Uma é a escritora, outra, a mulher: um estudo sobre as duas facetas da personagem feminina em Lésbia (1890), de Maria Benedita Câmara Bormann (Délia)

Durante o Oitocentos, a educação que a mulher brasileira pertencente à elite socioeconômica recebia era primordialmente para torná-la mãe de família e esposa exemplar. Contudo, com a modernização do Império brasileiro e almejando o desenvolvimento nacional, uma melhor educação se tornou necessária, inclusive para as mulheres. Dessa forma, algumas delas foram mais bem instruídas e, a partir dessa construção de conhecimentos, puderam questionar seus modelos de vida. Ao longo desse período, a imprensa e o mercado editorial brasileiros se desenvolveram efetivamente, todavia, esse espaço literário era bastante fechado para as escritoras mulheres que intencionassem escrever e publicar. Hoje, sabemos que, apesar dessas dificuldades em sua educação e vida social, notáveis mulheres tornaram-se escritoras no século XIX. Entre elas, figurou o nome de Maria Benedita Câmara Bormann, conhecida como Délia, escritora muito publicada no Rio de Janeiro oitocentista, embora hoje quase não se tenha acesso à sua obra ou registros de seu trabalho nos compêndios literários. Assim, a presente dissertação tem como objetivo ponderar sobre como se configura a personagem feminina no romance Lésbia, publicado em 1890 por Délia. No centro da trama, temos Arabela, que se torna escritora, participando do mercado editorial do final do século XIX, além de viver diversos relacionamentos amorosos ao longo da narrativa. Portanto, nossa leitura da figura feminina circunda dois aspectos: a representação da escritora no Brasil oitocentista e, em seguida, a análise de Arabela pelo viés de sua vida amorosa e afetividades, elementos que tornam a prosa de Bormann à frente de seu tempo. Para cumprir estes objetivos específicos, ancoramo-nos em estudos sobre a história da mulher brasileira, com foco naquela pertencente à classe mais abastada (VERONA, 2013; SANTOS, 2010; D’INCAO, 2018), estudos sobre a sexualidade e afetividade feminina (DEL PRIORE, 2014), sobre a história do mercado livreiro brasileiro do século em questão (EL FAR, 2006, 2010) e sobre a narrativa de ficção (CANDIDO, 2018; LEITE, 1985). Como resultado, acreditamos que atualmente ainda existe uma necessidade de rever a historiografia literária oficial, pois, se nomes como o de Délia – escritora que ajudou a consolidar a literatura brasileira – são apagados, é necessária uma revisão que resgate os nomes de nossas primeiras escritoras. Dessa forma, poderemos fazer uso de uma história literária mais igualitária.