com exclusividade nos anos de 1978, 1986, 1987, 1988, 1994, 1995, 1999, 2003, 2008, 2010 e 2012, considerando o período representado por esses anos tem-se um percentual de 29,26% em relação ao total de defesas. Atentando para a relação dos percentuais com o total de defesas pude observar que os homens gozam desse tipo de liderança nos anos de 1979, 1980, 2002 e 2013 cuja somatória, em termos percentuais atingiu de 8,60%. Já no que diz respeito às mulheres, o maior número de teses defendidas totalizando quatro (4) teses ao ano, equivalentes a 6,86% em relação ao total de defesas. Para os homens esse número é de três (3) teses no ano de 1983, o que equivale a 5,17%. No total geral a diferença é bastante significativa, de 18% em favor das mulheres, o equivalente a trinta e oito (38) indivíduos, ou seja, trinta e oito (38) teses. Isso significa que, com suas orientações de tese em programas de pós-graduação, o professor Saviani contribuiu com a formação de vinte (20) doutores e trinta e oito (38) doutoras. É expressivo o número de doutores e doutoras formados sob a orientação dos dois professores e o período em que isso ocorreu. Além disso, e considerando que as teses de interesse deste estudo fazem parte desse total, é possível notar quando e onde se deu cada produção. Essas informações podem auxiliar futuros estudos, inclusive para esta tese, no que concerne à observação de que temas foram privilegiados e em que períodos. Também podem constituir um indicativo dos desafios vivenciados pelos autores dessas produções em parceria com seus orientandos, uma vez que muitas e diversas são as dificuldades possíveis nesse processo e algumas delas podem estar ligadas ao contexto histórico de cada período. Em relação ao local de origem das teses analisadas, a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da Universidade de São Paulo, registra a produção efetuada a partir de 2005 e disponibiliza apenas quatro (4) das dezessete (17) teses orientadas pelo 99 professor Severino. Mas a situação mais difícil diz respeito a esse tipo de estudo cujas defesas foram realizadas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, não foi encontrada, na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, nenhuma das teses orientadas pelo professor Severino, defendidas na PUC-SP, no período de 1980 a 1998, interstício em que ele exerceu a docência em programas de pós-graduação desta universidade. No que diz respeito ao local de origem das teses orientadas pelo professor Dermeval Saviani, a busca na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UNICAMP foi bastante proveitosa. No entanto, no que concerne às produções originárias da PUC- SP, a situação é semelhante à das teses orientadas por Severino, não se consegue encontrar nenhuma tese26 disponível para acesso público sob a forma de documento digital. 3.4 AS PRERROGATIVAS TEMÁTICAS E OS MEIOS DE CIRCULAÇÃO DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA Se a história é processo marcado pelas relações realizadas continuamente em meio a tensões, conflitos e contradições que se efetivam na vivência dos homens, mas ao mesmo tempo, também é produto resultante dessas relações, então, o homem e tudo que ele cria além de histórico é social. O conhecimento é duplamente social, uma vez que o sujeito cognoscente, em sua particularidade epistêmica, parte e se nutre de um conhecimento já elaborado e organizado coletivamente, disponível na sociedade. É social também, na proporção em que não pode ficar enclausurado nessa singularidade elaboradora. A produção intelectual implica compartilhamento, diálogo e socialização, portanto, circulação de pensamentos, ideias e resultados de investigações do sujeito autor. Nesse processo, os meios de circulação são essenciais. Sendo assim, a produção teórica dos professores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani circula principalmente por meio de livros, periódicos nacionais e anais de eventos. 26 As informações sobre a presença/ausência das teses nas Bibliotecas Digitais de Teses e Dissertações da PUC-SP e da USP, contidas neste texto, dizem respeito ao período de coleta dessas informações específicas, que dei por encerrada em março de 2015, depois de muitas investidas com a perspectiva de atualização. 100 As informações obtidas no lattes 27 dos dois autores trazem indícios do quantitativo de sua produtividade teórica em cada ano dos 17 últimos anos que coincidem com o lapso temporal das teses orientadas por eles em programas de pós-graduação em educação e por mim analisadas nas próximas seções desta tese. QUADRO 4 – Produção Intelectual de Antônio Joaquim Severino no Período de 2000 a 2016 Período Livros Capítulos de Livros Artigos em Periódicos Trabalhos em Anais de Eventos Total Parcial 2000 1 3 2 2 8 2001 1 2 3 0 6 2002 2 2 2 1 7 2003 0 2 0 0 2 2004 0 2 5 1 8 2005 0 2 2 0 4 2006 0 2 3 0 5 2007 2 4 0 0 6 2008 1 0 1 0 2 2009 0 6 5 1 2 2010 0 5 5 1 11 2011 1 8 1 2 12 2012 1 1 3 0 5 2013 0 6 2 1 9 2014 1 9 4 1 15 2015 0 5 4 1 10 2016 1 2 2 1 6 Total 11 61 44 12 128 Fonte: Currículo Lattes de Antonio Joaquim Severino. Elaborada pela autora Na produção teórica de Severino referente à publicação de livros detacam-se os anos de 2002 e 2007 com dois livros cada. Dos 17 anos considerados, o autor não publicou livros em 7 deles, concidentemente o número de anos em que o autor não publicou em Anais de evento também é 7. No entanto, os números no quadro acima demonstram que a produção que mais se destaca em termos quantitativos é a de capítulo de livros (61) seguida da produção de (44) artigos socializados em periódicos que equivalem a 1/4 do total dos trabalhos 27 As informações traduzidas em termos numéricos nos Quadros 1 e 2 foram obtidas nos currículos lattes de Antonio Joaquim Severino, atualizado em 19/12/2016, no endereço http://lattes.cnpq.br/4415326563786783 e de Dermeval Saviani, cuja última atualização é de 26/05/2015. O endereço para acessar esse documento é http://lattes.cnpq.br/2205251281123354. 101 publicados. Do total de 128 produções mais da metade (72) é formada por livros e capítulo de livros. Os anos de 2003 e 2008 foram os que ele menos publicou, 2 capítulos de livro e 2 trabalhos em anais de eventos, consecutivamente. Os capítulos de livros e os artigos em periódicos são os tipos de produção que mantiveram sequência mais equilibrada. Não publicou capítulo de livro apenas no ano de 2008 e artigos em periódicos somente nos anos de 2003 e 2007. O quantitativo dos totais parciais demonstram que a partir de 2009 há um crescimento na produção desse autor, pois somente nos anos de 2012 e 2016 ela não supera a dos nove anos anteriores. QUADRO 5 – Produção Intelectual de Dermeval Saviani no Período de 2000 a 2016 Período Livros Capítulos de Livros Artigos em Periódicos Trabalhos em Anais de Eventos Total Parcial 2000 1 1 2 8 2 2001 0 2 7 3 2 2002 0 7 1 3 1 2003 1 3 4 5 3 2004 3 4 4 3 4 2005 1 7 5 2 5 2006 3 2 2 3 0 2007 2 4 9 1 6 2008 8 1 6 0 5 2009 1 2 0 0 3 2010 3 2 8 0 3 2011 2 5 6 0 3 2012 3 1 2 1 7 2013 3 4 4 0 1 2014 2 5 1 0 8 2015 0 0 1 0 1 2016 0 0 0 0 0 Total 33 50 72 29 184 Fonte: Currículo Lattes de Saviani. Elaborada pela autora A maior publicação de livros de Saviani concentra-se no ano de 2008, com oito livros dos 33 publicados por ele. Nos 17 anos referidos no quadro acima, o autor não publicou livros em 4 deles, dois no início do intertício e dois no final. Embora não seja a que apresenta o menor número de publicação, os trabalhos em anais de eventos, são o tipo de produção que deixou de ser socializada no maior número de anos (8 anos) 102 No entanto, os números no quadro acima demonstram que a produção que mais se destaca em termos quantitativos é a de artigos em periódicos (72) e a segunda com maior número de publicação é a de capítulos de livros (50). Os dois juntos formam mais da metade do total de 184 produções teóricas desse autor. Os dois últimos anos do período são os que apresentam o menor número de trabalhos publicados, apenas um (1) trabalho socializado em anais de eventos, ou seja, não há publicação registrada no lattes de Saviani no ano de 2016. Os títulos dessas produções indicam os temas estudados pelos dois autores. Neste sentido, foi possível notar que são marcados repetidamente por algumas palavras tanto nos livros como nos artigos, nos capítulos de livros e trabalhos publicados em anais e configuram uma espécie de eixo temático em torno do qual se reúnem os interesses investigativos desses dois pesquisadores. Principalmente palavras como pesquisa, epistemologia, conhecimento, ética, política, educação, pedagogia formação, pós- graduação, legislação educacional e trabalho e educação. Além destes termos, tantos outros poderiam ser apontados como demarcadores dos estudos realizados pelos professores Saviani e Severino, cujos resultados são apresentados em seus textos. Desde a publicação de seu primeiro livro em 1974, sobre a antropologia personalista, é possível observar que em sua produção bibliográfica Severino relaciona Filosofia e Educação e dedica uma atenção especial à Filosofia da Educação. Seus livros apresentam estudos acerca da filosofia contemporânea no Brasil, e dos problemas encontrados no ensino médio e na formação universitária. Ao dirigir sua atenção para a metodologia, faz ligações tanto com os métodos de estudo como com o trabalho científico e a leitura em filosofia. Ideologia e a construção da cidadania consistem em elementos por ele inspecionados quando se trata de educação. No que se refere à Filosofia contemporânea no Brasil, baseado na ideia de que para enfrentar os desafios histórico-sociais é preciso haver uma estreita relação entre filosofia, educação e política, Severino (2002) realiza um estudo, segundo ele, de caráter historiográfico e didático, sobre temas e abordagens assumidas pelo discurso filosófico no Brasil. Dentre outras abordagens, o autor faz referências à dialética hegeliana e a marxista. Em relação à primeira, menciona o resgate das ideias de Heráclito, realizado por Hegel, sobretudo a prioridade que este filósofo atribuiu à ideia de transformação profunda e permanente do real. 103 O professor Severino indica os diferentes desdobramentos do marxismo nas discussões filosóficas contemporâneas e menciona a apropriação que Marx faz da metodologia dialética como lógica e como lei do processo histórico incluindo neste processo a materialidade social. Nas publicações que versam sobre a ideologia e suas relações com a educação, com a perspectiva de construção da cidadania, notei uma atenção especial de Severino em explicitar esse conceito, apontando-o como uma categoria vital tanto para analisar como para compreender a educação. Como campo propício à pesquisa, a educação é uma área rica devido a multiplicidade de elementos que a constituem, as relações entre eles, especialmente as contraditórias e o seu desenvolvimento histórico e social que marcam a sua complexidade, entre eles a formação é um tema importante para o pesquisador dessa área. Como educador e filósofo da educação, o professor Severino tem interesse nesse tema. Severino (1987) denuncia o pouco caso da formação de professores em relação à fundamentação teórica e filosófica e aponta como tarefa da Filosofia da Educação garantir essa fundamentação para, por sua vez, assegurar o desvendamento da ideologia presente no discurso educacional. Chama a atenção para o dever que a educação tem de ensejar uma nova consciência social capaz de realizar uma profunda reflexão crítica e por meio dessa explicitar as diversas formas em que educação e ideologia se relacionam. Contribuindo, assim, para a transformação social. O autor conclui que apesar de vital essa consciência não é suficiente, é preciso agir. Em seus artigos sobre esse tema, percebi o esforço do autor em explicitar as condições em que se dá a formação dos professores no atual contexto brasileiro, em denunciar as insuficiências do modelo de formação e apontar o que considera imprescindível à formação que, em seu entendimento, tem que ser integral. Os artigos desse autor circulam por meio de pelo menos 36 diferentes periódicos e juntamente com os capítulos de livros e os trabalhos publicados em anais de eventos confirmam que ele não abandona as temáticas discutidas nos livros, mas as amplia, focaliza outras questões e busca novos objetivos. A produção desse intelectual tem como centro de interesse investigativo a educação em seus múltiplos aspectos e elementos. De modo que, no geral, esses textos versam sobre as relações entre educação, humanização, trabalho e ética no processo de construção da cidadania, a historicidade da educação, a crise da educação brasileira, a investigação científica, as questões epistemológicas da pesquisa educacional, a 104 Pedagogia, o espaço político da educação universitária, a pós-graduação em educação no Brasil, o processo de produção e sistematização do conhecimento, a pós-graduação em Filosofia da Educação e a metodologia de estudo. Estudos envolvendo um autor em particular também contam dessa produção. Os estudos sobre Emmanuel Mounier focam especialmente a concepção antropológica personalista, contribuição do personalismo para a educação da pessoa. Apoiada no Novum Organum, a investigação sobre Bacon refere-se à concepção de ciência como conhecimento e domínio da natureza e se estrutura a partir de três aspectos: o contexto em que Bacon viveu, a necessidade de um método capaz de superar as limitações dos métodos fundados no aristotelismo, a proposta de reformulação do processo do conhecimento e as questões relativas ao vínculo entre saber e poder na proposta baconiana e o processo histórico. A análise sobre a produção sociológica como sustentação crítica da política educacional de Celso de Rui Beisiegel traz indícios da trajetória intelectual desse professor e compõe, juntamente com outros textos, um livro organizado, especialmente, como uma homenagem a Beisiegel por ocasião da entrega do título de Professor Emérito da USP. Severino discorre, também, sobre a crítica à infelicidade na escola e o lugar de Rubem Alves na filosofia da educação e enfatiza que este autor assume a crítica de Freire acerca da educação bancária. Educação e formação estão intrinsecamente ligadas, assim, outro centro de atenção de um educador é a formação que Severino discute por meio de ligações com a educação, a filosofia e o ensino, com o entendimento de que “em seu sentido mais profundo, a formação é a realização do humano no indivíduo natural que somos, ao nascermos na espécie biológica a que pertencemos”. (SEVERINO, 2010, p. 59) A Filosofia é compreendida como formadora e transformadora da realidade, portanto, como elemento cultural necessário à escola, uma vez que tem a responsabilidade de orientar o discente na prática reflexiva que, de acordo com Severino (2010), deve garantir uma compreensão profunda, autônoma e consistente dos sentidos que direcionam a prática discente, sejam estes conceituais e ou valorativos, precisam ser relacionados às condições históricas reais em que a prática se efetiva. Essa compreensão fundamenta as investigações sobre o ensino, a prática do professor e do pesquisador. Relativo ao ensino superior preocupa-se com o contexto social e histórico do Brasil atualmente e com as controvérsias oriundas das leis brasileiras sobre o ensino. Interessado em filosofia e filosofia da educação, direciona seus estudos 105 ao ensino de filosofia e a formação do adolescente e do jovem no ensino médio, no processo de ressignificação de sua experiência existencial. As análises sobre a Filosofia dizem respeito tanto ao seu papel, compromissos e desafios, como a sua autenticidade, particularmente, da filosofia brasileira. Uma atenção especial é direcionada à Filosofia da Educação que é apresentada desde a sua trajetória no Brasil às suas relações com contexto historicossocial latinoamericano atual, é indicada como desafio de pensar a educação nos países e comunidades lusófonas, assim como também é confrontada com as ideias de filosofia e de educação. Nos estudos sobre essa disciplina são realizadas análises que sinalizam para as questões epistemológicas com atenção especial aos campos temáticos, aos paradigmas filosóficos e à constituição de círculos hermenêuticos. Nas investigações efetivadas por Severino o conhecimento é considerado em seu processo de produção e de sistematização na área educacional, a partir de suas relações com o ensino e a pesquisa. A sua construção é vista como via de aprendizagem filosófica no ensino médio e como desafio para a graduação e pós-graduação. A pesquisa, essencial à sua elaboração, é focalizada como princípio pedagógico no Ensino Superior, como o processo de sistematização do conhecimento na pós-graduação e como necessidade de integração com o ensino na docência universitária que, por sua vez, é analisada a partir do desenvolvimento profissional. A ideia de interdisciplinaridade e de intencionalização da prática compõe a análise sobre o conhecimento pedagógico, de tal modo que tanto as implicações epistemológicas da investigação educacional como as consequências para a elaboração da teoria e efetivação da prática da educação de conceitos como interdisciplinaridade transdisciplinaridade e complexidade constituem um desafio teórico para o pesquisador. A esse respeito, Severino (2007, p. 128) afirma que para “falar do conhecimento de qualquer objeto, de qualquer situação, é preciso contar com subsídios de muitas disciplinas que, embora autônomas do ponto de vista formal, atuam convergentemente mediante um processo que é, simultaneamente, transdisciplinar e interdisciplinar”. A pós-graduação e a consolidação de seus cursos em educação, as suas condições epistemológicas, políticas, formativas e institucionais consistem em assuntos inquietantes para Severino, assim como a política de pós-graduação no Brasil, o discurso filosófico brasileiro da atualidade sobre política e educação e a política de formação de professores. 106 Ao investigar o Lattes de Saviani em relação às pesquisas por ele realizadas deparei-me com o interesse investigativo desse intelectual em relação à história da pedagogia no Brasil, de suas ideias e teorias, a respeito da formação de professores e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O caráter histórico da educação no Brasil ficou visível nos temas de grandes pesquisas desenvolvidas por esse intelectual sobre a educação brasileira em diferentes períodos históricos, com temas como espaço acadêmico da pedagogia, a reconstrução histórica da escola pública no Brasil (1870-1996), e a história das ideias pedagógicas no Brasil. Assim como em pesquisas menores que ressoam nos artigos, capítulos de livros e trabalhos apresentados em anais de eventos que ampliam as temáticas estudadas por ele. Os estudos abrem espaço para os seus orientandos investigarem, em diferentes períodos históricos, a educação escolar as concepções de infância, os fundamentos filosóficos da educação, a crítica à história das ideologias, críticas a diferentes propostas de ensino e tantos outros temas indicados nessa produção. A docência desperta nos dois autores o interesse investigativo com relação ao ensino. O primeiro livro de Saviani foi publicado em 1984 e versa sobre o ensino público e a universidade. No geral, os seus livros demonstram o seu envolvimento teórico com a história e a história da educação e consistem indícios de sua atenção ao estudo de assuntos relacionados à educação, sobretudo no que se refere ao seu aspecto estrutural e sistêmico, e a possibilidade de formação da consciência filosófica. O aspecto político e legislativo da educação é abordado por meio de temas concernentes à política educacional brasileira, a democracia, às controvérsias e perspectivas relativas ao Sistema Nacional de Educação e ao Plano Nacional de Educação, ao papel do Congresso Nacional na legislação do ensino e à trajetória, limites e perspectivas da LDB. Percebe-se também em seus livros o interesse pela história e a teoria da pedagogia no Brasil, a elaboração da Pedagogia histórico-crítica, a possibilidade e emergência de sua prática. A discussão sobre a concepção de politecnia funda-se na ideia de unidade entre os aspectos manuais e intelectivos do trabalho. Pelo menos um de seus livros dá atenção especial à importância do debate teórico-metodológico no campo da história da educação, no que ele pode contribuir para a construção do sistema nacional de educação no Brasil. Os artigos de Saviani circulam por meio de cerca de 55 diferentes periódicos nacionais e à semelhança do que ocorre com a produção bibliográfica de Severino, junto 107 aos capítulos de livros e os trabalhos publicados em anais de eventos confirmam e ampliam o interesse do autor pelos temas analisados em seus livros. Quem se ocupa com a educação se preocupa em investigá-la. Então, de modo geral, nesses textos os temas versam sobre a educação em diferentes aspectos como o processo educacional na colonização, as ideias pedagógicas desenvolvidas nos séculos XVI, XVII e XVIII no Brasil, e o legado educacional do século XIX brasileiro, incluindo a discussão do Manifesto dos pioneiros da educação nova de 1932 e a crítica ao Sistema Nacional de Educação. E, ainda, sobre as transformações do capitalismo, do mundo do trabalho e da educação no cerne do desenvolvimento econômico. Analisa também a possibilidade de uma educação socialista e os desafios da sociedade de classes, inclusive os de uma educação pública e também de uma popular. Na perspectiva de desdobramentos da educação, Saviani volta a sua atenção para a pedagogia e a política educacional. A pedagogia é investigada a partir das relações estabelecidas com as lutas de classe e a educação escolar, as ideias pedagógicas no Brasil e o problema da periodização na história dessas ideias. O autor estuda tanto a trajetória da Pedagogia católica no Brasil como a Pedagogia e a política educacional no Império brasileiro. Reflete sobre a concepção e os problemas atuais da Pedagogia socialista e destaca o sentido desta no contexto de transformações. Só faz sentido como uma orientação pedagógica em períodos de transição entre a forma social capitalista com a correspondente pedagogia burguesa e a forma social comunista na qual – e apenas nela – será possível emergir uma pedagogia propriamente marxista, vale dizer, uma pedagogia comunista. (SAVIANI, 2011, p.23) Os nexos da educação com a política educacional no Brasil são inspecionados desde os princípios educacionais, passando pelo plano de educação, pela organização da educação nacional na LDB e suas implicações para o plano nacional de educação até à política e gestão da pós-graduação em educação no Brasil. Além de observar as relações do ensino com a gestão federativa da educação e a forma institucional do regime de colaboração no Brasil, estuda as ligações do sistema de educação com as instituições escolares no Brasil, com o conceito e a reconstrução histórica dessas instituições. Análises concernentes ao Estado e à educação no Brasil são realizadas em uma perspectiva histórica fertilizada pela denúncia da promiscuidade entre o público e o privado na história da educação brasileira. 108 Os estudos referentes à universidade expressam ligações com o ensino e com as mudanças atuais desta instituição. Como um dos elementos ligados à universidade, a questão da pós-graduação é focalizada em sua trajetória, perspectivas e situação atual. Esse nível de formação é apresentado com o lugar estratégico para a tão desejada passagem do senso comum à ciência da educação. São discutidas questões relativas ao problema da orientação em programas de pós-graduação em educação no Brasil. A História, estudada a partir de elementos variados, é unida à Historiografia e às questões para pesquisa da Escola Pública no Brasil. A importância de conhecer a história está em que é por meio dela que se adquire a própria humanidade do homem. Nas palavras de Saviani (2008, p.151): “é por ela que nós nos conhecemos e ascendemos à plena consciência do que somos.” As reflexões sobre a História aparecem aliadas às ideias pedagógicas e a reconstrução desse conceito, ao debate teórico e metodológico nessa área do conhecimento e à importância desse debate para a pesquisa educacional. Aliando-se às análises referentes à História da Educação, a sua importância na educação e na formação do educador, são considerados os aspectos relativos à história da formação docente no Brasil e aos saberes necessários à formação do Educador. Nesta perspectiva, são estudados problemas relativos ao ensino, à pesquisa e à organização na formação do campo da história da educação brasileira. A disciplina História da Educação é inspecionada a partir de suas relações com a política educacional e da ideia de uma nova perspectiva, de fontes para essa disciplina de um intercâmbio internacional nessa área e das fontes nas pesquisas em história da educação brasileira. As reflexões sobre a Filosofia da Educação são realizadas a partir do problema da inovação em educação, assim como da crise da modernidade e da projeção da filosofia da práxis. Em relação aos estudos envolvendo um autor em particular, Saviani dirige seu interesse a autores brasileiros, sobretudo no que diz respeito à educação e à filosofia, e a um importante autor italiano acerca do desenvolvimento do materialismo dialético. Enquanto os estudos sobre Anísio Teixeira revelam a atualidade desse autor que é apresentado como um clássico da Educação Brasileira, Casemiro dos Reis Filho é estudado em função da educação, com ênfase na historiografia da educação brasileira. Essa contribuição vai além da sua produção. Realiza-se, também, conforme Saviani (2002, p. 1), “na formação de outros pesquisadores por meio das atividades que desenvolveu em cursos de graduação e de pós-graduação lecionando a disciplina história da educação e orientando dissertações de mestrado e teses de doutorado.” 109 O pensamento pedagógico de Liberato Barroso também é alvo de investigação e considerado uma antecipação da discussão sobre o ensino livre que era a principal ideia debatida na Reforma Leôncio de Carvalho, de 1879, para investigar a questão da instrução pública como prioridade no Império brasileiro. Sobre o filósofo brasileiro Álvaro Borges Vieira Pinto, que elaborou uma teoria do desenvolvimento nacional, Saviani observa que a principal influência exercida por ele no campo educacional diz respeito ao seu esforço por uma compreensão filosófica da realidade nacional, que teve como eco a difusão da ideologia do nacionalismo desenvolvimentista que influenciou movimentos educativos, sobretudo sob a liderança de Paulo Freire. (SAVIANI, 2002) Destacam-se também os estudos sobre a importância atribuída ao diálogo sobre educação com autores como Paulo Freire e Adriano Nogueira e a ênfase sobre as injustiças sociais, as desigualdades e a falta de comprometimento do governo com o ensino de qualidade e as ideias pedagógicas de Abílio Cesar Borges. Saviani situa o lugar de Abílio César Borges na história e na historiografia da educação brasileira, enfatiza a concepção de homem e de infância e a aprendizagem no papel da escola, os conteúdos e os métodos de ensino. Analisa as ideias pedagógicas desse autor atento em esclarecer o seu significado, mas sem deixar de explicitar as controvérsias que essas ideias provocaram. Nos estudos a respeito do pensamento de Gramsci, Saviani fala acerca da recepção desse intelectual na educação brasileira e, entre outros aspectos, analisa a qualidade e o traço historicista do seu pensamento, ressaltando especialmente os limites de caráter subjetivo e objetivo que marcaram a leitura e recepção desse autor pelos educadores brasileiros. As discussões que dizem respeito a Gramsci e a educação no Brasil abarcam o levantamento de algumas produções que se referem a esse filósofo, publicadas no período de 1960 a 1990. Saviani discorre, ainda, a respeito de como se desenvolveram os estudos gramscianos na primeira turma do Doutorado em Educação, da PUC–SP, e do modo como ele mesmo leu as obras desse autor e como essas foram essenciais para a construção das matrizes teóricas da pedagogia histórico-crítica. As análises e reflexões que consistem no estofo dessas produções são fortes indícios da importância desses dois professores para a educação, a atividade de pesquisa, especialmente em seus aspectos políticos, éticos, epistemológicos e metodológicos. Por isso faz-se interessante destacar dois fragmentos de ideias trabalhadas por cada um eles 110 em um de seus textos, respectivamente, sobre ética como condição existencial em Severino e sobre as dificuldades metodológicas com Saviani. O primeiro refere-se ao fato de nossa condição existencial estar totalmente envolvida pela ética e pela episteme como bem se pode observar no trecho a seguir: Em tudo que fazemos, está sempre envolvido algum saber bem como alguma valoração. Isso decorre fundamentalmente da condição de entes dotados de uma dimensão de radical subjetividade, que nos coloca diante dos objetos de nossa experiência. Do ato mais simples ao mais complexo, um equacionamento subjetivo simultaneamente conceitual e valorativo perpassa sua realização concreta. (SEVERINO, 2014, p. 200) Note-se que o caráter axiológico que constitui a dimensão ética da existência é o que possibilita à consciência a noção de dever para com a humanidade que e se faz em cada indivíduo humano. Apesar de ser livre para fazê-lo, o sujeito não pode deixar que decidam por ele, esse compromisso com a existência é sempre axiológico, sempre valorativo, social e, ao mesmo tempo, particular. O ato de escolher aqui surge na sua contradição como determinação do dever implicado na atitude ética e no seu caráter de liberdade, ainda que a partir de determinadas condições, realizar ou não é uma decisão particular, um ato isolado de cada um, mas que tem repercussões sociais. Essa dimensão permite fazer opções, inclusive do quê e do como se quer saber. Ao mesmo tempo em que facilita, dificulta as escolhas também no contexto metodológico. Saviani (2013, p.189) faz observações sobre as “dificuldades que temos de colocar em prática o método desenvolvido por Marx que conhecemos pelo nome de método histórico-dialético”. Nessa perspectiva, é possível que uma das dificuldades mais encontradas esteja na aplicação de um método criado por outrem, na não compreensão de que, embora se possa fundamentar em princípios gerais de uma teoria, um método é sempre um arranjo particular de estratégias de investigação. O que se pode fazer é aproximar-se da experiência do outro para, a partir disso, empreender-se na sua própria caminhada epistemológica. Essa dificuldade leva a pensar que os limites de uma pesquisa são externos à abordagem filosófica com a qual o pesquisador elabora o método, organiza as estratégias metodológicas e analisa as informações relacionadas aos acontecimentos e fatos históricos centram-se nas ações do pesquisador, na compreensão que ele tem do processo do conhecimento, que começam a ser traçados no contexto da sua própria existência, da 111 sua formação, o que não significa dizer, necessariamente, de uma má formação, de um estudo insuficiente ou de qualquer coisa que o valha, mas de pensar nos contornos que começam a ser traçados na própria existência do pesquisador. Nesse sentido, pode-se ter como exemplo a observação que faço nesta seção de que os professores Saviani e Severino abraçam a abordagem materialista histórica dialética28, mas os estudos do primeiro são muito mais consubstanciados na História da Educação enquanto os do segundo são ligados à Filosofia da Educação. Note-se que as próprias experiências existenciais desses professores proporcionaram-lhes mais firmemente o contato com as contradições e opressões sociais, tanto no que diz respeito aos aspectos teóricos como nos práticos. Mas há também uma dificuldade na efetivação do pensamento em por em prática a própria lógica, que impõe a exigência metódica de pensar dialeticamente as contradições que a realidade apresenta. Lição que nos foi passada por Hegel, na perspectiva espiritual em que o movimento de produção da realidade é conceitual e que Marx deu prosseguimento por meio de uma concepção material de realidade, onde as contradições se estabelecem nas relações sociais de produção. No que diz respeito à Filosofia Dialética, além da abordagem materialista- histórica, que sustenta as análises dos dois professores, em Saviani percebe-se estudos interessados no marxismo e educação, no problema da subjetividade e da intersubjetividade na perspectiva marxiana e na atualidade de Karl Marx. Encontra-se também estudos sobre Gramsci e a educação no Brasil. No que tange às publicações de Severino elas incluem, por exemplo, estudos acerca do desafio da formação docente frente à dialética entre identidade e alteridade no processo educativo, sobre a abordagem crítico-dialética e suas implicações na formação do educador. Além de estudos sobre a contribuição da teoria crítica para a formação do indivíduo como sujeito Em relação ao interesse dos orientandos pela Filosofia Dialética, nas dissertações de mestrado, por parte dos orientandos de Saviani tem-se um estudo sobre o método dialético na investigação histórica da educação (1975) e dois trabalhos 28 Em se tratando da experiência educacional nas escolas e universidades, no que concerne à própria formação, Severino (2011, p. 368) esclarece que recebeu influência do tomismo, na formação pré- universitária, da fenomenologia, preponderante na universidade, mas na fase profissional encontrou-se “mais próximo de Marx, no que concerne a uma cosmovisão mais ampla, e de Gramsci, quando se trata de compreender o sentido histórico da educação.” 112 interessados em Gramsci, com um estudo relacionado a uma nova concepção de filosofia (1983) e outro aos intelectuais orgânicos e a educação (1987). No que se refere aos orientandos de Severino, encontra-se uma dissertação sobre metodologia dialética de construção do conhecimento em sala de aula (1992) e outra interessada nas contribuições de Theodor Adorno para pensar a possibilidade de emancipação humana (2009). Sobre o problema da receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação no Brasil, posso concluir que a intimidade com a dialética materialista-histórica marca a produção dos dois autores, assim, a sua produção bibliográfica indica uma grande receptividade da Filosofia Dialética nas suas práticas investigativas, especialmente as contribuições do materialismo histórico- dialético para a formação do pesquisador na área da educação. Mas é necessário frisar que as experiências vividas pelos dois, considerando a dialética constitutiva de cada um deles no confronto individualidade e socialidade, incide na forma como reagem e enfrentam as circuntâncias históricas. É importante ressaltar que as incursões dos dois professores sobre os temas relativos à educação, à filosofia e à história, além de ensejarem discussões de interesse da área da educação, constituem significativa contribuição para compreender um conjunto de problemas, assim como para pensar possíveis soluções. A decisão de perscrutar o processo de formação de Antonio Joaquim Severino e de Dermeval Saviani, trouxe à tona as repercussões acadêmicas na trajetória de formação desses dois autores/professores/orientadores e possibilitou observar o percurso de ambos no processo de graduação, de pós-graduação, de profissionalização e consolidação da docência. A metodologia utilizada nessa seção foi essencial para alcançar objetivo de examinar a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação e as contribuições do materialismo histórico-dialético para a formação do pesquisador nesse campo disciplinar A produção de conhecimento sobre filosofia da educação e história da educação no Brasil, com a discussão de diferentes problemas da educação em nível filosófico e histórico, e o volume dessas produções, confirmam a preciosa contribuição dos dois autores para a educação. Além disso, trata-se de uma produção que contribui para a prática da filosofia dialética no contexto tanto da produção científica em educação como da formação de 113 pesquisadores, que não se limita apenas a dos seus orientados, mas se estende como significativa contribuição à formação de seus leitores e estudiosos. Os mais de trinta anos de atividades teóricas e práticas que abrangem orientação de trabalhos científicos em programas de pós-graduação em educação, parece suficientes para eles adquirirem efetivamente a postura dialética, mencionada por Frigotto (1997), não deixando dúvidas sobre a competência para orientar as teses em educação, em especial, no que diz respeito à abordagem dialética. Tudo isso só reforça a importância desses dois intelectuais e confirma a escolha desses dois autores, como professores/orientadores das teses que serviram de material de análise na pesquisa que realizei para a elaboração desta tese. 114 4 A LÓGICA DE ELABORAÇÃO DO CONHECIMENTO EM EDUCAÇÃO: TESES ORIENTADAS POR SEVERINO E SAVIANI NO PERÍODO DE 2000 A 2015 A disposição para discutir a lógica do conhecimento em teses em educação e explicitar a configuração dos métodos que se expressam nessas produções, fundou-se na compreensão que a elaboração de conhecimento exige a realização de pesquisas que, por sua vez, são ações que se efetivam a partir de algumas orientações teóricas e metodológicas. Nesse sentido, fala-se de rigor, sinal de que se deve ter atenção aos elementos pressupostos a tais práticas. No que diz respeito às Humanidades, seja qual for o estudo, sua natureza e metodologia, por se tratar de uma investigação, levará sempre em conta um tema sobre o qual o pesquisador exercitará a sua curiosidade epistemológica. O tema consiste uma elaboração teórica que articula ideias e realidade objetiva, constitui o primeiro item a ser considerado nesse processo. É sobre ele que o pesquisador lançará suas suspeitas, sentirá indignação, direcionará suas críticas, atos necessários à ação que desencadeará a elaboração do problema por parte do pesquisador. Essa elaboração é um indicativo de que o estudo tem caráter científico e filosófico, exigido nos dois tipos de conhecimento, pois se trata de um elemento essencial para a atividade investigativa. Tanto que a esse respeito Severino (2000, p. 54) afirma que nada pode ser dito sobre o assunto estudado se “ele não se apresentar como um problema para aquele que discorre sobre ele”. As palavras desse autor indicam a essencialidade desse elemento no processo do conhecimento, ideia partilhada por Saviani (1991, p. 21-23) ao esclarecer que “a essência do problema é a necessidade”, de modo que este “possui um sentido profundamente vital e dramático para a existência humana, pois indica uma situação de impasse”. Como parte consubstancial de toda pesquisa, é imprescindível que o problema fique bem esclarecido tanto para o pesquisador como para o leitor dos resultados da pesquisa, devidamente organizados em um relatório que, no caso do doutorado, consiste no texto da tese do pesquisador, caso contrário, esse documento não apresentará rigor metodológico e perderá a importância científica e ou filosófica. Foi em meio à crítica e indagações que o objeto desse estudo, a particularidade do assunto investigado, foi definido. 115 Nesta seção estabeleci como objetivo discutir a lógica de construção do conhecimento expressa nos métodos de pesquisa adotados nas Teses Doutorais, visando à produção do conhecimento científico na área da educação. A análise foi guiada pelo seguinte problema: Como se configura o método e quais temáticas e objetos de estudos são privilegiados na investigação científica nas Teses Doutorais produzidas na área da educação? Para atingir o objetivo almejado e pensar o problema de pesquisa proposto a essa seção foram consideradas, para análise, as teses orientadas pelos professores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani, no período de 2000 a 2015. A não inclusão das dissertações nessa análise ocorre em função da maior probabilidade de melhor fundamentação teórica por parte dos doutorandos, posto que já têm a experiência dos estudos do mestrado, muito embora esses também apresentem dificuldades teóricas como atesta Gamboa (2013). A intenção não foi propriamente expor uma a uma as análises de cada tese, mas aproveitar alguns fragmentos desses textos para auxiliar na percepção e apropriação dos elementos que são essenciais para elaboração do conhecimento, a lógica seguida por esta que é indicada na análise do problema e, ao mesmo tempo, servir de exemplo para demonstrar alguns detalhes das lógicas expressas nas teses concebidas. Nessa perspectiva, a análise preocupou-se com os elementos do conhecimento que se destacam nas teses, tais como: a) o método, e a sua organização entre a apropriação e a elaboração, essencial no processo de investigação; b) as temáticas privilegiadas e suas ligações com a vida. Problematizadas elas fazem emergir o problema de pesquisa, outro elemento crucial, sem o qual não se produz conhecimento, e que se constitui o objeto de investigação de todo trabalho científico, ou a possibilidade de sua elaboração. 4.1 APROPRIAÇÃO E ELABORAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DO MÉTODO A opção por um método de investigação na pesquisa em educação e o envolvimento filosófico que isso implica, não é uma atitude simples, posto que consiste em ação que abrange elementos técnicos, epistemológicos, éticos e políticos. Na pluralidade de possibilidades dessa escolha estão inseridas diferentes concepções de conhecimento, de ser humano e de sociedade que o pesquisador assume. Contudo, no contexto da diversidade de concepções, falar de escolha de método já constitui um 116 problema que só se resolve na indicação de determinada forma de compreender todo o processo de investigação necessário à elaboração do conhecimento. No âmbito dessa diversidade é possível encontrar concepções subjetivistas que priorizam o pesquisador no processo do conhecimento e entendem que as escolhas e os desejos deste sujeito em relação às suas próprias inquietações epistemológicas são os determinantes do método. Este é, pois, determinado subjetivamente. Já em uma concepção que prioriza a realidade objetiva, ainda que o método seja compreendido como um traçado investigativo realizado pelo pesquisador, não são as escolhas e os desejos deste que determinarão o método, porém o objeto de investigação. As ações do pesquisador se submetem à realidade e as decisões que ele opera obedecem a determinações objetivas. O entendimento de que o método ou é determinado subjetivamente, ou obedece a determinações objetivas, consiste em um modo de pensar que se pauta na lógica formal alicerçada nos princípios da não contradição e do terceiro excluído. Ainda que o método seja determinado objetivamente, ele serve ao pesquisador em um processo de investigação, então seria interessante perguntar em que medida sujeito e realidade o determinam. Se um caminho para alcançar um objetivo, para chegar a um fim, é o que significa literalmente o método e se o homem pode ter vários objetivos, então haverá, em função disso, várias alternativas. Mas o que contém cada uma delas? Para onde conduzem? Quando se fala de método, diz-se da forma de construir o conhecimento, então, considerando o objeto de pesquisa desta tese é pertinente perguntar: como Hegel e Marx se posicionam a respeito? Segundo Röd (1984), sobre a questão do método Hegel orienta que se deve distinguir entre o método analítico e o sintético, posto que o verdadeiro método da filosofia faz esta distinção, mas também abarca o que de positivo há em cada um deles. Sendo assim, o método filosófico é tanto analítico como sintético. Esse mesmo autor observa que há muitos indícios nos textos de Hegel de que a análise é concebida por ele “como análise conceitual (e não de representações)”. (RÖD, 1984, p.137) Hegel parte da proposição kantiana de que o subjeito cognoscente é limitado, uma vez que é impossível para a razão conhecer a realidade em si. Tanto na Lógica como na Fenomenologia do Espírito, Hegel impõe-se a tarefa de superar a finitude da razão em relação ao conhecimento. Com essa preocupação, Hegel (1992) descreve 117 uma dialética do Espírito, ou seja, o caminho que a consciência humana percorreu para chegar até o Espírito Absoluto. O movimento inicial é pensado como uma tríade dialética em que o ponto de partida é pura abstração. A ideia como pura abstração constitui o princípio pelo qual é possível perceber que a realidade pode ser conhecida. Logo, a pureza abstrata é o que constitui a identidade da Ideia. A esse movimento que equivale a afirmação da tríade dialética, pela qual a Ideia se movimenta, Hegel contrapõe a Natureza que é a exteriorização da Ideia no tempo e no espaço, o que significa dizer que é o momento de negação da pureza abstrata, em que a Ideia perde a sua identidade para se fertilizar com o material sensível. O filósofo observa que o conteúdo da certeza sensível é concreto e isso faz com que o conhecimento sensível apareça como superior e mais rico quando, na verdade, é o mais pobre porque a sua verdade contém apenas o ser da coisa. As limitações do mundo da experiência indicam a Hegel que para concebê-lo é necessário negá-lo, pois por meio da negação ocorre o ressurgimento do positivo a partir do negativo, do pensamento a partir do ser, do sujeito a partir do objeto. Isso só se torna possível graças ao conflito das oposições. Hegel (1982) esclarece que o negativo está junto com o positivo e que somente com o conhecimento dessa proposição lógica é possível alcançar o processo científico. Ideia Princípio inteligível da realidade. Primeira fase do absoluto devir do espírito. Fase em si. Espírito. Ideia já concretizaada e consciente de si Fase da percepção. Fase por si. Natureza Exteriorização da Ideia no tempo e no espaço. Fase da experiência sensível. Fase fora de si 118 O movimento do método hegeliano se realiza por meio de conceitos numa ordem evolutiva e progressiva em que a afirmação é inferior à negação que, por sua vez, é inferior à negação da negação. De modo que a percepção se dá no espírito e não na Ideia nem na Natureza. O método dialético é, portanto, fundamentado no princípio do eterno devir, realiza-se progressivamente em tríade de modo que, em um segundo movimento, o Espírito também é negado para que se efetive em sua capacidade de progredir. Com esse método, que compreende um movimento proporcionado pela contradição, Hegel efetiva a sua intenção de demonstrar que a existência da realidade pressupõe a mediatização dos conceitos. Portanto, para esse filósofo o objetivo só existe em função do subjetivo. O real só o é em função do ideal. No processo do conhecimento tanto o objeto cognoscível como o sujeito cognoscente evoluem, uma vez que no momento da certeza sensível o sujeito apenas percebe, porém não tem consciência de si mesmo em sua capacidade de conhecer. Além disso, é só na percepção que o objeto se mostra como a coisa de muitas propriedades, portanto, é somente por meio dela que o objeto é apreendido na sua multiplicidade de Espírito Subjetivo. Equivale à individuação empírica. E evolui pelo movimento realizado pela consciência, autoconsciência e razão. Espírito Absoluto. Momento em que o espírito realiza a sua capacidade de conhecer o todo. A razão não tem limites diante do conhecimento. Espírito Objetivo. É a concretização da sociedade cujo movimento abrange o direito, a moralidade e a eticidade. Em Hegel o Estado é a suprema experiência do espírito. 119 qualidades.29 E o comportamento da consciência não se limita apenas a perceber, mas também se faz consciente de si mesmo30, isto é, a consciência faz-se auto-consciente e passa a pensar a realidade que, por sua vez, nada mais é que a razão. Hegel (1982) organiza um método de conhecimento baseado na lógica das contradições. A lógica hegeliana é uma dialética cujo método se realiza com base em uma relação triádica: afirmação, negação e negação da negação. Mas essa relação, de acordo com Nunes (1991), não revela inteiramente a natureza e o alcance da dialética hegeliana se não se explicita que os três termos da relação são conceitos e que se trata de uma relação criadora onde um conceito dá origem ao outro “e isso por efeito de uma negação interna, graças a qual a antítese nasce da tese, como elemento contrário que dessa mesma se separa. Por força da oposição entre os contrários assim produzidos, que se chama contradição, produz-se o terceiro conceito – a síntese” (NUNES,1991, p. 22). Para Hegel, a lógica é, sobretudo, a didática do ser, ou seja, ontologia e, enquanto tal, é a ciência da Ideia pura que tem como objeto o pensar entendido como a mais rica expressão do verdadeiro31. Foi baseado na lógica das contradições que Hegel pensou o método dialético de conhecimento. Compreendendo-se esta lógica como movimento realizado pela consciência em que essa goza da capacidade de pensar por contradições sem ser contraditória, as contradições da realidade material expressas nos conceitos que para Hegel constituem o real. É na obra desse filósofo que se encontra tanto o método dialético, como as raízes do método materialista histórico. A negação da negação é essencial para compreender a ideia de síntese de múltiplas determinações o que Marx, a partir de uma postura crítica, concebe como concreto. Com uma filosofia fundada na compreensão de que pensamento e realidade se desenvolvem simultaneamente, Hegel definiu o caráter histórico da filosofia e do pensamento. Nesse filósofo sobressai a ideia de realização do Espírito Absoluto32, que 29 Cf. Fenomenologia do Espírito. 30 Sobre o método dialético, além da Ciência da Lógica e da Fenomenologia do Espírito de Hegel e da A Filosofia Contemporânea: trajetos iniciais, de Benedito Nunes, confira também OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Epistemologia e Educação: bases conceituais e racionalidades científicas e históricas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016. 31 Cf. a Ciência da Lógica. 32 Na dissertação de mestrado observo o esforço da filosofia hegeliana em discutir o problema do sujeito e em mostrar o movimento da história. Em Hegel, a concepção kantiana de sujeito ativo, livre e soberano 120 consiste no terceiro momento do movimento dialético do espírito e em que esse realiza a sua capacidade de conhecer o todo. É o Espírito Absoluto que se efetiva na história, e ao fazê-lo constitui a própria história, promovido pelas contradições conceituais que dão à razão o poder infinito de conhecer, contrapondo-se à finitude desse poder, estabelecida na “coisa em si” kantiana. Hegel concretiza, assim, a superação dos limites da razão pura kantiana, transpondo a fronteira da coisa em si a partir da unidade entre o ser e o pensar. Nas discussões de Marx sobressai o capital como elemento essencial do capitalismo, modo de produção analisado por esse autor. A importância atribuída por Marx à produção material é suficiente para que ele a tome como objeto de estudo, devidamente declarado e delimitado no tempo e espaço. Trata-se da produção “burguesa moderna”.33 Em Marx, o método é baseado nos princípios da lógica dialética e prioriza a produção material, uma vez que para esse autor “os indivíduos são dependentes das condições materiais de sua produção” (MARX, 1999, p. 28). Se para Hegel um conceito é imediatamente o seu contrário, para Marx também é assim em relação à matéria. Ao tratar da produção da sociedade, ele o faz a partir do movimento dialético explicitado por Hegel e transposto para o seu próprio objeto de estudo. Isso fica evidente quando Marx (1991, p.5), afirma que “a produção é tanto um ramo particular da produção, por exemplo, a agricultura, a pecuária, a manufatura, ou ela é totalidade”. E, apropriando-se do princípio de contradição, esclarece que a produção além de particular é também, “certo corpo social.” Para um tratamento científico da produção o autor sugere que é necessário “distinguir entre a produção em geral, os ramos de produção particulares e a totalidade da produção”. Não bastasse essa relação triádica bem à moda hegeliana, Marx (Idem, p. 9) explica que a produção é também imediatamente consumo e vice-versa, isto é, “cada qual chega ao seu apogeu com o desenvolvimento progressivo e qualitativo do espírito, “saltos qualitativos estendem-se do espírito subjetivo, que se constitui a individualidade humana, ao espírito objetivo, formado pelas instituições sociais e pela cultura, até chegar ao seu desenvolvimento máximo no Espírito Absoluto – Ideia ou Razão – que nada mais é do que a totalidade do real, incluindo-se aí o homem, que não passa de mera representação da Ideia” (SOARES, 2012, p.75). A superação da filosofia finita de Kant por Hegel condiz com a redução do processo histórico ao desenvolvimento da Ideia. “A história humana é a própria Ideia encarnada na sociedade. O mundo hegeliano é uma determinação dos conceitos e o sujeito histórico é o cognoscente. O sujeito é “a substância verdadeira, o ser ou a imediateidade que não tem fora de si a mediação, mas é a própria mediação” (Idem). 33 Cf. Para a crítica da economia política. In: Cf. Manuscritos econômicos-filosóficos e outros textos escolhidos. 121 é imediatamente o seu contrário”. O autor reafirma assim a possibilidade de uma unidade dos contrários como Hegel propôs, o que se confirma quando, ao falar sobre o método da economia política, Marx indica que o correto é começar pelo real e pelo concreto e explica: O concreto é concreto porque é síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso. Por isso o concreto aparece no pensamento como o processo da síntese, como resultado, não como ponto de partida, ainda que seja o ponto de partida efetivo e, portanto, o ponto de partida também da intuição e da representação. (MARX, 1991, p. 16) Tanto para Hegel como para Marx, a história assume o sentido de um ethos existencial próprio da humanidade. Um significado que tem em sua base um princípio ativo. De qualquer modo a história resulta da ação humana, constituída seja na produção ideal, na elaboração dos conceitos, em Hegel, seja na produção material da existência, em Marx. Como se pode ver, apesar de compartilharem esse mesmo princípio, há uma grande diferença no sentido que a história assume no idealismo hegeliano, como produto da razão constituído na união entre ser e pensar, e no materialismo marxista, como produto da práxis humana que se estabelece na produção da existência, como prática social. Ainda que muitas críticas sejam feitas ao idealismo de Hegel, não se pode negar a importância desse intelectual para a filosofia, em especial para uma filosofia da história e suas ligações constitutivas com a dialética. Marx, mesmo considerando que Hegel cometeu um “erro duplo” 34 , reconheceu a grandeza do pensamento desse filósofo, sobretudo, no que se refere à dialética da negatividade como “princípio gerador”. É evidente a importância do pensamento de Hegel para a compreensão e explicitação da realidade e do papel especial que esse filósofo tem na história da humanidade. Sua filosofia, independentemente do que se possa dizer do ponto de vista crítico, permitiu compreender como a realidade se constitui. Em acordo com essas ideias, 34 Nos Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos, Marx aponta um duplo erro cometido por Hegel: o primeiro porque o filósofo considera a alienação apenas em nível de pensamaneto. O segundo, em consonância com o primeiro, porque Hegel compreender a história humana como história da produção do pensmento abstrato. 122 é possível afirmar que, do ponto de vista da dialética, as contradições são o estofo essencial da realidade seja esta observada por lentes idealistas seja pela ótica materialista. Somente após Hegel e suas preocupações com o desenvolvimento histórico da consciência, por meio da dinâmica contraditória dos conceitos, Marx pensou a história em sua materialidade produtiva, que se desenvolve processualmente por meio de contradições. A principal diferença entre os métodos de Hegel e de Marx, o que marca a oposição entre os dois modos de produzir conhecimento, é o fundamento: ideal para o primeiro e material para o segundo. Se a dialética pode conduzir a diferentes posturas e interpretações sobre o mundo, o ser humano e suas ações, essas concepções, de algum modo, influenciam e consubstanciam diversos modos de conhecer. Tal diversidade, então já depõe contra a ideia de existência de um método universal dialético. Então, mencionar o método dialético ainda que se trate de um de seus modos específicos, não significa referir um método universal, pronto para ser aplicado na investigação de qualquer objeto, não somente independente da natureza do próprio objeto como indiferentemente ao tempo e espaço em que sujeito e objeto se situam. Se não considerarmos esses aspectos cairemos na superficialidade de pensar que o conhecimento depende apenas da aplicabilidade de um método, isentando o pesquisador de qualquer esforço investigativo. A esse respeito, é preciso compreender que o que goza de universalidade são os princípios de uma teoria. São eles que consistem no sustentáculo epistemológico de um método. Sobre a dialética na atualidade, Gamboa observa que: Com base em Hegel, a dialética moderna e contemporânea se refere a uma visão ou ontologia dinâmica da realidade (Heráclito), a uma Lógica dinâmica entre pensar e ser (Hegel), a uma Teoria do conhecimento (Marx e Engels) e a um método científico-filosófico (Kopin, Löwy e Scaff, dentre outros) (GAMBOA, 2013, p.34). No que concerne ao método, Marx além de reconhecer a oposição entre o seu modo de produzir conhecimento e o de Hegel, frisa a importância de distinguir entre o método de exposição e o de pesquisa. Primeiro é preciso tomar posse da matéria, detalhadamente e, então, analisar seus diferentes modos de desenvolvimento, investigar 123 a ligação existente entre elas. Só então é possível “descrever adequadamente, o movimento real.” (MARX, 1996, p. 16) É sintomático que esse esclarecimento seja em reposta à crítica a ele dirigida no Mensageiro Europeu35, de que o seu método de pesquisa é “rigorosamente realista”, mas o seu método de expor, “por desgraça dialético-alemão.” Marx difere os dois métodos como que sugerindo que não se deve confundir o movimento do real, com todo o aparato objetivo, contraditório e antagônico, responsável pelo seu dinamismo, com a atividade que o pensamento realiza para apreender esse movimento, a fim de uma compreensão mais profunda da realidade. Parece fundamental discernir a lógica constituída pelo objeto investigado da lógica realizada pelo pensamento na elaboração do conhecimento dialético. O cuidado em fazer essa diferença é compreensível uma vez que ele não desenvolveu uma teoria da lógica e os estudos de Hegel nesse sentido são sustentados pelo idealismo. Porém, se a realidade constitutiva do objeto é dinâmica e se o motor desse movimento são as contradições, como pensá-las sem considerar o modo contraditório da lógica dialética tão bem explicitada por Hegel? Para esse filósofo, a ideia se desenvolve por meio de contradições internas ao próprio conceito que é, ao mesmo tempo, movimento. Em função disso, um conceito já traz em si a sua possibilidade de negação, de tal modo que do primeiro conceito emerge um segundo que, por sua vez, também será negado na trama dessas tensões, dando origem a um terceiro que, além de consistir em um momento do movimento, é um conceito muito mais rico posto que a “negação da negação” supera as contestações existentes entre os dois primeiros conceitos, no movimento triádico da lógica dialética e ao superá-las dá ensejo a novas contradições, isto é, transforma-se em novas afirmações que, por sua vez, serão negadas, em um movimento contínuo. A negação da negação firma o caráter revolucionário da dialética hegeliana, é esse momento do método dialético que garante a continuidade do movimento da história, ainda que efetuada nos conceitos e por eles impulsionada. É nesse momento que se efetiva a transformação garantida pela superação dialética, indicada pelo termo alemão aufheben cujo significado é suspender e implica três diferentes sentidos considerados por 35 Periódico de São Petersburgo citado por Marx no Posfácio da segunda edição de O Capital. 124 Hegel, de modo que a superação dialética constitui, ao mesmo tempo, negar, preservar e elevar a qualidade36. Embora essa discussão pareça simples e desnecessária, é importante para compreender que a negação da negação, ao ser colocada por Hegel em termos conceituais, é identificada por Marx como alienada37, mas nem por isso perde a sua importância para o materialismo histórico, pois ela, ao constituir uma unidade de contrários é a garantia da superação das contradições, mas também de criação de novas contradições, que serão superadas e assim por diante, ou seja, ela é a responsável pelo eterno devir. A negação da negação é uma das maiores contribuições de Hegel para a compreensão da realidade histórica, seja do ponto de vista do idealismo hegeliano, ou sob a visão do materialismo histórico, muito embora as concepções hegeliana e marxista de realidade sejam fundamentalmente opostas. Conforme Nunes (1991), apesar dessa oposição, a compreensão a respeito do processo do pensamento coincide nas duas concepções. A diferença está em que para Marx esse processo ocorre na interpretação da realidade pelo homem, enquanto que para Hegel consiste em um ato autônomo de criação da realidade pela razão, indicado pela compreensão de que “o que é racional é real e o que é real é racional”38, ou seja, para o primeiro a realidade é prática, para o segundo é ideal. Como fica, então, a dialética nos estudos que se sustentam no materialismo histórico se esse é dialético, isto é, busca seus fundamentos na filosofia dialética? Para Marx, (1996, p.17), a dialética ao conceber o existente, “afirmando-o encerra, ao mesmo tempo, o reconhecimento da negação e da necessária destruição dele; porque apreende, de acordo com o seu caráter transitório, as formas em que se configuram o devir; porque enfim, por nada se deixa impor, e é, na sua essência, crítica e revolucionária”. Entendo que a filosofia dialética, na base do método materialista histórico possibilita dizer que em Marx se trata de uma oposição de fatos, ou melhor, um confronto em que os três termos da relação dialética são constituídos pela matéria social, ou seja, por fatos. Então, para consistir uma relação criadora, como em Hegel, por uma força 36 Leandro Konder, em “O que é Dialética”, dá bons exemplos sobre esses três diferentes sentidos relacionando-os à prática. 37 Cf. Manuscritos econômicos-filosóficos e outros textos escolhidos. 38 Cf. O prefácio da obra Princípios da Filosofia do Direito. 125 interna, cada fato gera outro. Se considerarmos uma relação triádica, como em Hegel, do dinamismo impulsionado pela contradição produz-se um terceiro fato o que equivale à síntese, essencial no processo dialético. Nunes esclarece que o pensamento materialista alia-se à lógica dialética, de tal modo que o método dialético de Hegel e a sua terminologia (mediação, alienação, superação, objetivação) perderam esse substrato teológico-espiritual ao serem incorporados pelo marxismo. Mas tal como a dialética hegeliana, a marxista é como veremos um modo de pensar por meio de contradições, que reproduziriam as contradições da própria realidade. (NUNES, 1991, p.23) E nesse movimento, um pensamento capaz de perceber a possibilidade de outras situações, de outros aspectos e mesmo de outros fenômenos. José Paulo Netto (2011, p.7) afirma que para Marx, “o conhecimento teórico é o conhecimento do objeto tal como ele é em si mesmo, na sua existência real e efetiva, independentemente dos desejos, das aspirações e das representações do pesquisador.” Se o método em Marx não puder constituir uma intervenção do pensamento pelo qual é possível manipular o objeto, no sentido de reestruturá-lo, então, nesse caso o pensamento dialético seria apenas aquele que percebe as contradições da realidade material e o conhecimento seria apenas constatação. Porém, essa é uma capacidade do pensamento, da razão, do intelecto além e aquém da dialética material. O que realmente parece ser a função do pensamento dialético é, além de considerar as contradições, as leis objetivas, ser capaz de pensá-las como afirma Nunes na citação acima. Porém, levando em consideração a práxis, o valor desse pensamento estaria em compreender a realidade e com base nessa compreensão contribuir para as transformações que as contradições internas a ela propiciam. Isto concorreu para a ideologização e ortodoxia que ainda hoje é possível notar em alguns intelectuais autoproclamados marxistas. Penso que cada metodologia assume forma a partir do objeto investigado, fundamenta-se em uma filosofia e nela constitui seus próprios princípios. Se o conhecimento não pode prescindir de uma metodologia e sistematização, para além disso, a atividade filosófica se caracteriza pela tomada de consciência do homem sobre si mesmo, pela capacidade de articular uma visão de mundo, efetivando assim características ontológicas e, ao mesmo tempo, gnosiológicas, fundamentais para a realização de uma consciência preocupada com suas próprias maneiras de tratar a realidade, no processo de invenção do conhecimento. 126 Primeiro é preciso frisar que se trata de um caminho investigativo, ligado a um conjunto de ações que dão forma à atividade de investigação que gera conhecimento e que denominamos pesquisa. Esta se pauta na utilização rigorosa de métodos com a finalidade de elaborar e validar o conhecimento como produção do novo, porém com relevância epistemológica e importância social, para o que precisa apresentar uma atitude crítica e reflexiva tanto no trato com o tema estudado como com os métodos e as fontes históricas à disposição do pesquisador. Nesse contexto, o método diz o que fazer, porém longe de ser apenas o corpo de regras e procedimentos estabelecidos para realizar uma pesquisa, ele é uma expressão da compreensão que se tem do mundo e do conhecimento em seu processo elaborador. Isso significa que se efetiva consubstanciado por uma lógica e por um conjunto de concepções que dão a ele a consistência necessária para ser entendido com profundidade. O que parece simples emerge em sua complexidade, no conjunto das relações que juntamente com ele são efetivadas. Mas, é necessário considerar que o método, para além da lógica, constitui-se na própria vivência do pesquisador com o pesquisado, sua existência depende da prática, da ação investigativa desse sujeito cognoscente. Nessa perspectiva, situam-se as ponderações de Gatti em relação à apropriação de regras na prática de pesquisa. No exercício da pesquisa certas orientações e regras existem e são úteis e necessárias como referentes de validação e plausibilidade das análises. Mas se não forem apropriadas e integradas pelo pesquisador em suas formas de pensar e agir, num certo conjunto lógico-vivencial, num estado de espírito que leva a um certo tipo de olhar, de perspectiva ante os eventos, estas orientações e regras se tornam estéreis, porque mecânicas: levam tão somente à repetição, à imitação e não à apreensão criativa e consistente do entrelaçamento de fatos e dados em seus significados (GATTI, 2010, p.11) A criatividade, a reflexão e a dinamicidade necessárias à prática da indagação permitem compreender que pesquisar é também teorizar, realizando conexões com o objeto inquirido, num movimento contínuo, abrindo possibilidades, superando limitações e criando outras, no enfrentamento de dificuldades que surgem no processo. Dentre os desafios do conhecimento em educação a questão metodológica é um deles, uma vez que muitos são os obstáculos que emergem especialmente na possibilidade de apropriação mecânica de métodos consagrados historicamente como, por exemplo, o materialismo histórico. Sem uma atenção com o contexto, com a criatividade, 127 com os esforços empreendidos na constituição de um método, sem uma preocupação com o processo de teorização. A apreensão criativa e consistente do entrelaçamento de fatos e dados em seus significados. Isto só é possível pela apropriação transformadora, personalizada, das regras, formas de trabalho e orientações já formalizadas. Ou seja, o método de trabalho precisa ser vivenciado em toda a sua extensão, pela experiência continuada, pelas trocas, pelos tropeços, pelas críticas, pela sua integração mediada pelo próprio modo de ser do pesquisador enquanto pessoa. (GATTI, 2010, p. 11) A exigência de fundamentação supõe a apropriação, por parte do pesquisador, de um conjunto de princípios essenciais, precedentes, com os quais e a partir dos quais ele dialoga e elabora conhecimento. Isso significa que, mesmo que garantida a inventividade, há certa determinação constituída por uma forte influência da abordagem que orienta a análise. Nesse sentido, é possível perceber, por exemplo, que buscar a significação de algo, como atribuição de um sujeito, não é o mesmo que entender que essa significação consiste em um construto social mediado por um processo contraditório. Sendo assim, a própria abordagem contribui significativamente para a escolha do tema a ser estudado, a sua problematização, fundamental na elaboração do problema e análise que se fará dele. Olhando dessa foram, já se nota a presença do processo limitador do conhecimento, na delimitação do tema a ser estudado, na teoria que orienta esse estudo e a possibilidade de interpretações abertas no contato do sujeito que a inspeciona, nas estratégias de coleta de vestígios e nos próprios conhecimentos elaborados. A respeito das teses analisadas foi possível perceber que alguns autores nomeiam diretamente a concepção teórica que serve de base para o método por eles colocado em prática. Essa indicação é feita de diferentes modos desde a forma mais simples e direta, como o faz Barão (2008, p. 18) a respeito de sua tese quando afirma que “na abordagem teórico-metodológica teve-se como referência o materialismo histórico- dialético”, à mais elaborada, no sentido de justificar, de imediato, no texto essa escolha, como a de Coutinho (2013) que justifica a escolha do materialismo histórico-dialético como uma necessidade do pesquisador que tem a pretensão de que seus estudos, de algum modo, provoquem mudanças na prática social. A autora ainda menciona Marx quanto à compreensão de que na pesquisa o ponto de partida é também ponto de chegada, e no que concerne ao entendimento de que “o conhecimento é expressão da realidade concreta 128 vivenciada pelos homens não se confundindo, desse modo, com a própria realidade sendo, portanto, mais adequado quanto mais conseguir se aproximar desta”. (COUTINHO, 2013, p. 16) As justificativas de escolha nas teses, inclusive nas que se declaram materialistas históricas dialéticas, apresentam-se muito mais fundadas em necessidades e aspectos políticos, sociais e até estéticos, deixando de lado as necessidades epistemológicas. Uma exceção pode ser considerada a tese de Ghedin (2004) que dirige suas críticas à metodologia do ensino de filosofia no nível médio e identifica a sua tese como de “caráter epistemológico” A questão do ponto de partida e de chegada, inerente a qualquer processo de conhecimento, mencionada por Coutinho (2013) é discutida por Gamboa (2013, p.33), o qual entende que o caminho traçado pela lógica dialética perfaz o seguinte percurso. O processo traça um caminho de ida e de volta das respostas ou saberes já dados ou encontrados sobre esse fenômeno ou objeto (ponto de partida) à pergunta (ponto de chegada) e desta a uma nova resposta ou fase mais desenvolvida, formando um espiral progressivo da construção histórica do conhecimento sobre esse determinado fenômeno, objeto, realidade ou problema. A nova resposta será constituída como um novo ponto de partida para novos processos de negação e afirmação. A esse respeito, entendo que o que Gamboa identifica como respostas são informações que interpretadas pelo pesquisador dão forma à análise. Embora o problema seja colocado em forma de pergunta a ele não se imprime a necessidade de respondê-lo, porém de discuti-lo, problematizá-lo, examiná-lo, entendê-lo. Além disso, se o ponto de partida é o de chegada, há de se ter um caminho de ida e de volta, mas nem todas as teses subsidiadas na dialética materialista histórica, demonstram clareza em relação a esse percurso que Gamboa apresenta como logicamente necessário na dialética. Na perspectiva de nomear a concepção teórica que serve de base para os seus métodos de pesquisa os autores das teses apresentam uma diferença bastante significativa, considerando os dois orientadores. Das treze (13) teses orientadas por Saviani, cinco (5) não mencionam diretamente o método materialista histórico-dialético como o seu método de análise (38,46%), porém, sobre a aproximação dos autores com esse método, várias são as pistas deixadas pelos autores, seja com relação às categorias de análise dialéticas com base em Marx e ou em Gramsci, buscando enfatizar as contradições emergentes no 129 âmbito da pesquisa e frisar as mediações, seja em relação às referência e a forma como são usadas. Essas teses são ricas em citações de autores considerados marxistas como Guadêncio Frigotto, Dermeval Saviani, Jamil Cury e Karel Kosik, por exemplo. As exceções são a tese de Nunes (2002, p.12) que fala da contribuição da dialética hegeliana para a práxis educativa e se propõe a expor “a imanência educativa que emerge da dialética hegeliana”, sua aproximação é com a dialética de Hegel, e a de Carvalho (2010) que usa o método da história comparada que, segundo Barros39 (2007, p.9), consiste em uma complexa modalidade historiográfica, “já que se refere tanto a um ‘modo específico de observar a história’ como à escolha de um ‘campo de observação’ específico – mais propriamente falando, uma espécie de ‘duplo campo de observação’, ou mesmo um ‘múltiplo campo de observação”. Conforme esse autor a História comparada quer saber o que observar e como observar. No que diz respeito as doze (12) teses orientadas por Severino, apenas três (3) fazem alguma referência mais direta sobre os métodos de pesquisa usados (25%). Pansarelli (2010, p. 27) informa que o que possibilitou o seu método foi “uma postura marcada pela hermenêutica filosófica, pela defesa incondicional da interpretação contextualizada e autônoma das obras – postura certamente influenciada por Ricoeur, Levinas e outros, mas também pelo próprio Dussel”. Autores esses, reconhecidamente próximos a uma hermenêutica fenomenológica que, no que concerne a Dussel, de acordo com o próprio Pansarelli, consiste em uma fase que Dussel ultrapassa ao pensar e propor a filosofia da libertação. 39 Cf . BARROS, José D’Assunção. História Comparada – Da Contribuição de Marc Bloch à Constituição de um Moderno Campo Historiográfico. In: Revista História Social. Campinas-SP nº 13, 2007. Barros explica que a comparação se impõe como método. “Trata-se de iluminar um objeto ou situação a partir de outro, mais conhecido, de modo que o espírito que aprofunda esta prática comparativa dispõe-se a fazer analogias, a identificar semelhanças e diferenças entre duas realidades, a perceber variações de um mesmo modelo. Por vezes, será possível ainda a prática da ‘iluminação recíproca’, um pouco mais sofisticada, que se dispõe a confrontar dois objetos ou realidades ainda não conhecidos de modo a que os traços fundamentais de um ponham em relevo os aspectos do outro, dando a perceber as ausências de elementos em um e outro, as variações de intensidade relativas à mútua presença de algum elemento em comum. Será por fim possível, se o que se observa são dois objetos ou realidades dinâmicas em transformação, verificar como os elementos identificados através da comparação vão variando em alguma direção mais específica – de modo que se possa identificar um certo padrão de transformações no decurso de um tempo – e, mais ainda, se temos duas realidades contíguas, como uma influencia a outra, e como as duas a partir da relação recíproca terminam por se transformar mutuamente” (BARROS, 2007, p.10-11). 130 De qualquer modo, é preciso considerar as relações entre fenomenologia e dialética, assim como as particularidades do método fenomenológico, pois a primeira abordagem não ignora a presença da dialética na estrutura do fenômeno e realiza um esforço no sentido de descrevê-la. Rezende (1990, p.38) afirma que para a fenomenologia a dialética não é unidimensional, mas “polissêmica, incompatível com todas as formas de dogmatismo.” O método fenomenológico caracteriza-se pela descrição, compreensão e discursividade, por isso, com base em Rezende (1990), posso afirmar que em termos de pesquisas educacionais ele se realiza em três momentos: A contatação da realidade; a interpretação das informações constatadas e devidamente descritas; e a indicação de possíveis alternativas. Sobre a indicação de Pansarelli, é importante considerar que Dussel, o autor estudado por ele, aproxima-se significativamente da dialética e que existe uma possibilidade de aproximação entre a dialética e a hermenêutica, como bem pontua Minayo. A hermenêutica realiza o entendimento dos textos, dos fatos históricos, da cotidianeidade e da realidade na qual ocorrem, e suas limitações podem ser fortemente compensadas pelas propostas do método dialético. A dialética, por sua vez, ao sublinhar o dissenso, a mudança e os macroprocessos, pode ser fartamente beneficiada pelo movimento hermenêutico que enfatiza o acordo e a importância da cotidianeidade. Desta forma, busco concluir que, enquanto a práxis hermenêutica, assentada no presente, penetra no sentido do passado, da tradição, do outro, do diferente, buscando alcançar o sentido das mais diversas formas de texto, a dialética se dirige contra o seu tempo. Enfatiza a diferença, o contraste, o dissenso e a ruptura do sentido. (MINAYO, 2014, p.19) No entanto, a aproximação de Dussel em relação à dialética ocorreu em função da análise 40 que esse autor realizou do pensamento europeu nitidamente influenciado pela dialética hegeliana. Ao frisar a essencialidade dos elementos naturais e sociais da educação como referência empírica e do seu caráter prático como qualidade humana, Severino (2001, p. 40 Essa análise de Dussel foi fundamental para a proposição da analética que longe de ser uma negação da dialética é uma espécie de complementação em que a dialética é assumida, porém com a perspectiva de reconhecimento do outro como alteridade. 131 18) afirma que “uma abordagem científica de cunho puramente fenomenista ou fenomenológico, sem o suporte de uma abordagem dialética, perderia toda a sua consistência”. Essa compreensão de Severino aproxima-se do entendimento de Rezende no que diz respeito às possibilidades de dialéticas realizadas pela fenomenologia. Isso constitui um indício das diferentes formas que o suporte de uma abordagem dialética pode assumir na prática da pesquisa. Nesse sentido, apesar dos princípios serem os mesmos, são bastante diferentes as formas dessa abordagem nas teses de Loureiro (2008) que menciona que a sua tese se filia à teoria crítica do currículo e inclui em suas referências autores como Apple, Jamil Cury e Saviani, de Roberto (2014), que coloca Marx, Gramsci, Manacorda e Mézaros em suas referências, e a de Pereira (2014) que busca a contribuição de Karel Kosik, Marx, Peter Mclaren e Álvaro Vieira Pinto, que são teses que trazem indícios de proximidade com o materialismo histórico e dialético, como indicam as referências usadas pelos autores. Em relação à principal referência do materialismo histórico dialético, isto é, Karl Marx, apenas três (3) orientandos de Saviani não o incluem em suas referências, enquanto sete (7) orientandos de Severino não trazem esse autor em suas referências. Outro fator interessante é que duas teses orientadas pelo professor Saviani não apresentam indícios do materialismo histórico dialético, enquanto que as teses orientadas pelo professor Severino são bem mais flexíveis, diversificadas quanto à fundamentação teórica e metodológica. Essa diversificação ficou bastante clara quando comparei as teses de Pansarelli (2010) com fundamentação teórica da hermenêutica, a de Roberto (2014), que se orientou pelos princípios dialéticos e a de Loyola (2008). A análise de Loyola (2008, p. 13) sustenta-se nos conceitos elaborados principalmente por Nietzsche, Foucault e Deleuze, para investigar “até que ponto a instrumentalização e o comodismo do pensar têm afastado a possibilidade da autonomia e da criatividade para o pensar e o agir”. A respeito desta última tese é possível contar com as análises de seu próprio orientador sobre a experiência brasileira filosófica na atualidade. Nessas análises 132 Severino (www.hottopos.com/convenit3/severin.htm) 41 identificou uma vertente designada por ele como arqueologia. Severino menciona a arqueologia foucaultiana e a genealogia nietzschiana como os fundamentos epistemológicos e axiológicos, respectivamente, em que se sustenta essa tendência. Desse modo, pode-se, então, dizer que o método de Loyola é o arqueológico? É possível que essa diversificação tenha uma influência remota, porém que se propaga através do tempo e que diz respeito às dissemelhanças entre esses dois professores. Nesse sentido, é preciso considerar o curso de filosofia do qual Severino participou em nível de graduação, sobretudo, no que diz respeito a sua abertura às ciências naturais e humanas e a garantia do contato com as diversas tendências filosóficas contemporâneas, o que pode consistir uma influência nessa postura, mais aberta, por parte de Severino, assim como na compreensão que ele tem da necessária interdisciplinaridade na elaboração do conhecimento sobre educação. Muito embora, este termo seja comumente usado para referir um diálogo entre as diferentes ciências e não propriamente entre as diferentes filosofias. Das dificuldades teóricas que algum trabalho possa apresentar, é preciso considerar que as teorias, independente de suas especificidades científicas e filosóficas, não são elaboradas de imediato. Esse é um processo que requer anos de dedicação. De modo que cada filosofia requer uma vida de estudos de um filósofo e a ela ultrapassa e se fertiliza com outros trabalhos intelectuais e se transforma. Apropriar-se de uma filosofia com a perspectiva de ir além dela, de não apenas repetir o que determinado filósofo disse, mas de pensar com ele e a partir dele, não é algo simples, muito menos imediato, por isso o respaldo que se tem na pessoa do orientador. Evidentemente que não se pode responsabilizá-lo pela produção e pela falta de domínio teórico de seus orientandos, mas se a dialética materialista deve ser considerada uma postura, levando em conta a experiência do orientador como pesquisador, é possível inferir sobre a sua capacidade de um olhar mais aguçado sobre as produções de seus orientandos das quais pelo processo de orientação, torna-se coautor. No que diz respeito aos orientandos, há a possibilidade dessa postura ainda não estar consolidada, o que tenderá a conduzir apenas ao cumprimento de uma formalidade, de uma exigência acadêmica, implicando no problema mencionado por Gatti 41 O documento não indica a data de publicação, por isso optei por mencionar diretamente no texto o endereço eletrônico onde o localizei. 133 (2002) que é a falta de domínio dos fundamentos do método empregado para análise o que, consequentemente, repercute em interpretações empobrecidas. Seja como for, o perigo de incorrer nessas limitações diminui em decorrência do esforço do discente, do olhar atento dos orientadores e das críticas que ele recebe nas apresentações do projeto de pesquisa em vários momentos do seu processo de estudo, sobretudo, no momento de qualificação da tese. 4.2 RELAÇÕES ENTRE CATEGORIAS DA DIALÉTICA NO PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO: TOTALIDADE E CONTRADIÇÃO. Em seu percurso histórico a filosofia tem buscado o sentido de totalidade. As inquietações epistemológicas dos filósofos conduziram estes estudiosos à investigação de tudo que existe. No geral, nelas transparecem a necessidade e o desejo de compreender o todo e a sua constituição e importância para o conhecimento e existência humana, de tal modo que ao problematizar o mundo, o ser humano e suas ações, a totalidade pode se constituir uma categoria de análise. Mas, o que pode ser e quem põe tal categoria? Diversas são as interpretações sobre essa questão e conduzem a diferentes concepções, por isso é preciso compreender os princípios que fundam cada concepção. Neste estudo, privilegiei não a compreensão de um todo como algo dado, acabado, mas enquanto uma totalidade em processo, sendo assim a atenção ficou centralizada na filosofia dialética e considerou, principalmente, as contribuições de Hegel e de Marx para entender o sentido da totalidade e sua importância para o conhecimento. Afinal, nessa filosofia a totalidade consiste em uma categoria central, a partir da qual a análise se realiza. Na interpretação de Wolfgang Röd os escritos teológicos de juventude de Hegel já contêm elementos do pensamento dialético. De modo que a noção de totalidade pode ser notada, como é possível perceber, na proposição de que a “unidade do humano e do divino, que está no centro da doutrina cristã, segundo a concepção de Hegel, é o absolutamente verdadeiro, aquele verdadeiro que será chamado na Fenomenologia do Espírito, de totalidade” (RÖD, 1884, p.125). Ainda na interpretação desse autor, para Hegel, pensar a totalidade exige incluir também o sujeito. “Ao mesmo tempo, porém, a totalidade absoluta deve ser igualmente objeto do pensamento e diferente do pensante. A captação da unidade do pensante e da totalidade absoluta pensada é a tarefa atribuída ao pensar dialético.” (RÖD, 1884, p.126). 134 Na lógica dialética hegeliana, a negação é condição imprescindível à positividade e a experiência consiste em um movimento dialético. “Esse movimento dialético que a consciência realiza em si mesma, tanto no seu saber como no seu objeto, enquanto, a partir dele, o novo objeto verdadeiro surge para a consciência mesma, é chamado propriamente experiência” (HEGEL, 1992 p. 235). É por esse movimento que o pensamento logra reconstituir e explicitar a realidade em sua totalidade. Para o idealismo hegeliano, o mundo da experiência é limitado e diferente, e não pode ser concebido por meio de uma lógica que considera um ser idêntico a si mesmo, excluindo, pois o seu contrário. Uma lógica onde a negação não pode gerar a positividade significa a impossibilidade de superar a limitação. Por isso, é tão importante para Hegel o conceito de vir-a-ser absoluto, posto que é ele que explica a racionalidade absoluta da realidade da experiência, onde os opostos se geram mutuamente e a razão alcança um poder ilimitado no processo do conhecimento. Hegel dirige o seu pensamento ao encontro com a verdade que se estabelece numa unidade de opostos constituída no confronto entre o conceito, subjetividade, e a realidade, objetividade. Vencer essa oposição é para Hegel atingir a infinitude do finito em busca de uma identidade superior, expressa na própria superação da separação. No entanto, a separação é característica de toda realidade finita (SOARES, 2012). Sendo assim, Hegel dirá que “o desenvolvimento infinito do intelecto tem como própria constituição a de ser a alternação das determinações, isto é, unidade e separação são elas mesmas inseparáveis.” (HEGEL, 1982, § 149)42 Poder afirmar dialeticamente a existência da separação, mediante o seu oposto, a união, significa que pensar na possibilidade de que tudo se relaciona, é confrontar a probabilidade do seu oposto, de que tudo se separa. E isso não consiste um erro lógico, mas tão somente duas possibilidades diferentes, que indicam a importância de se perguntar em que medida se dá cada uma delas em determinado contexto e o que de fato é superado nesse confronto. Mas, a preocupação de Hegel está tão-somente em superar a finitude em função de uma identidade superior. Tal postura apresenta indícios dos limites da dialética hegeliana, uma vez que tudo que é ideal tende a ser tomado como único determinante histórico. 42 Na tradução em espanhol utilizada as páginas não são numeradas, somente os parágrafos. O trecho citado foi traduzido por mim para o português. 135 No prefácio da segunda edição da Ciência da Lógica, Hegel (1982) menciona a sua compreensão de que as categorias lógicas e matemáticas têm um caráter abrangente e universal e, por isso, se apresentam como abreviaturas da realidade. Portanto, devem ser aplicadas na vida cotidiana. Para esse filósofo, categorias como, por exemplo, “um todo e suas partes”, “um objeto e suas características” proporcionam relações do pensamento mais elevadas. Além disso, o estudo sobre a natureza, devido à realidade em que se matêm seus objetos, impõe a necessidade de fixar aquelas categorias que já não podem ser ignoradas, ainda que apresentem maior inconsistência em relação às outras categorias. Hegel entende que, apesar disso, devem ser consideradas válidas. De todo modo, no idealismo desse filósofo as categorias apresentam caráter objetivo, na medida em que surgem do desenvolvimento histórico e social e, portanto, não dependem do sujeito. Nos dois exemplos mencionados acima, há indicativo da categoria da totalidade, cuja importância para o processo do conhecimento também vem à tona quando na compreensão de Hegel (1992, p. 199), “o verdadeiro é o todo. Mas o todo é somente a essência que atinge a completude por meio do seu desenvolvimento. Deve-se dizer do Absoluto que ele é essencialmente resultado e que é o que na verdade é, apenas no fim”. A união do ser e do pensar, que constitui o Absoluto, consiste em uma unidade dos opostos cuja contradição garante a constância do devir. Hegel indica uma totalidade em aberto, processual, em constante vir-a-ser. Porém, essa totalidade permanece no plano conceitual. As relações contraditórias que importam são as do conceito, pois a experiência sensível depende dele, uma vez que os objetos sensoriais transcorrem no tempo e no espaço, o que equivale dizer que toda experiência desse tipo se realiza nesse âmbito. Assim, essa experiência depende desses conceitos para entender e explicitar, por exemplo, a fugacidade com que os objetos sensoriais se mostram e, ao mesmo tempo, a multiplicidade das determinações que os modelam. É importante destacar que falar de uma totalidade em aberto significa reconhecer o dinamismo da realidade, mantido pelas contradições. De maneira que apesar das diferenças entre Hegel e Marx, todo esforço da dialética nesses dois autores, volta-se às contradições entre as partes e o todo. Ambos consideram a necessidade de uma investigação capaz de transpor a fragmentação com que se apresentam os elementos da realidade no cotidiano. É necessário buscar por uma compreensão mais profunda da realidade, pois só assim é possível atingir o caráter essencial das coisas. É justamente 136 nessa procura que as categorias da dialética têm papel fundamental, e a totalidade representa uma delas. Mas a compreensão que se tem da totalidade não é uníssona. Nesse sentido, Kosik (1976) distingue dois grupos: os que entendem a totalidade concreta como um todo estruturado, dinâmico e autocriativo e os que pensam que ela consiste em um conjunto de todos os fenômenos e fatos. Para este segundo grupo a tese da concreticidade ou da totalidade é considerada uma mística, em função da impossibilidade do conhecimento humano abarcar todos os fatos, uma vez que sempre é possível acrescentar tanto novos aspectos como novos fatos. Mas, o sentido da totalidade não se refere a todos os fatos, pois “Totalidade significa: realidade como um todo estruturado, dialético, no qual ou do qual um fato qualquer (classes de fatos, conjuntos de fatos) pode vir a ser racionalmente compreendido” (KOSIK, 1976, p.43-44). Isso não significa dizer, necessariamente, completamente explicitado. Além disso, estar atento ao fato de que, em uma interpretação dialética, os dois grupos mencionados por Kosik não se excluem. A possibilidade considerada nessa concepção é a de superação. Esse autor menciona a tridimensionalidade de sentidos que a totalidade concreta assume nessa concepção. Na filosofia materialista a categoria da totalidade concreta é sobretudo e em primeiro lugar a resposta à pergunta: o que é a realidade? e só em segundo lugar, e em consequência da solução materialista à primeira questão, ela é e pode ser um princípio epistemológico e uma exigência metodológica (KOSIK, p. 1976, p. 42). A inquietação hegeliana em relação ao ser, evidentemente não é abandonada por Marx, mas redirecionada. Contudo, penso que a pergunta pelo ser, colocada desta forma, constitui uma pergunta nos moldes metafísicos, pois difere da inquirição sobre o que pode ser, ainda que Marx aponte uma espécie de herança genética como composição estrutural da realidade. O que poderá ser, então, a essência que define o ser? O imutável, como orienta a metafísica, por isso se fala em essência e aparência, e em um movimento que ocorre na superfície do fenômeno. Mas, se o ser se dá na relação sustentada pela contradição ele não seria puro devir? A pergunta mais apropriada para falar de um ser em movimento, que é pura possibilidade não seria então: o que pode ser a realidade? No que se refere à totalidade como categoria de análise Frigotto (1997) menciona uma confusão que se faz a respeito da necessidade de relacionar a parte com o todo e vice-versa com a ideia de um método capaz de captar todas as contradições e todas 137 as mediações. Isso significa “ignorar o caráter relativo, parcial, provisório, de todo o conhecimento histórico, e que o conhecimento científico não busca todas as suas determinações, as leis que estruturam um determinado fenômeno social, senão as que buscam as suas determinações e leis fundamentais” (FRIGOTTO, 1997, p. 81). Ainda assim, não deixa de ser uma limitação embora possa ser explicada e justificada. A pretensão da dialética da totalidade concreta em conhecer ingenuamente todos os aspectos da realidade, sem exceções, é negada por Kosik (1987, p.44) ao explicar que se trata de “uma teoria da realidade e do conhecimento que dela se tem como realidade. A totalidade concreta não é um método para captar e exaurir todos os aspectos, caracteres, propriedades, relações e processos da realidade; é a teoria da realidade como totalidade concreta”. Nem poderia sê-lo, em função da dinamicidade e da autocriação da realidade. Como apreender um todo que se move continuamente, que está permanentemente aberto a novas determinações? É preciso lembrar que a totalidade concreta consiste em uma resposta sobre o ser da realidade que é, nessa concepção, puro devir, processo que se realiza na trama contraditória das relações. Nesse caso, a totalidade consiste em apenas um momento da realidade histórica, ainda que se pense a concreticidade como essência, que um estudo particular só dá conta precariamente, apesar dos esforços do pesquisador. Além disso, não constitui uma estrutura simples. Essa complexidade já impõe certa dificuldade em sua apreensão, que a totalidade concreta como categoria de análise, ainda que possa ser concebida como princípio epistemológico e como exigência metodológica, não consegue superar. Em que pese a sua eficácia, sua real capacidade epistemológica no processo do conhecimento não permite conhecer todos os aspectos da realidade, não somente porque nenhuma teoria tem essa capacidade, ou seria ingênua a ponto de pensar que isso é possível, como indica Kosik (1976), mas especialmente, devido à lógica dialética desta realidade, ao seu caráter dinâmico, instituído nas relações do objeto do conhecimento que consiste justamente em um conjunto de processos. Além disso, a realidade reúne um conjunto de diversos fatores os quais trazem imanentes a si a pluralidade, a multiplicidade e a complexidade e isso constitui indícios das limitações dessa categoria de análise, apesar do esforço depreendido por cada pesquisador, cujo conhecimento é formado por uma particularidade, embora parta de outros e até os acrescente ao seu. Uma particularidade que pode ser negada dialeticamente em favor de uma socialidade, mas jamais excluída. 138 Por isso, Carvalho (2010, p. 15), fundamentada no materialismo dialético, pode afirmar que “ao buscar vestígios do passado, o pesquisador não lida com os fatos passados, mas com a reconstrução do real, pois os fatos nunca podem ser percebidos em sua totalidade e complexidade contraditória”. Ainda numa perspectiva materialista histórica dialética, ao investigar essa categoria, Konder observa a dificuldade que os estudiosos enfrentam ao se interrogarem sobre se estão fazendo a totalização adequada à situação por eles analisada. Konder (1981, p. 41) explica que esse é um problema sem solução “no plano puramente teórico. Nenhuma teoria pode ser tão boa a ponto de nos evitar erros”. Sobre o princípio de totalidade, tomado como categoria de análise, Ghedin (2004, p.16) parece reconhecer suas limitações ao afirmar que em sua tese “não tem a pretensão e nem a possibilidade de esgotar o conjunto de relações que se estabelecem nesse campo de estudo”. É nesse sentido que a categoria da totalidade não consegue se concretizar. Se isto é óbvio, não significa que se trate de uma afirmação inquestionável, que não se pode e não se deve problematizar. Ao procurar analisar e compreender a trama das contradições que se fazem notar nas relações entre os vários aspectos de um fenômeno e de um fato e entre um fenômeno e outro, um fato e outro, é que se pode perceber que, apesar de importante no processo do conhecimento, de fazer avançar em termos de profundidade e de ampliação o conhecimento que se pode ter da realidade como um todo, totalidade, como categoria de análise, está susceptível a limitações. É essa necessidade de alcançar o todo em que se processa e interagem todos os fenômenos e fatos que indica a limitação dessa categoria, que nem por isso perde a sua importância no processo do conhecimento. Certamente que se um fato constitui um todo formado de partes que se relacionam entre si, que apresenta leis em sua composição, é evidente que estas precisam ser consideradas, articuladas a fim de que se possa ter uma visão de conjunto, isto é, desse fato como um todo e, neste sentido, a categoria da totalidade requer grande investimento metodológico. O princípio metodológico da investigação dialética da realidade social é o ponto de vista da totalidade concreta, que antes de tudo significa que cada fenômeno pode ser compreendido como momento do todo. Um fenômeno social é um fato histórico na medida em que é examinado como momento de um determinado todo; desempenha, portanto, uma função dupla, a única capaz de dele fazer efetivamente um fato histórico: de um lado, definir a si mesmo, e de outro, definir o todo; ser 139 ao mesmo tempo produtor e produto; ser revelador e ao mesmo tempo determinado; ser revelador e ao mesmo tempo decifrar a si mesmo; conquistar o próprio significado autêntico e ao mesmo tempo conferir um sentido a algo mais. (KOSIK, 1976, p.49) Das palavras citadas acima pode-se observar a contradição que constitui o conceito de totalidade como princípio metodológico da investigação dialética. Ao mesmo tempo em que se apresenta como possibilidade de compreensão de um fenômeno, limita- se a apenas um momento de um todo, diante da impossibilidade de exauri-lo, e mesmo esse momento não é esgotado em seus múltiplos aspectos. É importante considerar que a fenomenologia também observa a questão da totalidade, porém reconhece as suas limitações na elaboração do conhecimento. É preciso, pois, considerar o entendimento que essa filosofia tem da totalidade. Nas palavras de Rezende (1990, p.27) “a fenomenologia busca a compreensão, embora com a certeza de nunca a alcançar em seu sentido pleno”. No geral, os autores das teses não se referem às limitações de seus próprios trabalhos. Ghedin (2004, p. 16) é uma das exceções encontradas entre as produções analisadas. Nesse sentido, afirma não ter “nem a pretensão e nem a possibilidade de esgotar o conjunto de relações que se estabelecem neste campo de estudo”. Referindo-se à sua tese Carvalho (2010, p.16) afirma: “Mas sabemos que há limitações aqui, sejam metodológicas, documentais ou mesmo de compreensão dos fundamentos teóricos seguidos”. Do total de 25 teses em apenas 5 (20%) os autores se referem às limitações de seus trabalhos, como nos excertos acima. São eles: Ghedin (2004), Fonseca (2010), Carvalho (2010), Loureiro (2008) e Scalcon (2003). A naturalidade com que as limitações apontadas até aqui, no processo do conhecimento sustentado pela concepção dialética, são assumidas pelos pesquisadores dificulta a compreensão da complexidade com que isso ocorre. É importante observar que a visão do fato como um todo articulado, além da categoria da totalidade, pressupõe outras categorias dentre elas a da contradição, responsável pelo movimento constitutivo do fato, ou realidade, o que indica que as relações mais importantes são as relações de contradição, pois são elas que propiciam as transformações. Note-se também que se a concepção de realidade e de conhecimento está centrada na matéria, as relações entre o ser e o pensamento implicam em que este último 140 procure conceitos, categorias e leis capazes de explicar como se constitui o real concreto e sua essência. Neste caso, os procedimentos na elaboração do conhecimento devem abranger tanto a investigação dos elementos constitutivos do concreto como o estudo do uso adequado de conceitos para compor a estrutura da análise sobre a qual o pesquisador precisa se debruçar. As categorias de análise são apresentadas pelos autores das teses, geralmente acompanhadas de uma justificativa. Com essa perspectiva, Souza (2012, p. 2) elege as categorias “trabalho, educação e questão social” por considerá-las fundamentais para conhecer as estratégias usadas pela burguesia industrial no seu processo de hegemonia, “tendo em vista ser o conflito entre capital e trabalho o cerne da luta que move as relações produtivas capitalistas e, a educação, um dos campos de mediação dessas contradições”. A autora esclarece que, no geral, o conjunto de categorias de análise usadas por ela em seu estudo, foi extraído da obra de Gramsci. Outra tese que buscou a contribuição desse autor foi a desenvolvida por Pinheiro, o qual afirma que dentre as diversas categorias interpretativas elaboradas por Gramsci ele se apropriou de: “movimento orgânico, movimento de conjuntura, movimento das ideias, movimento prático, sociedade política na correlação de forças com a sociedade civil, hegemonia e intelectual orgânico” (PINHEIRO, 2001, p.2). As categorias são necessárias para a compreensão do problema de pesquisa, de modo que Almeida (2001, p. 10), para “compreender o problema da delimitação do público e do privado no processo de transferência de tecnologia da Universidade Pública para as empresas capitalistas”, optou pelas categorias da dialética, totalidade e contradição, além das “de intelectual, de tecnologia, de universidade, de público e de privado”. A definição das categorias no processo de pesquisa é fundamental, mas não é uma operação mental simples, pois além da necessidade de fundamentação teórica elas precisam relacionar-se diretamente com os acontecimentos e fatos históricos e concernentes ao objeto de estudo. Isso significa que existem pelo menos dois tipos de categorias que Kuenzer (1998) define como: as de conteúdo e as metodológicas. As primeiras são recortes particulares, cujos contornos são definidos por meio da apropriação teórico-prática do conteúdo. É justamente em atendimento a essa necessidade metodológica que algumas das categorias selecionadas por mim, para análise nesta tese, são temas, problemas, objetos e métodos. A definição dessas categorias exige 141 que o pesquisador atente para os vestígios encontrados, pois é deles que elas surgem. O segundo tipo diz respeito ao próprio método Sob a orientação da concepção dialética, uma pesquisa e mesmo os textos dela resultantes têm que anunciar essas categorias, porém isso não é suficiente para definir a metodologia. Com esse entendimento Kuenzer indica que isso se dá porque: As categorias correspondem às leis universais, no sentido que permitem investigar qualquer objeto, em qualquer realidade. Mas se essas categorias são universais e concretas, não substituem a investigação e o contato com o conteúdo na contemporaneidade de um objeto tomado na especificidade de sua relação com outros objetos e com a totalidade. (KUENZER, 1998, p. 66) Nota-se, pois que as categorias da dialética como práxis, totalidade, contradição mediação, superação, conteúdo e forma são importantes em uma pesquisa, particularmente quando relacionadas à particularidade do objeto de estudo e a sua situação no tempo e no espaço. Essa relação é, então, a responsável por uma espécie de atualização dessas categorias no processo de elaboração do conhecimento, o que parece implicar a necessidade de contextualização. Então, a contextualização emerge no processo do conhecimento dialético como estratégia de fundamental importância, não só para situar o problema e o elemento histórico enfatizado no materialismo histórico-dialético, mas também para a efetivação do uso adequado das categorias de análise, sobretudo, a da totalidade e a da contradição. Muito embora apresente limitações a categoria da totalidade tem um significativo poder heurístico, sobretudo quando se trata de problemas relacionados à educação. 4.3 A CONTEXTUALIZAÇÃO COMO PERSPECTIVA DE TOTALIZAÇÃO. A contextualização é um item importante em um trabalho de pesquisa, uma vez que consiste em uma estratégia metodológica que possibilita articular tema, problema e objeto de pesquisa, pois esses não flutuam sem rumo no espaço, ao contrário, são elaborados, analisados e compreendidos em um determinado contexto histórico em seus vários aspectos como o epistemológico, o social, o ético, o político e o econômico. De modo que, de imediato, a questão do conceito consiste em um elemento lógico, que dá certa organicidade à situação do objeto no tempo e no espaço e as relações estabelecidas entre ele e outros fenômenos. 142 A ausência dessa estratégia na colocação de um problema dificulta a sua compreensão, posto que se omite as circunstâncias históricas, sociais, políticas e geográficas em que ele surge e se situa e em que se pode compreender o processo em seu conjunto de elementos constitutivos. Logo, é possível que essa estratégia evidencie um esforço no sentido da totalização visada pela dialética, uma vez que a elaboração desse item facilita a discussão dos conflitos internos, das contradições da realidade. Os elementos considerados em um contexto, as relações entre eles e a necessidade de compreendê-las apontam uma ligação lógica entre esse item e a categoria da totalidade. Sendo possível observar que embora diferentes os modos de utilização dessa categoria de análise nas pesquisas, uma forma bastante usual dessa apropriação parece ser a contextualização, sobretudo, em pesquisas historiográficas. No que diz respeito aos interesses epistemológicos deste estudo, de diferentes modos, os autores das teses analisadas privilegiam esse item metodológico em seus textos para falar do tema, do objeto e do problema de seu estudo. Na maioria das vezes ela se concentra na introdução do texto e ou em fragmentos por todo o texto, sobretudo se esse consistir em uma historiografia, mas há teses em que é apresentada em uma seção à parte, exclusiva para ela. Essa forma com que é apresentada, que diz da maior ou menor intensidade com que a contextualização é considerada, pode ser notada, por exemplo, nas teses de Geraldo Ghedin, Ruben Nunes, Celina Murasse e Renato Polli. Ao pensar sobre o ensino de Filosofia, Ghedin (2004, p.13), já na introdução do texto da tese indica que é preciso conhecer a tradição filosófica, “a sua história, sua trajetória, expressões, modos e maneiras de ser” a fim de compreender que o nosso ethos existencial, cultural e epistemológico tem uma gênese e consiste o valor cultural essencial para a educação. Fragmentos do contexto histórico do ensino são resgatados no intuito de situar o principal problema investigado na tese: o do ensino de Filosofia e o seu processo metodológico no âmbito da escola. Na tese de Nunes (2002) a contextualização aparece tanto em fragmentos, em vários momentos do texto como, por exemplo, para situar os fundamentos históricos clássicos da dialética em geral como se torna mais intensa na terceira seção para falar a respeito do lugar da educação na dialética de Hegel, sobretudo, para dizer do contexto histórico e das influências e contraposições ao pensamento deste filósofo. Já na tese de Murasse (2001), ela ganha o espaço de uma seção inteira para apresentar o contexto da sociedade brasileira no século XIX, pois é propícia à retomada, ensejada pela autora, do desenvolvimento do capitalismo e das discussões sobre a 143 necessidade da educação pública. No Brasil, era preciso uma educação pública especialmente técnica, visando à classe trabalhadora. Embora na Inglaterra, na França e em outros países esse tipo de educação não fosse prioridade, a conjuntura mundial era propícia à discussão sobre a necessidade da educação pública. Era intercontinental a concepção de que o progresso material depende da educação. No intuito de discutir sobre a exigência do debate ético na contemporaneidade, Renato Polli, assim como Murasse, dedicou uma seção inteira para apresentar uma reflexão sobre o contexto histórico da globalização neoliberal, avaliar os impactos do neoliberalismo na América Latina e no Brasil e apontar a necessidade e a validade do discurso ético em educação frente aos desafios da contemporaneidade. O item contextual é essencial para o autor lançar elementos a fim de indicar que é possível um debate sobre as relações entre ética e educação, com a perspectiva de que esse debate escape “às estratégias de instrumentalização do atual momento da globalização neoliberal” (POLLI, 2006, p.40). Junto à forma como os autores dispõem a contextualização em suas teses encontra-se a finalidade com que a usam. Nesse sentido, o que aparece de imediato ao leitor é o suprimento da necessidade que o autor teve de situar o tema e o problema de seu estudo. Essa finalidade já consiste em um forte indício da contribuição que esse item metodológico dá à pesquisa, uma vez que facilita a compreensão do problema, seja pela discussão possível das dimensões objetivas, relativas a necessidades e interesses sociais seja em razão de suas dimensões subjetivas, que apresentam um certo desconforto por parte do pesquisador em relação à alguma situação por ele vivida. De qualquer modo, a apropriação do contexto é fundamental para situar o fenômeno estudado no tempo, a fim de compreender a forma como evoluiu historicamente, que contradições provocou e ou sofreu, e por quais transformações passou. É justamente essa possibilidade que coloca em evidência que para além dessa finalidade, esse item pode contribuir para o cumprimento de uma exigência metodológica da filosofia dialética nos métodos que a tomam como fundamento, posto que o contexto compreendido dialeticamente consiste nas condições concretas que, para o materialismo constituem condições objetivas que auxiliam a construção do objeto epistemológico. Em relação à finalidade, com que os autores a utilizam, pode-se situar uma variedade de finalidades, que se diferenciam no cerne das pesquisas em educação. 144 Com um trabalho preocupado em analisar, especialmente, a expansão da oferta de ensino público primário na província, Estado e Município, e algumas práticas instrucionais implementadas pelo Estado paraibano, no que se refere ao funcionamento das cadeiras isoladas, o elemento contextual é utilizado por Pinheiro (2001) para situar as contradições surgidas no período educacional por ele analisado e chamado de Era das Cadeiras Isoladas e Era dos Grupos Escolares, analisar o processo de transição e ou coexistência de um modelo de organização escolar para outro e as políticas educacionais no contexto da segunda fase da Era dos Grupos Escolares. Em seus estudos doutorais, Enzo Roberto (2014) frisa a importância da formação do cidadão participativo e menciona que a educação básica, em particular no ensino médio, não deve se eximir do dever para com uma formação cidadã. O autor considera que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (LDB nº 9.394/96) demonstra uma atenção para com a preocupação da formação humana integral para a cidadania, contudo não dá a atenção necessária à educação profissional tratando-a resumidamente e, assim, abrindo espaço para o Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997, notadamente uma expressão da política neoliberal para a educação profissional apartada do ensino médio. Na visão do autor, essa situação muda a partir de três marcos, quais sejam: a alteração da concepção de educação profissional para o ensino médio propiciada pela nova regulamentação da educação profissional instituída pelo Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004; a ampliação do número de escolas técnicas em 214 novos campi foram criados, efetivada pelo programa de expansão da rede federal de educação profissional e tecnológica e garantida pela Lei nº 11.195, de 18 de novembro de 2005; e a transformação dos Centros Federais de Educação Tecnológica em Institutos Federais semelhantes às universidades. O próprio autor declara o quanto a contextualização é importante para situar o seu problema de pesquisa. Esse é um elemento interessante que põe em evidência as ligações da contextualização com a necessidade de cumprimento do princípio de totalidade, por meio deste transformado em categoria de análise é a frequência com que a gênese do fenômeno é buscada. A tese de Ivetti Magnani (2000) apresenta a trajetória histórica do ensino brasileiro e, nessa, atribuiu atenção especial ao formato institucional desse ensino e às funções de ensino, pesquisa e extensão, destacando o projeto neoliberal no que diz respeito às esferas política, econômica e educacional e, nesse contexto, situa o formato 145 institucional assumido pela educação superior, especialmente na década de 1980, os diferentes tipos de instituição responsáveis por essa educação e os prejuízos a ela causados na forma da legislação que determina que as universidades devem cumprir o princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, enquanto os centros universitários, tipo de instituição de ensino superior surgida juridicamente na década de 1980, ficam desobrigados da aquiescência a esse princípio. No que diz respeito aos outros tipos de instituições de ensino superior, a autora apontou a ausência de previsões sobre as atribuições que devem ser por elas efetivadas. Essa situação, assegurada pela legislação, define uma nova organização do espaço social da educação e marca a sua despolitização. Para pensar a institucionalização da formação em filosofia, em universidades nordestinas, Maria Dulcinea Loureiro não dispensa a contextualização para situar a criação da Universidade no Brasil. Assim, para compreender o tema em suas raízes históricas, Loureiro (2008) menciona as transformações ocorridas na sociedade brasileira no momento dessa criação, desde a substituição das importações, a crescente intervenção do Estado, implicando em um maior desenvolvimento da industrialização no Brasil e o confronto das políticas educacionais liberal e autoritária e finalmente a promulgação em 1931, do Estatuto das Universidades Brasileiras. Ao observar as formas e as finalidades com que os autores usam a contextualização, foi possível notar a importância que ela assume em cada texto e, em especial, como esforço para compreender o todo em que o objeto e o problema estão situados. O todo precisa dos acontecimentos empíricos e de sua situação histórica para ser compreendido. A esse respeito, Gamboa explica: O todo resulta do processo de articulação entre os dados objetivos e a interpretação do sujeito. O conceito de produção do objeto se torna mais claro, pois em tese não existem objetos, existem realidades empíricas que o sujeito percebe. [...]. O resultado dessa relação não é igual ao fenômeno empírico observado, não é uma simples cópia ou imagem lida ou percebida pelo sujeito. O resultado é uma síntese dessa relação, é uma construção que podemos chamar de objeto. [...] tanto o sujeito quanto os objetos se constroem e se transformam. (GAMBOA, 2012, p.141) A contextualização é essencial, uma vez que esse processo de dupla transformação indicado na citação acima e a sua compreensão pelo pesquisador, assim como a própria construção do objeto que, por sua vez, sofre influências do contexto em suas múltiplas dimensões, posto que é feita mediante condições materiais e históricas, ou 146 seja, tudo isso ocorre em um tempo histórico e em um espaço geográfico que abrigam múltiplas relações interiores e exteriores a eles e que precisam ser consideradas. Por isso, penso que a contextualização consiste em uma estratégia metodológica em busca da realização da totalidade como categoria de análise, nas pesquisas fundamentadas na dialética. No trabalho de Ronalda Barrreto Silva essa importância é visível desde a hipótese por ela levantada que se constrói a partir da compreensão de que no Estado sob o modelo de Bem-Estar, a Campanha Nacional de Escolas da Comunidade - CNEC era uma extensão sua no que diz respeito à oferta da educação. Porém, quando o Estado muda e “se explicita privatista, a CNEC necessita, então, adequar-se às leis do mercado, assumindo-se como empresa privada, ainda que possuindo especificidade no auferimento de lucros” (SILVA, 2001, p.23). Outros indicativos dessa importância são notados nas proposições das seções como, por exemplo, a de analisar o terceiro setor na sociedade, as novas tendências da privatização da educação brasileira contemporânea, a trajetória histórica e as transformações sofridas pela CNEC, desde a sua origem, em 1943, até o ano de 1985. Na tese de Souza (2012), a relevância desse item se torna evidente em função de seu interesse pela Confederação Nacional da Indústria. E foi trabalhado pela autora de acordo com os diferentes momentos do desenvolvimento do pensamento da burguesia industrial: a contribuição dos renovadores ao projeto industrialista; à consolidação da hegemonia burguesa sob o governo de Vargas; o fim do Estado Novo e o reordenamento do bloco de poder; a internacionalização do projeto industrialista; a crise do capitalismo nos países centrais; e a direção burguesa no processo de reestruturação produtiva, iniciado no Brasil na década de 1990. A autora expõe algumas contradições expressas no contexto social e conclui que para além delas “é na compreensão do real em sua totalidade, nas relações de forças entre as classes ou frações de classes, que encontramos as chaves para compreender a dinâmica desta sociedade e os caminhos para sua superação.” (SOUZA, 2012, p. 294- 295) A contextualização é essencial para a tese de Almeida (2001), em consequência de sua inquietação epistemológica para com as relações entre o privado e o público e sua produção de conhecimento. Especialmente, pelo fato da autora realizar um esforço para revelar as transformações históricas mais substanciais ocorridas nas últimas décadas que antecedem a década de 2000 e em decorrência da necessidade de entender 147 os princípios que norteiam os nexos entre a Universidade Estadual de Campinas e as forças econômicas e políticas em atuação nesse período. Almeida (2001, p. 9) frisou a importância da categoria de totalidade, como uma das mais profícuas da dialética hegeliana e marxista, “para as análises dos fenômenos sociais. Ela nos permite uma visão mais ampla da relação do local e ou do individual com o global”. Então, pensar a realidade como totalidade concreta e a totalidade como categoria de análise nos termos já mencionados no item anterior e agora nas palavras de Almeida, levou-me a compreender a questão da contextualização, como uma estratégia metodológica propícia ao esforço pelo atendimento à necessidade de se ter uma visão de conjunto dos fenômenos, assim como das relações entre os fenômenos e entre os aspectos de um mesmo fenômeno, sobretudo no que se refere às contradições, uma vez que esse artifício possibilita não somente a recuperação dos contextos como a recuperação dos processos de transformação e evolução dos fenômenos. Com a convicção de que a compreensão da Filosofia da Libertação passa pela questão conceitual e histórica, pelo anúncio da modernidade como era da razão, à mesma época da colonização da América Latina, ou seja, de que é preciso considerar a herança deixada pelo Iluminismo, e o interesse ou não a respeito da presença de Enrique Dussel e Paulo Freire por parte de pesquisadores e professores responsáveis pela formação, especialmente em cursos de Pedagogia, Pereira (2014) centrou o seu estudo no atual contexto brasileiro, tornando explícita a sua importância para a pesquisa. A contextualização é utilizada também para indicar a produção filosófica e educacional de um ou mais autores em um país ou mesmo em um continente. Assim, é usada por Regina Zanatta para falar da importância de Jonathas Serrano para a educação brasileira. Na tese desta autora, o principal objetivo já indica a relevância do referido item nesse estudo, posto que se trata, segundo Zanatta (2005, p. 180), de “acompanhar a trajetória de Jonathas Serrano no sentido de identificar a construção dos seus ideais educacionais, os quais lhe deram a base teórica para sua participação nas reformas que marcaram as primeiras três décadas do século XX.” Com a compreensão de que analisar a produção de um autor requer examinar cuidadosamente aspectos relacionados ao lapso temporal em que as suas obras foram publicadas e dedicar atenção especial às referências bibliográficas utilizadas por ele, assim como a todo e qualquer aspecto que facilite a compreensão de sua contribuição teórica e do percurso histórico traçado por ele, Gilcilene Barão (2008) deixa transparecer 148 a necessidade de situar a realidade brasileira e mostrar a evolução da trajetória de Florestan Fernandes, especialmente o contexto, e conteúdo e a história, além dos apontamentos relativos ao desenvolvimentismo e aos aspectos da política educacional, a fim de localizar a “recuperação da categoria revolução e da dinâmica das ideias pedagógicas, nas décadas de 1950 e 1960”. (BARÃO, 2008, p. 20) As questões relativas à reorganização das relações internacionais, que implicam na união dos países tidos como economicamente em desenvolvimento, a fim de fazer frente ao bloco constituído pelos países em melhor situação econômica no mundo, são tratadas por Daniel Pansarelli, a fim de situar nesse contexto, a reconfiguração da realidade política em nível internacional e a ressignificação de valores bem além daqueles exclusivamente políticos e econômicos, ensejando de acordo com o autor “um movimento de libertação cultural” que exige uma “ressignificação profunda da epistemologia” (PANSARELLI, 2010, p. 21). Essas questões são tomadas por esse autor para indicar que há na realidade prática latino-americana um ethos fundado na libertação, que “a produção intelectual, teórica em geral e filosófica em particular, por sua vez, parece não acompanhar o ritmo” (Idem, p.22). Nos estudos de Pansarelli, com uma perspectiva hermenêutica, que não abre mão da história, o contexto é importante para indicar a produção filosófica de Enrique Dussel, como uma construção autenticamente latino-americana, mas também para compreendê-la e interpretá-la. Em alguns estudos a contextualização está sob a forma de historiografia que pretende dar conta dos trabalhos que analisam as questões referentes ao tema. É desse modo que se apresenta e se faz importante nas teses de Horn (2002), e Vieira (2010). Considerando, que a pesquisa de Horn tem entre seus objetivos localizar historicamente a discussão sobre o ensino de Filosofia no Paraná e expor um panorama, retratar a atual realidade do ensino de Filosofia nas escolas públicas de nível médio deste estado, essa trama metodológica é fundamental. Assim como o é para Vieira que se preocupa em situar o surgimento da perspectiva cientificista na educação, no final do século XIX e a sua influência no Brasil nas décadas de 20 e 30, expressa no movimento da Escola Nova. Assim como, para enfatizar as raízes da institucionalização da disciplina Filosofia da Educação no Brasil. Compreender a experiência educativa da Ordem Franciscana, e saber sobre as contribuições dessa ordem para a educação no período colonial no Brasil requer, segundo Iglesias (2010) a apreensão da variação do objeto de estudo através 149 do tempo, o que já constitui um forte indício da importância que a estratégia metodológica aqui enfatizada assume em sua tese. Outros indicativos podem ser notados no texto da tese que apresenta uma revisão bibliográfica da historiografia produzida a respeito dessa ordem no Brasil no período colonial e uma análise das relações histórico-sociais que determinaram a introdução dessa ordem na tarefa evangelizadora da América. A contextualização parece importante, também naquelas teses que não apresentam preocupação com a totalização, posto que situam seus estudos em uma perspectiva filosófica diferente da dialética, como é o caso das teses de Olga Loyola com uma metodologia respaldada na Filosofia da Diferença, e Luciana Carvalho com a História Comparada, muito embora a questão do todo não seja exclusiva da filosófica dialética. Como bem frisa Severino (2012, p.39) “todo conhecimento se engendra num contexto geral complexo, num âmbito de totalidade dos seres humanos e, como tal, precisa estar sendo sempre reavaliado”. Na tese de Loyola (2008) é usada para analisar as relações de poder na sociedade, suas implicações na educação em geral, assim como para falar da crise do paradigma da Modernidade e das atuais tendências na reflexão sobre o ensino filosófico no curso superior, da origem da universidade enquanto instituição e descrever as circunstâncias históricas de sua fundação, a transformação histórica por que passou e a permanência de alguns daqueles elementos ou aspectos originais no tempo presente. Com um estudo comparativo entre um município português, Mafra, e outro brasileiro, Uberabinha, Carvalho (2010) lançou mão da contextualização, sobretudo, para efetivar a recuperação da história do século XIX, a fim de apresentar um panorama histórico da educação nos dois locais visados pela pesquisa. Essa estratégia foi importante para falar das reformas do ensino brasileiro e português no período republicano das concepções que perpassavam essas reformas, dos aspectos econômicos e sociais que exigiam que elas fossem efetivadas, das críticas e dos movimentos em favor da educação. Ao questionar sobre a distinção entre os projetos educacionais republicanos do Brasil e de Portugal, a autora entende que para fazer tal distinção é preciso compreender a origem da escola republicana em Portugal, assim como os aspectos social, político e econômico do país naquele período (1890 –1908). Então, dá ênfase aos nexos dos dois municípios com os países em que se situam e as relações, especialmente, políticas e econômicas entre Portugal e Brasil, as consequências econômicas e 150 financeiras da independência do Brasil para Portugal. A análise sobre a educação em uma perspectiva global e local, resultou do esforço da autora no sentido de buscar uma visão de conjunto que a dialética exige, via categoria da totalidade. De qualquer modo, a totalidade não constitui uma pretensão exclusiva da dialética, afinal como bem frisa Gamboa no fragmento citado abaixo. O conceito de totalidade tem uma função epistemológica fundamental para a filosofia e a ciência modernas. Para elas, o conhecimento representa um dos modos de apropriação do mundo pelo homem; além disso, os dois elementos constitutivos de cada modo humano de apropriação do mundo são o sentido subjetivo e o sentido objetivo. (GAMBOA, 1998, p.25) A necessidade de contextualização está implicada claramente nas hipóteses, no problema e nos objetivos. Em apenas um ou em todos esses elementos. No caso da tese de Coutinho (2010, p. 10), essa implicação diz respeito ao principal objetivo da sua pesquisa que é “compreender a questão da prática na formação do pedagogo no Brasil desde a origem do curso até os dias atuais compreender como vem ocorrendo da formação prática do pedagogo ao longo da história do curso de pedagogia”. Fábia Liliã Luciano destacou a importância do contexto histórico da instrução como elemento imprescindível a sua investigação que teve como pretensão restabelecer o surgimento e o processo de expansão do magistério público em Santa Catarina dando ênfase à explicitação das relações e contradições desse ensino com o governo da província, com especial atenção ao seu surgimento “no processo da educação pública e a sua circunscrição no contexto histórico mais amplo.” (LUCIANO, 2002, p.19) Com a perspectiva de contribuir “na elaboração de uma teoria crítica” para a educação brasileira, nos moldes de Dermeval Saviani, Scalcon (2003) faz uma breve análise do contexto político e econômico e destaca a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, como um feito inédito e um momento de “esperança e expectativa”, especialmente em decorrência da crise do modelo Taylorista-Fordista o que aponta o surgimento de um novo modelo econômico e de uma nova ordem, social e política. Observa que a base produtiva do sistema capitalista passou por significativas modificações que incidem diretamente no ambiente do qual a classe trabalhadora, do Brasil e dos demais países participa, para finalmente dizer que é nesse contexto que ela se dedica, em sua tese, a estudar a teoria à luz da prática, para conceber que a prática pedagógica e a teoria tiram lições mutuamente uma da outra. 151 Um aspecto interessante, já que a maioria dos autores e autoras traz à tona em suas teses a importância desse artifício metodológico em suas análises, é que Carvalho (2002) demonstra em seu trabalho um desprendimento em relação à contextualização, mesmo assim fragmentos do contexto moderno são retomados quando da recuperação que faz de conceitos ligados ao tema como desencantamento do mundo, modernidade e protestantismo. Ao perscrutar a análise weberiana, o autor destaca o sistema de dominação como a única relação possível dentro do Estado moderno, e dos três tipos de dominação apontados por Weber, como dominação tradicional, dominação legal e dominação carismática, criou como objeto de análise o funcionamento dos dois últimos tipos. O exame das teses trouxe à tona as muitas formas e finalidades com que a contextualização é usada nessas produções. Em maior ou menor escala, seja para situar as contradições ou mesmo o problema de pesquisa, ou ainda para compreender o movimento do objeto em sua trajetória desde a sua gênese, o elemento contextual é importante na análise dos acontecimentos e fatos históricos, sobretudo nos estudos que têm abordagem dialética ou fenomenológica histórico-hermenêutica. Um primeiro olhar à opção dos autores no que diz respeito à contextualização, remete a uma exigência do objeto de investigação e do problema analisado pelo pesquisador, o que é verdade. Assim o tema e o problema aparecem como determinantes da necessidade de considerar o contexto. Mas, tanto as formas e as finalidades com que a contextualização é usada nas teses, como a sua importância que emana dos textos, demonstram que essa categoria analítica agrega um esforço no sentido da totalização, para além da necessidade de articular o problema, o objeto e o tema. É necessário frisar que alojar algumas teses para falar da forma, outras para mencionar as finalidades e, ainda, outras para destacar a importância desse elemento constitutivo dos textos da maioria das teses, não significa que cada uma delas não apresente todos esses elementos na sua composição. De uma contextualização podem fazer parte outras dimensões da vida humana em sociedade, posto que esta apresenta outros elementos relevantes como a ética, a estética, a educação, a religião e as contradições que deles podem brotar, que poderiam dar uma visão mais completa do que se entende por totalidade. Além disso, essas dimensões são essenciais na elaboração do conhecimento, a tal ponto que a opção por um tema e a elaboração de um problema têm ligação direta com elas. 152 A possibilidade de pensar a contextualização como perspectiva de totalização permitiu perceber também que nos textos de caráter historiográfico, ela se espraia por todo o texto da tese, articulando as relações tanto geográficas como sociais, econômicas e políticas, muito embora em alguns momentos seja priorizado o elemento social. 4.4 A ESCOLHA DOS TEMAS E SUAS LIGAÇÕES COM A VIDA. O esforço para ensejar um diálogo com as teses orientadas nos últimos 15 anos pelos professores Antônio Joaquim Severino e Dermeval Saviani, a partir das quais discuti neste estudo a lógica do conhecimento em educação, com ênfase na configuração do método, buscando perceber as temáticas e os objetos privilegiados nessas produções, fez-me considerar que qualquer conhecimento individual se articula em um contexto geral complexo, bem além de sua expressão lógico-conceitual e da relação epistêmica entre um sujeito e um objeto, isto é, na efetividade do seu caráter histórico e social, uma vez que está implicado em relacionamentos que se estabelecem social e culturalmente. Como diz Severino (1998, p. 13): “o conhecimento individual se dá sobre um fundo de uma experiência radicalmente histórica e coletiva que lhe é anterior e lhe serve de matriz placentária.” Por isso, a escolha do tema deve privilegiar temáticas e objetos importantes para a sociedade, posto que a particularidade dessa escolha, na pessoa do pesquisador, não anula o caráter social das temáticas, dos objetos e do conhecimento. É também nesse contexto que se pode situar as relações entre as temáticas constitutivas das áreas de onde emergem os objetos, pois é por meio e a partir delas e com o auxílio imprescindível das fontes que os objetos são erigidos, percebidos, pensados, elaborados nas mediações da ação investigativa, reflexiva e criadora do pesquisador. Esse processo já aponta indícios das possibilidades, mas também dos limites do conhecimento que daí será gerado. Para a compreensão desse movimento é importante perguntar: como são feitas as escolhas temáticas? O que move o pesquisador nesse sentido? Muito embora se diga que não se pesquisa temas, porém problemas estes emergem no interior daqueles. No que diz respeito à elaboração de uma tese de doutoramento, que consiste em um trabalho que necessita de um orientador, no geral, observa-se nessas escolhas uma relação com as temáticas dos estudos deste, de sua inquietação epistêmica, do que ele está disposto a orientar. É evidente que o discente, ao pleitear uma vaga em um programa de pós-graduação, busca um orientador cujos estudos tenham alguma relação com os seus, 153 com as suas pretensões investigativas. Nesse caso, de modo geral, há afinidade de interesses epistemológicos, que se apresenta como possibilidade de estudos. Em uma das teses analisadas nesta seção, observou-se claramente essa relação, a partir das explicações da autora sobre a sua identificação com o materialismo como concepção de mundo e explicação da realidade e a consequente solidão profissional vivenciada em função disso, com a dificuldade de aproximação de seus pares. Nas palavras da autora: “Durante alguns anos vivi o que denominei de solidão acadêmica, finalmente rompida a partir de meu ingresso no doutorado quando do encontro com o professor Dermeval Saviani, o qual concordou em assumir a orientação de minha tese” (SCALCON, 2003, p.10) As pistas deixadas pelos autores e autoras das teses investigadas nesse estudo indicam os temas privilegiados por eles e a ligação de suas escolhas com as dimensões da vida. No que concerne aos temas privilegiados, pode-se pensar em alguns eixos em torno dos quais se articulam as temáticas que consistem no espaço em que se originam os objetos elaborados pelos pesquisadores em suas produções. Desse modo, a opção por esses eixos não é aleatória, eles são notados quando se observa essa produção e se relacionam entre si, considerando-se o total das teses estudadas. Nesse sentido, para melhor organizar a análise e entender essas articulações, para as teses orientadas pelo professor Saviani os eixos pensados são o trabalho, a prática pedagógica, a história, a filosofia, e o público e o privado. Quanto aos trabalhos orientados pelo professor Severino os eixos, em torno dos quais se juntam as temáticas privilegiadas nas teses são: formação, filosofia, ensino e história. Note-se que os eixos filosofia e história se repetem nos dois orientadores, que o eixo prática pedagógica está intimamente ligado ao do ensino e que este pode ser público ou privado, além de se realizar em diferentes níveis e, ainda, que estes dois últimos eixos estão ligados ao currículo. Há de se atentar também para o fato de que as temáticas dizem respeito a teses em educação e que logicamente a educação foi o campo de convergência dos interesses investigativos. No que se refere à relação entre aos eixos temáticos e os temas privilegiados nas teses orientadas pelo professor Saviani nos últimos 15 anos, notou-se que duas (2) teses são relativas ao trabalho, três (3) à prática pedagógica, três (3) à história, duas (2) à filosofia e três (3) ao público e o privado. Quanto as teses orientadas pelo professor Severino neste mesmo período, elas se distribuíram dentro das seguintes temáticas (2) 154 teses dizem respeito à formação, duas (2) à filosofia, seis (6) ao ensino e duas (2) à história. A respeito dos nexos entre as escolhas temáticas e as dimensões da vida, pode-se perceber que essa escolha apresenta íntima ligação com as dimensões de suas próprias existências, isto é, as marcas da vida social que lhe afetam diretamente, sejam elas epistemológica, ética, axiológica e, especialmente profissional, todas elas situadas social e historicamente. É o sujeito, em sua particularidade que, embora não perca seu caráter social, escolhe os temas que, de alguma forma, apresentam ligação com as dimensões da vida particularizada nesse sujeito. Essas dimensões se entrelaçam, muito embora nem todas sejam mencionadas pelos autores, assim como nem todos os autores optam por falar dessa relação, de modo que apenas aqueles que a mencionam diretamente serão aqui considerados. São quatro os autores, o que equivale a (16 %) do total das teses analisadas. E suas teses se situam, respectivamente, nos eixos temáticos formação, história, ensino e filosofia. Com um tema relacionado à formação do pedagogo, Vieira (2010) apropriou- se da Filosofia da Educação como objeto de suas inquietações investigativas, e esclareceu que a escolha do tema tem relação com suas atividades profissionais como docente universitária na disciplina Filosofia da Educação. Com a finalidade de discutir sobre a contribuição dessa área disciplinar para a construção da autonomia por parte dos educandos, essa autora busca Castoriadis e Valle, para fundamentar-se na ideia de que a filosofia da educação é necessária à construção do sujeito reflexivo, capaz de decidir sobre espaço democrático, é a que prima pela interrogação constante. O tema “o pensamento de Max Weber sobre o processo de racionalização do Ocidente Moderno” foi privilegiado por Carvalho (2002) que situou a sua escolha no âmbito da docência em Educação, quando sua preocupação de, em suas aulas, ampliar a disciplina didática, mas com o cuidado de não descaracterizá-la. Nessa perspectiva colocou-se a necessidade de realizar um esforço investigativo, no sentido de pensar a educação moderna, “tomando como orientação a análise de Weber sobre o processo específico de racionalização da conduta dos homens no ocidente, que vive a instauração do desencantamento e aniquilamento dos valores metafísico-religiosos” (CARVALHO, 2002, p. 18) Então, pode-se relacionar a sua escolha também com a dimensão ética da vida, uma vez que o autor compreende que essa disciplina não pode ser pensada 155 meramente do ponto de vista técnico, apesar de sua importância na formação e prática do professor, sobretudo de didática. Além de mencionar a importância dos elementos propriamente didáticos como, por exemplo, conteúdos, métodos e objetivos de ensino ele enfatiza a dimensão ética cujos valores se oferecem, no entendimento do autor, como “expressão e garantia de nossa condição de sujeitos” (idem, p. 8). Em suas reflexões sobre o tema do ensino Roberto (2014) considerou que tanto a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (LDB nº 9.394/96) como o Decreto nº 2.208/97 que separa o ensino médio da formação técnica profissionalizante, refletem a predominância neoliberal nas políticas de ensino para o nível médio. Mas em oposição a essa concepção que tem como base a fragmentação do trabalho, os educadores têm proposto a formação politécnica. Em função da conjuntura por ele apresentada, esse autor assume como objeto de pesquisa a proposta formativa do currículo do Ensino Médio Integrado ao Técnico – EMIT, com o objetivo de “compreender a articulação possível entre educação profissional e a geral como dimensões necessárias para o desenvolvimento pleno do estudante” (ROBERTO, 2014, p.19). O problema central sobre o qual investiu seus esforços consiste em saber: “quais os princípios pedagógicos articuladores para que esta proposta se desenvolva, no uso concreto da educação profissional e tecnológica, e seja oferecida uma educação profissionalizante de qualidade e cidadã como ação humanizadora, emancipadora e plenipotenciadora do estudante?” (Idem p.19) As preocupações por ele apresentadas se fixam profundamente em sua “reflexão e história de vida”. As relações da escolha do tema Filosofia da Libertação por Pansarelli (2010) e as dimensões da vida têm a ver com a sua experiência na militância política em agremiação comunista brasileira que, academicamente teve sua expressão marcada pela “aproximação com a filosofia da libertação em geral e com a obra de Enrique Dussel em particular” (PANSARELLI, 2010, p. 30). Os seus estudos nessa área têm sido contínuos e se fizeram presentes tanto na graduação como no mestrado e no doutorado. Desde o seu trabalho de conclusão do curso de graduação, com a monografia intitulada Ética e pedagógica na filosofia da libertação de Enrique Dussel aos estudos no mestrado que privilegiaram Paul Ricoeur e Paulo Freire que são dois relevantes interlocutores de Dussel, às pesquisas no programa de doutorado em educação, área que também era uma característica da sua vida acadêmica, o interesse investigativo de Pansarelli foi sempre direcionado à filosofia da libertação. 156 Não somente uma dimensão de pertencimento a um continente, mas pelas dimensões ética e política que parecem saltar das palavras do autor na citação a abaixo. Neste contexto de busca pela produção filosófica autenticamente relacionada aos ethos e às razões mais próprias aos povos do nosso continente é que se insere a produção filosófica de Enrique Dussel, autor da obra que serve ao mesmo tempo como objeto de estudos e motivador de uma produção filosófico-cultural crítica, que busco expressar na presente tese. (PANSARELLI, 2010, p. 23) Em seus estudos doutorais Pansarelli aponta alguns indicadores da reorganização das relações internacionais e situa a América Latina no cerne dessas adversidades que implicam uma nova configuração da realidade. Nesse contexto, a ressignificação dos valores extrapola os de cunho político e econômico e incide sobre os valores culturais, resultando daí um movimento de libertação cultural chamado de pós- colonialismo. Essa dinâmica provoca também uma profunda ressignificação da epistemologia. Tendo em vista esse contexto, o autor da tese buscou romper com a visão eurocêntrica a fim de pensar a possibilidade de um futuro a ser construído com referência e pertinência ao contexto latino-americano. Não só o tema, mas outros itens da composição dos estudos apresentados nas teses trazem indícios das relações contidas nas escolhas dos autores. Nessa perspectiva, encontra-se a tese de Loureiro (2008) quando da preocupação com a delimitação do espaço a ser investigado. Não objetivamos pesquisar todos os cursos de graduação em Filosofia que existem no território nacional. Portanto, restringimos a pesquisa à região Nordeste, por quê? A escolha por essa região se dá, primeiro, por uma questão de pertencimento, de residirmos e termos cursado a graduação em Filosofia na Universidade Estadual do Ceará – UECE, segundo, por que não encontramos pesquisas sobre estes cursos. E terceiro, por uma questão de tempo e possibilidade de realizar a pesquisa de campo a contento. (LOUREIRO, 2008, p. 13) A tese acima mencionada , situa-se no eixo temático do ensino. Nela a autora construiu como objeto o processo de institucionalização e profissionalização da Filosofia em Universidades do Nordeste. Com o objetivo de compreender a estruturação, a concepção de filosofia e o processo de formação nesses cursos, teve como base textos oficiais que regulamentam os cursos de formação e buscou discutir “como, a partir da criação dos cursos superiores de Filosofia se consolida o processo de institucionalização e profissionalização da Filosofia nessas universidades” (LOUREIRO, 157 2008, p.11). Duas hipóteses são consideradas pela autora e podem ser resumidas da seguinte forma: a) embora não seja determinante, o modo como a filosofia surge no Brasil marca profundamente o desenvolvimento do pensamento filosófico nesse país; b) a História da Filosofia é predominante nos cursos de graduação em Filosofia. Essa autora demonstrou a intenção de, por meio da análise das legislações, compreender como a formação em Filosofia foi pensada historicamente no Brasil e como esses documentos se realizaram efetivamente nas estruturas curriculares e projetos dos cursos de graduação desde seu surgimento, quais as suas implicações para os projetos de reformulação curricular, com a finalidade de adequação às Diretrizes Curriculares de 2001. Por fim, problematizou a concepção de formação centralizada na história da filosofia. Curiosamente, todas essas teses foram orientadas pelo professor Severino. Contudo, embora os orientandos do professor Saviani não tenham mencionado a possibilidade de relação entre a suas escolhas temáticas e dimensões de sua vida em particular, perscrutando o currículo lattes de seus orientandos, no lapso temporal deste estudo, pode-se notar que os temas estão ligados pelo menos a interesses particulares originados de sua formação em cursos de graduação e isso não é obra do mero acaso, embora não se possa esquecer que se forma histórica e socialmente. Nessa perspectiva, foi possível constatar que enquanto os doze (12) orientandos43 do professor Severino se distribuiram entre a Licenciatura em Filosofia com seis (6) representantes (50%), e a Pedagogia com cinco (5), ou seja, (41,6%), um (1), isto é, (8,4%), não informa os 13 (13) orientados pelo professor Saviani se dividem entre a graduação em Psicologia com uma (1) orientanda (7,7%), e entre as Licenciaturas em História, com cinco (5), isto é, (38,4%), e em Pedagogia com seis (6) orientandos (46,2%), 1 não informa (7,7%). Os cursos de Filosofia, História e Pedagogia são os de maior fequência entre os orientandos de um e outro pesquisador, o que se explica em função das atividades dos próprios pesquisadores. A trajetória acadêmica dos dois pesquisadores proporcionam fortes indícios desta acertiva, sobretudo no que se refere à docência e às pesquisas realizadas por eles. 43 Não encontrei registro dos Currículo Lattes de Evandro Luiz Ghedin e de Tânia Conceição Inglésias. 158 Embora eles sejam graduados e pós-graduados em Filosofia, os interesses de Saviani estão relacionados muito mais à História da Educação e os de Severino à Filosofia da Educação. É na área de História da Educação que Saviani tem centrado suas pesquisas. Pode-se dizer que tanto esse orientador como os orientandos oriundos dos cursos de Pedagogia e História, têm interesse pela História da Educação que, por sua vez, liga essas duas áreas de conhecimento. Severino, por sua vez, centra a sua produção em Filosofia da Educação, de maneira que os orientandos remanescente dos cursos de Filosofia e Pedagogia têm interesses teóricos coincidentes com os do pesquisador. Seguindo os vestígios deixados pelos autores das teses e considerando apenas os temas privilegiados pode-se dizer que duas teses dirigem seu interesse epistemológico ao trabalho que desde Hegel é compreendido como o motor propulsor de desenvolvimento humano. Apesar de seu idealismo e das críticas recebidas por isso, é esse filósofo que discute a importância do trabalho para a humanidade. Suas teorizações permitem a Marx, criticá-lo e acusá-lo de reconhecer unicamente o trabalho abstrato. Mas também são elas que possibilitam o fortalecimento filosófico da teorização materialista a respeito. Além de uma atividade essencial, sem a qual o homem não existe, o trabalho constitui importante conceito na dialética hegeliana e relevante categoria de análise na dialética marxista. Nessas teses os temas expressam uma relação entre o trabalho e a questão social, embora os objetos de estudo sejam diferentes. Em uma a discussão refere-se ao modo como se relacionam o trabalho, a educação e a questão social no Brasil, em outra a preocupação é com a formação para o trabalho manual no Brasil colonial. A tese de Elizabete Gonçalves de Souza (2012) abordou como objeto a Confederação Nacional da Indústria, com o objetivo de conhecer o projeto pedagógico da burguesia brasileira. Investigou o pensamento pedagógico dessa confederação a partir da análise de documentos produzidos no período de 1930 a 2000 pelas lideranças industriais e pela referida confederação, a qual é identificada como o principal intelectual coletivo da burguesia nacional. Desde a década de 1940 essa instituição consiste no centro de debates sobre educação no Brasil, isso foi crucial para a escolha da CNI como objeto de análise. A produção de Sonia Maria Fonseca (2010) inspecionou a condição social do trabalho manual e de sua formação no período colonial, implicando um extenso período 159 que vai de 1549 a 1822, o que amplia o objeto de estudo. E esse período foi delimitado porque divide momentos e fatos importantes à formação para o trabalho manual no Brasil Colônia, que são a chegada da Companhia de Jesus e da Missão Francesa, e o estabelecimento da Academia Imperial de Belas Artes. A questão da prática educativa reúne, em uma década, de 2003 a 2013, trabalhos que se ocupam com objetos diversos. O interesse por essa temática vai desde a conjugação entre prática e teoria à prática na formação do pedagogo. Os três trabalhos relativos a essa questão têm pedagogas como autoras, logo o interesse pelo tema tem em vista a dimensão acadêmica. O primeiro deles privilegiou a temática identificada pela própria autora como “a teoria na prática e a prática na teoria: uma experiência Histórico-Crítica” (SCALCON 2003, p. 8). Com o objetivo de verificar como é possível estabelecer a unidade entre essas duas atividades, partiu do pressuposto de que essa unidade pode ser efetivada por meio de uma prática fundamentada na crítica. Debruçou-se sobre o problema de como estabelecer uma unidade entre a teoria e a prática com referência a essa pedagogia em particular, que é considerada tanto teoricamente como em sua prática a partir de uma experiência realizada e analisada pela autora. Foi assim que se constitui como objeto a possibilidade de estabelecer a unidade teoria e prática para um processo de alfabetização. Essa tese sinaliza para o entendimento da necessidade de autocrítica na constituição, ou mesmo apropriação, de uma teoria crítica. A intenção de unir teoria e prática foi respaldada nos fundamentos da lógica dialética onde essas duas ações, apesar de diferentes constituem uma relação de interdependência. Sendo assim, esse estudo demonstra um esforço no sentido de superar a relação excludente da lógica formal, que tem contribuído significativamente para calorosas discussões nas reformulações dos cursos de graduação, especialmente os de licenciatura. O segundo trabalho escolheu como tema a experiência educativa da Ordem Franciscana no início da colonização da América e estabeleceu como objeto de pesquisa a educação praticada pelos franciscanos, com a perspectiva de analisar a contribuição dessa ordem para a configuração da educação no Brasil Colonial. O que moveu Tânia Inglesia (2010) nesse estudo foi a pouca atenção que a literatura dá à tradição missionária na história da educação no Brasil, o que implica na necessidade de ampliar a análise sobre essa história específica. A principal ideia é que em função da experiência evangelizadora e da presença da ordem franciscana no Brasil em seus quinhentos anos de história, essa ordem contribui para a forma assumida pela educação no período Colonial. 160 O terceiro é o de Luciana Coutinho (2013) que direcionou sua atenção ao objeto de estudo definido como o problema da prática na formação do pedagogo no Brasil, com o objetivo de compreender o percurso histórico da prática no curso de pedagogia no referido país. Para entender um objeto desse porte, indicou que o relacionamento com as fontes buscou observar quanto e como essa prática aparecia. Tanto no que diz respeito à política educacional e às propostas de formação do pedagogo, como na organização, no desenho curricular e no modo de realização do ensino realizado pelos professores do Curso de Pedagogia. Em Severino (2010), o campo temático é compreendido como território dos objetos e como uma macro categoria que abriga três outros conjuntos categoriais, quais sejam: os processos “epistêmico”, “valorativo” e “existencial”. De modo que tomando somente a questão da temática já se pode antecipar a riqueza que as pesquisas em educação podem constituir em termos de conhecimento. Com base nessa distribuição, foi possível entender que em uma perspectiva epistemológica em que a prática é investigada na sua relação direta com o conhecimento, nas pesquisas com fundamentos dialéticos materialistas, a prática só pode ser vista como práxis, não somente pela união entre teoria e prática como pelo objetivo de transformação implicado no sentido da práxis. Do mesmo modo, no que concerne ao processo valorativo e ainda seguindo as pistas deixadas por esse autor, a pesquisa sobre a prática educativa destacaria as dimensões econômicas, políticas e éticas. Assim como ao centrar o seu interesse no processo existencial, uma pesquisa sobre a prática educativa deveria articulá- la com a dimensão da existência humana, individual e social. Isso equivaleria não somente a construção de diferentes objetos a partir de um mesmo tema, como variadas perspectivas de análise, ainda que sob uma mesma orientação teórica. As teses relativas ao público e o privado foram todas defendidas no ano de 2001. Duas delas estudaram a relação entre público e privado e a outra parece não se inquietar propriamente com essa relação, mas com a constituição do magistério público. A tese de Ronalda Barreto Silva discutiu sobre o público, o privado e o comunitário na educação brasileira, observando que a redução da intervenção do Estado nas políticas sociais está implicada no abandono das proposições de democracia, de igualdade e do assistencialismo em relação à educação. Esse abandono alcançou a sua legitimação na transformação sofrida pelos conceitos no cerne da educação, sobretudo o conceito de público que passa do entendimento de esfera estatal para público não-estatal. Silva (2001) define como seu objeto de estudo a Campanha Nacional de Escolas da 161 Comunidade-CNEC, considerando que é expressiva a presença dessa instituição na educação brasileira e na política educacional, nos três níveis de ensino. Fábia Liliã Luciano (2001) situou seu estudo no campo da História da Educação, interessada em saber sobre como, em que bases, o magistério público se constitui e se expande em Santa Catharina, no século XIX. Esse trabalho parte, pois das questões relativas ao tempo histórico, ao modo e à finalidade. Uma terceira tese, a de Maria de Lourdes Almeida (2001), estudou a relação entre público e privado e teve um “objeto bem ‘recortado’ que é a Unicamp”. A principal questão é saber onde os convênios e parcerias de pesquisa com as instituições privadas podem comprometer o caráter público da universidade. Destacou a importância de uma universidade plural, apta a abranger diversas tendências de pesquisa e defendeu a tese que pode ser resumida na ideia de que as universidades abarcam diferentes modelos de relação da ciência com a sociedade. A supremacia de um modelo sobre os demais é definida pelos interesses econômicos. Entende que os setores público e privado se relacionam intimamente, não se separam, de tal modo que nas sociedades liberais o Estado está sempre a serviço do mercado. Tratar dessa questão remete o pesquisador à multiplicidade dimensional do tema e do objeto de investigação que um pesquisador em particular não consegue dar conta, sobretudo, se se pensar a categoria da totalidade, o pesquisado diante dessa multiplicidade e do todo constituído pela pesquisa enquanto ação humana histórica e social, parece insignificante. Mas não se pode esquecer que esse todo é composto de partes configuradas pelas investigações de cada pesquisador. A Filosofia, em torno da qual se formalizam temáticas e objetos de pesquisa reúne os trabalhos de Gilcilene de Oliveira Damasceno Barão, e de Ruben Guedes Nunes, defendidos respectivamente nos anos de 2008 e 2002. Com um estudo sobre o tema marxismo e educação, a tese de Barão (2008), teve como objeto de pesquisa a obra sobre educação produzida por Florestan Fernandes nas décadas de 1950 e 1960, com o entendimento de que a reflexão sobre o marxismo e a educação requer que se estude a obra desse educador. Guiada por questões relativas às análises de Florestan Fernandes sobre educação e sua identificação com a teoria crítica, e sobre as ligações do processo teórico da “centralidade na revolução”, com os textos deste autor sobre educação, a autora teve como objetivo entender dimensões ainda não pesquisadas da relação entre Florestan e a educação. 162 Com uma abordagem teórico-metodológica baseada no materialismo histórico e dialético, a autora optou por analisar a produção de Florestan “a partir do diálogo que este estabeleceu com os autores no interior de sua obra para a recuperação da categoria revolução” (BARÃO, 2008, p.19). Uma das conclusões de Gilcilene Barão é que as pesquisas sobre o tema por ela estudado precisam levar em consideração as contribuições teóricas de Florestan Fernandes uma vez que estas são essenciais para refletir sobre problemas ligados à vida, a sociedade no capitalismo. A investigação de Ruben Nunes dirigiu-se à dialética, a fim de investigar o caráter educativo imanente à dialética hegeliana. O trabalho foi orientado pela averiguação acerca de quais conceitos importantes da dialética de Hegel chegam à práxis educativa em geral. Nunes (2008, p.29) percebe a necessidade de “apreender uma fundamentalidade dialética natural”, entendida como lugar dos elementos dialéticos que, por sua vez, consistem no espaço em que o processo formativo é construído, movimenta- se e atua como mediação para a transformação. Ao considerar que os cursos de filosofia tratam com menosprezo à dialética, apesar da importância teórica desta filosofia, esforça-se por verificar se e até onde a contribuição da dialética hegeliana se explicita visivelmente no ato educativo. O eixo história que, de diferentes modos, se relaciona aos outros eixos ao redor dos quais os orientandos do professor Saviani desenvolvem suas temáticas e inspecionam seus diferentes objetos de pesquisa, aglutina no intervalo de uma década, três teses com temas e objetos diversos. As teses de Antônio Carlos Ferreira Pinheiro e de Celina Midori Murasse defendidas em 2001 e a de Luciana Beatriz de Oliveira Bar de Carvalho, concluída em 2010. Pinheiro (2001, p.2) considerou que “a direção do olhar do pesquisador, aquilo que lhe interessa desvendar e a forma como vai construindo seu objeto de pesquisa lhe possibilita eleger os pressupostos teóricos que melhor possam se adequar ao seu objetivo”. (PINHEIRO, 2001, p.2) Esse autor realizou incursões na história da educação paraibana para investigar o processo de implantação e expansão da educação escolar primária pública na Paraíba, no período de 1849 a 1949. Com um período histórico tão longo para dar conta, reuniu farta documentação que abrange desde os discursos, mensagens e relatórios de presidentes do país e de governadores do Estado da Paraíba, aos relatórios de diretores da instrução pública e coleções de leis e decretos. Analisou a oscilação com que se dá a 163 expansão do ensino público primário, as instruções do Estado paraibano a respeito da educação, a coexistência dos dois modelos educacionais estruturados como “cadeiras isoladas” e “grupos escolares,” o processo de passagem de um modelo a outro e as políticas educacionais no contexto do segundo modelo. Murasse (2001) elaborou como objeto de pesquisa o Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, entendido como “síntese de múltiplas determinações”. Com a compreensão de que a história da educação está firmemente articulada à história da própria sociedade, a autora parte do princípio de que a documentação oficial existente sobre o Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro expressa as lutas que os homens enfrentaram, a fim de solucionar as questões da sociedade brasileira, na segunda metade do século XIX. Todavia, essa documentação não foi suficiente para alcançar o objetivo de analisar a história dessa escola de arte e ofícios, o que demandou um estudo de obras relativas à economia e a história, além da biografia do fundador dessa instituição de ensino, considerando que a vida desta estava fortemente entrelaçada à vida de seu criador. Com um estudo sobre dois municípios, o de Uberabinha no Brasil e o de Mafra em Portugal, Carvalho (2010) tem o objetivo de entender as ações legislativas no âmbito da educação. Por meio de uma história comparativa a autora conduziu para as discussões a forma concomitante das políticas municipais. O interstício temporal da pesquisa, demarcado pelos anos de 1888 e 1928, foi pensado em consideração a fatos históricos que ocorreram tanto no Brasil como em Portugal e que assinalaram a mudança de regime do governo monárquico para o republicano, assim como a intensificação do debate a respeito da expansão do ensino público na esfera municipal do que resultou para as duas cidades um número significativo de decretos e as leis sobre a necessidade de implantação da escola pública. No que diz respeito aos trabalhos orientados pelo professor Severino os eixos, em torno dos quais se juntam as temáticas privilegiadas nas teses, intencionalmente pensados para organizar a análise são: formação, filosofia, ensino e história. Dois trabalhos orientados pelo professor Severino foram organizados em torno da ideia de formação. São eles o de Pereira (2014) e o de Vieira (2010). Pereira (2014) estudou a Formação de professores na América Latina com foco no contexto brasileiro atual. Com o objetivo de discutir o problema do lugar ocupado por uma filosofia da educação fundada no pensamento de Enrique Dussel e Paulo Freire, na formação de professores, a pesquisa se orientou pela questão relativa à identificação da contribuição de Enrique Dussel e Paulo Freire nos cursos de licenciatura em 164 Pedagogia. A autora organizou a investigação fundada na hipótese de “presença ausente” desses dois importantes autores na formação de professores. A questão, pois diz respeito à ausência de efeitos práticos das categorias pedagógicas de Paulo Freire e Enrique Dussel na educação brasileira, a exemplo menciona a não erradicação do analfabetismo, no caso brasileiro. Vieira (2010) concentrou sua curiosidade epistemológica na Filosofia da Educação na formação do pedagogo, com o objetivo analisar a possibilidade da disciplina Filosofia da Educação contribuir para a construação da autonomia por parte dos educandos. Duas teses dirigem sua inquietação epistêmica à Filosofia. São elas a de Daniel Pansarelli (2010), sobre a Filosofia Latino-Americana referida anteriormente, e a de José Renato Polli (2006) sobre a ética em Habermas e Freire. A tese de Polli concebeu como objeto o campo específico da eticidade. O esforço da análise foi dirigido a apresentar as epistemologias de Freire e Habermas, com o intuito de demonstrar que há convergência tanto entre pressupostos teóricos dos pensamentos de Jürgen Habermas e Paulo Freire, ou seja, entre a ética do Discurso e a Ética Universal do Ser Humano, como entre o método de trabalho de ambos, o autor analisa as relações entre a ética e a educação a partir das contribuições teóricas desses dois autores. Polli compreendeu que essa análise é importante porque consiste em uma possibilidade de indicar as formas de diálogos presentes nas teorias de Freire e Habermas. E argumentou que a Educação Libertadora de Paulo Freire pode ser tomada como base para refletir sobre valores, mediante a desumanização que se pode constatar nos dias atuais. A partir da análise das condições históricas vividas na sociedade contemporânea, o autor aponta os fundamentos do pensamento educacional freireano como um conteúdo importante para desenvolver uma nova ética. As teses em questão apresentam diversidade de objetos de pesquisa construídos de diferentes maneiras. Severino (2009) entende que o conhecimento deve ser compreendido “como uma construção de objetos”, independente de qual paradigma epistemológico adotado. E esclarece que por mais criativo que o sujeito seja, ele não poderá fazer existir um objeto, isso significa que para “apreender o objeto como sendo significativo para nós, sujeitos, é preciso como que refazer a estrutura desse objeto, seja ele físico, simbólico ou imaginário.” (SEVERINO, 2009, p. 17) 165 A leitura e análise dessas teses, proporcionou o contato com uma diversidade de objetos e de temas nos quais eles se situam. Entre os pesquisadores da área da educação o ensino é um dos temas privilegiados. Por isso mesmo formou outro eixo ao redor da qual se reúnem várias teses, durante oito anos. Três delas dirigiram seu interesse epistemológico ao ensino em nível superior, uma defendida no ano de 2000 e as outras duas no ano de 2008. A primeira dessas produções realizou uma investigação sobre o ensino superior nos anos 90 e elegeu como tema “os desdobramentos das universidades constituídas apenas como instituições de ensino e das universidades de ensino e pesquisa” (MAGNANI, 2000, p. 1). Com o objetivo de analisar esses desdobramentos, partiu da hipótese de que a flexibilização do princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, firmado no Decreto nº 2.306/97, definiu as condições para uma nova forma de elitização e desigualdade no ensino superior no Brasil. A tese de Loyola (2008) acionou o ensino superior como área de estudo e optou pelo tema ensino de filosofia, com a compreensão de que consiste em um tema filosófico que precisa ser analisado para além das questões relativas às instituições de ensino. Nessa perspectiva, indicou a necessidade de análise das relações de poder na sociedade e da relação entre filosofia e educação. A partir dessa compreensão, analisou, do ponto de vista teórico, as tendências atuais na reflexão a respeito do ensino de filosofia em nível superior, colocando em destaque os elementos curriculares que estão por traz da opção pela inclusão da disciplina Filosofia. A fundamentação teórica buscada por Loyola confirmou a possibilidade de diversas trilhas metodológicas para se alcançar diferentes objetivos, com exigência de inventividade, reflexão e dinamicidade. Pensar a questão da pesquisa, remete à noção de pluralidade que se constitui nas diversas possibilidades temáticas, na oportunidade de construção de diferentes objetos e problemas de pesquisa. Realizar uma pesquisa significa, especialmente, confrontar-se com as dúvidas que brotam no processo investigativo e com a surpresa diante do inusitado das contradições que emergem nesse processo, proporcionando as transformações e a abertura de trilhas onde brota a criticidade e a criatividade. As duas teses que focalizam o ensino médio são a de Evandro Luiz Ghedin, defendida em 2004, e a de Geraldo Balduino Horn em 2002. A primeira consiste em um estudo teórico, de caráter filosófico que discute o problema do ensino de filosofia no ambiente da escola, a partir da compreensão de que 166 embora a filosofia tenha a sua importância reconhecida na sociedade, a disciplina requer propostas metodológicas. Em função disso, Ghedin (2004) se dedicou a pensar pressupostos epistemológicos e consequentes implicações metodológicas para o ensino de Filosofia, compreendido como condição para um processo reflexivo, crítico e criativo. Com o estudo, investigou elementos metodológicos para o ensino de Filosofia, sobretudo no nível médio, com a pretensão de explorar e apresentar uma epistemologia da prática do filosofar, que faça do ensino de filosofia uma práxis formadora de atitude filosófica. A segunda escolheu o tema ensino de Filosofia no nível médio das escolas públicas estaduais do Paraná, centrando sua análise no objeto das práticas do ensino da Filosofia no Paraná. À semelhança da hipótese de Loureiro (2008) em relação ao ensino de filosofia no nível superior, Horn (2002) problematiza o currículo de Filosofia do Ensino Médio centrado em recortes da história da filosofia. Em sua análise o autor abarcou os principais componentes constitutivos de uma disciplina, interrogando, pois os objetivos de ensino, critérios de seleção dos conteúdos, recursos didáticos e perspectivas metodológicas. As teses de Alonso Bezerra de Carvalho (2002) e de Regina Maria Zanatta (2005) podem ser consideradas como trabalhos que giram em torno da história, particularmente, da educação. A tese de Zanatta (2005) identificou a importância de Jonathas Serrano para a educação brasileira, com a hipótese de que, no transcorrer de sua vida, esse educador construiu uma atitude conciliatória entre as perspectivas tradicional e progressista de educação, o que lhe valeu uma projeção profissional em várias áreas como, por exemplo, a Filosofia, a Pedagogia e o Direito. Indicou como principal objetivo de seu estudo o de identificar, na trajetória de Jonathas Serrano, a elaboração dos seus ideais educacionais, que embasaram teoricamente a sua participação nas reformas ocorridas nas primeiras três décadas do século XX. Nesta seção, efetivei um diálogo com as teses que servem de fonte histórica para os estudos realizados nessa parte do trabalho. A leitura desse material possibilitou projetar a organização das informações para realizar a análise das fontes constituídas pelas teses e perceber os temas privilegiados, o recorte feito pelos autores a partir dos objetos de estudo por eles organizados e as estratégias metodológicas dos pesquisadores que discutem a educação em programas de pós-graduação sob a orientação dos professores Dermeval Saviani e Antônio Joaquim Severino, nos últimos 15 anos. 167 Nesse sentido, pode-se dizer que das 13 teses orientadas pelo professor Saviani, duas delas não se fixam teoricamente no materialismo dialético, enquanto que as teses orientadas pelo professor Severino demonstram uma abertura e uma flexibilidade teórica e epistemológica, condizente com a ideia de interdisciplinaridade, embora esta seja comumente usada para referir diferentes ciências e não propriamente diferentes filosofias. A respeito do problema de como se configura o método e quais temáticas e objetos de estudos são privilegiados na investigação científica nas Teses Doutorais produzidas na área da educação, concluo que dialeticamente falando é inviável conceber um método universal, posto que se assim o fizessemos estaríamos absolutizando uma determinada maneira de elaborar conhecimento em detrimento da real diversidade de formas de produção teórica. A constituição de um método abrange tanto apropriação como elaboração. A primeira diz respeito aos princípios de uma determinada teoria que serve de fundamento à elaboração do método. O objetivo de discutir a lógica de elaboração do conhecimento expressa nos métodos de pesquisa adotados nas Teses Doutorais, visando à produção do conhecimento científico na área da educação, foi alcançado. Nesse sentido, a opção de considerar os fundamentos das duas abordagens que se detacaram nas teses, a fenomenológica e a dialética, foi essencial. Foi essa estratégia que, juntamente com as fontes, possibilitou entender melhor o que é apropriado e o que é elaborado na lógica de construção do conhecimento por cada pesquisador. As fontes históricas analisadas nesta seção, apontam que o método é tanto apropriado como elaborado, que as categorias da totalidade e da contradição estão estreitamente ligadas no processo do conhecimento consubstanciado na dialética e que a contextualização para além de articular tema, problema e objeto de pesquisa, também consiste em uma estratégia metodológica para se buscar atingir a totalidade. Quando os autores das teses mencionaram que o seu método é o materialismo histórico-dialético o que pude constatar foi apropriação de princípios sutentando a elaboração do método, dando forma à lógica particular de cada tese, cujos vestígios são encontrados, inclusive no modo de estruturar o texto da tese. Na configuração do método, destaco a estratégia dos autores em buscar atingir a totalidade por meio da contextualização, muito embora esse todo estruturado apresente 168 um conjunto de complexas relações que um pesquisador não consegue examinar em uma pesquisa. As informações indicam, ainda, que a totalidade também é considerada do ponto de vista da fenomenologia que reconhece a impossibilidade de desvelar todos os sentidos da realidade. 169 5 MEANDROS E COMPLEXIDADE DOS LIMITES EPISTEMOLÓGICOS NA ABORDAGEM DIALÉTICA EM TESES DOUTORAIS EM PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO. O processo do conhecimento suscita questões cujas elaborações teóricas indicam a compreensão que o homem tem de si mesmo, de sua capacidade de conhecer e de definir objetivos, e do entendimento que formula sobre o ambiente que o cerca e do qual ele próprio participa como co-produtor. Considerando as diversas possibilidades instauradas nessa ação, o homem se sente profundamente tocado pelo desejo de definir, social e consensualmente, o porquê e qual a melhor forma de conhecer. Determinar as finalidades e metas que precisa atingir, os objetivos que deseja alcançar, as necessidades a suprir, os valores, éticos, políticos, epistemológicos e antropológicos que necessita realizar, e como fazer tudo isso. A produção do conhecimento envolve a junção de muitos elementos, um conjunto de fatos e circunstâncias ligados entre si. Isso me permitiu falar dos meandros e complexidade dos limites epistemológicos e, no caso deste texto, dirigir a atenção a uma abordagem específica relativa à pesquisa em educação. A complexidade graça tanto os objetos ou fenômenos de pesquisa no contexto espacial e temporal em que se localizam como as pesquisas e as circunstâncias em que essas se realizam. De modo que, em uma análise epistemológica é preciso compreender a “obra científica como um todo lógico que articula diversos fatores, os quais lhe dão unidade de sentido. Essa unidade de sentido se produz em condições histórico-sociais que a determinam e a caracterizam como única e como parte do processo maior de produção do conhecimento humano” (GAMBOA, 2012, p.56). Tanto o conhecimento como a formação do sujeito cognoscente são processuais e exigem pensar em nossa época histórica, nos problemas que ela apresenta, nas perspectivas de solução dos mesmos e nas limitações expressas neste esforço intelectual, no confronto de ideias e concepções e nas possibilidades de compreensão e interpretação que elas traduzem. Enfim, nos desafios que o conhecimento enfrenta, sobretudo, na educação. Envolver-se com o processo do conhecimento em educação, com base em uma epistemologia que tem como preocupação indagar sobre as condições de possibilidade e limites do conhecimento científico, impõe que se pense acerca dos 170 recursos epistemológicos e metodológicos disponíveis. Porém, esses não são os únicos elementos a considerar, também existem os aspectos éticos e políticos que sustentam a pesquisa. A produção do conhecimento não pode prescindir de interrogações a esse respeito, a fim de que para além do rigor metodológico, alcance o rigor ético, político e epistemológico. A ética consiste em uma atividade teórica que se funda, sobretudo, no princípio do bem e, com base nele, compreende, interpreta e explica o comportamento moral. Ética e moral, então, são ações teórico-práticas que consubstanciam a vida do homem em sociedade. Se no seu jeito de existir cultural e historicamente, o homem assimila noções de bem e de dever, assim como dos princípios de responsabilidade, de justiça e de compromisso que aos poucos vai reelaborando para dar forma a uma consciência particular do bem, do dever e de todos esses princípios, pode-se supor que a existência dessa consciência, que tem claro o conjunto de valores que assume singularmente, facilitaria o trabalho da ética. Porém, isso não é suficiente, pois o caráter social da vida humana exige que o bem seja pensado do ponto de vista plural para que nenhum bem particular venha contrariar o bem coletivo. Mas como fica isso na dialética da vida? Na exigência da definição da noção de bem pode-se notar os conflitos entre o individual e o coletivo que a ética não consegue resolver posto que a sua responsabilidade é investigar sobre o bem e o comportamento moral dos homens e não determinar o que cada indivíduo tem que fazer em cada situação. Como a existencialidade humana tem caráter social, a relação entre as atividades de pesquisa e as obrigações morais, deve ser considerada não apenas pelo pesquisador, uma vez que ficaria no âmbito da singularidade. “Em suma, o limite ético da pesquisa é traçado pela dialética entre consciência individual, sociedade civil e sociedade política legitimamente empossada. Todavia, a consciência do pesquisador é a última instância de decisão.” (NOSELLA, 2008, p. 265) Em sua existência, todo homem é chamado a tomar decisões que envolvem compromissos éticos e capacidade de discernimento suficiente para compreender o processo histórico na constituição de seus nexos e contradições. Esse caráter decisório da existência humana efetiva relações de poder, mas também instaura a liberdade que se insinua na relação do sujeito com o mundo. Seja o sujeito livre um indivíduo, grupo ou classe, seja a liberdade afirmada, relativa, limitada, negada, precisa existir como condição 171 da vida política. Pode-se, então, dizer que o ethos existencial humano é fundamentalmente ético, mas também político. A ética e a política são amálgamas da vida social. E se o conhecimento se faz nesse espaço, então é preciso perguntar: Está o conhecimento acima do bem e do mal? Goza ele de uma neutralidade axiológica? A produção do conhecimento constitui uma ação isenta de um comportamento moral? Assim, ao pesquisador cabe perguntar que implicações éticas, políticas, sociais, epistemológicas e pedagógicas, tem sua pesquisa? Que contribuições ela traz para a sociedade no momento histórico em que está sendo realizada? Com que ou com quem o conhecimento que está sendo produzido tem compromisso? Sobre o que tem responsabilidade? Dizendo de outro modo, o pesquisador não pode fugir de sua responsabilidade ética e política no fazer pesquisa. Como ação realizada histórica e socialmente, gerar conhecimento não escapa ao caráter político da existência humana, portanto, das relações de poder que definem esse ethos como político. De modo que qualquer que seja a abordagem tem que se adequar ao que é considerado uma boa pesquisa, ainda que isso não se faça sem questionamentos. Então, é necessário pensar sobre o que determina uma boa pesquisa em educação, os critérios com que se julga tanto no nível das agências de fomento, em que se decide se é necessário, qual o montante e qual pesquisa vale à pena financiar, como no cerne dos programas de pós-graduação onde o processo de produção do conhecimento passa pela validade concluída nos rituais de qualificação e defesa dos textos de teses e dissertações. Tanto que para a exposição dessas, Gamboa (2013, p.134) sugere que “é fundamental atender às formalidades, às exigências técnicas, aos critérios de rigor do trabalho científico (normas técnicas, ABNT) e as recomendações das agências de fomento [...].” Contudo, neste processo de avaliação e validação de pesquisas pode-se observar, de acordo com Nosella (2010) o burocratismo acadêmico e o nivelamento pelos títulos e diplomas, a fragmentação epistemológica e as visões genéricas de muitos estudos. Sabe-se que um dos maiores centros de elaboração do conhecimento atualmente são as universidades e que as dificuldades enfrentadas por elas no desenvolvimento das pesquisas são as mais diversas no contexto brasileiro.. O crescimento e a consolidação de Programas de Pós-Graduação e de grupos e núcleos de pesquisa tem trazido à tona, e com frequência, discussões sobre as dificuldades no trato com a pesquisa em educação. Indagações relativas à cientificidade 172 do campo educacional, sobre o estatuto epistemológico da educação, e sobre o que vem sendo produzido na área, como são feitas essas produções e quais os critérios de avaliação dessas produções, frequentemente funcionam como eixos em torno dos quais se realizam essas discussões. Além da exigência de um estatuto epistemológico bem definido frente a complexidade do fenômeno educacional, outra dificuldade, conforme Kuenzer e Moraes (2005) é um impulso produtivista e um recuo da teoria. Gamboa (2011), por sua vez, apontou as dificuldades consequentes do recente desenvolvimento da pesquisa na universidade brasileira, das condições oferecidas pelas instituições para a produção da pesquisa, da multiplicação desarticulada de grupos, das demandas diferenciadas das agências de fomento até as limitações oriundas de concepções de ciência predominantes ainda nos programas de pós-graduação. As críticas que fertilizam a história da produção do conhecimento incluem avaliações sobre as metodologias de investigação, as condições de realização dos estudos e os critérios utilizados para reconhecer a importância e relevância das pesquisas. A esse respeito Marli André (2000) observou que os critérios de validade, de fidedignidade, e de generalização com que se julgavam os trabalhos científicos, assim como os pressupostos e os métodos de pesquisa passam por críticas, as quais ensejaram novos modos de pensar e de fazer pesquisa baseados nos critérios de plausibilidade, de credibilidade e de transferência. Por outro lado, Moraes (2001) mencionou que as pesquisas em educação, aos poucos, têm suprimido a discussão teórica e isso trouxe sérias implicações tanto políticas, como éticas e epistemológicas à produção de conhecimento nesse campo investigativo. Isso se deve a uma “utopia praticista”, para a qual o “saber fazer” é suficiente e descarta a teoria ou mesmo a restringe a um discurso persuasivo, porém fragmentário. O principal argumento usado pela autora diz respeito à perda de referência ocasionada pela crítica contemporânea que basicamente baniu a racionalidade moderna e com ela os métodos, a verdade, o racional, a objetividade, perdendo-se, então a possibilidade de apreender cognitivamente o real, instaurando assim uma crise epistemológica. Essa crise é identificada como o “recuo da teoria”, responsável pelo ceticismo instalado na sociedade atualmente. Segundo Moraes (2001, p.13) esse ceticismo “não é apenas epistemológico, mas também ético e político”. No que diz respeito ao processo de teorização em educação, mais recentemente, Saviani (2007) questionou se seria possível a existência de uma teoria da 173 educação, propriamente científica e sugeriu que antecedendo essa questão é necessário ter em vista a pluralidade de sentidos dessa expressão e a exigência de considerar o seu significado no cerne da concepção na qual se insere. A educação possui uma especificidade que lhe é própria e que precisa ser observada nas discussões que se fazem a seu respeito, sejam elas de maior teor filosófico, epistemológico, histórico, ético, pedagógico e mesmo estético, que é o fato de se constituir uma prática social e, como tal, complexa. Estudiosos do assunto, como Antônio Joaquim Severino, por exemplo, chegam à conclusão de que fazer ciência na educação é diferente de fazer ciência nas ciências naturais e nas ciências humanas. Sobretudo em função do caráter práxico da educação, em decorrência do qual “se impõe a exigência de uma profunda reconceituação de ciência”. (SEVERINO, 2001, p.17). O desafio nesse processo cognoscente é o reconhecimento das diferentes dificuldades que atingem a ação investigativa e afetam direta e indiretamente a produção de conhecimento intelectual em educação. Dentre essas, além das já mencionadas neste texto, que outras dificuldades podem surgir? Existem aquelas especificamente relativas ao caminho traçado por um pesquisador na singularidade de um determinado projeto de pesquisa. Mas, no que consiste à particularidade da abordagem dialética e do ponto de vista epistêmico que dificuldades são estas? A partir dessas reflexões emergiu a questão fundamental que orientou a produção desta seção: Quais os limites epistemológicos na abordagem dialética quando seus pressupostos são aplicados na construção das Teses Doutorais provenientes dos Programas de Pós-Graduação em Educação? Entre todos os aspectos desafiantes no processo do conhecimento em educação e considerando-se o poder heurístico da abordagem dialética, está o que considero um dos desafios mais instigantes que é reconhecer a presença necessária da contradição na lógica constitutiva da realidade e suas implicações no conhecimento, que por sua vez, do ponto de vista da perspectiva filosófica em questão, não prescinde desse princípio. Por isso, é preciso atentar para os limites e possibilidades que a unidade dos contrários, fundamental nessa lógica, pode oportunizar. Lidar com todas essas questões num esforço para que elas não ressoem negativamente na pesquisa, também foi um grande desafio. Em se tratando de conhecimento científico e de sua elaboração na educação, ainda há muito que se discutir, apesar da produção que se tem a respeito do assunto. 174 Desse modo, formulei como objetivo desta seção analisar as implicações epistemológicas da abordagem dialética na produção do conhecimento científico resultante das Teses Doutorais. Os meandros e a complexidade dos limites epistemológicos em uma abordagem também epistemológica, no âmbito da pesquisa em educação, definem-se a partir tanto do objeto de investigação como dos pressupostos teóricos que sustentam a abordagem, de possíveis carências teóricas do pesquisador e das circunstâncias em que a pesquisa é realizada. Por isso, considero nesta análise as abordagens cujos princípios orientam as metodologias nas teses, o sujeito epistêmico, o objeto e a materialidade deste e a relação entre os dois, a teoria que fundamenta os pesquisadores cujas teses são aqui consideradas e a verdade a que chegam em suas pesquisas. 5.1 A RELAÇÃO ENTRE O SUJEITO E O OBJETO NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO. Para ser produzido, o conhecimento necessita de um sujeito que duvide, questione, indague e execute essas ações sobre um objeto. Mas como esses dois elementos, fundamentais a essa produção se relacionam no processo gnosiológico? Essa é uma questão tão importante que Hessen (1987, p.87) considera que “o verdadeiro problema do conhecimento consiste no problema da relação entre o sujeito e o objeto”. Esses são considerados por Gamboa (2013) os dois primeiros princípos do conhecimento. A compreensão que se tem desses dois elementos, do papel que cada um realiza frente ao processo de conhecer, efetiva diferentes percepções que marcam as diversas concepções filosóficas de conhecimento. No transcorrer da história, pode-se notar que se destacam três formas de se situar acerca da questão, que são mencionadas pelos dois autores acima referidos. Esses posicionamentos dizem respeito à supremacia do sujeito, no cerne das abordagens subjetivistas ou do objeto, no âmbito das abordagens objetivistas. Mas, é ainda em meio ao movimento realizado pela história que se pode notar um esforço epistemológico no sentido de se superar a dualidade entre subjetivismo e objetivismo e a se manter um equilíbrio entre sujeito e objeto, os dois elementos fundamentais sem os quais o conhecimento não existe. Porém, sem descartar a especificidade de cada um. Afinal, no processo do conhecimento, quem conhece é o 175 sujeito. Resta então uma questão: como o equilíbrio é efetivado entre os dois princípios e como esses se relacionam nesse processo? Das três abordagens referidas na análise realizada na quarta seção, interessou- me de modo particular ao estudo que culminou neste texto a respeito do sujeito, do objeto e da relação entre eles, as abordagens fenomenológica44 e a dialética, posto que são elas que se destacam como subsidiárias das teses analisadas na pesquisa realizada no processo de doutoramento, muito embora o objeto de investigação seja centrado na dialética. O esforço teórico voltado em alguns momentos à fenomenologia, nesta tese, é importante não somente porque a abordagem filosófica é encontrada entre as teses analisadas, mas especialmente porque, segundo Rezende (1990), a fenomenologia realiza diversas dialéticas no processo do conhecimento. Na perspectiva fenomenológica, a relação entre sujeito e objeto consiste em uma correlação entre entidades jamais dissociadas. Em uma aproximação com Edmund Husserl, nessa relação em que a consciência cognoscente estabelece com um fenômeno que se mostra, ela, para conhecê-lo, precisa lançar mão da epoché45, ou seja, colocar em suspensão toda e qualquer informação prévia sobre o objeto, “todo o conheciento, crenças e valores a fim de permitir que o mundo seja compreendido como vivência” (SOARES, 2009, p. 303). A epoché seria a garantia, do ponto de vista da fenomenologia husserliana, desse sujeito epistêmico, impessoal, indicado por Gamboa. De modo semelhante, mas do ponto de vista positivista, essa impessoalidade seria a neutralidade do pesquisador. Essa vivência supõe abordar o objeto no cerne do contexto em que ele está inserido, ou melhor, do qual faz parte, levando em consideração que esse ambiente é essencial para compreender a pluralidade fenomênica de sentidos. Isso é importante para entender os significados que brotam no meio cultural, onde a consciência e o fenômeno se relacionam. Vivenciar o fenômeno significa, pois apreendê-lo em sua polissemia, o que permite intuir a essência, num processo em que conhecer supõe descrever. 44 Talvez uma melhor classificação dessa abordagem seja “fenomenológica ou histórico-hermenêutica”. A respeito dessa classificação cf. HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e Interesse. Rio de Janeiro: Zahar, 1982, e GAMBOA, Sílvio Sánchez Projetos de Pesquisa, fundamentos lógicos: a dialética entre a pergunta e a resposta. Chapecó, SC: Argos, 2013. 45 Cf. Conferências de Paris. 176 Um exemplo da importância e necessidade de considerar o fenômeno no contexto no qual ele emerge pode ser constatado nas palavras de Pansarelli (2010, p.27) quando ele se refere à hermenêutica e à “defesa incondicional da interpretação contextualizada” como marcas de sua postura enquanto pesquisador. Em Husserl, o cuidado em explicitar a relação da consciência do indivíduo com o fenômeno indica uma exigência de auto-reflexão e a necessidade da intersubjetividade no processo do conhecimento. A auto-reflexão radical, porém, é plenamente universal, é inseparável e, ao mesmo tempo, inseparável do método fenomenológico genuíno da auto-reflexão na forma da universalidade essencial. Mas a auto- interpretação universal e essencial significa domínio sobre todas as possibilidades ideais inatas ao ego e a uma intersubjetividade transcendental. (HUSSERL, 1992, p. 37) Para Husserl a consciência e os objetos cognoscentes são correlatos. Da mesma forma, em Heidegger o sujeito não existe sem o mundo, do mesmo modo em que o mundo depende da compreensão do ser. O sujeito é temporal, circunstancial e por isso mesmo finito. O conhecimento surge da relação entre os dois num processo em que conhecer é interpretar para compreender melhor.46 Tendo isso em vista, o conhecimento supõe uma autocompreensão. Nesse sentido, Seibt (2009, p. 262) afirma que “o que se consegue com a interpretação do próprio interpretar é muito mais uma postura atenta, crítica do ato de conhecer, do relacionar-se e do interpretar [...] que não está limitada por métodos e conteúdos prévios”. A interpretação é uma capacidade humana essencial no processo do conhecimento, sobretudo no âmbito da filosofia. Sendo assim, o caráter interpretativo do sujeito não é exclusivo de uma hermenêutica fenomenológica, mas também faz parte de uma hermenêutica dialética. Aliás, de acordo com Rezende (1990), a fenomenologia efetiva uma dialética que se sustenta na finalidade do sentido, em um esforço em compreender a dialética existente entre as estruturas do mundo e do homem com o objetivo de descrevê-lo. Como diz Ghedin (2004, p. 273): “Ver não é apenas perceber o objeto, mas fundamentalmente interpretá-lo. O universo da percepção é um feixe de interpretação. Esta dialética entre perceber e interpretar é que potencializa o pensamento, a linguagem, 46 HEIDEGGER, Martin. Ser y Tiempo. 2ª ed. Trad, Jorge E. Riviera. Santiago do Chile: Editorial Universitária, S.A. ,1998. 177 a criatividade e a inteligência humana.” O objeto necessita de um sujeito para ser visto, interpretado, por isso o sujeito é aquele que pensa e age “para além do imobilismo gerado pelas filosofias do não-sujeito”. (Idem, p.35), Nas abordagens dialéticas, sujeito e objeto constituem uma unidade contraditória e a relação entre eles se dá no cerne dessa unidade. Mas como pensar um sujeito e um objeto que se relacionam contraditoriamente? No contexto lógico dessa perspectiva, o sujeito se constitui por meio de uma relação dialética entre um sujeito particular, individual e outro universal, social. A esse respeito Gamboa (2013, p. 56) enfatiza a necessidade de diferenciar dois sujeitos quais sejam: um “empírico que se refere a uma pessoa que faz uma observação e é influenciada pelo que ela tem de particular e individual (interesse ou paixões)”, e o “epistêmico” que diz respeito a atividades relativas a uma abordagem científica determinada e não propriamente a uma pessoa47. O que essa síntese manteria do sujeito empírico? Como eliminar desejos, interesses e paixões? Como efetivar essa espécie de purificação do sujeito, mediante uma matriz disciplinar? Como fica a unidade na multiplicidade do próprio indivíduo? Penso que a questão agora é, considerando a dialeticidade, saber qual a síntese originada na negação da negação. É evidente que não se pode excluir da constituição do sujeito, o caráter social que marca a existência do indivíduo humano, posto que esse é datado e situado, não vive isolado e, por isso mesmo necessita seguir regras, estabelecer acordos, reconhecer limites, elementos que constituem a materialidade histórica do sujeito. É possível observar que apesar das diferentes concepções de sujeito, a sua dimensão social tende a vir à tona. Por isso, Pereira (2014, p.52) ao fazer uma pequena discussão sobre o conceito de sujeito, menciona as “dificuldades que o termo ‘sujeito’ assume em tempos pós-modernos”, para enfim afirmá-lo como sujeito social, capaz de expressar resistência mediante situações em que o seu “ser/estar” é negado. É interessantes notar, que na tese de Vieira (2010), em que o objeto de investigação “é a disciplina Filosofia da Educação”, especialmente como componente 47 Gamboa recorre a Fourez (1995, p.50) para dizer que o sujeito epistemológico diz respeito a “um conjunto de atividades estruturantes ligadas a uma abordagem científica determinada, paradigma ou matriz disciplinar. Refere-se a uma maneira socialmente estabelecida de estruturar o mundo”. 178 curricular do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Viçosa, a relação entre sujeito e objeto é compreendida com base em Castoriades. Nessa perspectiva, Vieira (2010, p. 29) afirma que “a fabricação social dos indivíduos só se efetiva à medida que esses interiorizam as instituições.” A sociedade é criada por indivíduos sociais, mas é também instituinte. Dessa compreensão, pode-se deduzir que o objeto, sobretudo relativo à educação, é criado pelo sujeito que, por sua vez é criado pelo objeto, enquanto sócio-histórico, num processo de reciprocidade. O sujeito é, portanto, expressão das instituições que ele mesmo cria. Todavia, entendo que, do ponto de vista da abordagem dialética e considerando a compreensão da dimensão social do sujeito, o sujeito empírico não pode ser totalmente apagado na constituição do sujeito epistêmico, pois o conjunto de atividades mencionado por Fourez (1995), referenciado por Gamboa (2013), no espaço particular de uma pesquisa, serve ao sujeito cognoscente que além disso e de poder contar com a tecnologia, pode e deve lançar mão de sua capacidade criativa. E, ainda, se o sujeito epistêmico diz respeito a uma abordagem científica, essa é produto de estudos, experiências e ações humanas. Essas atividades não são apenas executadas, são também pensadas, otimizadas pelo pesquisador, a partir do acúmulo de informações e experiências disponíveis, inclusive as suas próprias. Criadas e realizadas por um sujeito multidimensional e plurrelacional, portanto, reflexivo, criativo, político, social, moral, ético, axiológico, metodológico epistemológico etc., e não um mero executor, autômato, cumpridor de tarefas, com vistas a um fim. Se assim fosse, bastaria conter na análise do objeto as relações desse com o contexto social, e estariam totalmente invalidadas as informações referentes às relações do pesquisador com o seu objeto de pesquisa, relatadas em algumas teses como fragmentos do memorial de seus autores e autoras. É importante lembrar que no contexto de um estudo determinado, é esse sujeito que toma decisões, duvida, questiona, efetiva concordâncias e discordâncias ao aceitar e ou recusar o que já está instituído socialmente, embora faça isso a partir de referências culturais com as quais ele convive cotidianamente. É ele que muitas vezes paga o ônus dessa rejeição, sendo deliberadamente ignorado no meio científico ou 179 simplesmente considerado louco,48 até que consiga firmar um acordo com outros sujeitos, no que se refere à sua recusa e as críticas que a consubstanciam. De qualquer modo, a partir da resistência ao estabelecido, uma matriz disciplinar é melhorada, atualizada. Os desacordos organizados nas críticas geralmente desembocam em novas matrizes disciplinares. Gradativamente vai se efetivando um novo paradigma do conhecimento. Gamboa (2013, p. 56), por sua vez, considera que a constituição do epistemológico se dá “a partir do sujeito empírico, ou psicológico, destacando ou tomando dele algumas atividades que são privilegiadas para atender os pressupostos epistemológicos de garantir a explicitação pública das formas como são construídas as perguntas e as respostas”. Mas a análise das teses indica que nem sempre o sujeito epistemológico está preocupado em elaborar uma resposta, a lógica do conhecimento é conduzida por outros caminhos, onde o centro da preocupação do pequisador não se situa na busca por uma resposta. Nesse sentido, Ghedin (2004, p.14) é um exemplo quando diz: “pretendemos recuperar e por um problema mais do que lhe apresentar uma solução.” Na perspectiva de Hegel, a dialética é o processo de conhecer em que sujeito e objeto, a princípio opostos, perdem sua oposição. Com essa compreensão, o filósofo concretiza a sua pretensão de estabelecer a unidade entre ser e pensar, o que significa uma negação do diverso e uma afirmação do absoluto, fazendo da dialética uma filosofia do uno. Há aí um problema: se unindo ser e pensar, por um lado, Hegel assegura a elaboração do conhecimento sem limites para a razão, por outro, com a superação da contradição sugere a eliminação da diversidade e da dialética que tem na contradição o seu principal princípio. É preciso garantir a multiplicidade no uno. Mas, como? A solução é encontrada na própria lógica dialética, posto que com essa superação outras contradições surgem necessariamente para dar continuidade ao movimento da realidade, efetivando com isso a unidade na multiplicidade. Em Hegel, o conhecimento é processual e se desenvolve por meio da experiência sensível e da percepção que se efetivam na relação entre o sujeito e o objeto. Nesse processo, o tempo é importante, pois é nele que ocorre o movimento, é ele que 48 A história nos mostra que “os resistentes” que são reconhecidos, muitas vezes o reconhecimento vem depois de sua morte. E os pesquisadores que com eles entram em acordo é que efetivam um novo paradigma. 180 possibilita a passagem da experiência sensível à percepção. Na Fenomenologia do Espírito, Hegel demonstrou que é a partir do tempo transcorrido que se alcança a percepção, em um processo de negação que permite perceber a dialética do próprio objeto, as propriedades diversas que ele possui, assim como a capacidade de se pensar de diferentes modos, incluindo-se aí a própria contradição. Para esse filósofo não é difícil pensar assim, pois ao identificar pensamento e ser, como afirma Gamboa (1998, p.11) “uniu no conceito de lógica os três campos, dissolvendo a ontologia e a gnoseologia na lógica. Segundo ele, as leis do mundo objetivo são as mesmas leis da lógica.” Se a natureza do pensamento propriamente dita é dialética e, portanto, contraditória, então, com base em Hegel, Nunes (2002, p.12) pôde defender a tese de que “toda a produção pensante necessariamente também o é”. Logo, a educação consiste em um ato dialético, e o sujeito é reflexivo. Essa característica também é mencionada por Barão (2008). Com o entendimento de que sujeito e objeto são contraditórios e de que o “objeto é delimitado,” Barão (2008, p. 43) pode afirmar em relação ao seu objeto de pesquisa que “o estudo de um pensador social e da sua obra não pode ser apartado do meio social e histórico em que foi gerado”. O sujeito do conhecimento é aquele que reflete sobre a realidade, ou parte dela, de tal modo que para essa autora, a sua tese consiste na materialização de sua reflexão a repeito das questões relativas à história da educação. As características relativas ao sujeito epistêmico, ou melhor, as definições de sujeito nas teses analisadas são as mais diversas. Nesse sentido, além do sujeito reflexivo, pude extrair dos referidos textos outras características ou dimensões do sujeito. A ideia de autonomia do sujeito também pode ser encontrada nas análises contidas nas teses. Carvalho (2002, p. 202), entende que o mundo “como pleno vir-a-ser, não constitui um sistema, mas uma totalidade permanentemente geradora e destruidora de si mesma – um processo e não uma estrutura estável, um campo de forças instáveis em permanente tensão”. Por isso, para esse autor a educação necessita propiciar a libertação, precisa desfazer o determinismo ligado às situações objetivas e oportunizar, “o exercício da autonomia.” É possível notar nas análises desse autor, a necessidade de considerar a autonomia, a libertação e a ação na formação do sujeito, como garantia de efetivação do seu potencial transformador da realidade e de desenvolvimento do conhecimento. 181 Ao contrapor-se a postura determinista, a ideia de autonomia se insinua na interpretação que Loureiro (2008, p. 13) faz quando afirma: “não acreditamos que o sujeito seja determinado pela sua origem, o que caracterizaria uma visão determinista, tampouco podemos fazer esta inferência sobre o desenvolvimento de qualquer área do conhecimento humano, [...]”. Na questão da transformação da realidade social, é essencial a efetivação de um sujeito social, constituído por um conjunto de sujeitos particulares que, gozando de autonomia e liberdade suficientes para decidir, de acordo com o seu nível de consciência, se participam ou não de ações transformadoras, contribuem para a realização da práxis. Fundamentando-se no conceito de práxis “enquanto uma unidade dialética reflexão-ação”, Polli (2006, p. 107) compreende que o sujeito é dialógico, problematizador e interage com outros sujeitos com a finalidade de transformar o mundo. Roberto (2014, p.15), por sua vez, entende que o sujeito é o cidadão participativo e sua educação “depende de uma formação humana da qual a educação formal participativa é responsável”. Mas a efetivação da cidadania não é tão simples assim. Severino (1994, p. 98) observa que: Quando falamos de cidadania estamos nos referindo a uma qualificação da condição de existência dos homens. Trata-se de uma qualidade de nosso modo de existir histórico. O homem só é plenamente cidadão se compartilha efetivamente dos bens que constituem os resultados de sua tríplice prática histórica, isto é, das efetivas mediações de sua existência. Ele é cidadão se pode efetivamente usufruir dos bens materiais necessários para a sustentação de sua existência física, dos bens simbólicos necessários para a sutentação se sua existência subjetiva e dos bens políticos necessários para a sustentação de sua existência social. Além disso, penso que falar do sujeito participativo requer compreender algumas diferentes atitudes que podem acompanhar esse termo. Afinal, esse sujeito pode, especialmente em um contexto contraditório como o da sociedade capitalista, assumir diferentes posições que podem ser tanto conciliatórias como de rejeição. O sujeito participativo pode ser, pois, tanto resistente, crítico e combativo em determinadas situações como harmonizado a elas, em outras. Nesse sentido, Zanatta (2005, p.184) se refere à confirmação da hipótese do seu trabalho, de que “a forma conciliadora que caracteriza a participação de Serrano no 182 movimento educacional das primeiras décadas do século XX, foi construída em seu processo de vida e foi sua própria luta de vida”. Essas diferentes posições, sobre o fundamento da práxis, se situam como sustentação do próprio conhecimento transformador, uma vez que na práxis teoria e prática estão unidas na efetivação da transformação. Mesmo quando se trata de posições conciliatórias, ocorre alguma mudança. Assim como acerca das definições do sujeito, as compreensões que se tem dos objeto de pesquisa nas teses analisadas são as mais diversas e bastante esclarecedoras do entendimento sobre a relação entre esses dois princípios do conhecimento. Com o entendimento de que o sujeito é interessado e o objeto não constitui algo aprisionado no tempo e espaço, Pinheiro (2001, p. 2) menciona “que a direção do olhar do pesquisador, aquilo que lhe interessa desvendar e a forma como vai construindo seu objeto de pesquisa lhe possibilitam eleger os pressupostos teóricos que melhor possam se adequar ao seu objetivo”. Com esse autor tem-se a ideia de hitoricidade do objeto que se realiza além de um tempo e lugar determinados, de um objeto que percorre o tempo e atravessa espaços, mas que é construído. Nesse sentido, é importante observar que o objeto em si independe do sujeito, mas o objeto de pesquisa não. Fonseca (2010) indica que não existe uma determinação exclusivamente objetiva, que não é o objeto que, sozinho, dita as regras a serem seguidas ao afirmar: Projetamos nosso objeto de pesquisa sobre a historiografia quase como um ritual de passagem e de confirmação, e recolhemos dela aquilo que pretendíamos que fossem os elementos que corroborassem a nossa argumentação lógica. Feito o percurso anterior é chegado o momento das considerações finais. (FONSECA, 2010, p.133) De qualquer modo, o sujeito interfere na realidade. Estes “projetamos o nosso objeto” e “recolhemos o que pretendíamos”, na citação acima, dão forma à realidade pela interpretação que um sujeito particular faz dela, embora o material recolhido possa ser fruto da ação de outros sujeitos. Além disso, o uso da primeira pessoa do plural no projeto e na recolha de informações aponta para um sujeito que se afirma em sua socialidade. Mas, se é possível falar de sujeito social é porque os indivíduos em sociedade, não vivem isolados e tendem a se unir em grupos e classes sociais de modo 183 que o sujeito em sua individualidade não foge a sua socialidade, e é dessa forma que está implicado no objeto. Em uma aproximação a Marx, ou melhor, ao materialismo histórico subsidiado pela filosofia dialética, a produção do conhecimento carece de uma relação também marcada pela contradição entre sujeito e objeto, considerados em sua imersão na realidade histórica e social, em sua materialidade. De acordo com essa compreensão, as teses que, de alguma forma, fundam suas análises no materialismo histórico-dialético, indicam uma diversidade de características atribuídas ao sujeito epistemológico, mas todas elas conduzem a um sujeito ativo. Ao situar o seu objeto de pesquisa, Marx (1991) mencionou sua existência objetiva, isto é, sua independência em relação ao sujeito pesquisador. Mas é preciso considerar que o objeto de estudo desse autor era a produção material na sociedade burguesa, ora tanto essa produção como a sociedade onde ela é realizada são resultantes da ação humana. Logo, o sujeito está implicado no objeto. Sujeito que é particular, mas também social, empírico e epistêmico como síntese formada no processo do conhecimento. Ao fazer a diferença entre o método hegeliano e o seu, Marx (1996, p.16) afirmou: “Para mim, ao contrário, o ideal não é mais do que o material transposto para a cabeça do ser humano e por ele interpretado”. Ao mencionar a ação interpretativa, na constituição do conhecimento, o autor deixa transparecer que a reprodução do movimento real do objeto pelo pensamento não pode ser realizada de forma mecânica, mais uma vez dá indícios da construção do objeto pelo pesquisador. Afinal, em uma filosofia cuja categoria central é a práxis, o sujeito de pesquisa jamais poderia ter um papel passivo. Portanto, mesmo que uma investigação sobre um objeto de pesquisa consista em uma necessidade social e histórica, objetiva para o sujeito particular, para o indivíduo que se lança à investigação, esse não pode ser anulado, posto que no que se refere a sua pesquisa é ele, em primeira instância que realiza essa ação. Para falar de objeto de pesquisa se faz necessário considerar um sujeito pensante. Por isso, para Marx, o conhecimento é construído pelo pensamento em sua 184 capacidade operacional, é como pensa Prado Júnior (2001, p. 9)49 quando diz que o pensamento consiste numa ‘representação’ mental do concreto (isto é, da parcela de Realidade exterior ao pensamento conhecedor, e por ele considerada), representação esta elaborada a partir da percepção e intuição. Veja-se bem ‘representação’, e não reprodução, decalque ou outra forma da transposição de algo, da Realidade para o pensamento”. Sobre a possibilidade de escolha dos objetos, Almeida (2001, p.10), referindo-se em sua tese à produção de ciência e de tecnologia, indica-os como necessidade histórica e afirma que, nesse sentido, “a escolha dos objetos de pesquisa não é mera questão, de valor ou idiossincrasia, ou da racionalidade ou interesse pessoal, mas refere-se a um processo mais amplo, que predispõe os indivíduos perante determinadas possibilidades.” É como necessidade histórica que o objeto pode ser entendido como síntese de múltiplas determinações, ou seja, determinado pelo contexto em suas múltiplas dimensões, mas também, de certa forma, pelo pesquisador, pois essa predisposição a que se referiu Almeida (2001) e essa necessidade histórica que marca o objeto, não anulam a escolha por parte do pesquisador, tendo em vista que como não se trata de uma única necessidade, é possível dizer que o sujeito escolhe o que quer pesquisar, na medida em que privilegia uma necessidade histórica dentre tantas outras. O problema parece estar contido em certas interpretações que em nome do sujeito social e histórico descaracterizam o sujeito particular nesse processo, ainda que se tenha que observar que sua sociabilidade implica no “conjunto geral das relações sociais” Por ser um sujeito e um conhecimento situados a criatividade na elaboração do conhecimento traz a marca dos fatores políticos, econômicos e culturais de uma época. Por isso, e em função do movimento da realidade é possível falar da variação do objeto. 49 Para esse autor, há uma forma de conceber o conhecimento, que o compreende “não como resultante de uma elaboração propriamente, e sim como ‘apreensão’ de algo exterior ao intelecto ou pensamento, e preexistente a ele e suas operações. E que apreendido e incorporado ao pensamento, se faz Conhecimento. Essa forma de interpretar o Conhecimento, e que constitui o maior embaraço oposto à adequada análise e interpretação dele, se insinua, no mais das vezes inadvertida e desapercebidamente” (PRADO JÚNIOR, 2001, p. 9) 185 Nessa perspectiva, e apropriando-se da educação praticada pelos franciscanos no Brasil Colonial como objeto de estudo, Inglésias (2010, p. 4) frisa ser necessário apreender a “variação do objeto de estudo através do tempo”. A análise dessa mobilidade objetiva remete à necessidade de considerar o contexto histórico em que o objeto é “delimitado”, “elaborado”, “construído”, “apropriado”. Mas, considerando a relação entre sujeito e objeto e as diferente abordagens teóricas resta situar a partir de que elementos é possível observar os limites interpostos no processo cognoscente e no processo transformador da realidade, que o conhecimento ajuda a realizar. Nessa perspectiva, se é preciso considerar o contexto histórico na delimitação do objeto então o contexto em que se situa o objeto de pesquisa é um elemento limitador. Contraditoriamente, embora ele permita uma visão mais completa do objeto, nem por isso deixa de limitá-lo, ainda que isso decorra da necessidade de situá-lo no espaço e no tempo, porque se refere a um tempo e espaço determinados, apesar da flexibilidade do objeto, isto é, de sua variação histórica. Dialeticamente, é possível falar não somente em delimitação, mas também em elaboração e em construção do objeto e dizer que essa se faz por meio de um modo de pensar por contradições as contradições que a realidade apresenta. Ainda que se pense a objetividade, ao aproximar-se de um objeto com intenções investigativas o sujeito já interfere de algum modo nesse objeto que perde a qualidade de “em si” e passa a ser objeto de estudo, de interesse de um sujeito em particular. É isso que me permite falar em elaboração e em construção e não apenas em apropriação e ou delimitação, ainda que em uma perspectiva que considere a realidade em sua materialidade. Um objeto também pode ser um limitador do conhecimento, posto que o pesquisador tem necessidade de delimitá-lo, de construi-lo, etc. No âmbito da educação, por exemplo, ao se considerar o ensino como objeto de investigação, o sujeito cognoscente precisa delimitar o objeto, definir de qual ensino vai tratar, que aspectos e relações vai privilegiar em seu estudo. Isso significa que todo conhecimento inicia com limitações, pois no momento em que o sujeito cognoscente dirige a sua atenção para um aspecto da realidade, no sentido em que é esse aspecto, essa particularidade que ele lançará à investigação, o ato de delimitar, já impõe um limite. A relação entre sujeito e objeto é contraditória, pois ao 186 mesmo tempo em que esses dois elementos ou princípios, são possibilidade de conhecimento, no âmbito da relação entre os dois, surgem como limitadores. Do mesmo modo, as ações que marcam a relação entre o objeto e o sujeito e apontam uma relativa dependência do objeto em relação ao sujeito, possibilitam a percepção de que os limites do conhecimento se insinuam na elaboração do objeto, de estudo, pois o pesquisador é quem demarca o que quer e precisa pesquisar em uma determinada realidade, ainda que isso se coloque para ele como uma necessidade histórica. Logo, as ações subjetivas também impõem limites. Nesse sentido é que, para Ghedin (2004, p 237), “os limites do conhecimento são limites de nossas habilidades criativas, não da infinidade da realidade. Por isso, ele é busca permanente que possibilita, ao longo de toda trajetória, o descortínio de nosso próprio ser no horizonte do mundo.” Resta agora observar que limites cada fundamentação teórica que sustenta a metodologia de investigação e as análises dos objetos de estudo podem provocar no conhecimento. Na fenomenologia, aprender o fenômeno em seus diversos e diferentes sentidos é essencial a um processo em que conhecer é descrever. Assim, o discurso descritivo assume grande importância, mas que palavras traduzem com eficiência esse fenômeno? Essa pergunta traz suspeitas de que as limitações do conhecimento em estudos fenomenológicos, podem se situar no discurso. Mas, Rezende (1990) diz que o discurso fenomenológico é relevante, pertinente e suficiente. Contudo, a redução realizada pela epoché proposta por Husserl apresenta um limite no processo do conhecimento, uma vez que essa estratégia metodológica não consegue realizar uma redução completa, pois não se pode retirar todas as determinações que a fenomenologia exige. Trata-se de um limite da própria lógica fenomenológica de conhecimento. Muito embora essa impossibilidade seja considerada por Husserl (1992) a maior lição que essa redução nos dá. A dilética também não se isenta de limitações de modo que o materialismo histórico ao se apropriar do princípio de totalidade da dialética não consegue escapar das limitações. Nesse sentido, assim como a redução fenomenológica não consegue eliminar todas as determinações exigidas pela fenomenologia, o princípio de totalidade não atinge, metodologicamente, todas as relações que envolvem o processo dialético da realidade, 187 seja esta social ou natural, embora essa perspectiva de atingir tudo do todo, seja ingênua, como propôs Kosik (1976). O princípio de totalidade da dialética é compreendido no materialismo como totalidade concreta que, segundo Kosik (1976, p. 44), “é uma teoria da realidade e do conhecimento que dela se tem como realidade”. Uma teoria que entende a realidade como um todo estruturado, processual e em desenvolvimento, o que é um avanço. Mas, os princípios epistemológicos decorrentes da dialética, aliados a essa teoria, não escapam à limitação do conhecimento nessa abordagem teórica. Embora pelo princípio de totalidade seja possível conceber a realidade como um todo estruturado, o que indica que para conhecer um de seus elementos é necessário compreender as suas relações com o todo, o que depõe a favor do seu poder heurístico, isso não se faz sem limitações. Se realmente tudo é um eterno fluir, então a totalidade é movediça e o conhecimento só consegue saber sobre um instante do movimento desse todo estruturado. É nesse sentido que se pode falar de limites do conhecimento dialetico quanto à totalidade. Além disso, tanto no pensamento como na realidade objetiva, a contradição é o princípio limitador no processo do conhecimento na lógica dialética. E isso se explica pelo seu próprio caráter: ao mesmo tempo em que abre possibididades ele impõe limitações, que não cessam com a unidade dialética onde as contradições se superam, uma vez que essa superação é, por sua vez, a abertura para novas contradições, vitais para manter a realidade e o conhecimento em movimento. Em função do poder heurístico que isso constitui, essa limitação subjacente à contradição tende a uma naturalização que, de certo modo, oculta os limites nesse processo. Não há método infalível, no sentido de que não apresenta nenhuma limitação, assim como não há teoria que explique tudo, mas diante da obviedade disso, as limitações passam a ser consideradas naturais nesse processo. Compreendo que é necessário pensar mais sobre isso. Do ponto de vista do aspecto político, o princípio de contradição possibilita saber que o movimento transformador da realidade social só é possível em função da contradição objetiva constituída pelas relações sociais de produção em Marx, pelas relações intersubjetivas expressas pelo conhecimento elaborado socialmente e efetivadas pelas ações subjetivas com a decisão dos indivíduos de participarem ou não politicamente em prol da transformação, seja essa atitude criticamente consciente ou não. Entretanto, a transformação é apenas uma possibilidade. 188 O princípio de contradição permite saber que o movimento transformador da realidade social só é possível em função da contradição objetiva constituída pelas relações sociais de produção em Marx e intersubjetivas, expressas pelo conhecimento elaborado socialmente. Mas também subjetivas com a decisão dos indivíduos de participarem ou não politicamente em prol da transformação, seja essa atitude criticamente consciente ou não. Entretanto, a transformação é apenas uma possibilidade. No que se refere à epistemologia esse princípio ao ser apropriado como categoria de análise pelo pesquisador, na medida em que proporciona possibilidades cognoscentes, permitindo reconhecer, refletir e analisar as contradições, coloca em evidência o poder heurístico da dialética. Contudo, se na perspectiva idealista a limitação consiste em manter a transformação no nível das ideias, do pensamento, no materialismo o limite epistemológico está em intentar uma unidade dos contrários a fim de superar as contradições. Esta superação não depende propriamente do epistemológico, ainda que do conjunto deles, e quando as contradições são superadas em uma unidade dialética, imediatamente outras contradições são geradas e outros limites se interpõem no processo do conhecimento, ou seja, os limites não são superados de uma vez por todas. Embora haja avanço, a questão dos limites permanece. Uma das dificuldades que o pesquisador que assume o materialismo histórico- dialético enfrenta é efetivar concretamente uma categoria essencial à filosofia dialética, a práxis, unidade entre teoria e prática cuja finalidade vital é a transformação, porque essa não constitui um resultado exato, porém apenas possível. Do ponto de vista da dialética é necessário considerar os princípios de contradição e de totalidade por meio dos quais as limitações se insinuam no processo do conhecimento. Assim como a complexidade com que se dá esse processo limitador que se realiza contraditóriamente como limitação e possibilidade constituindo uma tensão que dinamiza o conhecimento e o faz avançar, mas não sem impor-lhe limites nesse processo. Nessa teia de relações vão se colocando as possibilidades epistêmicas, mas também as suas limitações de modo a cumprir o princípio de contradição que fixa o caráter dialético da realidade. 5.2 A PROVA REVELADORA DA MATERIALIDADE DO OBJETO A questão da materialidade do objeto, da sua maior ou menor importância no processo do conhecimento, em especial em educação, relaciona e confronta diferentes 189 concepções de sujeito, objeto e conhecimento, e não constitui uma questão simples como pode parecer. No que se refere a análise de uma produção científica, a primeira dificuldade encontra-se no fato de que nem todos os autores indicam diretamente o seu objeto de pesquisa, restando ao pesquisador deduzi-lo por meio de sua própria interpretação do texto analisado. Das doze (12) teses orientadas pelo professor Severino, 42% não indicam diretamente o objeto de pesquisa e das treze (13) sob a orientação do professor Saviani, 31% não o fazem. Ao observar as teses que serviram de material de análise, com os seu diferentes objetos de investigação, em algumas parece simples situar a materialidade do objeto, em outras não. Este elemento característico do objeto parece surgir sem nenhuma hesitação, quando se trata, por exemplo, da definição de objetos de estudo como os de Almeida (2001, p.7), “a Unicamp”, de Murasse (2001, p. 2), “o Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro” e já que se trata de uma universidade e de uma instituição escolar, a sua qualidade material não deixa dúvida a nenhum leigo nessa discussão epistemológica, e o de Barão (2008, p. 9) que são os “escritos educacionais de Florestan Fernandes produzidos nas décadas de 50 e 60.” Mas não parece tão simples assim dizer da materialidade de um objeto de pesquisa que é identificado como nos exemplos a seguir, como: O objeto de estudo de Horn (2002) identificado por ele como “a compreensão das questões que emergem das práticas pedagógicas do ensino de Filosofia no Paraná, bem como as possibilidades de ampliação do espaço e da pertinência da disciplina na escola”, o de Polli (2006) apontado como o “campo específico da eticidade” e o de Scalcon (2003) indicado como “a unidade teoria e prática no processo de alfabetização”. Quando se trata da matéria enquanto componente físico a percepção é imediata. No entanto, quando diz respeito às relações vividas pelo homem, a matéria parece um pouco mais difícil de ser percebida. Além disso, é preciso considerar que essa questão assume diferentes interpretações e compreensões, de acordo com a perspectiva teórica que dela trata e de como se desenvolve o conhecimento a partir de cada uma delas. O processo cognoscente nas abordagens fundadas na fenomenologia é indutivo, toma as partes como ponto de partida e se dirige ao todo, em busca dos significados dos fenômenos e de seus sentidos, para o que se faz necessário recuperar os contextos onde cada fenômeno se mostra e em que as diferentes manifestações 190 fenomênicas se juntam para constituir um todo que pode ser compreendido e interpretado50. Nessa perspectiva, se de algum modo é possível falar de matéria, esta constitui um fenômeno que se dá a conhecer a um sujeito que busca compreender o seu caráter polissêmico. De qualquer modo, em função disso, o importante para essas abordagens são os diversos significados e sentidos do objeto de estudo e não propriamente a sua materialidade, as suas leis e causas. Penso que foi com essa perspectiva que Pansarelli (2010) buscou o contexto em que se situa a obra de Dussel, seu objeto de investigação. Em sua análise esse autor se debruçou sobre os conceitos eurocênctricos com o intuito superá-los e de criar novos conceitos, novos significados a fim de fazê-los alçar um sentido pertinente ao contexto latino-americano. Contudo, na segunda parte da tese, onde, embora sem desconsiderar Dussel, o autor diz que é o momento de maior autonomia das suas proposições e de sua autoria, o sentido de materialidade se torna central, uma vez que é nessa etapa, que a “materialidade dos corpos,” sua “carnalidade concreta”, é proposta como critério de validação dos processos de libertação desejados pela filosofia da libertação. Rezende (1990, p.20) observa que “a fenomenologia não é materialista, no mesmo sentido que o marxismo.” A preocupação dessa abordagem é muito mais com a existência do que com a matéria. Para ela, a dialética não é determinista, mas sim estrutural polissêmica e simbólica. A centralidade da polissemia fenomênica nas pesquisas nessa abordagem não ignora o caráter social da existência humana, todavia a subjetividade na sua individualidade também é essencial, sobretudo na realização da epoché. Isso permite Ghedin (2004, p. 320) afirmar que “o processo de aula é sempre um processo grupal; é algo que se dá sempre em grupos de estudantes, embora que quem aprende é o estudante em sua individualidade e em sua subjetividade, além de outros fatores que interferem neste processo.” Nas abordagens dialéticas o processo do conhecimento é dedutivo vai do todo às partes, contudo, sem descuidar de voltar ao ponto de partida. Mas é preciso um cuidado especial, no sentido de discernir as abordagens idealistas das materialistas, posto que elas têm diferentes posturas sobre o assunto. 50 Cf. Gamboa, 2012 191 No geral, para uma abordagem idealista é preciso primeiramente investigar o espírito, ou seja, é necessário buscar as leis gerais do pensamento humano. Para Hegel (2005, p.436) “a essência do espírito é formalmente liberdade, negatividade absoluta do conceito de identidade,51” o que significa que não exclui totalmente a contradição. Para ele, a realidade é vir a ser, é desenvolvimento, compreendido como processo dialético. Grosso modo, para os idealistas, o pensamento é o criador da realidade, do concreto. De maneira que os fatos só adquirem sentido e significado na mente humana. Para os materialistas, histórico-dialéticos, é o contrário, como se pode observar nas palavras do próprio Marx (1999, p.37): “os homens, ao desenvolverem sua produção material, e seu intercâmbio material, transformam também, com esta sua realidade, seu pensar e os produtos de seu pensar. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência.” A materialidade do objeto é constituída no cerne da matéria social que é forjada na produção material da vida. Por isso, é possível notar que os autores que identificaram suas teses como materialistas histórico-dialéticas buscaram referir a materialidade de seus objetos de estudo, realizando um esforço na perspectiva de esclarecer as relações entre o objeto de pesquisa com a base econômica e com as relações sociais de produção dela advindas. Nesse sentido, Silva (2001, p.22) ao investigar “a Campanha Nacional de Escolas da Comunidade”, analisa as novas tendências de privatização da educação brasileira enfatizando a relação do seu objeto de estudo com o Estado, dirigindo sua análise à demonstração do modo como “o discurso da comunidade serve aos interesses das políticas neoliberais, com a ampliação do mercado para setores sociais, especialmente o setor educacional. (SILVA, 2001, p.24). Nos estudos de Marx, a materialidade é compreendida como a base econômica e as relações que ela provoca e que as sutentam. Na produção social de sua existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade, essas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e intelectual. (MARX, 2008, p. 47) 51 Traduzido da edição em espanhol. Cf referências 192 Do ponto de vista do marxismo, um paradigma não se estabiliza se estiver desligado dos acontecimentos materiais, o que significa dizer da base econômica e das relações de produção. Na tese de Coutinho (2013, p. 17) “o problema da formação prática dos pedagogos no Brasil” é, na compreensão da autora, determinado histórica e pedagogicamente como uma consequência da relação entre teoria e prática. Essa autora dá indícios de que seu objeto de pesquisa tem relação direta com a base econômica, primeiro quando da criação do curso de Pedagogia onde se nota que a sua função é nitidamente a de formação profissional. Depois na década de 1960, com um conjunto de documentos tais como o parecer de Valnir Chagas em 1962, a Reforma Universitária de 1968 e o Parecer 252 em 1969 funcionalidade do curso de Pedagogia no Brasil passou a referir, de acordo com Coutinho (2013, p. 236) “os princípios de racionalidade, produtividade e eficiência por meio da pedagogia tecnicista, assumida como orientação pedagógica oficial do estado”. Há nessa análise uma relação indireta entre a formação prática do pedagogo e a economia. Nas teses de Fonseca (2010, p.3) que tem como objeto de estudo a condição social do trabalho manual no período colonial e de Souza (2012) com a Confederação Nacional da Indústria – CNI, a materialidade dos objetos de pesquisa, do ponto de vista marxista, salta aos olhos, pois seria esdrúxulo tratar desses objetos sem considerar a base econômica. Nessa perspectiva, as ações que consistem na multidimensionalidade giram em torno da economia e das relações sociais de produção, por isso mesmo, Luciano (2001), que no resumo de sua tese indica como seu objeto de estudo “a constituição e a expansão do magistério público em Santa Catharina”, em suas análises dá a perceber a relação da instrução pública com a base econômica, como proposta do próprio governo, progresso da nação. No entanto, Luciano (2001, p.209) refere outros contextos para além do econômico, ao afirmar: “O contexto político, econômico, social, cultural e histórico, em que esteve circunscrito a docência apresentavam a instrução como uma premência no desenvolvimento e no progresso da nação”. Contudo, entendo que os acontecimentos materiais no cerne da educação se manifestam para além da economia, ainda que ligados a ela. A materialidade se traduz 193 nas questões de caráter educacional, formativas do sujeito social, político, ético epistemológico, lógico, metodológico, econômico, cultural, reflexivo, enfim na multidimensionalidade que incide no modo como os homens propriamente produzem a sua existência. Para o materialismo histórico-dialético, a realidade advém da práxis. Isso significa que a produção de ideias tem ligação direta com a vida material dos homens. As ações é que fazem a realidade. “O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens, aparecem aqui como emanação direta de seu comportamento material”. (MARX, 1999, p.36). A materialidade do objeto para o materialismo histórico-dialético é constituída no cerne da matéria social que, do ponto de vista dessa perspectiva, é forjada na produção material da vida. Os autores das tese estudadas, que buscam fundamentar-se nessa perspectiva, demonstram ter clareza de que as ideias dependem da vida material. Nesse sentido, para referir a materialidade de seu objeto Murasse (2001, p.1) afirma que “a instituição escolar é realização de homens que, por sua vez, vivem em constante processo de transformação e que modificam o conjunto de suas instituições em resposta às contínuas mudanças desencadeadas no mundo que os cerca”. A escola é uma instituição social, surge da ação dos homens e tem relação com a produção da vida, é, portanto, parte da matéria social, criada em função das determinações Para tratar da questão relativa à qualidade material do objeto, no caso das teses em educação, as que indicam o materialismo histórico-dialético como método de análise e abordagem teórica, centram os seus argumentos na compreensão materialista que entende, por exemplo, que objetos como “a concepção antropológica de ensino médio integrado ao técnico,” de Roberto (2014), ou “os desdobramentos das chamadas universidades de ensino e das universidades de ensino e pesquisa, embutidas nelas a associação entre ensino, pesquisa e extensão no atual formato institucional do ensino superior brasileiro”, de Magnani (2000), ou mesmo “o processo de implantação e expansão da educação escolar primária pública na Paraíba, de 1849 a 1949”, de Pinheiro (2001) são partes da matéria social e, como tal, sofrem múltiplas determinações. Nessa direção, a materialidade é compreendida e provada pelos autores das teses com base no entendimento que a base teórica materialista histórico-dialética tem de matéria social, da qual a educação é parte essencial e se faz como síntese de múltiplas 194 determinações como compreende essa perspectiva. Os autores que buscam abordar o objeto de investigação fundados na abordagem materialista histórico-dialética realizam um esforço teórico, no sentido de esclarecer a questão da materialidade do objeto de investigação em suas teses. Nesse sentido, observam que o fenômeno educacional se liga à produção e reprodução da sociedade humana, ou seja, os objetos são considerados em sua materialidade como fenômenos sociais que se relacionam com outros fenômenos. De modo que a prova reveladora da materialidade dos objetos nas teses estudas, fundamentadas nessa abordagem, situa-se nas explicações dos autores para demonstrar que seus objetos são sínteses de múltiplas determinações, cuja historicidade faz emergir a ação prática dos homens. Se a dialética, a lógica e a teoria do conhecimento se identificam, se existe coincidência entre elas, e se essa lógica dialética se faz presente tanto na realidade material como no processo do pensamento que, na perspectiva da dialética materialista, parte do concreto, vai até o abstrato, onde considera as relações, categorias e conceitos e retorna ao concreto no pensamento que consiste, de acordo com Gamboa (1987, p.26) “uma rica totalidade de determinações e relações diversas”, como diria Hegel, um conceito mais rico, esse movimento, para ser fiel à dialética é eveido de contradições, então, os contrários limites e possibilidades fazem parte desse processo lógico, conceitual e/ou material. Embora nessa perspectiva, sobressaia uma preocupação com a questão da objetividade que explícita ou implicitamente perpassa as demais questões, ela não consegue livrar-se da subjetividade, ainda que coloque uma subjetividade social acima de uma individual, ou um sujeito epistêmico acima de um empírico não é possível execrá-lo nem pensar nele sem considerar a idealidade, isto é, a capacidade de pensar e de elaborar conceitos. Não há como aceitar a ideia de expurgação dessa característica humana, sobretudo em uma lógica fundada no princípio da contradição, em que a unidade dos contrários é aceita e estes são necessários para que ocorra um movimento transformador da realidade. Assim, todo o esforço para provar a qualidade material do objeto, aliás a própria materialidade, na dialética passa pelo subjetivo e envolve-o não somente em sua singularidade, mas também na sua pluralidade, ou seja, na sua socialidade. Ainda que se possa dizer que matéria fala por si, isso de nada adiantaria se não houvesse uma subjetividade capaz de interpretá-la e de trasmitir essa fala, via sua própria interpretação da realidade. Aqui parece residir uma limitação em relação à prova da 195 materialidade do objeto: essa verdade só teria validade perante uma apreciação social, caso contrário de nada valeria. Justamente porque a lógica dialética movimenta-se pela contradição, é possível perceber como os limites deslizam por entre as duplas de contrários. A complexidade está em que dentre essas duplas encontram-se os limites e as possibilidades em forma de continuidade. 5.3 A VERDADE CIENTÍFICA. Em termos de conhecimento, do senso comum à ciência, é habitual surgir uma preocupação com a verdade independentemente da discussão que esse termo possa suscitar, trazendo à tona a necessidade que o homem tem da certeza diante da realidade. Todo trabalho científico está implicado com a verdade, seja para refletir sobre a mesma, seja para assumir ou recusar determinada concepção. Mesmo os que tendem a dispensar uma discussão sobre o assunto, ou a evitar o uso do termo. De qualquer modo essa questão se faz presente, ainda que em muitos de forma apenas subjacente, quando os pesquisadores, os cientistas, submetem seus estudos e os resultados deles oriundos a critérios de validade fundamentados em uma teoria e firmados socialmente. A sociedade precisa saber se o conhecimento elaborado é correto, verdadeiro, válido. Além disso, um trabalho centrado em uma abordagem epistemológica não pode deixar de fazer, ainda que brevemente, uma discussão desse conceito. A complexidade desse termo emerge desde a sua origem prática, posto que esta se dá em um julgamento, consensual ou arbitrário, relativo a um espaço e tempo determinados. O caráter histórico da verdade implica na mudança do conceito, de acordo com as diferentes concepções de homem, mundo e conhecimento. Nesse sentido, conforme Abaggnano (2000) é possível distinguir cinco conceitos de verdade, quais sejam: como correspondência; como revelação ou manifestação; como conformidade com uma regra; como coerência; e como utilidade. Tendo em vista as duas abordagens teóricas que receberam destaque nessa seção, os dois primeiros conceitos acima mencionados que, por vezes, se juntam em alguns estudos, interessam particularmente à análise pretendida nesta subseção. A verdade compreendida como correspondência consiste no conceito mais antigo, e bastante usado. Já a noção concebida como revelação ou manifestação, tem conforme Abbagnano duas maneiras essenciais: uma empirista e outra metafísica ou 196 teológica. Para a primeira “a verdade é o que se revela imediatamente aos homens, sendo, portanto, sensação, intuição ou fenômeno”. Para a segunda forma, “a verdade se revela em modos de conhecimento excepcionais ou privilegiados, por meio dos quais se torna evidente a essência das coisas, [...]. A característica fundamental dessa concepção é a ênfase dada à evidência, assumida ao mesmo tempo como definição e critério da verdade”. (ABBAGNANO, 2000, p. 996) Na concepção fenomenológica, a verdade é compreendida como revelação das essências, pois são essas que se manifestam por meio da epoché, instrumento metodológico que auxilia nessa revelação e, portanto, possibilita ao sujeito a apreensão da verdade. Esta é a evidência com que os fenômenos se apresentam ao sujeito, é o desvelamento do significado e dos diversos sentidos do fenômeno pelo sujeito. Na perspectiva husserliana, verdade e evidência pertencem a todos os objetos fenomenológicos, incluindo-se aí valores e sentimentos. Por sua vez, Heidegger manteve a compreensão da verdade como revelação ou descoberta. Todavia, é preciso considerar a questão da autocompreensão. Nesse sentido é que Japiassu (1992, p. 161) afirma que é “a partir do modo como o sujeito se compreende que pode chegar a compreensão dos outros, seja mediante suas obras, seja mediante seus comportamentos. E é por isso que toda compreensão implica uma autocompreensão”. Sob essa perspectiva, a preocupação está em apreender o significado e os sentidos do fenômeno que serve de objeto de investigação, e esses se dão a conhecer, posto que o fenômeno os revela em suas diversas manifestações. Em seus estudos sobre a obra de Dussel, Pansarelli (2010, p. 241) elaborou a verdade de que existe uma filosofia latino-americana, mas afirma que “a filosofia da libertação está em construção, inconclusa, configurando-se à produçao filosófica crítica, poiética, contemporânea.” Essa verdade é revelada ao autor pelo fenômeno por ele investigado em suas diferentes manifestações, contidas nas diversas obras de Dussel por ele interpretadas. Porém, certamente há um consenso intersubjetivo dessa verdade no âmbito dos estudiosos que se debruçam sobre a possibilidade de uma filosofia originária da America Latina. Mas se é possível considerar a intersubjetividade, esta também diz respeito às obras de diferentes autores, além das obras de Dussel interpretadas por Pansarelli. Rezende (1990, p.29) explica que “a fenomenologia não é uma filosofia da evidência, mas da verdade em todas as suas manifestações”. Contudo, desvelar “consiste 197 em descobrir que a verdade nunca se revela totalmente.” Eis a limitação da abordagem fenomenológica no que se refere à constituição da verdade. Segundo Gamboa, não há nessa perspectiva uma pretensão de fidelidade ao objeto. Não é na objetividade que reside o critério de verdade, mas na intersubjetividade. A verdade é resultado do consenso intersubjetivo da comunidade científica. Seu caráter relativo (é verdade para esse grupo) se faz ainda mais relativo quando o consenso ocorre em um determinado momento, em um contexto ou um cenário histórico específico (é verdade em um determinado grupo em determinados momentos; em outro momento ou contexto é outra verdade, outro significado), razão pela qual esse enfoque se denomina também historicismo, ou histórico hermenêutico. O interesse que comanda esse processo cognitivo é o prático de consenso. (GAMBOA, 2013, p.75) Na perspectiva dialética o objeto deve ser abordado em seu percurso histórico sem descuidar das suas relações com outros objetos no tempo, para que se possa entender o movimento contraditório que tanto o constitui como proporciona a transformação. No que concerne ao entendimento da questão da verdade por Hegel, esse filósofo a pensava como correspondência entre a objetividade e o conceito. A ideia é transformada em critério de validade, ou melhor, ela é a própria verdade. É por meio dela e na sua forma que a verdade existe52. Por isso, a verdade científica expressa na afirmação de Nunes de que “a educação é um ato dialético”, pode ser comprovada pela ideia hegeliana de que a natureza própria do pensamento é dialética. Nessa perspectiva, a objetividade do conceito permite a Nunes (2002, p. 249) afirmar que “também é dialético todo o processo de captação, consideração e construção pensante de seus objetos, como saber, e, por extensão, é igualmente dialético o processo de transmissão a outro desse saber, como formação educativa”. Essa concepção de verdade como correspondência entre realidade e ideia também pode ser encontrada nos textos de Marx, mas com a diferença de que o seu critério de verificação consiste na prática humana, social e histórica. Com essa perspectiva, aliando-se à economia e a política, Murasse (2001, p.125) afirma como verdade alcançada por meio da pesquisa que resultou no texto de sua tese que “o progresso técnico é antes causa de uma determinada forma de orgnização do 52 Cf . Ciencia de la Logica. 198 ensino do que resultado dela, ou seja, o nível de desenvolvimento material alcançado por um país é que permite que ele insista na formação dos cidadãos necessários”. Marx (1999, p.125-126) defendia a práxis como categoria epistemológica fundamental e a tranformou em critério de verdade e de validade científica ao dizer que “a questão de saber se cabe ao pensamento humano uma verdade objetiva não é uma questão teórica, mas prática. É na práxis que o homem deve demonstrar a verdade, isto é, a realidade e o poder, o caráter terreno de seu pensamento”. Uma das conclusões da análise de Silva (2001, p.183) sobre a Campanha Nacional de Escolas da Comunidade, é a de que é possível perceber por meio da trajetória histórica dessa campanha, portanto, uma questão prática, “que o Estado continua presente, de forma modificada, nas políticas sociais: através de uma política privatista explícita e não apenas através de práticas clientelistas”. Horn (2002, p. 233), por sua vez, afirma que por meio da pesquisa foi possível observar que “a Filosofia de fato está presente em uma significattiva parcela das escolas públicas do Estado. Mas ela não está presente com a sua história, com a sua especificidade, com a sua lógica própria, com a sua cidadania de mais de 2.500 anos de existência”. Então, é da práxis que emerge a verdade cuja objetividade se coloca para além da vontade do pesquisador e garante a sua aceitabilidade pela comunidade científica. O mundo real é, constituido pela unidade entre produção e produto, entre sujeito e objeto e consiste em um processo no decorrer do qual a verdade se realiza. Nesse sentido, Kosik (1976, p. 23) explica que o mundo da realidade “é o mundo em que a verdade não é dada e predestinada, não está pronta e acabada, impressa de forma imutável na consciência humana: é o mundo em que a verdade devém.” Então, a verdade é relativa a história e à sociedade em que ela é elaborada, portanto, consiste em uma possibilidade histórica. Mas, para falar da verdade científica a que chegam os autores das teses que servem de material de análise neste texto, penso que é preciso não perder de vista que essas verdades são relativas à educação, uma vez que os objetos de investigação dessas teses se situam no âmbito dessa prática. Depois, é preciso ter em conta que elas se relacionam a diferentes particularidades da educação, o que indica a necessidade de considerar o seu poder de abrangência. Nesse sentido, é esclarecedora a afirmativa de Iglésias (2010, p. 394) quando diz: 199 Compreende-se que reduzir a explicação de um fenômeno a apenas um dos seus agentes causadores é limitar o conhecimento. Sabe-se que não há como explicar um fato histórico tendo como base apenas um de seus agentes causadores. Contudo, também não se pode ter a pretensão de dar conta de explicar, em uma só pesquisa, esse mesmo fenômeno em todas as suas nuances. Penso que sob a fundamentação da dialética, em decorrência de seu movimento que se faz por meio das contradições, compreender a história exige o reconhecimento da impossibilidade de explicar um objeto de uma vez por todas, pois o movimento traz novos elementos que precisam ser considerados. Souza (2012, p. 296) afirma que “o projeto de hegemonia iniciado pela burguesia brasileira entre 1930 e 1940 com a industrialização, vem se ressignificando em consonância com o movimento do capitalismo em seu quadro internacional.” Portanto, essa verdade diz respeito a um período histórico e a uma sociedade determinados e à análise realizada por essa autora, o que significa dizer que a verdade refere-se a um tempo e lugar determinados e à cada análise e interpretação realizadas. Mas isso não significa que não possa estender-se a outros espaços e tempos, contudo com características próprias a esses, específicas de cada momento histórico e de cada lugar, com novos elementos. No que diz respeito às teses, foi possível observar que a verdade é compreendida, de acordo com a abordagem por elas assumidas, mas, apesar das diferenças entre a concepção de revelação na fenomenologia e de correspondência na dialética, elas trazem muito em comum. Se, por um lado, à luz da perspectiva fenomenológica a verdade diz respeito ao significado e aos sentidos do fenômeno e seu critério de validade é intersubjetivo e, portanto ela é relativa a um grupo e a um momento, na dialética, ela consiste na correspondência entre a objetividade e o conceito, do ponto de vista hegeliano, e entre a realidade e a ideia, do ponto de vista marxiano. De qualquer modo, na abordagem dialética a verdade é histórica e social, portanto, relativa, a uma história e a uma sociedade, muito embora no hegelianismo a história se refira ao desenvolvimento do espírito, e no marxianismo ela diga respeito à práxis humana. O próprio Marx (1991, p. 20) deu indicativos da relatividade da verdade, ao recusar as verdades absolutas consideradas pela metafísica. Quando tratou das próprias categorias de análise, ele deixou transparecer o caráter relativo e transitório que emerge 200 da história ao afirmar que “apesar de sua validade para todas as épocas, são, contudo, na determinidade desta abstração, igualmente produto de condições históricas, e não possuem plena validez senão para estas condições e dentro dos limites dessas”. As abordagens ou perspectivas teóricas e metodológicas são importantes elementos a partir dos quais as verdades são instituídas, mas há outros não menos importantes no processo do conhecimento, que dizem respeito às particularidades da temática abordada pelo pesquisador. No que se refere às teses estudadas as particularidades da educação, consideradas por essas se fazem notar por meio dos objetos gerados, dos problemas de pesquisas, das hipóteses propostas e dos objetivos almejados, elementos em torno dos quais as verdades são instituídas e declaradas nessas produções, sobretudo no esforço de cada autor, no que concerne à defesa da tese proposta e os textos trazem fortes indícios disso. É por isso, por exemplo, que Barão (2008, p. 371) amparada pelo materialismo histórico-dialético, evidenciou que o próprio objeto dá subsídios suficientes para a elaboração da verdade sobre ele, permitindo inclusive, “considerar equivocadas outras interpretações que antecederam” a da própria autora em sua tese. Na estudo de Carvalho (2010) a verdade é indicada na confirmação da hipótese de que os municípios de Uberabinha e de Mafra são o que se pode chamar de pedagógicos, no sentido de que as autoridades constituídas não se limitam às dimensões políticas administrativas, mas dirigem-se à dimensão econômica, colocando a educação no centro dos interesses financeiros, tomando-a como propulsora do desenvolvimento sócioeconômico. Há uma correspodência entre a realidade e as ideias, a verdade encontra a sua validade na práxis, corresponde ao movimento prático em que essa educação acontece, desde os documentos e leis a seu respeito, nos dois municípios em questão. O caminho percorrido em busca da confirmação das hipóteses e das teses enunciadas pelos autores consiste no esforço que cada autor realiza na perspectiva de elaboração da verdade científica em sua tese. Tanto que são bastante comuns nas teses analisadas afirmações como a de Magnani (2000, p. 155) “a análise dos principais documentos referentes à Reforma do Estado, [...] fornece pistas para o ententimento do presente trabalho”. Outra nuance da questão consiste em que para demonstrar a verdade a que chegam em suas teses os autores dão atenção especial às fontes, sobretudo às primárias, posto que elas são o fundamento dessa demonstração. Polli (2006, p. 188), por exemplo, 201 fundamentou seus argumentos “nos principais textos de Freire e Habermas” para conseguir seu intento de “mostrar que há de fato, não propriamente semelhanças ou proximidades, mas simplesmente convergências fundamentais” entre os dois autores. É com base nas fontes que Zanatta (2005, 128) frisa “que na luta pela implantação de um ensino mais dinâmico, mais de acordo com a sociedade que também entrava em uma nova dinâmica, foi disseminando uma nova maneira de compreender” As textos que mencionam diretamente a questão da verdade são os de Sônia Fonseca, de Suze Scalcon, de Evandro Ghedin, e de Olga Loyola. Isso significa somente 4 dentre as 25 teses analisadas, ou seja, 16% dos casos. A primeira refere-se à parcialidade da verdade. Fonseca (2010, p.6) compreende que “as verdades produzidas são sempre parciais e sujeitas a novas perspectivas à luz de novas fontes, mesmo que sob os mesmos procedimentos teórico- metodológicos.” A segunda, a de Scalcon (203, p. 5) menciona a prática como critério de verdade. Embora não declare diretamente nenhuma noção de verdade, pode-se dizer que Carvalho (2002, p. 10-11) entende que as verdades são parciais assim como a dificuldade em se alcançar a objetividade quando, observa que a inserção do historiador no presente, determina e condiciona os questionamentos que ele lança ao passado, de modo que “suas abordagens sempre estarão sujeitas a revisões; por isso não se alcança a suposta objetividade em estudos concebidos como definitivos, mas sim quando se está convicto da necessidade de rever procedimentos e concepções”. A terceira, diz respeito ao inacabamento da verdade, uma vez que essa é “construção permanente”. Ghedin (2004, p.72) afirma que “a verdade é um horizonte do humano que se manifesta pela busca incansável de seu encontro”. A quarta, que não se alia às duas abordagens que se destacam entre as teses analisadas e sim à filosofia da diferença, pergunta sobre como os professores de filosofia poderiam filosofar e servir de incentivo aos seus aluno. Loyola (2008, p. 160) entende que um primeiro passo nessa direção seria enfrentar “as ciladas da noção de verdade.” A autora refere-se à pretensão de universalidade de certa forma de fazer filosofia, remete- se à crítica nietzscheana do conceito de verdade e recusa a noção de verdade absoluta. Não poderia ser de outro modo, se considerarmos que a tese dessa autora fundamenta-se na filosofia da diferença, ou seja, em uma filosofia cujos esforços dirigem-se à crítica da filosofia moderna, prima pela destruição do sujeito moderno e de seus anseios em relação 202 à razão e à verdade, destituindo-o do prestígio de reinar soberano como sujeito cognoscente53. A discussão sobre a verdade como revelação na fenomenologia e como correspondência na dialética é pouco usual nas teses, os autores e autoras apenas realizam um esforço para demonstrá-la por meio de seus estudos, sem fazer qualquer referência ao termo muito menos ao conceito emanado da abordagem epistemológica colocada em uso em suas análises. O fato é que na maioria desses textos a verdade não é sequer mencionada, quanto mais discutida, problematizada. 5. 4 A SUSTENTAÇÃO TEÓRICA DA TESE ENUNCIADA A sustentação teórica das teses analisadas neste texto, funda-se nos princípios da teoria e do método de abordagem. São esses elementos que orientam as análises realizadas pelos pesquisadores, são eles que, juntamente com as informações colhidas nas fontes disponíveis, fornecem subsídios para a demonstração e comprovação das teses. Mas, em 24% do total de 25 teses os autores não declaram diretamente qual a concepçãofilosófica que fundamenta a abordagem teórica e metodológica de sua análise, deixando ao leitor a interpretação sobre essa questão. Os autores que assim agem são Carvalho (2002), Pereira (2014), Silva (2001), Fonseca (2010), Luciano (2001)54 e Nunes (2002). As teses dos dois primeros perfazem um total de 16,6% das 12 teses orientadas por Severino, e as dos demais equivalem a 30,7% das 13 teses orientadas por Saviani. Mas, apesar dessa omissão, encontrei indícios dos princípios das abordagens teóricas usadas por esses autores nas afirmações que fazem em suas análises sobre a sua própria compreensão de mundo, sociedade e história, nas citações de obras e autores referenciados e nas categorias utilizadas por eles. Com base nisso, busquei compreender a abordagem teórica, especialmente, das cinco produções que não declaram diretamente qual a filosofia que fundamenta a abordagem teórico-metodológica usada. 53 Cf. COSTA, Gilcilene Dias da. Labirintos do filosofar/pesquisar com Nietzsche-Deleuze. In: Miscelânios Fermentário N. 8, vol. 2, 2014 54 A tese de Luciano foi disponibilizada [na biblioteca online da unicamp] sem a introdução onde, conforme discrimina o sumário, está contida a parte metodológica. Em decorrência disso e como a autora não faz referência no texto disponível sobre a questão, situei a tese de Luciano entre as que não declaram diretamente qual a filosofia que fundamenta a sua abordagem teórica. 203 Com essa perspectiva, destaco as explicações deixadas por Carvalho (2002) sobre a sua compreensão de realidade como movimento e a sua conclusão de que a educação precisa ajudar os homens a entenderem o mundo como vir a ser, isto é, não como um sistema, mas como uma totalidade geradora. Em sua tese Pereira (2014, p. 17) usa a categoria da práxis, fala de arcos de investigação ao se referir à estrutura de seu texto e à pesquisa exploratória “com seus procedimentos técnicos vazados na pesquisa bibliográfica.” As pistas deixadas em seu texto remetem a esse tipo de pesquisa fundamentado em uma abordagem sócio-histórica, cujos vestígios emergem desde a estrutura da tese e estendem-se ao uso de categorias como: sistema, totalidade, ser e estar. Porém, dizer que se trata desse tipo de abordagem não define se tem suas bases referenciadas no materialismo histórico-dialético. Afinal trabalhos subsidiados na fenomenologia podem usar esse termo, uma vez que essa filosofia considera a historicidade do fenômeno. As marcas do materialismo histórico-dialético se evidenciam na tese de Fonseca (2010), especialmente, pelas referências que usa para discutir a categoria trabalho como demonstram as citações que a autora faz das obras de Marx para fundamentar a análise sobre a divisão social do trabalho, desde a fase manufatureira até a fase indústrial e discutir a questão do trabalho produtivo e improdutivo. Além disso, autores como Mário Manacorda e Luís Antônio Cunha, conhecidos pela sua proximidade com o marxismo, auxiliam na distinção entre artes liberais e mecânicas e a definir a especificidadede da atividade indicada por termos como artista, artífice e artesão, que designavam as diferentes formas de trabalho no Brasil Colônia e aparecem frequentemente na historiografia em questão. Ao falar da lei de 15 de outubro de 1827, que organizou a instrução no Império e criou as escolas de primeiras letras, Luciano (2001, p.20) frisa as dificuldades econômicas, técnicas e políticas encontradas pela referida legislação e faz referência ao discurso liberal e aos anseios deste que, na década de 1827, pleiteava que as questões específicas das Provícias fossem descentralizadas da Corte. A menção ao discurso liberal, à realidade concreta, as referências de Marx e Gramsci e as citações deste último consistiram em minha análise palavras-chave, indícios claros da aproximação ao materialismo histórico por parte da autora. Em relação a Nunes (2002) a abordagem teórica de sua tese tem como base a dialética hegeliana, pois as referências mais usadas são de Friedriche Hegel (17) e de seus estudiosos como James Joyce (4). É evidente que essas obras são usadas para explicitar o 204 seu objeto de estudo e buscar evidências para a comprovação da tese. Contudo, notei que algumas citações mesmo de outras referências são usadas no sentido de confirmar algumas possibilidades e aspectos da dialética hegeliana, e, de algum modo, enaltecer Hegel e a importância de seu pensamento para a contemporaneidade. Nesse sentido, ao tratar da práxis como ação educativa, Nunes esclarece que o termo é usado na acepção marxiana, mas com o cuidado de lembrar as relações que se estabelecem no âmbito da história, cuja concepção em Marx é sustentada na sua noção de dialética materialista que, por sua vez, “tem por base a dinâmica fundamental da dialética hegeliana, a negatividade”. De modo semelhante, cita Foucault para dizer da dificuldade que se tem em escapar de Hegel, e da necessidade de compreender o quanto é difícil separar-se dele. A tese de Silva (2001, p.178), apesar de omissa a respeito de indicação direta da fundamentação filosófica da abordagem teórico-metodológica de sua produção, desde a estrutura do texto, expressa entre outros aspectos uma preocupação com o contexto, com o neoliberalismo como ideologia da globalização. Apropria-se da concepção ampliada de Estado gramsciana, o que concorre para a conclusão da autora de que o setor público não estatal ao se fortalecer “contribui para a desobrigação do Estado no que diz respeito ao oferecimento dos serviços sociais e educacionais, ferindo os direitos de cidadania e atentendo às diretrizes das políticas neoliberais de ampliação do Mercado em todos os âmbitos sociais”. A aproximação dessa autora em relação ao materialismo histórico-dialético se expressa também nas referências que faz a Guadêncio Frigotto, Pablo Gentille, Luís Antônio Cunha, István Mézaros e Saviani, que são autores cuja aproximação do materialismo histórico dialético é expressiva. Outro aspecto interessante é que das 25 teses analisadas 5, isto é, 20% fixam seus estudos em obras de autores. Com essa perspectiva, Barão (2008, p. 9) investiga os “escritos educacionais de Florestan Fernandes produzidos nas décadas de 50 e 60”, com a intenção de recuperar a categoria da revolução como contribuição do marxismo, via obra de Florestan à educação brasileira. Pansarelli (2010) trata da obra de Enrique Dussel, a fim de explicitar os fundamentos da filosofia dusseliana e compreender as possibilidades de existência da filosofia da libertação como filosofia latino-americana. A tese de Nunes (2002), versa sobre a obra de Hegel, a fim de colocar em evidência os fundamentos que demonstram a imanência da dialética ao ato educativo, a de Carvalho (2002) estuda a obra de Max Weber com interesse especial no sistema de dominação como a única relação possível dentro do Estado moderno e a de Zanatta (2005) interroga 205 a obra do historiador Jonathas Serrano (1885-1944) a fim de saber quais os princípios ou fudamentos do pensamento desse autor, no âmbito das discussões educacionais de sua época. Esses cinco autores demonstram em seus textos uma curiosidade epistemológica em saber quais os pressupostos dessas obras e da história da Educação brasileira nos períodos concernentes ao lapso temporal de seus estudos. Penso que é importante frisar que os autores dessas cinco teses se comportam muito mais como filósofos do que como historiadores, considerando a diferença que Kosik (1976, p. 228) faz entre o hitoriador e o filósofo. O historiador pergunta pelo “que acontece na história’, enquanto o filósofo “quer saber quais são os pressupostos de toda e qualquer história”, como é o caso, por exemplo, de Pinheiro (2001) que quiz saber o que aconteceu na história da educação no Brasil, no Estado da Paraíba em relação a “Era das Cadeiras Isoladas 1783 – 1849 e a Era dos Grupos Escolares 1849- 1949”. A análise possibilitou perceber que as teses que se autodenominam historiográficas, ou realizam estudos historiográficos, mas não dizem que o fazem, aliam- se ao que Kosik caracteriza como historiador, ou seja, sua questão central refere-se a uma curiosidade com o que acontece na história. Nessa perspectiva, com a finalidade de exemplificar situo a tese de Fábia Luciano (2001) que busca saber sobre a história do magistério público catharinense desde a sua gênese até o século XIX. Entre os autores que optaram pela concepção materialista histórico-dialética, as análises e a metodologia assumem diferentes matizes, que se formam conforme as referências utilizadas. Nesse sentido, no que diz respeito às diferenças entre as teses que optaram por essa concepção, posso dizer que as categorias de análise consistem em um forte elemento de diferenciação, pois elas não estão somente de acordo com o objeto, mas sobretudo de acordo com o referencial, de modo que foi possível observar que a comprovação das teses que optaram por essa concepção seguem os princípios da lógica dialética. Porém, embora todas essas teses usem alguma categoria ou princípio da dialética e do materialismo histórico, as categorias de análise mudam de acordo com o referencial. Nas teses que se fundamentam em Marx, sobressaem as categorias referentes ao materialismo histórico e à dialética, como trabalho, totalidade concreta, práxis, ideologia, alienação e contradição. Dentre essas encontram-se a de Murasse (2001) que utiliza o método histórico e usa como categoria de análise a totalidade, a contradição e a 206 mediação e a de Coutinho (2013) que define o campo da história da educação como perspectiva de análise e usa como categorias a práxis, a totalidade e a contradição. Enquanto que nas teses que se fundamentam em Gramsci às categorias metodológicas do método materialismo histórico-dialético, como práxis, totalidade, contradição, acrescentam-se outras referente às teses desenvolvidas pelo próprio Gramsci como transformismo, hegemonia, intelectuais orgânicos, bloco histórico e concepção ampliada de Estado. Esta como possibilidade de incluir nas análises sobre o Estado, não só a sociedade política, mas também a sociedade civil. Dentre as teses com uma abordagem fundamentada em Gramsci situa-se a de Almeida (2001), que refere-se a uma abordagem teórico-metodológica materialista histórico-dialética, com referência em Marx, mas sobretudo em Gramsci e usas as categorias totalidade, intelectual, tecnologia, público e privado. Outros exemplos, são as teses de Souza (2012), de Iglesias (2010) e de Pinheiro (2001). Fundamentada no materialismo histórico-dialético a fim de compreender a realidade em sua totalidade orgânica, Souza (2012) analisa a relação entre trabalho e educação por meio de três categorias gramscianas: hegemonia, intelectuais orgânicos e bloco histórico. O conceito de práxis em Marx foi fundamental para considerar a atividade missionária dos franciscanos como prática didático-pedagógica, informa Iglesias (2010). Em sua justificativa em relação à referência gramsciana na decisão pelas categorias Iglesias (2010, p.5), observa que para analisar o processo de ascensão do poder na evangelização espanhola na América, “foram encontrados subsídios suficientes no conceito de hegemonia de Gramsci.” Em sua análise sobre a educação paraibana Pinheiro (2001, p. 9) indica o materialismo histórico-dialético como abordagem teórico-metodológica e menciona que a sua preocupação com a formação econômica e social brasileira, o levou a “adotar uma metodologia que mantivesse o entendimento da relação entre o particular e o geral”. Esse autor faz uma análise de documentos, apropria-se da totalidade que é uma categoria da dialética, mas usa especialmente categorias gramscianas. No geral essas teses demonstram uma atenção com o contexto econômico e político e enfatizam o neoliberalismo como ideologia da globalização, todavia, as análises expressam aspectos e relações bem diferentes em função das categorias. 207 Apesar de afirmar que é a partir de uma perspectiva hermenêutica, que desenvolve e propõe direcionamentos para “a interpretação da imagem como orientação para o ensino de Filosofia”, já na epígrafe que abre a sua tese Ghedin afirma que não tem o objetivo de seguir uma corrente, mas perseguir ideias que traduzam na sua essência, um caminho a ser construído por elas. Desse modo, tanto Martin Heidegger como Antonio Flávio B. Moreira aparecem em sua tese entre os autores mais referenciados. Ghedin (2004, p. 13-14), remete à epoché husserliana ao afirmar que “não há como fazer Filosofia sem uma inserção na tradição filosófica, mas é possível filosofar colocando-a entre parênteses.” E observa que “escolher uma filosofia pressupõe saber sobre seus sentidos e significados”. Mas, ao mesmo tempo, fala de contradição, mediação, totalidade e práxis. Com uma abordagem teórico-metodológica fundamentada na hermenêutica filosófica, Pansarelli (2010, p. 90) assume-se como defesor da interpretação contextualizada e explica que sua postura ao tratar com as “classificações dusselianas é, também, mais próxima da tentativa de lidar com sua essencialidade (fenomenologicamente falando) do que com dados concretos e formais”. Ao estudar as possibilidades do ensino filosófico no curso superior, Loyola (2008, p. 13) “investiga até que ponto a instrumentalização do conhecimento e o comodismo do pensar têm afastado a possibilidade da autonomia e da criatividade para o pensar e o agir.” Essa autora fundamenta sua análise em Nietzsche, Foucault e Deleuze, considerados filósofos da diferença e usa como categorias de análise ou melhor, “ferramentas conceituais”, governamentabilidade, subjetivação e saber-poder, desterritorialização, territorialidade. Das três teorias encontradas na orientação dessas produções científicas, a dialética, a fenomenologia e a filosofia da diferença, como uma possibilidade teórica e metodológica, sobressae-se quantitativamente o materialismo-histórico dialético, com um percentual de 68% das 25 teses analisadas. Cada uma delas consiste em um conjunto de conhecimento e práticas55 que a partir de princípios gerais estabelecem suas categorias de análise e contribuem para a elaboração de diferentes metodologias. Tendo em vista a questão dos princípios e a orientação filosófica da fenomenologia destacam-se os princípios de intencionalidade, de indissociabilidade e de 55 É a existência desse conjunto de conhecimentos e de diferentes práticas que, embora sigam princípios gerais, me permite perceber que os diferentes o referencial teórico influencia a utilização das categorias. 208 finitude. Esses princípios, aliados à noção de significação, consistem em categorias de análises que proporcionam a compreensão e interpretação do fenômeno que se dá a conhecer na relação que efetiva com a consciência Sob a visão husserliana, a intencionalidade é compreendida como nexo, direção, orientação. Com esse princípio se define que a consciência se dirige para fora de si, para um fenômeno, portanto, será sempre consciência de alguma coisa. O segundo princípio, o de indissociabilidade, consiste em uma exigência do primeiro e estabelece que consciência e objeto são correlatos, uma não existe sem o outro. A significação pode ser considerada a principal categoria de uma abordagem que centra a sua análise na compreensão e interpretação das manifestações dos sentidos do fenômeno. Na perspectiva heideggeriana, o princípio de finitude é responsável por uma interpretação que entende que as possibilidades da existência humana são condicionadas e que a temporalidade constitui a estrutura humana que faz com que o homem seja, como diz Padovani e Castagnola (1993, p. 488) “possibilidade de ser que se determina no fluxo do tempo. O mundo, enfim, na sua totalidade nada mais é que historicidade, temporalidade, nada”. Do ponto de vista da fenomenologia hermenêutica fundamentada em Paul Ricoer que se basea nos pensamentos de Husserl e de Heidegger, a interpretação leva em consideração a experiência compreensiva de modo que se realiza no círculo hermenêutico em uma relação entre experiência e expressão, e entre esta e a interpretação.56 Nas abordagens fenomenológicas, os contextos têm importância essencial. Desse modo, para as teses baseadas na fenomenologia, o princípio de intencionalidade, esse dirigir-se para fora de si mesma da consciência intencional, leva em consideração não somente os fenômenos como também o que está a sua volta. Eles são compreendidos a partir de suas manifestações no contexto, posto que é por meio deste que se percebe as suas diferentes manifestações no tempo e no espaço, isto é, os diversos modos com que eles se articulam constituindo novos sentidos. A consideração do ambiente concorre não somente para a compreensão do caráter polissêmico do fenômeno, mas também da imutabilidade de sua essência, pois o que muda são as condições dessas manifestações provocando mudanças superficiais, o que para a fenomenologia significa a oportunidade 56 Cf. RICOEUR , Paul. O conflito das Interpretações: ensaios de hermenêutica . Trad . Hilton Japiassu Rio de Janeiro: Imago, 1978. 209 de se ter uma nova visão do fenômeno, ou seja, as mudanças contextuais são as responsáveis por novos sentidos do fenômeno investigado. Tendo em vista que os fenômenos se dão a conhecer no cerne de um contexto, que eles só têm sentido nesse ambiente, em sua tese, Pansarelli (2010) analisou o contexto em que se situa o seu objeto de estudo e apontou alguns indicadores das relações internacionais no cerne das quais surge o movimento da libertação. Na perspectiva dialética, sobressaem os princípios de contradição e de totalidade e no materialismo histórico-dialético esses princípios e o conceito de práxis. O primeiro, sem o qual não há movimento no sentido da transformação. É pelo movimento contraditório dos fenômenos que se percebe o caráter provisório de sua existência, a sua superabilidade. Além de ser um princípio da dialética, a contradição consiste também em um elemento essencial do dinamismo do real, um princípio gerador do movimento da própria realidade. Do ponto de vista crítico e de compreensão do objeto investigado, é importante analisar as contradições a ele relacionadas assim como as dele próprio. Nesse sentido, Souza (2012, p.7) refere-se em sua tese à necessidade de analisar “a relação entre educação e trabalho na tentativa de desvelar as contradições que guardam os discursos da universalização e do aumento de escolaridade básica profissional”. Por isso, foi possível notar que o esforço por compreender e analisar as contradições apresentadas pelo objeto ou mesmo no contexto em que ele se insere, sobressai nas teses. Um outro exemplo de vestígios desse esforço, pode ser encontrado nas palavras de Inglésias (2010, p.76) quando menciona que “é na contradição latente entre a fraternidade franciscana não classista e a ordem medieval estamentária que está a chave de leitura para a interpretação do movimento”. É interessante a apropriação que os autores fazem desses princípios em suas teses. A contradição, por exemplo, é considerada na compreensão e explicação do conceito de práxis. Nesta perspectiva, Coutinho (2013, p. 232) dirigiu sua reflexão à “relação contraditória entre teoria e prática”. Sua decisão de investigar essa relação é pertinente, uma vez que a práxis consiste em uma unidade formada de teoria e prática que, do ponto de vista dialético constitui uma unidade de contrários. Afinal só considerando a existência de contradições é possível falar de transformação. Na abordagem materialista-histórica, visa-se compreender a realidade social como um todo onde os fenômenos se relacionam de tal modo que para se entender um 210 deles é preciso relacioná-lo com o todo. É preciso levar em consideração, como diz Minayo (2000, p.25), que o fenômeno social só pode ser apreendido a partir de uma “relação intrínseca de oposição e complementariedade entre o pensamento e a base material”. A totalidade é explicitada como contraditória e em contínua realização e garante uma visão geral capaz de observar as relações entre os diferentes processos. A respeito da totalidade como princípio metodológico referente à investigação dialética da realidade social, Kosik (1976, p. 49) explica que analisar sob o ponto de vista da totalidade concreta, “antes de tudo significa que cada fenômeno pode ser compreendido como momento do todo”. Ainda sobre esse princípio, há uma postura que se refere a sua imprescindibilidade. Nesse sentido, indico por exemplo, Carvalho (2010, p.15) que compreende que mesmo quando uma investigação se dirige a uma situação local deve fazê-lo “sem perder de vista a totalidade”. E Horn (2002, p.149) que entende que “o problema só é filosófico quando abordado na perspectiva da totalidade.” Os autores das teses fazem diferentes observações sobre esse princípio, porém, no geral se fixam no seu poder heurístico, independentemente das limitações que ele possa implicar. Em relação à categoria práxis, Kosik (1976, p. 221) afirma que “a problemática da práxis na filosofia materialista [...] nasce como resposta ao problema filosófico; que é o homem, o que é a sociedade humano-social e como é criada esta sociedade?” A categoria práxis é utilizada de diferentes maneiras pelos autores. Nesse sentido, Ghedin (204, p. 15) a utiliza para dizer que “a reflexão crítica adquire sentido ao se transforma em práxis”. Scalcon (2003, p.14), por sua vez, estrutura o texto da tese de modo que “os três capítulos, procuram representar enquanto caminho metodológico, o movimento teoria-prática-teoria tomado como unidade sintetizada no conceito de práxis. E Iglesias (2010, p. 388), ao concluir a sua tese, observa que “é possível assegurar que a práxis educativa franciscana deu-se a partir da realidade americana sob a influência de anos de hegemonia no campo evangelizador construída na Europa.” Ao considerar os excertos das teses desses três autores e relacioná-los com as explicações de Kosik na citação referente à práxis, acima, posso dizer que essa categoria ao atender a necessidade de discutir um problema, define o homem como sujeito cujas ações formam uma unidade teórico-prática que visa à transformação da realidade. 211 Nas teses fundamentadas na dialética os fenômenos também são analisados a partir do contexto, mas nessa abordagem eles são determinados pela sua participação na história. Como estão em permanente transformação, sua compreensão carece de explicitação do seu movimento, cuja dinâmica depende das contradições por meio das quais a transformação se efetiva. A dinamicidade do fenômeno implica uma progressividade, e depende das mudanças sociais. Nesse processo, as relações são fundamentais, de modo que todo fenômeno precisa ser compreendido como parte do movimento histórico, por isso a categoria da totalidade é tão importante nessas abordagens. O conhecimento tem, nessa perspectiva teórica, a importância que lhe confere a necessidade de transformação social, para a qual ele pode contribuir significativamente. Gamboa (2012, p.132) menciona um “conhecer para transformar” referido por Marx em relação à filosofia. Por isso mesmo, Polli (206, p.27) enfatiza a possibilidade de “transformação e de emancipação social”, na perspectiva histórico-dialética. Penso que não é exagero voltar a dizer que embora seja essencial para compreender as condições em que o fenômeno ocorre no tempo, o contexto também consiste em uma estratégia para garantir a realização do princípio de totalidade, posto que é ele que facilita a observação de outros fenômenos que se dão na relação com o fenômeno investigado e das contradições que emergem nessas relações. Fundamentada no materialismo histórico-dialético, com especial referência em Gramsci e com um forte apelo ao contexto econômico Almeida (2001, p. 8), afirmou que o fenômeno “se mostra em sua correlação a totalidade na qual se insere e se relaciona dialeticamente” e cita Karel Kosik para referendar e fortalecer esse princípio na tese, no que diz respeito à compreensão do fenômeno como parte de um todo. De modo semelhante, e no intuito de entender a realidade social, Souza (2012, p. 20), evidenciou que, para que isso aconteça é preciso “encontrar na parte a relação com o todo; compreender a interioridade e a exterioridade como constitutivas da totalidade analisada, procurando mostrar que o fenômeno social só pode ser apreendido a partir das determinações e transformações apontadas pelos sujeitos envolvidos.” Outro aspecto marcante da sustentação teórica da tese, no cumprimento da orientação metodológica do materialismo histórico é que o objeto consiste no ponto de partida e de chagada da análise. Nesse sentido, cito a guisa de exemplos Murasse (2001) 212 e Almeida (2001) que mencionaram diretamente essa concepção metodológica em suas teses. O movimento do objeto de estudo na história e a sua gênese é uma preocupação constante nessas teses a fim tanto de seguir a orientação teórica como para falar das transformações históricas verificadas no lapso temporal do estudo realizado. A fundamentação teórica centra-se nas obras de autores que tratam da abordagem filosófica da tese e é reforçada no conjunto de obras que também abordam o objeto em questão. Nesse sentido, Murasse (2001, p. 128) expôs que as respostas a que chegou “foram elaboradas durante o processo da pesquisa: através da utilização de inúmeras fontes, confirmando uma vez mais que o específico não se explica por si mesmo, mas a partir do geral”. Observe-se, porém, que essas fontes são de dois tipos bibliográficas e documentais. Aliás esses tipos são predominantes entre as teses analisadas. A respeito da utilização das fontes algumas outras relações são possíveis, elas precisam estar de acordo com vários aspectos da produção de conhecimento. Nesse sentido, Corrêa (2012) observa que: [...] as opções por determinados tipos de fontes para subsidiar a produção da verdade histórico-científica, requer sincronia entre a temática escolhida, as opções teórico-valorativas dos pesquisadores, os problemas que fustigam sua curiosidade, as finalidades das investigações e as tecnologias metodológicas adotadas. (CORRÊA, 2012, p. 404) É marcante a presença de obras relativas ao objeto, que complementam e reforçam a sustentação teórica das teses. Tanto no que diz respeito à fenomenologia como no que se refere à dialética, essa literatura geralmente auxilia na contextualização e na revelação do significado e dos sentidos, na primeira abordagem, e no esclarecimento da trajetória das contradições e das relações do objeto investigado com outros fenômenos, como a política, a economia, a cultura e a sociedade, na segunda. E os rizomas na filosofia da diferença. Em algumas teses, a literatura foi utilizada como material de análise, sobretudo no que se refere aos argumentos utilizados pelos autores sobre determinados conceitos, como por exemplo Magnani (2000) que utiliza essa estratégia para falar do conceito de projeto social. E Horn (2002, p.15) que, de modo similar, referencia vários autores a partir dos quais aponta “possíveis concepções acerca do currículo, do ensino e da formação humana e a forma como esses conceitos se interrelacionam”. 213 Nas relações entre a literatura, a abordagem filosófica e epistemológica, e o problema, os pesquisadores organizam seus argumentos para sustentar a tese por eles anunciada direta ou indiretamente no texto da Tese Doutoral. Tanto as concepções assumidas como as categorias usadas pelos autores em suas análises, são essenciais identificadores de que a comprovação das teses assumem características bastante peculiares, pois há uma grande diferença no modo de compreender, explicar e analisar um objeto e de discutir um problema por meio da dialética, da fenomenologia e da filosofia da diferença, Posto que em Foucault, por exemplo, a questão não é descrever o poder, situá- lo no tempo e no espaço determinados ou mesmo reconstruir sua gênese, analisar as relações que realiza e as contradições que movimentam essas relações, porém analisar as relações de poder com a perspectiva de compreender as diferentes formas que esse assume em constante transfomação e considerar a existência de uma rede de micros poderes articulados ao Estado. Uma coisa é voltar-se para o liberalismo com o intuito de compreender a sua polissemia, outra é buscar entendê-lo como teoria que sustenta uma classe hegemônica e serve de ideologia de manutenção do poder dessa classe sobre às demais, e ainda outra é considerar o liberalismo como uma prática refletida de governo, ou seja, um modo de governar. Na dialética, o esforço para entender as contradições, a unidade dos contrários e as relações disso com a realidade concebida como totalidade estruturada é bem diferente da mobilização intelectual realizada pela fenomenologia para compreender as significações e a polissemia fenomênica, assim como do esforço efetivado pela filosofia da diferença para para entender a transversalidade dos fenômenos, a territorialidade dos conceitos, a partir de uma filosofia do múltiplo que se estabelece numa perspectiva rizomática. No que concerne às teses analisadas, as que mencionaram o materialismo histórico-dialético como método que subsidiou a pesquisa e, portanto, orientou a análise das informações contidas nos textos das teses apresentadas como requisito essencial do processo de doutoramento, além de relativo ao seu tempo, o sujeito epistêmico é aquele que analisa, interpreta, critica, cria, produz e reflete. Logo, é capaz de pensar e agir criticamente sobre a realidade, por isso é autônomo, ou seja, precisa exercer a autonomia necessária à transformação da realidade. 214 Por serem situados no tempo e no espaço, tanto o sujeito como o objeto sofrem e, ao mesmo tempo exercitam, a influência dos fatores políticos, econômicos e culturais de uma época. Isso significa que a capacidade criativa do primeiro na elaboração do conhecimento é marcada por esses fatores, no cerne de uma realidade que se movimenta por contradições, posto que é social e histórica. Muito embora os objetos em torno dos quais os autores das teses desenvolveram as suas análises tenham, a princípio, uma existência independente dos pesquisadores, enquanto sujeitos investigativos, esses interferem de algum modo naqueles ao transformá-los em seus objetos de pesquisa. Nesse sentido, é possível dizer que todos os objetos de pesquisa têm o sujeito implicado no objeto. No que diz respeito à abordagem dialética, nessa teia de relações vão se colocando as possibilidades epistêmicas, mas também as suas limitações de modo a cumprir o princípio de contradição que fixa o caráter dialético da realidade e do pensamento e que é responsável pelo movimento. O exercício de crítica e o esforço de análise das implicações epistemológicos da dialética e da fenomenologia na produção do conhecimento foram fundamentais para compreender os limites provocados pela redução fenomenológica e pelo princípio de contradição, por mais esdrúxulo que esse último possa parecer. Quanto à filosofia da diferença, diferentemente da fenomenologia, afasta-se bastante da dialética, centro da investigação desse estudo. As poucas referências que fiz a ela se dão em função ao respeito pela tese de Loyola (2008). As verdades constituídas nas teses analisadas, que foram elaboradas a partir das análises das fontes escolhidas para a pesquisa, são verdades que se definem, especialmente pelo uso das categorias de análise por parte do pesquisador. Entre os autores com teses com uma abordagem materialista histórica- dialética, as análises e a metodologia assumem diferentes matizes, que se formam conforme as categorias de análise e as referências utilizadas. Essa seção foi fundamental para compreender que os meandros e a complexidade dos limites epistemológicos são muitos e discretos, o que dificulta a percepção imediata das limitações que se interpõem no processo do conhecimento. Nesse sentido, a naturalidade com que o princípio de contradição é acatado e com que o pesquisador lida com ele, pelo fato de ser ele, concretamente, necessário ao movimento, aumenta ainda mais essa dificuldade. 215 Deslindar os meandros e a complexidade dos limites epistemológicos do conhecimento em educação, exige uma atenção especial às contradições que se fazem presentes tanto no processo, como na lógica constitutiva da dialética, como princípio gerador do movimento do conhecimento e da realidade. Princípio esse que apesar das proposições dialéticas de unidade dos contrários e de superação das contradições, perderia seu valor dialético se a superação fosse absoluta, se exterminasse de uma vez por todas com as contradições, inviabilizando o movimento transformador. 216 6 CONCLUSÃO Neste estudo, com base no referencial teórico, parti do problema da complexidade dos limites epistemológicos da filosofia dialética na produção do conhecimento científico em educação, com a curiosidade de saber como se configuram as limitações epistemológicas da filosofia dialética em pesquisas em educação, apesar do reconhecimento de sua capacidade heurística e da sua organicidade lógica. Reconhecer limites implica uma postura crítica que não se reduz a detectar possíveis falhas ou dificuldades em determinada situação, fenômeno ou objeto de pesquisa, mas também reconhecer suas qualidades e as contribições que pode dar ao movimento dialético da realidade. Foi no cerne dessa compreensão que, no caminho em direção à produção de análise e argumentos ao problema mencionado, emergiu a necessidade de saber sobre qual o lugar de importância atribuído à Filosofia Dialética no âmbito da produção do conhecimento científico no campo da pesquisa em educação no Brasil. A esse respeito posso concluir que no enfrentamento das dificuldades epistemológicas em sua atividade investigativa visando à produção do conhecimento, os pesquisadores das teses e das dissertações, cujos resumos foram recolhidos para compor a segunda seção, buscaram o auxílio da filosofia. Uma vez que o domínio das técnicas de pesquisa, embora essencial, não é suficiente, há necessidade vital de adentrar no universo teórico-conceitual das abordagens filosóficas que se colocam no contexto investigativo do pesquisador como possibilidades de embasamento para análise. Desde o primeiro resumo referente ao ano de 1989, observei que termos como limites, possibilidades, mudança, transformação, progresso, dialética, totalidade dialética, práxis são recorrentes nos textos. A princípio poder-se-ia dizer que termos como dialética, totalidade e práxis constituem um indicativo da escolha da abordagem filosófica dialética e de estudos sobre essa filosofia, mas a materialidade de minha pesquisa evidenciou que não é bem assim. A presença dessas expressões nos resumos, contudo não constituem garantia disso, mas um fator que contribuiu para a compreensão de que, da forma como muitos desses textos estão elaborados, não permitem a visualização de elementos simples, porém fundamentais à estrutura de um trabalho dessa natureza. As informações sobre o objetivo, o problema de pesquisa, a metodologia, as fontes históricas, o período de abrangência do estudo e a conclusão central, ainda que de 217 modo resumido, possibilitam uma boa visão sobre o trabalho, pois permitem saber com que objetos os autores se envolvem, a partir de quais problemas exercitam sua curiosidade epistemológica, qual seu principal objetivo e estratégias metodológicas. Mas perscrutando os resumos desse ponto de vista foi possível notar que poucos são aqueles que indicam pelo menos o objetivo, a metodologia e a conclusão geral. Os autores de algumas produções se dedicaram a falar exclusivamente do tema com uma síntese do que foi desenvolvido sobre esse item nos estudos, sem o cuidado de mencionar ou dar indícios claros sobre os outros elementos. Não bastasse a constatação dessas dificuldades nos resumos, também se fazem presente em alguns trabalhos completos. Ao considerar-se com Gatti (2002, p. 11) que “quem pesquisa procura descrever, compreender ou explicar alguma coisa”, pode-se concluir que essa explicação inclui cada movimento do processo de pesquisa. A falta de elementos estruturais impulsiona um questionamento sobre a finalidade de um resumo. Afinal qual o sentido de um resumo em um trabalho científico? Para que ele serve? De um lado, a leitura desse material permitiu observar que nem todos os resumos são claros quanto a esses itens. De outro, essa leitura mostrou-se insuficiente para falar sobre o conhecimento que os autores dessas produções têm dos meandros teóricos, técnicos e metodológicos da abordagem escolhida, Então, surgiu a necessidade de ler também as partes das Introduções e Conclusões dos textos integrais das teses doutorais. Percebi como esses autores são afetados pela Filosofia em suas produções, pelo menos no sentido de compreender a necessidade de um diálogo com essa área do conhecimento para subsidiar a análise de seus objetos de pesquisa. Isso se deve, em parte, à influência exercida pelos seus avatares que orientaram as produções textuais das pesquisas defendidas nos Programas de Pós-Graduação. Apesar das críticas a essa falta acima mencionada, é preciso lembrar que seguir as regras relativas à presença dos elementos considerados neste estudo, essenciais para constar no resumo, implica atentar para as regras estabelecidas pelo programa de pós-graduação a partir do qual a tese é elaborada. Entendo que uma produção dessa natureza não se resume ao cumprimento de regras. Contudo, penso nessa produção como contribuição para a elaboração de conhecimento por outros pesquisadores. O maior número de informações contidas em um resumo facilita a seleção do material que se precisa ler para um determinado estudo. Não ignoro o amplo espaço que o pesquisador tem para exercitar a sua criatividade e a importância desta, pois ela consiste em um 218 elemento marcante na organização lógica das ideias, na diferença de estilos que muitas vezes torna o trabalho mais interessante. Para além dos problemas encontrados quanto à organicidade dos resumos analisados, pude constatar que a filosofia dialética tem lugar privilegiado, no sentido de ser buscada como abordagem filosófica das pesquisas em educaçao. Aliás, a filosofia tem esse lugar, pois além da dialética, sobretudo, materialista histórica, são mencionadas nessas produções, a hermenêutica, o pensamento complexo de Morin e a perspectiva pós- crítica, além de dezoito áreas do conhecimento a que essas produções estão conectadas. Se, é interessante que pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento busquem a abordagem da Filosofia Dialética e de outras filosofias, igualmente relevante foi a presença de diversos temas nos resumos dessas produções. Com relação à questão acerca de qual a receptividade da Filosofia Dialética nas práticas investigativas dos pesquisadores em educação no Brasil, representados neste estudo por Dermeval Saviani e Antônio Joaquim Severino e as contribuições do materialismo histórico-dialético para a formação do pesquisador em educação, as análises realizadas na terceira seção permitiram concluir que essa contribuição se expressa massivamente na opção por essa abordagem na fundamentação teórico-metodológica das produções dos dois professores, de onde se conclui a grande receptividade da filosofia dialética em suas práticas. Mas a proximidade dos dois autores com o materialismo histórico-dialético fez-se de forma diferenciada, em função da dialética de suas próprias existências. Por exemplo, no que concerne à epistemologia dialética, enquanto Saviani aceita o caráter ontológico do materialismo histórico, impresso no esforço científico de Karl Marx, Severino o descarta e se aproxima das questões da existência. No entanto, sem negar a importância de uma antropologia filosófica no contexto da formação. Essa postura repercute nas teses por eles orientadas e contribuem para os contornos que lhes dão forma. Saviani e Severino deixam transparecer em seus textos que a tarefa de reflexão e análise a que se lançam em suas investigações sobre fenômenos educacionais, e a forma como o fazem, oferece importantes contribuições para o desenvolvimento da pesquisa e do conhecimento sobre a educação brasileira, sobretudo, com produções nos campos disciplinares da filosofia e filosofia da educação, da história e história da educação e da historiografia. Embora haja uma coincidência entre os termos usados, as ideias e os fatos discutidos por um e outro autor, percebi que em Severino são mais frequentes as 219 articulações com as disciplinas Filosofia e Filosofia da Educação, contudo, sem perder a perspectiva histórica. Enquanto que em Saviani a maior assiduidade das relações é com as disciplinas História, História da Educação e Historiografia. Porém, dizer dessa maior proximidade de Saviani com a história, não significa uma recusa em relação à filosofia, uma vez que as suas produções são consubstanciadas na filosofia dialética materialista e histórica. Essa postura dos dois autores só efetiva, na prática, a compreensão de que não se pode separar história e filosofia. Foi possível constatar que o teor crítico das obras de Severino e Saviani não se dirigem ao materialismo histórico-dialético, com essa perspectiva propriamente. Ao contrário, tanto um como outro mencionam as possibilidades epistêmicas desse método, juntamente com a lógica que o consubstancia, o que parece uma incongruência práxica. A receptividade da filosofia por esses intelectuais se espraia em suas produções científicas e nas orientações de trabalhos científicos o que me levou a verificar a importância da escolha desses autores como orientadores das teses elencadas para a análise. Sobre a questão de como se configura o método de investigação científica e quais temáticas e objetos de estudos são privilegiados na construção do conhecimento científico em educação, nas teses orientadas pelos Severino e Saviani, identifiquei o esforço que os autores dessas teses fizeram no sentido de organizar uma metodologia cujo desenvolvimento foi fundamental na constituição de uma produção original, sobretudo nos casos de temas já bastante estudados por outros autores. Considerando a possibilidade de afinidade de interesses epistêmicos que aproximam orientadores e orientandos, e relacionando os dados da terceira e quarta seções, percebi que as produções dos dois orientadores se reúnem em torno de eixos temáticos aos quais se juntam as teses, tais como formação, ensino, história, trabalho, prática pedagógica e filosofia. O método se configura por meio de diferentes lógicas, de acordo com as abordagens assumidas por cada autor. Nas teses estas são a dialética, a fenomenológica e a pós-crítica fundada na filosofia da diferença. E, ainda, do modo como cada autor organizou o caminho de ida e de volta traçado entre a pergunta e a resposta. Porém, o caminho investigativo em algumas teses é bem diferente desse. Um exemplo são as teses de Ghedin (2004) na qual a preocupação é recolocar um problema e não propriamente chegar a uma resposta sobre ele, e a de Pansarelli (2010) em que o caminho é apenas de ida entre a pergunta e a resposta, uma vez que o ponto de chegada dessa tese não é o ponto 220 de partida, não é a esse ponto que o autor volta com um conhecimento “mais rico”, como diria Hegel, nem com uma práxis tranformada, no dizer de Marx. Em função da criatividade necessária à elaboração de conhecimento, sobre a dimensão metodológica, talvez seja mais coerente referir a uma abordagem epistemológica para indicar a aproximação com um determinado aporte teórico que dá sustentação ao método traçado por um pesquisador em particular, muito embora a pesquisa seja uma atividade social. Nesse sentido, a maioria das teses analisadas foi guiada pela fundamentação da dialética, especialmente no materialismo histórico, o que consiste um sintoma da influência do marxismo nas pesquisas em educação orientadas pelos professores Saviani e Severino. Contudo, é preciso lembrar que este último professor orientou teses tanto na abordagem materialista histórico-dialética como na fenomenológica e na perspectiva pós- crítica. Destaco também que tema, problema e objeto de estudo se relacionam intimamente, que há sempre um problema envolvido no processo de conhecimento, seja do ponto de vista teórico, de uma tensão surgida no confronto de teorias, da necessidade de reelaboração teórica, de recolocação de um problema, seja de uma necessidade prática constituída como uma dificuldade essencial à vida. Por isso mesmo, as teses referem pesquisas que não se constituem apenas como bibliográficas, na medida em que analisam problemáticas produzidas por meio da realidade educacional no Brasil. A opção dos temas privilegiados e a elaboração do problema nas teses relacionam-se às dimensões da vida dos autores, especialmente as dimensões acadêmica e profissional, assim como do contexto geral da sociedade e em particular da educação. Ao analisar as teses observei que a categoria contextualização foi adotada no processo do conhecimento nas abordagens fenomenológica e dialética. Nessa última, como estratégia essencial para situar o problema e o caráter histórico do objeto, mas também com a perspectiva de garantir o uso adequado das categorias de análise, especialmente as da totalidade e contradição. Assim como uma estratégia para atingir a totalidade Isso foi fundamental para esclarecer que, muito embora apresente limitações a categoria da totalidade tem um significativo poder heurístico, sobretudo quando se trata de problemas relacionados à educação. Por isso mesmo, os dois princípios, de totalidade e de contradição apresentam-se em todas as teses que buscaram uma abordagem dialética e são apropriados por seus autores e autoras como categorias de análise. 221 Quanto ao objeto de pesquisa desta tese, não encontrei trabalhos preocupados e ocupados em analisar os limites epistemológicos da Filosofia Dialética na produção do conhecimento científico no campo da educação. Dentre as dissertações orientadas pelos dois professores e examinadas na terceira seção apenas uma orientada pelo professor Saviani dirigiu o seu estudo para o método dialético e outra conduzida pelo professor Severino discutiu sobre metodologia dialética de construção do conhecimento em sala de aula. Na quarta seção dediquei-me a investigar como se configura o método e quais temáticas e objetos de estudo são privilegiados na investigação científica em Teses Doutorais produzidas na área da educação. Nessa seção, verifiquei que o método de pesquisa é tanto apropriado como elaborado, uma vez que para pensar, traçar e desenvolver o seu método o pesquisador se apropria de princípios epistemológicos essenciais à lógica de sustentação de uma teoria filosófica e a partir disso e das fontes de pesquisa traça e efetiva o seu próprio método. Reconhecer a elaboração de um método significa considerar a autonomia, ainda que relativa, posto que o intelectual tem que seguir regras, e a capacidade criativa do pesquisador, que ao buscar solucionar dificuldades, surgidas no percurso de investigação, cria estratégias para superá-las e isso já indica alguns limites que se colocam no caminho investigativo. Desde o momento da escolha temática, vão se delineando os limites que, em termos acadêmicos, geralmente são mencionados como delimitação do tema, do objeto, etc. Se essa delimitação e se esses elementos necessários à realização de uma pesquisa são escolhidos, pensados, elaborados com base em uma fundamentação teórica, filosófica, epistemológica, esses limites têm relação com a teoria que fundamenta epistemologicamente a pesquisa, muito embora as abordagens sejam quase sempre pensadas na perspectiva da possibilidade e, de fato, funcionam como tal, porém fazendo emergir limitações. No concernente à indagação de quais os limites epistemológicos na abordagem dialética quando seus pressupostos são aplicados na construção de Teses Doutorais provenientes dos Programas de Pós-Graduação em Educação, as análises foram realizadas tanto na quarta seção, quando esses limites começam a ser mais diretamente apontados e discutidos, como na quinta seção para a qual a questão foi orientada. Para tanto, na quinta seção considerei os meandros e a complexidade com que esses limites se apresentam, destacando os elementos do conhecimento como o 222 sujeito e o objeto, as relações possíveis entre eles no processo do conhecimento e, sobretudo a abertura que tanto o sujeito empírico quanto o sujeito epistêmico correm o risco de permitir. O primeiro, por meio de seus interesses ou paixões, que podem conduzir os resultados, independetemente do que é determinado objetivamente, o que equivale a dizer socialmente. O segundo, relativo a uma abordagem epistêmica e, nesse caso, a abertura às limitações, é constituída no próprio seguimento dos princípios da filosofia que consubstancia a abordagem epistêmica realizada por esse sujeito. Penso que não é demais lembrar, nesse momento de finalização deste texto, que em Hegel, a ideia se desenvolve por meio de contradições internas ao próprio conceito que é, ao mesmo tempo, movimento. Em função disso, um conceito já traz em si a sua possibilidade de negação, de tal modo que do primeiro conceito emerge um segundo que, por sua vez, também será negado na trama dessas tensões, dando origem a um terceiro. Além de consistir em um momento do movimento, a negação da negação” é um conceito que supera as contestações existentes entre os dois primeiros conceitos, no movimento triádico da lógica dialética. Entretanto, ao superá-las dá ensejo a novas contradições, isto é, se transforma em novas afirmações que, por sua vez, serão negadas, em um movimento contínuo. A negação da negação firma o caráter revolucionário da dialética hegeliana, é esse momento do método dialético que garante a continuidade do movimento da história, ainda que efetuada nos conceitos e por eles impulsionada. A negação da negação, ao ser colocada por Hegel em termos conceituais, é identificada por Marx como alienada57, mas nem por isso perde a sua importância para o materialismo histórico, pois ela é a garantia da superação. Para Marx, (1996, p.17), a dialética ao conceber o existente, “afirmando-o encerra, ao mesmo tempo, o reconhecimento da negação e da necessária destruição dele; porque apreende, de acordo com o seu caráter transitório, as formas em que se configuram o devir; porque enfim, por nada se deixa impor, e é, na sua essência, crítica e revolucionária”. A negação da negação é uma das maiores contribuições de Hegel para a compreensão da realidade histórica, seja do ponto de vista do idealismo hegeliano, seja sob a visão do materialismo histórico, muito embora as concepções hegeliana e marxista de realidade sejam fundamentalmente opostas. 57 Cf. Manuscritos econômicos-filosóficos e outros textos escolhidos. 223 Mas, se Hegel estava correto, a superação dialética nega e, ao mesmo tempo, preserva a qualidade. Mas, se o que é negado é preservado, e se a negação da negação se transforma em uma nova afirmação que dá sequência ao movimento contraditório da dialética, o que é preservado das limitações? Que limitações são mantidas ou mesmo criadas quando me refiro à fecundidade heurística de um método? Se esse movimento dialético é material, se o sujeito apenas o expressa via pensamento, ainda assim cabe perguntar: que possibilidades e limitações são negadas e/ou preservadas? Essas questões consistem um indicativo de que a dialética, tanto do ponto de vista ideal como da perspectiva material tem limitações de ordem lógica. Penso que, se a ideia se desenvolve por meio de contradições, então ao acompanhar esse movimento, o pensamento, de alguma forma, o realiza. Se o movimento conceitual pensado por Hegel pode ser o ponto de partida para entender a dinâmica material e se esta também se movimenta por contradições, e se esse movimento pode ser pensado idealmente e realizado materialmente e se nele a contradição abre espaços para as possibilidades, então, também o faz para as limitações. A transformação guarda em seu cerne um lugar para a contradição e vice-versa, portando possibilidades e limitações, são aí guardadas. Pensar por contradição não significa falar de contradição lógica, porém consiste em exercitar-se em um processo lógico nada simples, em que as contradições funcionam, ao mesmo tempo e, contraditoriamente, como possibilidades e limites: na medida em que impulsionam o movimento transformador, o limitam. É, pois essencial compreender que pelo princípio fundamental da lógica dialética juntamente com as possibilidades são germinados os limites, ambos constituídos na imanência da tensão geradora da unidade dialética, ainda que essa unidade seja consubstanciada na superação. Compreensão perfeitamente válida nessa lógica, em cujo caráter contraditório, do qual o método para ser dialético não pode fugir, encontra-se a complexidade dos limites epistemológicos da filosofia dialética. Se o pesquisador, realmente tem a consolidação de uma teoria, se esta já se constituiu uma atitude consciente e segura, parece claro que a própria teoria impõe, pois, limites na maneira específica de olhar, pensar, agir, analisar. Os contornos implicados na teoria já são limites internos a ela. Talvez o problema seja justamente assumir esses limites com naturalidade e, consequentemente, não pensar e não agir sobre isso, o que pode influenciar uma postura ortodoxa por parte do pesquisador. 224 Portanto, observando especialmente o princípio da contradição é possível comprovar a tese pela própria lógica dialética em que a tensão gerada entre os opostos implica um movimento contraditório que impõe avanços e limites. No entanto, acatar o desafio de analisar o problema investigado nesta tese, não é fácil, sobretudo, quando se considera a capacidade heurística do materialismo histórico-dialético, mencionada por autores como Severino, Gamboa e Saviani. É como se nos fosse permitido criticar a dialética, mas não o materialismo histórico-dialético. Indicar as limitações da dialética, inclusive materialista histórica na pesquisa na área da educação, onde os autores mencionados já apontaram as qualidades metodológicas dessa abordagem, ressoa como heresia acadêmico-científica. O princípio de contradição é inerente à dialética, logo, ao tentar comprovar uma tese que propõe que essa abordagem tem suas limitações e que essas são também de ordem da lógica, parece uma quimera ou, no mínimo, devaneio epistemológico. Contudo, considerando que o movimento é impulsionado por contradições possíveis de situar tanto no movimento conceitual, como da prática social, compreendo que a lógica dialética, seja do ponto de vista ideal, seja material, apresenta limitações, cuja complexidade dificulta sua apreensão imediata. Comprovar esta tese significou enfatizar o supostamente obvio, desnaturalizar o “natural” e fortalecer a compreensão de que a filosofia para ser crítica tem que ser autocrítica. O exame da produção teórica existente, sobretudo de Friedrich Hegel e Karl Marx, das informações extraídas dos currículos lattes de Severino e Saviani, bem como das teses por ele orientadas permitiram comprovar a afirmativa proposta no estudo relatado neste texto, ou seja, a seguinte Tese: a abordagem dialética na pesquisa educacional, inclusive em sua concepção materialista histórica, apresenta limitações que não são apenas de ordem da insuficiência teórica dos pesquisadores que adotam seus pressupostos nas pesquisas que realizam, mas em razão da complexidade em que se originam as tensões epistemológicas implícitas em tal filosofia, em função do caráter contraditório em que se estabelece o movimento do real e de sua própria lógica, da dificuldade que se tem de colocar em prática o materialismo histórico dialético, na perspectiva da práxis transformadora da realidade, bem como do modo como os autores constroem seus objetos e métodos heurísticos no processo de produção do conhecimento científico. A multiplicidade de dimensões e relações do objeto no contexto histórico, 225 implica ainda mais na presença complexa dos limites da dialética, apesar da sua capacidade heurística nas pesquisas em educação. Embora essa tese tenha sido defendida em todas as seções, especialmente nas duas últimas, penso que não é demais lembrar que tanto no que diz respeito às relações estabelecidas entre o sujeito e o objeto, a constituição da verdade científica, a materialidade do objeto e a necessidade de sustentação teórica da tese, a contradição se faz presente como elemento essencial ao movimento transformador. Porém, dialeticamente, esse caráter dificulta a percepção das limitações que circulam sinuosamente por entre esses elementos, por meio desse veículo transformador. Dialeticamente falando, não há contradição sem totalidade e vice-versa, de modo que os limites interpostos por uma unem-se aos limites provocados pela outra. A presença da contradição nas relações sociais e, portanto, na educação, e a multiplicidade de dimensões e relações constitutivas dos objetos implicam na complexidade dos limites da dialética que se efetivam na prática da pesquisa e, consequentemente, na elaboração do conhecimento. Além da multiplicidade de dimensões e relações do objeto, indicadas no último trecho da tese proposta, o homem e a sociedade também têm múltiplas dimensões, como por exemplo, a histórica, a ética, a política, a estética, a reflexiva, a epistemológica, a metodológica, a religiosa e a artística, que acompanham o sujeito em suas práticas investigativas. Essa multidimensionalidade objetiva e subjetiva implica a realização de múltiplas relações entre o ser humano e a realidade material em seus variados aspectos. Isso constitui o fator fundante do que considero a complexidade das limitações da dialética, uma vez que essas deslizam sinuosamente por entre essas ações que se organizam e se realizam na relação entre sujeito e objeto, a partir da filosofia em questão. É justamente essa multidimensionalidade objetiva e subjetiva que implica a necessidade, na lógica dialética, de compreensão da totalidade. Assim, o caráter contraditório e dinâmico da realidade impõe que se repense o conceito de total mediante às necessidades do conhecimento e que se crie o conceito de totalidade concreta para explicar o que desse total é considerado e, consequentemente, está contido na ideia de totalidade, processo esse que serve para definir, no âmbito do materialismo histórico- dialético, na exposição feita por Kosik (1976) sobre a tridimensionalidade de sentidos desse vocábulo, no contexto teórico dessa concepção. Nessa perspectiva, a totalidade consiste em uma teoria da realidade para a qual esta é compreendida como um todo 226 estruturado, significativo para cada fato ou conjunto deles, mas também é concebida como princípio epistemológico e exigência metodológica. Fazer pesquisa consiste em um grande aprendizado na própria experiência, hesitando, criando, atentando às críticas, à diversidade de conteúdos, à complexidade dos limites que se interpõem ao processo, a inquietação epistemológica que certamente conduz à criação de um problema de pesquisa, sobretudo novo, ainda que o problema com que estivera envolvido até o momento permaneça atual. Há tanta proximidade das limitações e das possibilidades que se fazem presentes na atividade de pesquisa que fica difícil dizer o que realmente é externo e interno a uma abordagem teórica e uma metodologia. Contudo, a leitura das fontes analisadas neste estudo, trouxeram vestígios suficientes para entender que o processo histórico e as investigações realizadas por autores interessados na educação em geral e na dialética em particular abrange a epistemologia, a educação, a dialética e o método, de modo que os limites da abordagem filosófico-epistemológica usada pelo pesquisador para fundamentar sua análise se fazem presentes no processo de elaboração do conhecimento. Nesse sentido, em relação ao materialismo histórico-dialético, é que penso sobre: as assertivas de Gamboa (2012) a respeito das limitações relativas à falta de profundidade teórica dos pesquisadores em educação; da possibilidade da falta da necessária postura materialista histórico-dialética mencionada por Frigotto (1997); da semelhança na maneira de pensar “por meio de contradições” nas dialéticas hegelianas e marxista, afirmada por Nunes (1991); e, talvez, por isso mesmo, da dificuldade de colocar em prática o método materialista histórico, indicada por Saviani (1991) e de uma educação marxista, apontada por Genylton (2013), justificada em função dos avanços teóricos não serem acompnhados por avanços práticos. Com base na ideia de contradição como dínamo do processo histórico e na complexidade em que se dá esse movimento, é possível pensar que as limitações da abordagem filosófica dialética na pesquisa e de um método oriundo desta são de origem complexa. Por fim, lembrar a provisoriedade das conclusões a que se chega neste estudo, considerando que a realidade muda historicamente, também mudam os estudos e as interpretações, outras leituras poderão proporcionar análises talvez mais consistentes e profundas e, consequentemente, inferências mais relevantes. Com essa perspectiva, indico alguns limites enfrentados na construção desta Tese, como: as dificuldades de acessos as teses, o que determinou o lapso temporal de 227 quinze anos, de 2000 à 2015; a omissão de alguns autores quanto a elementos importantes como a indicação da abordagem epistemológica de sustentação da tese e a indicação clara da própia tese, o que implicou uma questão não somente epistemológica e metodológica no processo de investigação, mas sobretudo ética, em que, como pesquisadora, assumi a responsabilidade de inferir quais eram de fato esses elementos, a que se referiam, o que propunham; e as dificuldades de levar adiante a decisão de obter o meu objeto de estudo, pois em duas disciplinas cursadas no Programa de Pós-graduação, nas análises sugeriam a mudança de objeto, pois examinar as limitações epistemológica da dialética soava quase como um contrassenso. Como apontar as limitações de uma abordagem considerada com um grande poder heurístico? As críticas foram desanimadoras. Mas no que diz respeito a uma atitude de resistência pude contar com o apoio do meu orientador. No movimento realizado no processo da pesquisa, a metodologia foi se modificando à medida que foram surgindo os problemas. Manter a decisão de examinar a dialeticidade da lógica dialética, sustentando minha Tese nos princípios de contradição e totalidade foi um empreendimento difícil, porém contribuiu para fortalecer a preocupação em explicitar os meus argumentos ao apresentar uma outra visão da lógica dialética, até certo ponto diferente da proposta por Marx (1991) e referenciada por Gamboa (2013). Entendo que a lógica dialética compreende a contradição no seu interior, muito mais do que a preocupação em encontrar respostas e transformá-las em novas questões. Mesmo que se considere a proposição marxista de que a lógica dialética perfaz um camimho em direção as respostas relativas ao problema de pesquisa e um retorno a este problema, modificando-o no sentido de refinamento e completude, ele nada tem a ver com a dialética se não considerá-la uma lógica fundamentada na contradição. 228 REFERÊNCIAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia.4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. ADORNO, TH. W. Educação após Auschwitz. In: Educação e Emancipação. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995. AGUIAR, Wisley Francisco. Filosofia, música e sociedade: a noção de progresso em Theodor W. Adorno. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Uberlândia – Filosofia, 2009. ALBUQUERQUE, Maria Betânia Barbosa Albuquerque. Trilhas e Temas da Disciplina Filosofia da Educação a Partir da PUC-SP. Tese de. Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - Educação: História, Política, Sociedade, 2002. ALMEIDA, Maria de Lourdes Pinto de. 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José Marcos Miné Vanzella. A liberdade como condição de ampliação da razão científica e tecnológica do pensamento de Leonardo Coimbra. Dissertação de Mestrado. Universidade Gama Filho – Filosofia, 1998. VIEIRA, Fábia Magali Santos. A Formação Inicial de Professores On-Line. Possibilidades, Contradições e Desafios: 2000-2005. Tese de Doutorado. Universidade de Brasília – Educação, 2009. VIEIRA. Marilene Melo A Filosofia da Educação no currículo do Curso de Pedagogia. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo – Educação, 2010. VIEIRA, Roney Wagner. A dialética na crítica à ilustração conforme a Fenomenologia do Espírito. Tese de Doutorado. Universidade Federal de São Carlos – Filosofia, 2007. VIEIRA PINTO, Álvaro. Ciência e Existência: problemas filosóficos da pesquisa científica. São Paulo: Paz e Terra, 1999. WEFFORT, Luis Fernando. Poesia, retórica e educação na Ifigênia em Áulis de Eurípides. 01/03/2008. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo – Educação ZANATTA, Regina Maria. Jonathas Serrano e a Escola Nova no Brasil: raízes católicas na corrente progressista. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo – Educação, 2005. 240 APÊNDICE A – TESES DEFENDIDAS NO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DO INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ – 2011 A 2015 Nº Autor (a) Título Palavras-Chave Ano de Defesa 01 Diana Lemes Ferreira A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a Política de Formação Docente Regulação Educacional. Política de Formação Docente. Organismo Internacional. 2011 0 02 Ivanildo do Socorro Mendes Gomes. Ivanildo Do Socorro Mendes Gomes. Movimento pela Educação de Jovens e Adultos nas Confinteas e seus Desafios para a Política Educacional. Movimentos. Política de Educação de Jovens e Adultos. CONFINTEA. Diversidade. Inclusão. Sustentabilidade. 2 2012 0 03 Maria Auxiliadora Maués de Lima Araújo A GESTÃO PREMIADA: a experiência de gestão do C.E.E.M.R.C. São Francisco Xavier em Abaetetuba – Pará. Política educacional. Gestão educacional. Gestão gerencial. Lógica da Premiação. 2012 0 04 Doriedson do Socorro Rodrigues Saberes Sociais e Luta de Classes: Um Estudo a Partir da Colônia de Pescadores Artesanais Z-16 – Cametá/Pará Saberes sociais. classe social. consciência de classe. saberes de pescadores 2 2012 0 05 Luciene das Graças Miranda Medeiros O Reuni – Uma Nova Regulação da Política de Expansão da Educação Superior: O Caso da UFPA Educação Superior. Expansão. Regulação. REUNI. 2 2012 0 06 Maria Roseli Santos Que Design é Este? Representações Sociais que docentes possuem sobre o seu trabalho no curso de Design/UEPA Trabalho Docente. Design. Representações Sociais. 2 2012 0 07 Amélia Maria Araújo Mesquita Os Elementos de Inclusividade na Prática Curricular de Uma Professora: Uma análise da partir da Cultura Escolar Inclusão Educacional. Prática Curricular. Cultura Escolar 2 2013 0 08 Damião Bezerra Oliveira A Formação do Pesquisador na Pós- Graduação em Educação na Universidade Moderna: Valores epistemológicos e Ético-políticos Universidade. Pós- Graduação. Formação do pesquisador. Pesquisa Educacional. Educação e valores. 2 2013 09 Maria Edilene da Silva Ribeiro A Gestão Universitária: Um Estudo na UFPA, de 2001 a 2011. Universidade. Gestão. 2 2013 241 Gerencialismo. Participação. 10 Flávio Corsini Lirio Avaliação da Implementação das Ações de Enfrentamento ao Abuso Sexual Contra Crianças e Adolescentes em Escolas Públicas de Ensino Fundamental do Bairro do Guamá – Belém/Pa Política pública. violência sexual contra criança e adolescente. Educação. 2 2013 1 11 Ghislaine Dias da Costa A Educação como Transgressão: Nos horizontes da escolarização de Hansenianos no Pará do século XX a (re) criação da experiência de si. Belém-PA Hanseniano. Escolarização. Políticas e Práticas de Controle. Transgressão. 2 2013 1 12 Isabel Cristina França dos Santos Rodrigues Professoras Aposentadas em Território Rural/Ribeirinho: Identidades e Práticas Socioculturais. Identidade docente. Práticas socioculturais. Trabalho. Velhice. 2 2013 1 13 Jadson Fernando Garcia Gonçalves Biografemática e Formação: Fragmentos de Escrita de uma vida Biografema. Vida- Escrita. Auto- biografia. Auto- biografia-deriva. Formação de Professores. 2 2013 1 14 Joyce Otânia Seixas Ribeiro A Tradução da Tradição em Práticas Curriculares no Colégio Estadual Paes de Carvalho Etnografia pós- moderna. Tradução cultural. Práticas curriculares tradutórias. Corpo. Gênero e sexualidade. 2 2013 1 15 Leandro Klineyder Gomes de Freitas Currículo e Formação Docente no Curso de Ciências Sociais/UFPA: configurações, continuidades e rupturas (1963-2011) Currículo. Teoria Crítica. Formação Docente. Educação Superior. Curso de Ciências Sociais. 2013 1 16 Mariza Felippe Assunção O Mito da Virtuosidade da Avaliação: Trabalho Docente e Avaliações Externas na Educação Básica Avaliações Externas. Regulação Educacional. Trabalho Docente 2013 1 17 Roseane do Socorro da Silva Reis Fernandes Ser Orientador em Programas de Pós-Graduação em Educação: Uma descrição fenomenológica Ser orientador. Fenomenologia. Existência. 2013 1 18 Verônica Lima Carneiro Política de Avaliação e Trabalho Docente no Ensino Médio Políticas educacionais. Reforma do Estado. Políticas de avaliação. Avaliações externas. Trabalho docente. Ensino médio. 2 2013 242 1 19 Walter Lopes de Sousa O Programa Gestão Nota 10 do Instituto Ayrton Senna e a Educação em Santarém-Pa Parceria público- privada. Gerencialismo. Educação 2 2013 2 20 Ana Paula Vieira e Souza. Trabalho Infantil: uma análise do discurso de crianças e de adolescentes da Amazônia paraense em condição de trabalho Trabalho e educação. Crianças e adolescentes. Trabalho Infantil. Trabalho como princípio educativo. Estranhamento 2 2014 2 21 André Rodrigues Guimarães Trabalho Docente Universitário: Participação dos Professores na Materialização da Contrarreforma da Educação Superior na Ufpa Trabalho docente. Universidade pública. Contrarreforma. 2 2014 2 22 Francisco Valdinei dos Santos Anjos O Entre-Lugar e o Não Lugar da Docência: Representações Sociais de Professores de Dança Formação Docente. Dança. Ensino de Dança. Representações Sociais. 2 2014 2 23 Francisco Willams Campos Lima Controle Social e descentralização na gestão da política educacional de Castanhal – PA. Classes Subalternizadas. Estado. Controle Social. Descentralização. Sociedade Civil. 2 2014 2 24 Gerlândia de Castro Silva Performatividade Homoerótica em Práticas Discursivas Docentes. Docência, Performatividade e Homoerotismo 2 2014 2 25 Jorge Leal Eiró da Silva. Arquitextura dos Afetos: Escrileituras Sobre Desenhos de Artistas- Professores Escrileitura. Artistas- Professores. Cartografemas. Desenho. Formação 2 2014 2 26 Leandro Passarinho Reis Júnior. Tramas de Subjetivação: Analítica da Fabricação do Parfor-Pedagogia- Campus de Bragança/UFPA PARFOR. Tramas de subjetivação. Currículo. Formação de professores. História. 2 2014 2 27 Maria do Socorro Ribeiro Padinha Padinha Relações Raciais: a pesquisa na Pós- Graduação em Educação no Brasil (2005 – 2010) Educação. Relações Raciais. Pesquisas. Práticas Formalizadas. 2 2014 2 28 Maria Izabel Alves dos Reis. O Adoecimento dos Trabalhadores Docentes na Rede Pública de Ensino de Belém-Pará Adoecimento. Condições de Trabalho. Políticas Educacionais. Saúde. Trabalho Docente. 2 2014 243 2 29 Oneide Campos Pojo. A Parceria Público-Privada do Instituto Ayrton Senna e a Prefeitura Municipal de Benevides-Pa: entre os desafios (pro)postos e os limites da realidade. Parcerias Público- Privadas. Instituto Ayrton Senna. Correção de Fluxo. Gestão Escolar. 2 2014 3 30 Raimundo Sérgio de Farias Junior A Precarização do Trabalho e do Adoecimento Docente em Instituições de Ensino Superior Privadas/Mercantis. Trabalho docente. Precarização do trabalho. Adoecimento docente, Ensino superior privada. 2 2014 3 31 Sônia Eli Cabral Rodrigues. A Dimensão Afetiva nas Representações Sociais de Docentes da Pós-Graduação em Educação Afetividade. Educação. Representações Sociais. 2 2014 3 32 Sonia Maria Maia Oliveira. O Ensino de Ciências Naturais dos Anos Iniciais: Concepções e Práticas Pedagógicas dos Docentes em Formação pelo Parfor/Pedagogia/Ufpa/Belém Ensino de Ciências Naturais. Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais de Ciências. Pedagogia. Professores em Formação. Formação de Professores. 2 2014 3 33 Antonino Cezar Leite Lobato. Capital Intelectual Versus Capital Cultural Científico no Campo Acadêmico da Educação Física Belém-Pará Campo acadêmico. Capital intellectual. Capital científico. Educação Física. 2 2015 3 34 Dário Azevedo dos Santos Vias e Trajetos de Escolarização de Sujeitos Homoafetivos Velhos da Cidade de Belém Sexualidade. Envelhecimento. Escolarização. Homoafetividade 2 2015 3 35 Ilma de Andrade Barleta. A Gestão Educacional no Plano de Ações Articuladas do Município de Macapá-Ap: Concepções e Desafios Gestão Educacional; Plano de Ações Articuladas; Sistema de Ensino Municipal de Macapá-AP. 2 2015 3 36 João Paulo da Conceição Alves Gênese e Materialidade da Noção de Competências na Prática Pedagógica de Professores de Uma Escola de Ensino Médio Em Macapá/Ap Pedagogia das Competências. Prática Pedagógica. Pragmatismo. Estado do Amapá 2 2015 3 37 Luana Costa Viana A Colonização de Corpos, Corações e Mentes: Educação e Higienismo em Escritos de Periódicos Pedagógicos no Pará (1891-1912). Educação. Higienismo. Colonialidade. 2 2015 244 3 38 Maria do Socorro Pereira Lima. Infância, Educação e Criança: Um Estudo Histórico-Literário Nas Obras Serões Da Mãe Preta E Chove Nos Campos De Cachoeira (1897- 1920) História da Infância e da Criança. História da Educação no Pará. Literatura da Amazônia. Cultura infantil. 2 2015 3 39 Maria Lúcia Martins Pedrosa Marra “Escola Itinerante”: Uma Experiência De Formação De Professores Indígenas No Estado Do Pará, Brasil Belém/Pa Educação Escolar Indígena; Formação de Professores; Reflexividade. 2 2015 4 40 Nazaré Serrat Diniz de Souza Na Belém Ribeirinha, a Juventude e o Direito à Escolarização com Educação Profissional: Análise da Experiência da Casa Escola da Pesca. Juventude Ribeirinha. Direitos. Escolarização de Jovens e Adultos. Pedagogia da Alternância. Educação Profissional. 2 2015 4 41 Raimunda Dias Duarte A ordem de educar meninos na Amazônia paraense: uma análise discursiva da obra ‘Compendio de Civilidade Cristã’, de Dom Macedo Costa (1880 a 1915) História do livro; análise do discurso; leitura; civilidade; moral cristã. 2 2015 4 42 Sérgio Bandeira do Nascimento. Biopolíticas de Saúde Mental, Poder Disciplinar Psiquiátrico e Modos de Subjetivação de Professoras Primárias Internadas como Loucas. Poder disciplinar psiquiátrico. Modos de subjetivação. Loucura de professoras primárias. 2 2015 4 43 Vanilson Oliveira Paz. Institucionalização da Gestão Democrática da Educação como Política Pública no Sistema Municipal de Ensino de Igarapé-Açu, Pará. Gestão democrática; Descentralização; Autonomia; Participação; Sistema Municipal de Ensino. 2 2015 Fonte: Teses defendidas no PPGED. Disponibilizadas em http://www.ppgedufpa.com.br/. Elaborado pela Autora 245 APÊNDICE B – TESES ORIENTADAS POR ANTÔNIO JOAQUIM SEVERINO- 2000- 2015 Nº Autor Título Ano de Defesa IES de Origem e endereço de acesso 0 01 Enzo Basílio Roberto Humanização, interdisciplinaridade e pesquisa: Em busca de uma alternativa qualitativa para a formação do estudante do ensino médio integrado ao técnico. 2 2014 UNINOVE https://bibliotecatede.unin ove.br/handle/tede/553 0 02 Maria Rita Nascimento A contribuição de Paulo Freire e Enrique Dussel para a formação de professores no Brasil – A EJA como ilustração. 2 2014 UNINOVE https://bibliotecatede.unin ove.br/handle/tede/572 0 03 Daniel Pansarelli. Filosofia da Práxis na América Latina: Contribuições à filosofia contemporânes a partir de E. Dussel. 2 2010. USP www.teses.usp.br/teses/dis poniveis/48/48134/tde- 20042010-143015/pt- br.php 0 04 Marilene Melo Vieira. A Filosofia da Educação no curriculo do Curso de Pedagogia. 2 2010. USP https://sapientia.pucsp.br/ handle/handle/10078 0 05 Maria Dulcineia da Silva Loureiro A Institucionalização da formação em filosofia em Universidades do Nordeste 2 2008 USP Biblioteca da USP 0 06 Olga Aparecida Nascimento Loyola Filosofia na universidade: traçar, inventar, criar. 2 2008. USP www.teses.usp.br/teses/dis poniveis/48/48134/tde- 26012009-171841/ 0 07 José Renato Polli. Ética do discurso e ética universal do ser humano: convergências entre Jurgen Habermas e Paulo Freire 2 2006 USP Biblioteca da USP 0 08 Regina Maria Zanatta Jonathas Serrano e a Escola Nova no Brasil: raizes católicas na corrente progressista. 2 2005 USP Biblioteca da USP 0 09 Evandro Luiz Ghedin. O filosofar como práxis: pressupostos epistemológicos e implicações metodológicas para seu ensino na escola média. 2 2004 USP Biblioteca da USP 1 10 Alonso Bezerra de Carvalho Max Weber: burocracia, carisma e educação. 2 2002 USP Biblioteca da USP 1 11 Geraldo Balduino Horn Por uma mediação praxiológica do saber filosófico no ensino médio: análise e proposição a partir da experiência paranaense. 2 2002 USP Biblioteca da USP 1 12 Ivetti Magnani. Ensino superior nos anos 90:ensino, pesquisa e extensão 2 2002 USP Biblioteca da USP Fonte: CNPq. Currículo Lattes. http://www.cnpq.br. Acesso em: 08/12/2014 246 APÊNDICE C –TESES ORIENTADAS POR DERMEVAL SAVIANI – 2000-2015 Nº Autor Título no de Defesa IES de Origem 0 01 Luciana Cristina Salvatti Coutinho. A questão da prática na formação do pedagogo no Brasil: uma análise histórica. 2 2013. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 02 Elisabete Gonçalves de Souza. Relação trabalho-educação e questão social no Brasil: uma leitura do pensamento pedagógico da Confederação Nacional da Indústria CNI (1930-2000). 2 2012. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 03 Luciana Beatriz de Oliveira Bar de Carvalho. As origens do Município Pedagógico no Brasil e em Portugal: estudo comparado dos casos de Uberabinha e Mafra. 2 2010. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 04 Tânia Conceição Iglesias. A experiência educativa da Ordem franciscana: aplicação na América e sua influência no Brasil colonial. 2 2010. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 05 Sonia Maria Fonseca. A formação para o trabalho manual no Brasil Colônia. 2 2010. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 06 Gilcilene de Oliveira Damasceno Barão. As contribuições educacionais de Florestan Fernandes: o debate com a Pedagogia Nova e a centralidade da categoria revolução. 2 2008. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 07 Suze Gomes Scalcon. A teoria na prática e a prática na teoria: uma experiência histórico- crítica. 2 2003. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 08 Ruben Guedes Nunes. Hegel, Dialética, Educação. 2 2002 UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 0 09 Maria de Lourdes Pinto de Almeida. A apropriação do conhecimento público pelo setor privado na relação Universidade-Empresa: um estudo a partir do caso da UNICAMP. 2 2001. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 10 Fábia Liliã Luciano. Gênese e expansão do magistério público catarinense (1836-1889). 2 2001. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 11 Ronalda Barreto Silva. Educação comunitária: além do Estado e do mercado? A experiência da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade - CNEC (1985-1998). 2 2001. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 1 12 Antonio Carlos Ferreira Pinheiro. Da Era das Cadeiras Isoladas à Era dos Grupos Escolares na Paraíba. 2 2001. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ 1 13 Celina Midori Murasse. O Liceu de Artes e Ofícios: uma explicação histórica.. 2 2001. UNICAMP http://repositorio.un icamp.br/ Fonte: CNPq. Currículo Lattes. http://www.cnpq.br. Acesso em: 08/12/2014